REALIZAÇÃO DUO Informação e Cultura. COORDENAÇÃO GERAL Maria Helena Cunha Marcela de Queiroz Bertelli. CURADORIA Marta Porto XBrasil

August 29, 2017 | Author: Eugénio Candal Fernandes | Category: N/A
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Belo Horizonte — Minas Gerais — Brasil 5 a 8 de outubro de 2010

REALIZAÇÃO DUO Informação e Cultura COORDENAÇÃO GERAL Maria Helena Cunha Marcela de Queiroz Bertelli CURADORIA Marta Porto | XBrasil PATROCÍNIO USIMINAS PARCERIA AECID – Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento XBrasil APOIO Banco do Brasil

EDIÇÃO DUO Editorial COORDENAÇÃO EDITORIAL

APOIO CULTURAL Instituto Cultural Usiminas CentroeQuatro Instituto Antônio Mourão Guimarães – IAMG Rádio Inconfidência Rede Minas Hoje em Dia COLABORAÇÃO Itaú Cultural Fundação Municipal de Cultura

Maria Helena Cunha Élida Murta PRODUÇÃO EDITORIAL Lais Vitral REVISÃO Rachel Murta TRANSCRIÇÃO Cássia Torres FOTOGRAFIA

PRODUÇÃO EXECUTIVA Paralelo 3 | Cibele Teixeira e Camila Valente IDENTIDADE VISUAL E DESIGN Voltz COBERTURA MULTIMÍDIA Fábrica do Futuro ASSESSORIA DE IMPRENSA Sinal de Fumaça

Artur de Leos – Fábrica do Futuro

ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA Maria Helena Batista e Sumaya Costa

DESIGN GRÁFICO

EQUIPE DUO INFORMAÇÃO E CULTURA | 2º SEMINÁRIO

Voltz Design

coordenação de comunicação

Élida Murta IMPRESSÃO Formato Artes Gráficas

coordenação de produção

Lais Terçariol Vitral

“O espaço, fora de nós, ganha e traduz as coisas.” Rainer Maria Rilke

07/10

SUMÁRIO

Conferência Lugares e agentes para a produção de teoria

66

Martí Peran

67

DUO Informação e Cultura

10

Mesa 3 A arquitetura do espaço e suas linguagens

74

Natacha Rena

75

Instituto Cultural Usiminas

12

Fernando Maculan

76

Estudio de Arquitectura y Paisaje – Luis Callejas

91

Ana Tomé | AECID O espaço cultural ibero–americano Marta Porto | XBrasil O espaço que antecede os espaços culturais

13

Pedro Mendes

93

14

Mesa 4 Artes, expressões artísticas e linguagens

96

Lucas Bambozzi

97

Marcello Dantas

105

06/10 18

Conferência de Abertura Espaço: criação da imaginação

08/10

Alcione Araújo 108 28

Mesa 1 Espaço como imaginário

Mesa 5 O espaço como experiência: repertório e gestão Experiências nacionais

29

Eduardo de Jesus

109

Antônio Carlos de Moraes Sartini

30

Leonel Kaz

114

Carlos Gradim

36

Stéphane Huchet

121

Sérgio Vaz

42

Mesa 2 A cidade como espaço cultural

123

Christian Jardón

43

Jacqueline Guimarães

136

Gloria Inés Palomino

44

Aimar Labaki

139

María del Valle

50

Mauro Munhoz

59

Estevão Fiúza

Experiências internacionais

Mosaico de Fotos

149

duo informação e cultura

Com o desejo de aprofundar a reflexão sobre o campo e sobre a prática da gestão cultural no Brasil e na Ibero-América, a DUO Informação e Cultura realizou, em Belo Horizonte, em outubro de 2010, o encontro Espaços Culturais - 2º Seminário Internacional de Gestão Cultural. Para aprofundar essa reflexão era preciso avançar, também, na metodologia de preparação e na definição da dinâmica do 2º Seminário. Consideramos, assim, que o tema espaços culturais pudesse ser capaz de potencializar uma discussão ampla sobre os sentidos, o espaço, a gestão, a sustentabilidade, enfim, sobre o lugar onde a cultura se realiza. Nessa perspectiva, realizamos, em 2009, em parceria com a consultora e curadora Marta Porto, um Encontro Preparatório no qual tivemos a participação de diversos especialistas brasileiros que eram referências em suas áreas de atuação. Assim, a programação final deste 2º Seminário, tanto no que se refere à definição de conteúdos e de convidados quanto ao formato de sua realização, foi resultante desse processo de cooperação cultural. Estabelecemos uma dinâmica que tinha por objetivo proporcionar ao público um maior aproveitamento dos conteúdos apresentados e debatidos durante todo o seminário. A escolha do espaço CentroeQuatro nos permitiu realizar uma dinâmica flexível, composta pela alternância de conferências, de ‘mesas redondas’ e de discussões em formato de ‘entrevista’, complementada por uma programação que incluiu: a ocupação dos espaços de circulação por intervenções artísticas, produzidas pelo artista Leo Piló; duas videoinstalações, que ocuparam uma sala especial do espaço; sessões de cinema, com curtas temáticos; e, ainda, debates mais informais – na Arena Fábrica do Futuro – realizados após os encontros oficiais de cada dia.

No intuito de democratizar o acesso à programação tivemos a preocupação de incluir as redes sociais e o uso da tecnologia virtual durante todo o Seminário. Esse trabalho foi realizado pela Fábrica do Futuro, ONG sediada em Cataguases (MG), que, além da cobertura multimídia de todo o Encontro, também utilizou as plataformas de mídias sociais – twitter e facebook – para transmitir, em tempo real, os acontecimentos das atividades programadas. A presente publicação tem como propósito ampliar a divulgação – gratuita – dos conteúdos gerados durante o encontro Espaços Culturais - 2º Seminário Internacional de Gestão Cultural para um público interessado e, cada vez mais, diversificado e atuante no campo da gestão cultural. Essa é uma política que a DUO tem adotado em favor da democratização do acesso à informação e à formação no campo da cultura. É importante destacar que um encontro internacional e especial como esse só se realiza com a construção permanente de parcerias sólidas, tendo a cooperação como uma atitude propositiva e a gestão como fio condutor para a consolidação do espaço da cultura em nossa sociedade. Assim, queremos agradecer a todos os nossos patrocinadores, apoiadores, parceiros, colaboradores, fornecedores, convidados e, em especial, ao público participante deste 2º Seminário. De nossa parte, queremos dizer que foi realmente gratificante promover e realizar este encontro e que já estamos trabalhando com a perspectiva de dar continuidade às nossas iniciativas no campo da formação cultural.

instituto cultural usiminas

o espaço cultural ibero–americano ana tomé

Diretora do Centro Cultural da Espanha em São Paulo/AECID

O Instituto Cultural Usiminas consolida-se como um dos mais notáveis e perenes testemunhos de cidadania corporativa que se tem notícia na história da indústria brasileira. Em 1993, a Usiminas inovou ao lançar as bases do projeto com o objetivo de sistematizar os investimentos culturais das empresas do grupo e implantar projetos culturais de longo prazo. Desde então... luzes, câmera e muitas ações! Ao longo de sua história – contando sempre com o apoio das Leis de Incentivo à Cultura e, a partir de 2007, com o apoio também da Lei Federal de Incentivo ao Esporte – a Usiminas já patrocinou mais de 1500 projetos em cerca de 50 municípios do Brasil. Números que, em pouco tempo, fizeram da Usiminas uma das empresas que mais investe em cultura em Minas Gerais por meio da Lei Estadual de Incentivo. Números que ganham vida nos palcos, quadras, salas de aula, livros, imagens, sons e movimentos que estão aí por este Brasil afora, educando as emoções e encantando as pessoas. Nosso diferencial? Simples... ir além da produção artística, abrangendo a cadeia produtiva da cultura e do esporte, do palco ao espetáculo, da ideia ao aplauso, dos treinos às conquistas. Mais do que contribuir para formar artistas ou atletas, o compromisso da Usiminas é colaborar com a formação de indivíduos mais conscientes de seu papel na sociedade. Ou seja, a partir da excelência tecnológica do aço que produz, posicionar-se como indutora do desenvolvimento social das comunidades onde está presente, a partir de uma política sustentada por três valores principais: a inclusão, a formação e o desenvolvimento do cidadão. Afinal, com a Usiminas é assim: inovação em aço, também a serviço da Arte e do Esporte, também a serviço do Homem.

A emergência do conceito de gestão cultural e a implementação de novas práticas na gestão da cultura no âmbito ibero-americano vêm se apoiando com sucesso, a nosso ver, no intercâmbio e na transferência de conhecimentos entre a América Latina e a Espanha. Em ambas as regiões, a profissionalização do setor foi se desenvolvendo a partir de uma dinâmica de imediatismo mais baseada na intuição que no planejamento estratégico: a maioria dos profissionais que vimos se incorporar nesse novo espaço profissional até a década dos anos 1990 não tinha uma capacitação especializada, a qual era inexistente na região, e procedia de uma formação e experiência profissional fundamentalmente autodesenhada. Sem dúvida, esse panorama está mudando: são vários os cursos universitários agora existentes e, ainda mais numerosos, os seminários, oficinas e programas lato sensu que vêm sendo organizados com sucesso na região, como é o caso, em Belo Horizonte, do Seminário Internacional de Gestão Cultural, a caminho da sua terceira edição. Outro elemento-chave que tem contribuído significativamente para a mudança de cenário é o crescimento da mobilidade dos atores, dos fluxos de cooperação cultural dos agentes públicos e da sociedade civil no espaço ibero-americano, o que oferece uma oportunidade de equidade na distribuição da informação e da experiência. Assim, os contatos presenciais complementam de forma efetiva as vantagens trazidas pelas novas tecnologias da informação. Acreditamos que a Espanha, por meio de diferentes instrumentos e programas - sejam estes administrados pela Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (AECID), pelo Ministério da Cultura, pelas Universidades ou por outras instâncias da administração -, tem tido um papel significativo e complementar tanto junto às iniciativas locais como às multilaterais, como é o caso de organizações como SEGIB ou OEI, das quais a AECID é a fonte de financiamento espanhol. Em nossa opinião, esse trânsito de pessoas representa um elemento determinante não somente na configuração profissional do setor cultural, mas também na criação de esse espaço “regional” ibero-americano que ambicionamos. Entendemos que o novo profissional da cultura tem a oportunidade de encarar sua missão profissional de uma forma proativa e política, e que a entende como uma função social, fruto de uma análise da realidade cultural contemporânea, em oposição ao administrador clássico, que se limitaria a atuar dentro do sistema formal e burocrático. Dessa forma, entendemos que o incremento da mobilidade tem gerado trocas de experiências e conhecimentos que auxiliam na especialização do setor e que são determinantes para a formação do espaço cultural ibero-americano. Os esforços em prol de ações conjuntas, projetos de cooperação e processos de co-produção, permitem criar um clima de confiança entre os profissionais e as organizações de gestão cultural, o que vem gerando plataformas e redes de encontro cada vez mais amplas. Nesse contexto, consideramos que a AECID, através da rede de Centros Culturais da Espanha na América Latina, tem sido um elemento dinamizador desse modelo equitativo de cooperação cultural ao qual aspiramos, visão que confiamos ser compartilhada por parceiros e sócios locais.

o espaço que antecede os espaços culturais marta porto

XBrasil

O que é espaço? O que é pensar a cultura e as artes a partir de espaços? Como entendemos a configuração de lugares dedicados à subjetividade, à memória, à percepção e ao conhecimento em um presente no qual o valor da experiência se desloca gradualmente do real para o virtual? Quando a Duo me convidou para pensar o programa deste seminário-encontro, fiquei algumas semanas acionando a minha memória afetiva para lugares que despertaram o meu senso estético, onde vivi encontros com obras, ideias, pessoas, que me emocionaram e me fizeram sair diferente de quando entrei. Um tempo sem computador, celular e feiras tecnológicas. Um tempo em que estar no Louvre, na Bienal de Veneza ou na lavagem da escadaria da Igreja do Bonfim, na Bahia, era um acontecimento único, exigia preparo e tempo. Não estava ao alcance de um click, de um vídeo postado no Youtube, na velocidade das redes de telejornalismo globais, das tecnologias multimídias disponíveis em todas as partes do mundo, mesmo que de forma desigual. Duas vivências em especial não me saíam da cabeça. Uma que vivi adolescente, quando entrei no Museu do Louvre e fiquei decepcionada com a Monalisa: — tão pequena! Apesar das explicações mais que eruditas do meu pai, demorei anos para me desprender daquela primeira sensação: surpresa e decepção. Muitos anos depois, estava no mesmo Louvre e parei ao lado de uma família hispânica constrangida diante do filho de uns 13, 14 anos, que entrava pela primeira vez no museu francês, mas já tinha passeado por seus corredores e obras através das redes virtuais e, enfadonho, dizia aos pais: eu já conheço. Espantados os pais tentavam convencer o garoto de que estar ali era uma experiência única, mas experiência implica vivenciar de forma própria e, naquele momento, a magia não aconteceu. Todos os jovens sentem isso? É claro que não! Ainda há surpresa e encantamento em estar ali, in loco, mas há um dado novo: a realidade virtual e as mutações que ela traz na condição da experiência. Uma mutação na forma de a subjetividade se dar. Então, é preciso, antes de tudo, entender a mutação nesse espaço, a forma de viver experiências simbólicas, de produzi-las e disseminá-las, que antecede a ideia de espaços culturais. Isso é que merece ser sublinhado. E assim começamos a pensar o lugar e o tempo para os espaços culturais neste aqui e agora. Entendendo essa como uma primeira ideia, espaço cultural é um lugar de constituição de experiências, de alargamento do tempo-espaço do sujeito a partir do contato com situações, com obras, com atividades que afetam os seus sentidos, promovendo desejos, fantasias, sonhos, apreensão de conhecimentos ou, simplesmente, emoção. Podemos supor que o debate atual gire em torno dessa questão-chave: quais os fatores que juntos permitem ao sujeito vivenciar esse espaço-lugar-tempo e como, então, ele deve se constituir?

Responder a essa questão não é simples, passa pelo entendimento do tempo histórico que se vive (contexto), os desafios e oportunidades que ele nos impõe, dos conflitos culturais em cena nos territórios materiais (cidades, comunidades, grupos) e virtuais (as redes sociais e de relacionamentos, as tribos nômades, os estilos de vida e de comportamento, a aldeia global), das linguagens acionadas e requeridas para promover ação, pensamento e criação, e, por fim, como a dimensão simbólica – arte e cultura –, criadora de subjetividades, afeta o campo do imaginário social e a noção existencial da vida. Pensar espaços culturais na atualidade é ter em mente que, quanto mais complexas e difusas se tornam as questões culturais, mais limitados são os instrumentos de que dispomos hoje para fazer frente a elas. Além das questões trazidas pelos gestores culturais, como da gestão dos espaços, repertório cultural, acesso e linguagens, formação de quadros, sustentabilidade e modelos administrativo-financeiros, há dilemas, desafios, riscos, oportunidades para se reorganizar o discurso e com ele o pensamento e a práxis sobre espaços culturais. Noções que provêm da filosofia, da teoria do imaginário, da arquitetura e urbanismo, da psicanálise, dos artistas e criadores, das novas formas de fruição que colaboram para ressignificar essa noção de espaço, e especialmente de espaço cultural. Reunir esse pensamento em uma proposta de curadoria para um encontro de quatro dias em Belo Horizonte não foi fácil. Exigiu um processo de várias mãos que começou a se construir no encontro preparatório realizado em novembro de 2009 que contou com a participação de muitas mentes ativas e criativas. A partir desse encontro, organizado em quatro categorias de debate, construímos as bases do programa realizado durante o Seminário. Se há espaços voltados para a dimensão cultural da vida – simbólica – é porque se reconhece um lugar primordial onde mora a imaginação, o sonho, a criatividade. Uma dimensão da vida humana ligada ao campo da subjetividade, do desejo e do imaginário. Esse campo se organiza, desde a origem do homem, em rituais, mitos, símbolos, que organizam nosso sistema interior de crenças “como cacos de cerâmica partida num sítio arqueológico”. E é a crença de que o homem é um ser capaz de imaginar, sonhar, criar, produzir imagens, simbolizando a sua passagem pela vida que dá sustentação à constituição de espaços culturais. É esse espaço de significação da dimensão criativa e imaginativa da vida que a curadoria buscou afirmar através de uma programação que se abriu para os artistas e os criadores, dialogando com filósofos, escritores, pensadores e gestores, para afirmar a experiência poética e artística como espaço que mais realiza no homem a sua experiência pessoal.

al cione ara ujo

06

Convidado: alcione araujo Escritor Rio de Janeiro – RJ

/10

olhar o espaço

Sabendo o mundo pelo tato, cheiro, sons, gosto, que seria do amanhecer? Pergunta o poeta Ferreira Gullar, sugerindo o olhar como sentido privilegiado. Para essa viagem pelo maior dos espaços culturais, vasta riqueza de detalhes se oferece à percepção. Ao utilizar a imagem como representação do passado, a memória torna-se o museu da imaginação. É nesse museu, nesse espaço de imagens, que as ideias ganham forma. E, ao despegar-se do real, o imaginário articula-se no simbólico. Daí o espaço estar intimamente ligado ao olhar e à memória, num truísmo: sem ver não sabe. Sem memória não se lembra. museu da imaginação. jardim da imaginzação

Conferência de Abertura

Toda imagem é capturada pelo olhar. O exercício do olhar é um permanente sair de si, um esforço constante de trazer o mundo para si. Olhar não acumula, não abarca: ele procura. Não descansa sobre o visto, se mete nas frinchas. E sempre deseja mais do que lhe é dado ver. O olhar é sempre pura interrogação. O que é? É? Não é? O olhar pensa. Daí se dizer que as imagens capturadas pelo olhar são o jardim da imaginação. É nesse jardim, nesse espaço florido, que a imaginação ganha forma. Jardim e museu da imaginação não seriam fantásticos espaços culturais?

Os conceitos ocidentais de espaço. Na poesia: Dante e o espaço transcendental: inferno, purgatório, paraíso terreal e paraíso celestial. Na ciência: Galileu e o espaço cósmico: estrela, movimento, planeta, sistema solar. Nas artes plásticas: do renascimento, com o homem no centro da tela, ao abstrato, expansão máxima da imaginação. Na sociologia: espaço público e espaço privado. Na literatura: Guimarães Rosa e ‘o sertão é dentro da gente’. Na psicanálise: o útero, dimensões mínimas, felicidade máxima. Na filosofia: Bachelard e a poética do espaço. Nas narrativas dramáticas: cena-cenário-encenação, palco, telona e telinha como reconstruções públicas do espaço íntimo.

espaço: criação da imaginação¹

A percepção de um espaço físico real, independentemente de sua utilidade, é a organização e a interpretação das impressões sensoriais do indivíduo, à luz da sua memória. Ao articular categorias como organização, interpretação e memória, a percepção se dispõe como fato de linguagem. No entanto, para cumprir o objetivo proposto pelos organizadores deste evento, de ampliar o conceito poético de espaço, em vez de nos acomodarmos ao seu entedimento como linguagem, sugiro breve visita a alguns espaços culturais, usando a memória e a imaginação.

olhar e ser olhado

¹ Em geral, falo de improviso, seguindo singelo plano de voo. Não escrevo para otimizar a presença física e, olho-no-olho da plateia, confiar na eloquência viva, nos devaneios, depoimentos e imprevistos que animam a viagem. Quando vão publicar, reviso a gravação, mantendo o élan vital. Não foi possível no caso. Fechadas as janelas do local, o calor derretia; abertas, o ruído ensurdecia, e o microfone teve crises de mudez. Por ironia, o tema era gestão cultural. A transcrição ficou precária também porque andei falando fora do microfone e me perdi no tempo. Eis a mixagemsampleada-compilada da transcrição, do plano de voo e do que incluí e excluí depois.

Uma pessoa, toda pessoa é um olhar lançado ao mundo, e todo corpo se expõe à infinidade dos olhares. Cada um vê à sua volta, e é visto pelos que o rodeiam. Vejo todos vocês e sou visto por vocês. E eu os vejo do meu lugar e só posso vê-los daqui. Cada pessoa, cada corpo tem o seu jeito de olhar. Eu sou tantos quantos são os que veem. Diferentes olhares, diferentes percepções, diferentes visibilidades. o olhar como construção. o lugar de onde se olha

O homem não via como vê agora. Aprendeu a olhar com o tempo. Ou, com o tempo, mudou a maneira de olhar. Portanto, o olhar é uma construção. E também a percepção é histórica. Não apenas como humanidade, mas também como indivíduo. Cada um vê o mundo com a sua história. Quem vê vê de algum lugar – que lugar? Só vejo do meu lugar – onde nesse momento me encontro na minha trajetória existencial, social, intelectual e de voyeur! É desse lugar que olho, e só desse lugar posso ver o mundo e percebê-lo.

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 19

corpo como prisão. olho como janela

ouvir chama para dentro

Olha-se para conhecer. Para obter conhecimento do que se olha. Descobrir as diferenças. Pode-se aprender a olhar? Há uma pedagogia do olhar? Leonardo da Vinci (séc. XV):

A audição é importantíssima na apreensão do saber. O ouvir chama para dentro. Ouço em mim, dentro de mim. O que ouço reverbera em mim. Em mim, onde tudo deve começar. A visão socrática do conheça-te a ti mesmo sugere voltar os olhos para dentro de si, e o ouvir é o mais dentro de si. Para Aristóteles, a visão é um sentido superior, mas, nas questões da inteligência, a audição é mais importante. A fala ouvida é expressão da razão. A fala utiliza a palavra, construção social e linguagem elaborada pela razão. Na palavra está o coração da educação que, em última análise, é memória e experiência. Em suma: a educação, forma sistematizada de apreensão do saber, é memória e experiência articuladas pela palavra, que pode ser transmitida e conservada.

Não vês que o olho abraça a beleza do mundo? É janela do corpo por onde a alma especula e frui a beleza do mundo, aceitando a prisão do corpo que, sem esse poder, seria um tormento. Admirável necessidade! Quem acreditaria que um espaço tão reduzido seria capaz de absorver as imagens do universo? O pintor deve fazer-se semelhante ao espelho, que adota a cor do que olha e se enche de tantas imagens quantas coisas tiver diante de si.

o dentro e o fora do olhar

a visão se impõe ao verbal. a palavra invadida pelo olhar

Wim Wenders, cineasta alemão, no livro “Empresta-me teus olhos”:

O poder mágico dos olhos:

O enquadramento é algo muito estranho porque o que está fora é quase mais

Amor à primeira vista. Mau olhado. Direito a discordar: ponto de vista. De

importante do que o que está dentro. Costumamos olhar o enquadramento

onde se vê: perspectiva. Afirmar verdade: evidente e sem sombra de dúvida,

pelo que ele contém num quadro, numa foto ou num filme. Normalmente,

é claro. Tem a ver. Não tem a ver. Logo se vê. Está se vendo. Veja o que diz!

pensamos no que está no interior, mas o verdadeiro ato de enquadrar

Escutar: Olha aqui. Ver para crer. Vidente. Visões de mundo. Revisão.

consiste em excluir algo. Acho que o enquadramento se define muito mais pelo que não se mostra do que pelo que se mostra. Há uma escolha contínua

olhar fiador da palavra

quanto ao que será excluído. Para mim é a parte mais instigante de todo o

Cremos nas palavras porque cremos em nossos olhos. Cremos que as coisas existem porque as vemos, e as vemos porque existem. Pode-se dialogar com a palavra, a imagem se impõe.

processo cinematográfico. Porque, a cada fotograma que você realiza, você decide o que faz e o que não faz parte da história. Portanto, o enquadramento tem total relação com o contar da história.

audiovisual imagem e emoção

Oliver Sachs, neurologista e escritor, no filme “Janelas da Alma”: O ato de ver e de olhar não se limita a olhar para fora, não se limita a olhar o visível, mas também o invisível. De certa forma, é o que chamamos imaginação. Todos nós somos criaturas emocionais. E creio que todas as nossas percepções, as nossas sensações e experiências são carregadas de emoção, de emoção pessoal. Acredito que a emoção fique, por assim dizer, codificada na imagem. Curiosamente, às vezes, a emoção pode se separar da imagem. As pessoas que têm este problema, denominado Síndrome de Capgnes, podem deixar de reconhecer o marido, a esposa, os filhos, e

Uma imagem vale por mil palavras. Não se entende essa ideia sem as palavras. A era do audiovisual instala a crise da palavra. A saturação da imagem coincide com o declínio da palavra e a crise da razão. Pensar leva ao aprofundamento e à crítica, à imagem sedutora e sensual, afasta o pensamento e a crítica, leva à reconciliação e à adesão. Daí a hegemonia das técnicas de marketing na persuasão política. O silêncio das imagens vence os argumentos. Produtos não se explicam, são consumidos pelo que são: Coca-Cola é isso aí. eugen bavcar, fotógrafo, filósofo, cego, no filme

“a janela da alma”:

passam a acreditar que estão sendo enganadas. Elas dizem “Você não é meu marido, você se parece com ele, mas é uma imitação. Você não é

Vocês não são videntes clássicos, vocês são cegos. Porque atualmente

o verdadeiro. Você tomou o lugar dele.” Aparentemente, o que acontece

vivemos em um mundo que perdeu a visão. A televisão nos propõe

nesse caso é que o sentimento de ternura e a familiaridade desaparecem.

imagens prontas e não sabemos mais vê-las, não vemos mais nada

O reconhecimento visual existe, mas não o emocional. E, nesse caso, a

porque perdemos o olhar interior, perdemos o distanciamento. Em outras

pessoa mergulha em plena contradição e é forçada a concluir que está

palavras, vivemos em uma espécie de cegueira generalizada. Eu também

sendo enganada, que estão lhe pregando uma peça. Isso reforça a ideia

tenho uma pequena televisão, e assisto-a sem enxergar. Mas há tantos

de que o reconhecimento, a memória visual e toda forma de percepção

clichês, que não é preciso que eu veja fisicamente para entender o que está

devem estar inseparavelmente ligadas à emoção. Quando a memória

sendo mostrado. Às vezes, verifico por telefone. Telefono para alguém e

visual é desconectada da emoção que lhe corresponde, uma grave crise

me dizem “Sim, tem razão, é isso que está acontecendo”. [...] Para mim,

nervosa pode acontecer.

imagem e linguagem estão ligadas, isto é, o verbo é cego, mas é o verbo

20 – Conferência de Abertura: Espaço - Criação da Imaginação - Alcione Araujo

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 21

que torna visível. Sendo cego, o verbo torna visível, cria imagens. Graças ao verbo, temos as imagens. Atualmente, as imagens se criam por si mesmas,

se deixa seduzir pelos sentidos corre os riscos da incerteza ou de se perder no que vê.

deixaram de ser o resultado do verbo, e isso é muito grave. É preciso que haja equilíbrio entre verbo e imagem. Por exemplo, Michelangelo não viu Moisés. Ele não foi segui-lo no Sinai. Não viu como o decálogo foi lançado sobre o bezerro de ouro. Mas leu o texto.

a imagem chega ao espírito

Há muito enigma na passagem da imagem capturada pelo olho até o espírito. É complexa a relação entre o olho e o cérebro. Envolve o sistema nervoso central, todos os sofisticados órgãos visuais, incluindo os nervos óticos. A neurologia sugere que os neurônios são uma espécie de disco rígido, o HD dos computadores, que controlam tudo o que acontece no corpo e nas emoções dos indivíduos, da velocidade de circulação do sangue à memória de fatos passados. Os neurônios registram todas as imagens vistas durante a vida. O mal de Alzheimer é o refluir aleatório dessas imagens armazenadas ao longo da vida. wim wenders, cineasta alemão, no livro “empresta-me teus olhos”: Você pode sair do cinema depois de dez minutos, caso sinta, depois

Platão inaugura a separação entre corpo e alma e institui a desconfiança nos sentidos. Propõe ao homem deixar a caverna, afastar-se do mundo sensível e suspeitar da percepção, das pulsões, dos caprichos do corpo, abandonar cópias e simulacros e se voltar para a luminosidade radiante da Ideia. Na sua República, o rei será filósofo, os poetas e pintores serão expulsos. Suas ideias evitam o que os sentidos percebem; só acolhe ideias puras, de percepção não sensível. O rigor em separar ideia e imagem, inteligível e sensível, é esforço consciente para constituir conceitos universais, a fim de que o elemento concreto não seja confundido com a Substância. A Ideia, imaterial e pura, é tomada como realidade primeira, anterior e superior à matéria sensível. Como em todo objeto sensível há uma transcendência silenciosa, a Ideia não designa apenas o aspecto não sensível do que é sensivelmente visível. Ela é a essência daquilo que se pode ver, escutar, tocar, sentir. É uma visão despojada dos sentidos e do corpo, que leva à evidência, à essência e à certeza. As ideias são entidades não físicas, imóveis, inalteradas, irredutíveis. Esse esquecimento dos sentidos funda método e conhecimento, crucial na história do pensamento, instituindo o princípio: pensar é se pôr a distância. Entre a ordem empírica e a reflexão há um abismo de recusa.

desses dez minutos, se perceber que aquilo que verá é algo que vai querer apagar posteriormente, e que não vai conseguir apagar. Acho que

o jardim

muitas imagens, uma vez que entram em nós, continuam a viver dentro

O bem mora no prazer do sábio, dizia Epicuro: mente quieta, domínio das emoções e sobre si mesmo. Esse prazer apenas satisfaz uma necessidade ou aquieta a dor, e conduz-nos a uma vida simples. O prazer está no corpo e no pensar - a saúde. Libertar o homem e a função principal da filosofia. Propõe permanente encontro, a começar pela sua escola: jardim, que é espaço de encontro. Para ele a sensação nasce do encontro de duas presenças, dois corpos. Todo conhecimento começa nos sentidos, que são mensageiros do saber. Nem a razão ou o conceito pode refutar os sentidos porque dependem deles.

de nós. Se vejo um filme e percebo que não quero que continue a viver em mim, a única solução é levantar e sair. Você não pode, na verdade, você não tem escolha. Aprendi isso com a minha esposa. Eu nunca havia saído de um cinema antes de conhecer minha esposa. Ela era muito radical. Às vezes, saía depois de cinco minutos, e dizia: ‘Eu sei que não quero que este filme continue vivo na minha memória’. Ela sai e eu fico lá sentado sozinho, e tendo que pensar: ‘Será que continuo vendo este filme? O que quero fazer?’ E aprendi que é bom sair.

o que os olhos não veem o coração sente

novo espaço. novo lugar do homem

Radares e instrumentos de telemetria e navegação alongaram, ampliaram e estenderam a capacidade do olho humano. Pode-se dizer que o homem vê mais, vê até o invisível. Aviões pousam com instrumentos quando o olho humano nada vê. Na paisagem imutável, quando o olho humano é inútil, os instrumentos conduzem a nave. Vemos o Google-earth, maps, street view, etc. O olhar se estendeu, o mundo encolheu, hoje é um telecentro cultural. No entanto, teleguiado, teleconduzido, enquadrado e filtrado. O passeio livre da alma é pensar.

O esforço europeu de restaurar a cultura grega suscitou o Renascimento, que mudou o espaço pictórico-simbólico. A tela reproduz a projeção do olho humano, com a técnica da perspectiva e seu ponto-de-fuga no olho do espectador. A perspectiva introduz a racionalidade na obra de arte. Descobre-se um espaço que não havia antes, assim como aconteceram as grandes descobertas feitas pelos navegantes. E o novo espaço é organizado com novos critérios. No centro da tela, onde reinavam deuses e santos, aparece o homem, mortal e pecador.

a caverna

o cosmo

Para vários filósofos, o saber sensível é vago, incerto e confuso. No mundo dos sentidos não há estabilidade nem harmonia. A realidade sensível não pode produzir conhecimento porque as coisas sensíveis são imponderáveis, dissemelhantes e múltiplas nelas mesmas. Quem

As discussões de Galileu Galilei com seus adversários aristotélicos anunciam a mudança no tratamento do olhar. O conflito entre o que se vê a olho nu e o que mostra o telescópio leva à negação do telescópio para o saber astronômico e à negação do saber de Galileu, perigoso para valores

22 – Conferência de Abertura: Espaço - Criação da Imaginação - Alcione Araujo

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 23

teológicos-metafísicos. O telescópio tem intrigante poder de ver o que não existe; muda distâncias, luminosidades, grandezas. Revolucionário o argumento de Galileu: telescópio não é auxílio para aumentar o tamanho dos objetos aumentando o poder do olhar, mas instrumento para corrigir a visão. A visão verdadeira é a proporcionada pela geometria de luz e lentes. Ele prova que nossos olhos não sabem ver, e não podem ver. Isso só pode ser compreendido pelo sentido da vista, que a Natureza não nos deu a capacidade de discernir tamanhas diferenças. Ao contrário, o olho introduz estorvos e obstáculos que lhe são próprios. Quem diria: olhos estorvam a visão! O telescópio é a razão corrigindo o olhar, ensinando-o a ver, liberando-o de si mesmo ao mostrar que a umidade dos olhos reflete e refrata a luz, modifica os raios luminosos e deforma objetos. A imagem será verdadeira quando o telescópio corrigir a imagem subjetiva ilusória, aquilo que veem nossos olhos não equipados. O essencial no telescópio não é aproximar objetos, mas transformar o ato de ver, fazendo-o resultar do ato de conhecer. O telescópio cria o olhar perspicaz, separando os olhos e a visão, fazendo desta o modelo intelectual daqueles. Algo semelhante se deu quando Leibniz se animou com o microscópio do biólogo Leeuwenkock. O microscópio põe em movimento duas ideias: o ideal do conhecimento como adequação do intelecto à coisa e a visão como melhor modelo da função de conhecer. o lugar para se ver além: o conhecimento

Para Descartes, ver é olhar atentamente, meditar, desconfiar, querer mais. É o intuits mentis, a intuição intelectual, para corrigir os enganos do olhar sensível. Sua visão é de conhecimento completo, olhar por todas as partes, em todas as direções. O resultado é ver e conhecer perfeitamente, aperceber-se, ver através, atravessar com a vista, perscrutar. Esse olhar penetrante, atravessador e reflexivo é o de um olho perspicaz, que vê claramente por ser dotado de qualidade fundamental que reencontra no visível e que, dali, por mutação, transmite ao espírito e ao intelecto: a perspicuitas, clareza e distinção do transparente. É o único olhar de vidência perfeita, evidentia, marca do verdadeiro. Eis porque falar em ponto de vista, aceitando que ideias e opiniões dependem do lugar de onde se vê o real, também ensina que se trata de visão feita nas alturas, que abarca até os confins do horizonte e o mundo circundante. Sua ciência se chama optikê, em grego, e perspectiva, no latim. Perspectiva é ver para frente e em profundidade, visão conquistada pelo artista, graças à geometria, que faz da perspectiva a geometria da visão. Com ela, o olho do observador se faz medida do visível e prepara, na filosofia, o advento do sujeito do conhecimento, capaz de evidência e de intuição porque, do lugar onde está, vê tudo, vê completamente. o lugar do espírito e o lugar da natureza

Para Hegel, os olhos não são o espelho do mundo e a janela da alma, como disse Da Vinci. Nem existe o olho da alma, o olhar interior do cristianismo, morada da verdade (o olho do corpo é fonte de pecado. Faz do homem escravo e por ele tem de se livrar das paixões para não perder a liberdade interior. A mortificação do olhar é necessária, porque nos olhos

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estão compreendidos todos os sentidos). Pensar não é experimentar, mas construir conceitos. Radical, Hegel propõe o olho do espírito, que nega o olho do corpo. Grande mudança no pensamento ocidental, marca o distanciamento e até certa aversão ao mundo dos sentidos, e a descoberta da oposição entre o homem e a natureza. Para superar essa contradição, propõe o Espírito Absoluto. Com a morte do sensível, inicia a era do Espírito: o conhecimento intelectual. Para Hegel, o Espírito é Ciência, e a ciência, a única realidade objetiva do Espírito. É a Ciência que tenta unir o que ela própria cindiu em elementos. Criamos dicotomias permanentes: a consciência e a coisa, o sujeito e o objeto – divisões que determinam as esferas do sensível e do pensado, do que vê e do que é visto. corpo, o lugar do espírito

Contra a ideia separada do espírito, Merleau-Ponty cria a fé perceptiva – a ilusão carrega a promessa da visão verdadeira que corrigiria a ilusória, se corrigíssemos nosso ponto de vista. Só a experiência sensível, fundamento para as construções do conhecimento, pode revelar a cegueira da consciência. Como diria Fernando Pessoa: ‘O que em mim sente está pensando.’ Separada do sensível, a consciência passa a ser propriedade física da Ideia, e, a partir daí, ela se tomará a si própria como causa primeira, e evocará seu poder sobre o corpo. Separada de sua própria causa, a consciência, ideia da ideia, produz ideias confusas e inadequadas. Quando escreve: Somos o mundo que pensa, o mundo que está no âmago da nossa carne; ou cita Cézanne: Sou a consciência da paisagem que se pensa em mim, sugere radical mudança na maneira de pensar: tomar o corpo como fundamento. Diz: Definir o espírito como o outro lado do corpo? Não sabemos de espírito que não esteja de par com um corpo, que não esteja estabelecido sobre esse solo!

Refere-se indiretamente a toda a tradição de Platão, Hegel e Descartes que pretende a dominação das paixões pela consciência, e a cisão entre espírito e corpo. Para ele, o olho não é suporte natural do espírito, nem o espírito é a sublimação da visão. Propõe a retomada a partir de um momento esquecido no qual o pensamento de ver substituiu o ver e fez dele seu objeto. Como Epicuro, disse que todos os nossos pensamentos têm sua origem nas sensações por conjuntura, analogia, similitude e combinação. E todo o conhecimento se instala nos horizontes abertos pela percepção. Ver é ter à distância, o olhar apalpa as coisas, pousa sobre elas, viaja no meio delas, mas não se apropria delas. Essa imaterialidade da operação visual a torna propícia ao espírito. Ela prepara os olhos para a transferência ao intelecto. O pensamento fala com a linguagem do olhar. O espírito dirá o que os olhos não sabem ver. o lugar da imaginação

Na linguagem intelectualista, imagem é simulacro. Não tem vida própria, nem significado autônomo; seu significado está fora dela e exige tradução. E só revela sua significação como conceito. Entre o real e o conceito,

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a imagem é mera passagem provisória; trampolim entre o sensível e o inteligível – metáfora, alegoria – sem autonomia. Por isso, para estudar a imaginação poética, Gaston Bachelar rompe com as práticas tradicionais das pesquisas filosóficas. O passado de cultura não conta; é inútil o esforço para construir pensamentos. Nada há que sirva de base a uma filosofia da poesia. O ato poético não tem passado. Em sua simplicidade, a imagem poética não ecoa o passado e prescinde de um saber. Ela é a dádiva da consciência ingênua. O poeta, na novidade das suas imagens, é sempre origem da linguagem. Contrariando a tradição, para Bachelard: a imaginação não é, como sugere a etimologia, a faculdade de formar imagens da realidade, ela é a faculdade de formar imagens que ultrapassam a realidade, que cantam a realidade. É uma faculdade de sobre-humanidade. A imagem percebida e a imagem criada são duas instâncias muito diversas e seria necessária uma palavra especial para designar a imagem imaginada.

Há diferenças entre imaginação reprodutora e imaginação criadora – a esta pertence a função do irreal, que é psiquicamente tão útil quanto a função do real, evocada por psicólogos para caracterizar a adaptação de um espírito à realidade etiquetada por valores sociais (rorschach). A hegemonia da visão na produção de conhecimento é sabida desde Aristóteles. Bachelard diz que ela fatalmente leva à consideração do mundo como espetáculo, como teatro, como panorama. O sujeito do conhecimento é colocado na posição contemplativa de espectador, enquanto o objeto do conhecimento tende a fundir-se em unidade homogênea e totalizadora. É preciso que o conhecimento seja acompanhado de igual esquecimento do saber. A imaginação é um poder maior da natureza humana. A imaginação nos desliga do passado e da realidade. o lugar dos afetos

Há um elo afetivo entre a pessoa e o lugar, diz Bachelard, e se dispõe a determinar o valor humano dos espaços de posse, felizes, amados e louvados, coração de uma poética do espaço. Ao valor real ligam-se valores imaginados. O espaço criado pela imaginação não pode ser indiferente, abandonado à medida e razão do geômetra. A casa como instrumento de análise da alma humana. Todo espaço verdadeiramente habitado tem a essência da casa. A casa abriga o devaneio, protege o sonhador, deixa sonhar em paz. Apenas pensamentos e experiências sancionam valores humanos. Ao devaneio pertencem os valores que marcam o homem em profundidade. Lugares nos quais se viveu o devaneio se reconstituem por si mesmos num novo devaneio. As lembranças das antigas moradas são revividas como devaneios, são imperecíveis. A casa é dos maiores poderes de integração para pensamentos, lembranças e sonhos. Sem a casa, o homem seria um ser disperso. Ela é corpo e alma. O espaço é tudo porque o tempo não anima a memória. A memória não registra a duração concreta. Não se podem reviver durações abolidas. Só se pode pensá-las na linha do tempo abstrato, sem densidade. É pelo espaço, no espaço, que encontramos os belos fósseis de uma duração concretizados em longos estágios. Mais urgente que a determinação das datas é a localização dos espaços do nosso devaneio e dos nossos afetos, e da nossa intimidade. Com este breve passeio por museus, jardins e outros espaços da imaginação, espero ter contribuído na ampliação do horizonte poético do espaço cultural. Agradeço a atenção.

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edu ardo de jes us

Contraditórias em suas abordagens e complementares em seus conteúdos as palestras desta mesa redonda colocaram em jogo duas dimensões bem distintas em torno da questão do imaginário. Previsto como eixo central da discussão, a noção de imaginário foi contemplada, de forma bastante ampla, abrindo espaço para outras questões tranversais ligadas ao campo da arte, cultura e também às formas de acesso, exibição e fruição de obras e conteúdos artísticos. De um lado, as propostas radicais dos artistas da década de 1960 com inovadoras formas de mostrar e convocar o sujeito a experimentar as obras, tema tratado por Stéphane Huchet, e, de outro, as novas formas de exibição, pilhadas pelas mídias digitais em projetos como o Museu do Futebol, em São Paulo, abordado por Leonel Kaz.

Mediador: eduardo de jesus Doutor em Artes pela ECA/USP, professor de Cinema e Vídeo da

/10 Mesa Redonda O que é espaço? O que é pensar a cultura e as artes a partir de espaços? Como entendemos a configuração de lugares dedicados à subjetividade, à memória, à percepção e ao conhecimento? Como se configuram e reconfiguram os espaços culturais a partir do advento das novas tecnologias, das redes virtuais, do fenômeno dos blogcamps, youtube, twitter? A multiplicidade dos espaços de significação impõe uma reflexão profunda sobre o lugar e as características dos locais destinados à produção e à fruição das artes, da cultura e do conhecimento. Propomos identificar essas configurações a partir da construção subjetiva e do imaginário.

PUC Minas Belo Horizonte – MG

Entre essas duas diferenciadas e distintas abordagens podemos perceber, mesmo que de forma sutil, como estamos tecendo a trama da contemporaneidade. Podemos entender o contemporâneo, sob a luz de Giorgio Agamben, como “uma relação especial entre tempos”, já que trazemos o passado, confrontamos o futuro e fazemos isso na espessura urgente do tempo presente. Como diria Agamben, “no escuro do presente”. As duas abordagens, distantes e paradoxalmente próximas, demostram essa típica situação contemporânea em relação ao passado e suas heranças, como na comunicação de Huchet, e em relação ao futuro e aos novos parâmetros que podem ser construídos com o uso de novos suportes e tecnologias, enfatizados pelos projetos e experiências apresentados por Kaz. Tudo isso serve para iluminar as situações que experimentamos agora, mas, longe de um consenso, talvez a dúvida e a incerteza sejam mais produtivas para nos arremessar na aventura da reflexão sobre o contexto atual dos espaços culturais e os imaginários que eles podem despertar.

espaço como imaginário

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O Museu do Futebol está construído debaixo das arquibancadas do estádio do Pacaembu. Esse dado é significativo, porque vocês devem se lembrar de que os anos de 1930 foram os anos de ascensão do getulismo no Brasil. Particularmente, eu considero extraordinário esse período histórico porque foi quando se criou “o imaginário idílico” brasileiro, principalmente através da Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Foi quando também se criou a imagem que o Brasil tem de si mesmo a partir de todos os escritores do Nordeste, como o baiano Jorge Amado, o alagoano Graciliano Ramos, a cearense Rachel de Queiroz, o paraibano José Lins do Rego. Foi quando, em 1933, Gilberto Freyre escreveu Casa Grande e Senzala, e Sérgio Buarque de Hollanda, em 1936, escreveu Raízes do Brasil – inaugurando, ambos, uma nova visão antropológica da histórica. Finalmente, foi quando surgiu uma arquitetura de vigor próprio com Oscar Niemeyer, o prédio do MEC e a Pampulha. Enfim, é quando o Brasil passa a deixar de olhar para fora e começa a olhar para dentro. Exatamente esse é o momento no qual se moldam grandes estruturas cívicas que, até então, só existiam no Rio, do qual o exemplo maior é o Estádio da Rua São Januário, o estádio do Vasco da Gama. Era ali que Getúlio Vargas desfilava enquanto a criançada e a “mocidade” – para usar um termo de época – entoavam os hinos cívicos através de uma preparação feita por Villa-Lobos. Ora, sendo o Rio de Janeiro a capital do país e havendo a pujança econômica de São Paulo, nada mais criterioso do que construir um estádio de futebol que se inserisse dentro das ideias de progresso social e educacional do período histórico. São as ideias do Anísio Teixeira, nosso maior educador, que vão ganhar a configuração de dar formato ao complexo do Pacaembu: um estádio de futebol, áreas para esportes diversos (natação, tênis) e toda uma concepção da mens sana in corpore sano, dominante na época. É curioso como esse estádio é singular em sua concepção arquitetônica, já que está inserido em um vale (diferentemente dos outros estádios, que têm um formato de xícara), com um frontão de 150 metros de extensão, e em que, embaixo das arquibancadas, se inserem os mais de três mil metros quadrados de conteúdos e percursos expositivos do Museu do Futebol. Para o projeto, não houve uma curadoria que inventasse uma ideia “genial” para ser feito por um arquiteto “genial” e uma museógrafa “genial” que desse sentido às coisas, não. O que houve foi uma concatenação de ideias da curadoria com a museografia e com o arquiteto; todo mundo trabalhando junto, todo mundo cedendo espaço um ao outro. Então, exatamente embaixo do avesso das arquibancadas, se estruturaram os quatro andares do Museu. No último andar se situa a administração com entrada independente; já o andar térreo tem um auditório de um lado e, do outro, um restaurante, uma loja e um grande hall de entrada. No segundo e terceiros andares se faz um percurso contínuo de visitação em que a grande “pegada”, sala após sala expositiva, foi a seguinte: o Museu do Futebol é um museu da história do Brasil contada por meio da paixão do futebol. Foi assim: o futebol começou no Brasil em 1896, poucos anos após a libertação da escravidão. Ali se mostra como o futebol foi uma

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leo nel kaz Convidado: leonel kaz Curador do Museu do Futebol São Paulo – SP

Algumas digressões sobre museus - experiência: futebol, mar e amanhã.

batalha em que o povo brasileiro entrou e ganhou. Tomou a si o esporte – antes destinado só às elites – e deu a ele uma linguagem própria, autenticamente nacional. Ali se mostra como, através da criatividade do gol de bicicleta ou da “folha-seca”, os nossos jogadores – mais do que jogadores – se transformam em inventores. A primeira sala do percurso expositivo é uma homenagem ao barroco mineiro e, exatamente por isto, se chama Sala dos Anjos Barrocos, na qual aparece uma seleção de vinte e dois jogadores que fizeram do futebol uma revolução de círculos alados, de novas invenções da parábola em direção ao gol. É curioso como o museu é essencialmente multimídia e, portanto, não tem súmula de jogos, não tem troféu, nada disso. Aliás, não tem relíquias. Seu grande acervo é o visitante e sua capacidade pessoal de se transformar, pessoalmente. Muitos criticam museus que não têm acervos e que, portanto, a palavra mais adequada para instituições sem acervo seria a de centro cultural. Parece-nos essa proposta etimológica um tanto ultrapassada, já que o próprio ICOM (que é o Conselho Internacional de Museus), assim como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN já reconhecem, há mais de uma década, que o patrimônio imaterial também é uma forma de acervo e, no caso do Museu do Futebol, como no Museu da Língua Portuguesa, como já antes mencionado, um dos mais importantes acervos é o próprio visitante. O visitante é o acervo. Nesses museus experienciais ele modifica a coisa e a coisa é modificada por ele. É outro tipo de percepção. Assim, a Sala dos Anjos Barrocos ecoa o som dos atabaques constitutivos da formação étnica brasileira e se veem projetados nossos jogadores de futebol voando no ar, em curva bem armada, e “o que mais o corpo inventa é coisa alada”, como disse o poeta maior, Drummond. A Sala dos Torcedores, embora prevista no projeto original, mudou de lugar baseada num acaso. Tivemos de abrir um buraco na parede interna lateral do estádio por causa de uma infiltração e, atrás dessa parede, nós encontramos uma gruta maior do que esse auditório em que aqui nos encontramos. Era a área de sustentação das arquibancadas laterais, com pilares entremeados. Foi aí que, no Museu, nós transformamos esse espaço nas verdadeiras Termas de Caracalla do futebol brasileiro. Fizemos projeções gigantescas em todas as direções filmando trinta torcidas brasileiras que dialogam entre si num espetáculo de cerca de dez minutos. Então, o Museu ocupa espaços com muitos jogos de sístoles e diástoles, de luz e sombra, criando exatamente um local para o imaginário e para a descoberta. O Museu não é curatorial no sentido de uma exposição em que chega o curador e diz assim: vocês têm que aprender isso e aquilo. Ao contrário, o Museu é um local de descoberta individual: cada um cria a sua própria narrativa. Por exemplo, nós saímos da Sala dos Torcedores, que é extremamente contemporânea, e caímos na Sala das Origens, que se reporta aos primórdios do futebol no país, ou seja, à última década do século 19. Sugeri a Daniela Thomas e Felipe Tassara, assim como ao Mauro Munhoz, respectivamente museógrafos e arquiteto do Museu, que criássemos

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um espaço que narrasse essa saga do Brasil que começa com Charles Muller, que traz a primeira bola, em 1896, e que vai até a ascensão dos primeiros jogadores negros no futebol brasileiro na década de 1920. A Sala exibe 415 fotografias e um filme de seis minutos, narrado por Milton Gonçalves, contando essa saga da história brasileira. Ou seja: o Museu procura correlacionar épocas históricas – correlação esta que, via de regra, é muito escassa no sistema educacional brasileiro. Mencionei antes que olhávamos para fora de nosso território. O Teatro Municipal do Rio de Janeiro (uma cópia do Palais Garnier, a Ópera de Paris) foi inaugurado em 1909, no dia da data nacional da França, 14 de julho, com um discurso falado... em francês, por Olavo Bilac. Só a partir, praticamente, da década de 1935 é que Anísio Teixeira, Monteiro Lobato, Pixinguinha, Sérgio Buarque, Portinari, Nélson Rodrigues, Mário de Andrade, Tarsila, Portinari e Villa Lobos fundam o Brasil. O Brasil que nós somos hoje é aquele mesmo que nós fomos na década de 1930. Então nós alçamos a heróis da cultura brasileira, na Sala dos Heróis, Domingos da Guia e Leônidas da Silva, ou seja, dois jogadores de futebol que se tornaram heróis tão significativos da cultura brasileira como acontece nas demais formas de expressão artística, nas artes, na literatura, na música. O Museu do Futebol é totalmente concebido para a visita dos portadores de deficiência visual. Todo o percurso tem faixas específicas para deficientes visuais, assim como audioguias, materiais táteis, e mesmo educadores especialmente treinados que facilitam ao cego a compreensão do espaço. O Museu é o único equipamento do gênero no Brasil totalmente adaptado. Na Sala das Copas do Mundo nós também fizemos uma fusão não apenas de momentos históricos do Brasil, mas de momentos históricos internacionais. É muito engraçado, o Museu do Futebol ocupa pouco mais de três metros quadrados expositivos, tem 1.700 fotografias e sete horas de vídeo, mas o reitor Mario Moutinho, da Universidade Lusófona de Lisboa, ao visitar o Museu do Futebol disse: “Esse é o Museu da Palavra! As gerações aqui se interpenetram e provocam uma babel, uma algazarra de comunicação.” Para vocês terem uma ideia, o Museu do Futebol é visitado por apenas 25% de público que são fanáticos por futebol. Os outros 75% são pessoas de todas as outras gerações, camadas sociais ou interesses diversos que se interessam ou não pelo futebol. E há um dado muito curioso: a segmentação geracional da visita é a mesma para crianças, adolescentes, adultos e idosos. Isso quer dizer que o Museu é, de fato, um programa da família. De fato, o projeto previa esse tipo de aporte de público que provocasse uma maior comunicação geracional. No campo das atividades educacionais, nós temos cerca 20 educadores e 20 monitores. Temos um programa total de acessibilidade, um auditório com 180 lugares com esplêndidas condições, no qual acabamos de produzir um Simpósio sobre a Literatura do Futebol com teses de mestrado e doutorado sobre o futebol: mais de 180 teses foram apresentadas – o que demonstra o crescente interesse de perceber o futebol sob novas e diferentes perspectivas.

32 – Mesa Redonda: Espaço como Imaginário - Leonel Kaz

Agora, por meio da Fundação Roberto Marinho (também responsável pelo gerenciamento de projeto dos museus do Futebol e da Língua Portuguesa), nós estamos fazendo no Rio de Janeiro dois novos projetos: o Museu de Arte do Rio - MAR, projeto do escritório Bernardes & Jacobsen, e o Museu do Amanhã, criação arquitetônica do espanhol Santiago Calatrava. O Museu de Arte do Rio se situa em algo que denominamos de “eixo da arte brasileira”, ou seja, a antiga Avenida Central (hoje Rio Branco), onde também se situam o Museu Nacional de Belas Artes e, ao final, o Museu de Arte Moderna - MAM. O Plano de Revitalização do Porto do Rio é o projeto mais importante da prefeitura do Rio. É exatamente no coração desse projeto que se situa o MAR, na Praça Mauá, e, logo próximo, no Pier, o espaço a ser ocupado pelo Museu do Amanhã. Ao lado de ambos, o Morro da Conceição e o Morro de São Bento. Nós temos em cada um desses morros 400 anos de história. No Morro da Conceição está a Fortaleza da Conceição onde ficou preso Duguay Troin e outros invasores franceses; ao lado, o Palácio Episcopal do Império; um pouco mais adiante, a Pedra do Sal, que é o mais importante monumento do negro brasileiro, sendo que os negros eram trazidos das embarcações, evidentemente, pelo mar que avançava nas áreas hoje de aterro. Do outro lado nós temos a Igreja e o Mosteiro de São Bento que, junto com as igrejas de Minas, incorporam o ápice do barroco construído em redor do século 17. O MAR e o Museu do Amanhã são extremamente significativos porque se entrecruzam no eixo da Avenida Central, que é a Avenida Rio Branco. A atual Avenida Rio Branco foi construída há exatamente um século com 113 prédios, dos quais hoje só restam pouco menos de uma dezena - um dos quais é o prédio do MAR. Então esse novo epicentro de revitalização está construindo dois museus que dialogam entre si. O MAR é um Museu constituído de uma ideia-chave: a reterritorialização do espaço urbano. Vocês devem ter acompanhado o esforço do governador Sergio Cabral, do Estado do Rio, em reocupar os territórios urbanos que foram desalojados pelo tráfico. Aqui a Prefeitura do Rio e a Fundação estão fazendo um trabalho semelhante: uma reterritorialização econômica, social, cultural e educacional do espaço urbano. A partir dessa mesma vertente, surge o conceito do MAR: a ocupação de três tipos de territórios que convivem ao mesmo tempo nos dois prédios interligados – os territórios urbanos, os territórios artísticos e os territórios existenciais. Os territórios artísticos, através das exposições-diálogo; os territórios urbanos, através da exposição permanente sobre o Rio de Janeiro; e os territórios existenciais, através da criação de uma Escola do Olhar que nós estamos fazendo com uma equipe multidisciplinar formada de filósofos, neurocientistas e artistas. Por que exposições-diálogo? Porque simplesmente o Rio de Janeiro, apesar de relativa perda econômica nas últimas décadas, continua concentrando quase 60% de todas as coleções de artes plásticas do país, públicas e privadas - públicas porque foi capital do Império e da República; privadas porque, curiosamente e diferentemente dos paulistanos que, com toda vênia, formam coleções (como aconteceu com a Coleção Neo-

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concreta do Adolpho Leirner vendida para um Museu de Houston, Texas), no Rio de Janeiro Gilberto Chateaubriand, Sergio Fadel, João Sattamini e Luis Antônio de Almeida Braga – para citar apenas alguns – formam coleções extraordinárias e as deixam em comodato nos museus como o de Arte Moderna e o de Arte Contemporânea de Niterói. Então, nós vamos tomar por empréstimo parte desses acervos e constituir exposições-diálogo de obras pictóricas ou de outras formas de expressão artística a exemplo do que faz a Tate Modern.

gevidade e o aumento populacional sendo ressaltados) e o pensamento (mostrando a integração e a diversidade culturais). Na verdade nós já tivemos, no passado, os museus de ciência de vestígios (que era onde se reuniam os objetos dos gabinetes de curiosidades), depois nós tivemos os museus de evidências (onde se demonstravam as provas), hoje nós estamos construindo um museu de possibilidades futuras, um museu que é um amálgama de ciência e de filosofia, um museu sobre nossas possibilidades de, nos próximos 50 anos, contribuir para a modificação de nossa existência planetária.

O MAR é constituído de dois prédios: um da década de 1910, de estilo eclético, e outro prédio mais modernista – que se interligam. Esse prédio modernista terá um painel (que é uma fachada de vidro fosco de mil metros quadrados) no qual em 365 noites do ano nós vamos ter projeções de luz diferenciadas. O segundo item (o da ocupação dos territórios urbanos) é uma exposição permanente sobre o Rio de Janeiro com acervo e com material multimídia. Diferentemente do Museu do Futebol, aqui nós vamos trabalhar com acervos. E o terceiro item (o dos territórios existenciais) é o da Escola do Olhar, uma escola de percepção do sensível e não apenas do artístico, que vai atuar junto à escola pública. A Escola do Olhar, que vai funcionar no prédio modernista, é voltada basicamente aos professores da rede pública municipal, uma formação de percepções mais sensíveis sobre si mesmo e sobre os alunos e que vai funcionar em interação com a área de exposições do prédio de estilo eclético. O Museu do Amanhã, do qual sou co-curador com o físico Luís Alberto Oliveira, se situa no píer da Praça Mauá, para onde Santiago Calatrava projetou uma arquitetura orgânica, depois de sua visita ao Jardim Botânico, onde entrou em contato com nossa Floresta Atlântica. O primeiro andar terá um pé direito de seis metros de altura e o segundo andar, mais quinze metros: uma catedral do século 21. Aliás, os Museus são as catedrais novas do século 21: os lugares de encontro, de “apaixonamento”, de convivência, em que o visitante abandona a hipnose da tela do monitor ou o estar atrás das grades dos seus prédios. No espaço externo ao Museu haverá uma grande praça, a ser utilizada como espaço expositivo; depois, o visitante entra no átrio atravessando uma área que nós estamos chamando dos Amanhãs de Ontem - ou seja, como teria sido concebido um Museu do Amanhã, por exemplo, em 1850? Há um auditório de 450 lugares e, ainda no andar térreo, uma sala de exposições temporárias, atividades educativas, o Observatório do Amanhã, restaurante, loja e administração. No segundo andar, a museografia predomina com uma Espiral Cósmica, que mostra as ciências cósmicas, desde as nebulosas mais distantes até a estrutura geodésica do olho de uma libélula ou de um DNA. Após a saída da Espiral, o visitante perpassa as ciências terrestres: a matéria (com as mutações do clima em primeiro plano), a vida (com a lon-

34 – Mesa Redonda: Espaço como Imaginário - Leonel Kaz

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Falar de Corpus experimental, corpo “pesado”, imaginação artística do grave… no início de uma mesa redonda sobre o espaço do imaginário faz sentido se pensarmos dentro de uma perspectiva crítica singular. Para mim, a arte representa uma maneira privilegiada de imaginar o espaço. Assim, tratarei do corpus experimental que as artes plásticas, artes espaciais e espacializantes, por excelência, realizaram por volta de 19681970, porque é nessa época que os artistas inventaram as mais inesperadas relações com o espaço. Por que falar disso num seminário em que a presença das novas tecnologias constitui um horizonte declarado, em que se pretende falar de gestão cultural? Sendo historiador e critico, penso que nos deparamos, em geral, com uma ausência de profundidade histórica quando se fala de imagem. Muitas vezes, o aparato técnico, claramente novo, reveste com uma embalagem inédita comportamentos ou modos de percepção mais antigos ou consagrados. Certas pretensões em pensar uma corporeidade mutante também se chocam de frente contra aqueles que acreditam que jamais superaremos nossa condição corpórea. Há pouco, uma tese feita na área de filosofia e ciências humanas, em Florianópolis, me tocou muito porque, no final, a pesquisadora narra a experiência que alguns cegos tiveram de arquiteturas ou espaços abertos em Belo Horizonte. O que os cegos são capazes de construir em termos de imagem, concernente à sua materialidade, a seu impacto sensorial, à sua imaginação formal, às suas profundidades virtuais assombra o que nós, videntes, somos capazes de ver, enxergar, sentir. Para os cegos, tal praça ou tal edifício são capazes de fazer uma percepção espacial singular levantar-se, constituir-se, adensar-se porque, como nos anti-heróis de Samuel Beckett, são corpos que, na ausência da visão, se levantam, se erguem, parecem estender-se até os confins do ambiente e integrar-se nele. Dão-nos uma lição de construção e imaginação do espaço. Nós, comparativamente, já somos anestesiados. Insisto: para mim, no contexto bruto e abrupto da cidade, em que as leis do mercado da construção civil nos criam um cenário seco e contrário a todo tipo de cultura sensorial e sensual, em que o mínimo espaço livre é sempre investido por algo que possa render para uma minoria de profissionais que transformam a cidade em mero suporte mecânico de seu enriquecimento, em que o apelo para espaços verdes e respiração espacial parece sonhos infantis frente à grande palavra autoritária dos construtores, sei da profunda inutilidade da critica solitária, sei da inutilidade de tentar mudar o consenso que leva inclusive o ensino de arquitetura e urbanismo a ser aquilo que antecipa o radical ferimento dos mínimos princípios ambientais… No entanto, sei que o meio ambiente começa dentro de nós e de nossa mente e que a arte tem muito a nos ensinar, notadamente nos seus aspectos mais plásticos, mais fenomenológicos, mais analíticos e críticos.

36 – Mesa Redonda: Espaço como Imaginário - Stéphane Huchet

sté phane hu chet Convidado: stéphane huchet Professor Associado, Departamento de Análise Crítica, Escola de Arquitetura da UFMG – BH (MG)

Corpo experimental e imaginação artística do grave ou como a arte em volta de 1968 imaginava o espaço...

Na arte dos anos 1960-70, os artistas tentaram imaginar formas para fazer o corpo sair das limitações nas quais a arte tinha deixado os corpos repetirem as mesmas experiências desde séculos e séculos. Essa arte dos anos 1960 e 1970 me parece interessante porque ela conseguiu inventar e explorar uma espacialidade, imaginar experiências espaciais inéditas, já que se tratava de sair dos vestígios da caixa geométrica, alargando-lhe os confins. Se, de um lado, falamos tanto hoje em diluição e virtualização da existência, procuravam-se na época, de maneira hipercriativa e inovadora, modos de libertação experimental, mas sem nunca seguir injunções tecnológicas induzidas pelo mercado, sem obrigar o artista a convergir com o grau de desenvolvimento capitalista da tecnologia como hoje. O que vemos nessa época são coisas mais próximas das motivações dos pensadores pré-socráticos: a tentativa de inventar proposições artísticas, estéticas e performáticas que correspondem a desafios postos pela dimensão corporal da experiência. Daí o que chamo de «grave», de investigação das condições da gravidade e da gravitação do corpo. Vejo a arte dessa época como uma forma de expansão e condensação do gesto artístico na hora de inventar-lhe gestos novos e uma nova plasticidade experimental. Quero falar disso porque estamos em um momento em que os princípios que mencionei no título dessa comunicação – «grave», «peso» – vão na contramão das tendências críticas em vigor. Quero falar de uma gestualidade inédita que parecia soltar e liberar os recursos físicos e existenciais da arte, mas que o fazia através de um investimento particularmente criativo e instigante da superfície da Terra, do solo, da horizontalidade. A arte procurava a invenção de uma correlação simbólica inédita entre obras, dispositivos, intervenções e performances artísticas e a geo-grafia/métrica. Ser agrimensor do infinitamente grande ou do infinitamente pequeno, ser agrimensor do real num momento em que ocorre uma dilatação das coordenadas da arte não é jogo fácil. O motor gerador de imagens passa por uma expansão viajante, que leva essa geração, do desenho, da maquete, até núcleos arquitetônicos e urbanos, às periferias, aos terrenos sem identidade e, para retomar os nomes de dois grupos de artistas belo-horizontinos e de Porto Alegre, aos «lotes vagos», aos «espaços perdidos», às margens de lagos, a terminais, etc. Dennis Oppenheim e as impressões digitais sobre um campo, Gordon Matta-Clark e suas rachas arquiteturais, as inscrições no solo de linhas e círculos para marcar um território, linhas e círculos em geral profundamente fora de proporção com a imensidão circundante, mas como geo-metrias ativas (fazendo aqui alusão a Richard Long ou Hamish Fulton), são marcos dessa estética da inscrição. Estamos aqui frente a trabalhos que, ao mesmo tempo que liberam uma energia formal, experimental e plástica forte, precisam, para existir, de recursos práticos e simbólicos que chamo de traço, traçamento, inscrição, estrita e rigorosamente pensados. Os artistas dessa época – gosto de dizer – não têm um modo de trabalhar anárquico ou desorganizado, bem pelo contrário, eles apresentam propostas rigorosas, o que é a única maneira de dar consistência às suas in-

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venções. São invenções «graves». O tão conhecido Double Negative que Michael Heizer escavou em 1969 na beirada de um platô situado acima de um amplo vale do Oeste dos Estados Unidos, por exemplo, trabalha com coordenadas formais pesadas, monumentais, faraônicas. O tema da «linha de fuga», presente na filosofia de Gilles Deleuze, encontra nesse momento uma legitimidade evidente: para mim, o emblema disso são os trabalhos do artista minimalista Carl Andre, emblemas da estética da inscrição: Log Piece, em 1968, e Secant, em 1977, paralelepípedos cuja justaposição traça uma trilha virtualmente infinita sobre o solo encenam um espaço e um lugar que perderam sua verticalidade, isto é, a referência à estatura transcendente do homem. Nessas instalações ao ar livre, o homem é convidado a andar, fadado à horizontalidade do mundo. Na definição que Andre dá do lugar – “um lugar é uma área, em um ambiente, que foi alterada de maneira a tornar o ambiente geral mais perceptível“², podemos entender como a estrada é, de certa maneira, análoga ao Riss heideggeriano, o traço inaugural e diferenciador. A reflexão sobre a perceptibilidade do espaço leva Andre a afirmar logicamente que a “escultura ideal é uma estrada”³ … Espaço é a linearidade de uma estrada, lugar cuja generalização significa que perdeu seu caráter local e sedentário. Carl Andre propõe: “a posição do artista engajado é de correr ao longo do solo”⁴. Definição incrível que transforma a escultura em puro motor performático de deslocamento horizontal e vetorial. A escultura como cinetismo – eis uma concepção que a transforma em puro tempo. Sem dúvida, a concepção que Andre tem desse espaço-lugar no qual a relação de escala é sacrificada é paradoxal: se os percursos a pé de Richard Long ou Hamish Fulton desde os anos 1970, outros marcos, ainda, da estética da inscrição, marcam o território através dos dispositivos “matéricos” de atestação das longas caminhadas que eles realizam em grandes espaços inóspitos do planeta, territorializando também as ações através de um complexo e rico sistema de documentação (foto) gráfica, os fluxos, segundo Andre, emblematizados por Log Piece ou Secant nos levam ao lado de uma pura desterritorialização virtual. Assim como podemos dizer com o psicanalista Jacques Lacan que a manifestação da linguagem é que ça parle (fala, id fala), podemos dizer que a escultura ideal, segundo Andre, é que ça flue, id flui, flui… A escultura não filtra mais os vetores do espaço, ela é movimento contínuo, em potência de forma. Movimento é esse em-potência-de-forma, mas na afirmação de uma impossível situ-ação, ou, melhor dito, o lugar como pura virtualidade, grau zero da perceptibilidade. Nasce dessa situação um ambiente, um environment.

ção da proposta artística. Por que explorar o ângulo, como faz Nauman num vídeo que o mostra se movimentando durante sessenta minutos no ângulo de uma parede e do chão? Trata-se de explorar as zonas mortas do espaço, de explorar as matrizes insuspeitas da sensação, mas uma sensação estruturada. Podemos relacionar isso com a grande exposição de Robert Morris em 1971, na Tate Gallery, Bodyspacemotion… Trata-se, de maneira clara ou selada, de explorar uma semiologia da energia propositiva em formas que articulam corpo, corpus-séries e geo-metria. Cildo Meireles se destaca no campo que nos interessa aqui. Os Espaços Virtuais, os Cantos são um exemplo notável de animação das coordenadas espaciais articuladas pelo ângulo. Meireles disse em depoimento a Antônio Manuel: estes trabalhos pressupõem a movimentação do eventual observador para que se obtenha esta situação de ortogonalidade. Na verdade, eles foram concebidos como teoremas. São uma demonstração, não só especificamente ao nível do olho, mas ao nível da posição dele – observador – em relação ao trabalho; o que, em última análise, é uma coisa ligada ao olho. Mas pressupõe esse deslocamento, o encontro dessa posição. Uma das características desse trabalho seria, exatamente, o seu próprio tamanho, e este tamanho definindo uma das relações que ele teria com o observador.⁵

A terminologia utilizada por Meireles no seu depoimento formula e articula os componentes essenciais das estéticas espaciais, situacionais e corpóreas características dos anos 1960 e 1970. Sintetizam fenomenologia da percepção, reflexão sobre o olhar, analítica do movimento, geometria tátil, etc., categorias trabalhadas pelas vanguardas internacionais da época. Uma obra como Wall-Floor Positions, de Nauman, condensa-as perfeitamente. Uma parte substancial da argumentação apresentada por Cildo Meireles acerca dos Cantos se aplica bem a alguns trabalhos que Nauman realizou na mesma época. Através do movimento do corpo no ângulo entre solo e parede, Wall-Floor Positions mostra como é possível transformar um espaço tectônico e geométrico em sensação movediça e incorporar as coordenadas do espaço. Frente a um trabalho como esse, é importante ressaltar a libertação que realiza com relação a certos padrões construtivos da geometria que tinham reinado com tanta força na pintura abstrata ou no próprio minimalismo. O que Nauman quer manifestar nessa sucessão de posições entre parede e chão é a energeia corpórea capaz de superar as limitações impostas ao corpo pelo enquadramento da geometria: valoriza uma geo-metria tátil e cinética, sucintamente, mas eficazmente assinalada e encenada, embaralhando as certezas e coordenadas tradicionais do ergon.

² ANDRE, Carl, citado in: LIPPARD, Lucy, Six Years: the Dematerialization of the Art Object,

Nesse arquipélago estético, certos artistas trabalham sobre as condições de permanência da arte em relações de proporção com o corpo. Poderíamos falar de novo da arte de Lygia Clark e Hélio Oiticica. Mostremos Bruce Nauman, com Wall Floor Positions (1968), ou Cildo Meireles, com seus Cantos e Espaços Virtuais (1967), em que ambos marcam e experimentam deslocamentos críticos no corpo na sua relação com o espaço… Mais uma vez, estamos frente a singulares maneiras de inscri-

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New York: Praeger, 1973, p.47

³ ANDRE, Carl, citado in: WALDMAN, Diane, Carl Andre, catálogo de exposição, New York, The S.R.Guggenheim Foundation, 1970, p.19

⁵ MEIRELES, Cildo, depoimento citado in: Cildo Meireles, textos de Ronaldo Brito e Eudoro Augusto Macieira de Sousa, Rio de Janeiro:

⁴ Idem, ibidem

FUNARTE, 1981, p.13

O que tanto Meireles quanto Nauman fazem nesse ano 1968 jamais é da ordem da deriva incontrolada ou anárquica. Os Cantos, claramente, e Wall-Floor Positions, mais secretamente, tem relações intempestivas profundas com uma sentença fundadora da modernidade, a do poeta

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francês Arthur Rimbaud, que se propunha em 1870 proceder à “desregulação raisonné de todos os sentidos” – “le dérèglement raisonné de tous les sens”. Inúmeras obras das vanguardas artísticas dos anos 1960 – dos Happenings à Body Art, por exemplo – lhe devolvem uma pertinência e uma atualidade como programa estético da modernidade. Mas é preciso insistir no fato de que o desregramento é construído através de uma pesquisa formal que tem um caráter sistemático ao qual a palavra “raisonné” remete. Contém um coeficiente racional, racionalizante, isto é, critérios e eixos de ação que norteiam o processo de desregulação. Esse não é anárquico. Poderíamos falar de um experimentalismo exacerbado, mas estruturado. É assim que Nauman desenvolve uma fenomenologia do espaço que é simultaneamente uma fenomenologia do corpo em situação. Certa dimensão dramática trabalha as proposições de encenação da percepção por Nauman ou Meireles nesses anos: ao reduzir drasticamente o dispositivo de encenação experimental a seu grau zero, elas procuram trazer à tona os harmônicos corpóreos que essa encenação suscita. Tudo isso desemboca na ideia de que todo sujeito pode ser ressituado e «remontado» através dos efeitos inerentes a muitos dispositivos artísticos e discursivos.

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jacque line fer reira

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Mediadora: jacqueline guimarães ferreira Jornalista Belo Horizonte – MG

/10 Entrevista Pensar o espaço cultural como ocupação e intervenção urbana, como projeto de memória e de revitalização de uma cidade ou sítio histórico. Experiências de cidades, bairros e comunidades que se mobilizam a partir de agendas culturais. Propomos discutir os projetos culturais que têm como locus de ação o espaço urbano e a arquitetura do espaço. A cidade como acontecimento: encontros, conhecimentos e reconhecimentos.

a cidade como espaço cultural

O registro escrito tem a propriedade de aprofundar e melhor organizar o pensamento. Mais ainda, cria a opção de continuidade. Sobre o quê se falou na entrevista “A cidade como espaço cultural” durante o 2º Seminário Internacional de Gestão Cultural? Foi uma discussão sobre a cultura dentro do espaço urbano? Quem sabe sobre a espetacularização da cultura e seu uso como ferramenta mercadológica dentro do planejamento urbano contemporâneo? Talvez sobre a configuração de uma cultura dentro de um território específico? Houve tudo isso e muito mais, como se verá nas páginas seguintes. Algumas das ideias chegam com o vigor de uma proposta aberta, sedentas de intervenção, palpites, pesquisa, adesão. Outras, já familiares, exibem-se como decisões verticalizadas, prescindem de diagnósticos e tentam impor vitrines antirreflexivas. Reunidas, todas essas ideias expõem a cultura urbana contemporânea como ela é: conflitante, marcada por disputas de poder e tensões próprias da vida social. O dito: dar continuidade ao tema é opcional. E para aqueles que queiram aventurar-se por caminho tão delicado, talvez seja interessante dar os primeiros passos interrogando-se sobre a possibilidade de libertar a cultura de uma suposta função política. Ou, de um modo mais razoável, sobre a possibilidade de libertar os espaços culturais do controle excessivo. Afinal, a quem são destinados os espaços culturais da cidade? Pode-se criar um espaço público de cultura contido dentre os lugares que demarcam espacial e simbolicamente as diferentes identidades de um corpo urbano? Poderão existir formas que permitam a negociação socioespacial? É necessário haver uma ordenação nesse sentido ou os distintos nós de ruas, esquinas, edificações e ruínas de uma cidade pedem outros modos de intervenção que não suprimam o reencontro com o imprevisível, o estranho, o imponderável, com a vida? Três abordagens, três experiências com apropriação de território através do fazer cultural, a entrevista a seguir tenta contribuir para o debate sobre a constituição de espaços públicos de cultura como espaços de troca.

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Quando eu me preparei para este encontro, escolhi três pontos sobre os quais poderia falar: (1) Movimento Arte Contra a Barbárie, (2) a ressignificação do espaço teatral a partir da utilização cênica de espaços públicos na obra de Antônio Araújo e seu Teatro da Vertigem, e (3) o fato de estarmos num momento em que é preciso despolitizar o teatro para podermos repolitizar a discussão sobre o financiamento público à cultura. As mesas que acompanhei até aqui me levam a improvisar. Fiquei tocado pela sensação de que, se eu não registrar e tornar públicas minhas experiências, elas necessariamente perecerão – do ponto de vista da memória. E os depoimentos que aqui escutei me levaram a pensar em duas empreitadas do início da década de 1990 – uma na esfera artística, outra na da gestão cultural – que têm diretamente a ver com os temas que estamos discutindo aqui. No início da década de 1990, o movimento teatral em São Paulo começou a renascer, isto é, a tomar um novo impulso, de certa forma retomando procedimentos e questões que haviam sido abandonados durante a ditadura. Refiro-me mais especificamente ao ressurgimento dos grupos e de uma determinada forma de teatro político. O grupo mais importante a surgir nessa fase é o Teatro da Vertigem, dirigido por Antônio Araújo. Ele influenciou vários grupos e artistas – e está no centro de nossa melhor produção até hoje. Suas duas características mais marcantes são o chamado processo colaborativo e o fato de seus espetáculos serem encenados não em salas de teatro, mas em espaços públicos que, além de dialogar diretamente com a obra, ressignificavam a própria cidade para o espectador: uma igreja, um hospital abandonado, um presídio, o Rio Tietê… O primeiro espetáculo da Vertigem, “Paraíso Perdido”, estreou em 1992. Nesse mesmo ano, dirigi meu primeiro espetáculo, “Tudo de Novo no Front”. É sobre esse espetáculo e outro que dirigi no ano seguinte, “Prova de Fogo”, que vou me deter agora. Não pretendo que eles tenham a mesma importância ou qualidade que “Paraíso Perdido”, mas creio que merecem registro, pelo que tinham de específico, e pelo que podem falar de minha obra posterior. “Tudo de Novo no Front” (1992), texto e direção assinados por mim, era um espetáculo multimídia que contava com a participação de 29 atores e era encenado em uma discoteca de muito sucesso na época, a Up and Down.

aimar la baki Convidado: aimar labaki Dramaturgo, diretor, roteirista,

formance para um espectador à sua frente. O ritmo do espetáculo era dado pelo diretor/operador de som (na época não existia DJ) que cortava bruscamente as performances, com uma música. Dançando, os atores se reespalhavam pelo espaço. Ao parar a música, começavam nova performance. E assim por diante. Em 1984, as performances eram intercaladas com alguns textos, ditos por atores para toda a sala. Trechos de poema, um pedaço de texto de Oswald de Andrade, o obituário de Júlio Barroso por Pepe Escobar, etc. Em 1992, esses “momentos de teatro” em meio às performances eram textos escritos por mim, esquetes de humor que tangenciavam a história brasileira entre 1964 e aquele ano.

ensaísta e tradutor. São Paulo – SP

Espaços: cênico, público, artístico e da memória.

Quando o público entrava em “Tudo de Novo no Front”, encontrava o bar aberto, servia-se de bebidas, e, depois de se acomodar nas mesas, podia ver, nos monitores espalhados pela casa, clipes de imagens do que o homem já havia imaginado que seria seu futuro: “2001”, “Blade Runner”, etc. Terminado o espetáculo, uma música irrompia na pista – “Roque Santeiro, o Rock”, de Gilberto Gil - e os atores tinham como marca final só ir para o camarim quando esta música acabasse. O público, convidado a dançar com o público, emendava o espetáculo na vida normal da casa noturna. “Tudo de Novo no Front” era uma tentativa de hibridar teatro e performance num espaço público, a casa noturna, que é palco cotidiano para o cidadão “liberar-se provisoriamente”. A pista como metáfora para o palco – ou vice-versa. O espaço público revelado como espaço artístico, ou, ao menos, espaço de desenquadramento, de desregramento revelatório. Ficamos apenas dois meses em cartaz. Poucas pessoas viram. Quem viu não esqueceu. Um ano depois, dirigi um espetáculo que aprofundava as mesmas questões – tirando a performance como elemento e introduzindo a memória. “Prova de Fogo” foi escrita por Consuelo de Castro em 1968. É uma versão ficcionada de um episódio que a autora presenciou quando era estudante da Faculdade de Filosofia da USP. O prédio, após alguns dias de batalha campal entre seus estudantes de esquerda e os estudantes de direita da Universidade Mackenzie, na mesma rua, foi invadido pelo exército. Foi então cedido à Junta Comercial de São Paulo, em cuja posse permaneceu até o final da ditadura.

Sua origem estava numa performance que dirigi em 1984, “1964/1984: Rito de Passagem”, que contou com atores como Leopoldo Pacheco, Magali Biff, Eliana Fonseca, Patrícia Gaspar, Plínio Soares, Sofia Bisilliat e muitos outros.

O texto de Consuelo de Castro começou a ser ensaiado por José Celso Martinez Corrêa, em 1969, com o Teatro Oficina, mas foi sumariamente proibido. Houve uma montagem “clandestina” no CRUSP, nos anos 1970, dirigida por Tim Urbinatti, mas permaneceu profissionalmente inédita.

A estrutura era a mesma. Os atores se espalhavam pelo espaço cênico e realizavam performances simultâneas. Cada ator realizava sua per-

Em 1993, o prédio já havia sido devolvido para a USP, mas não havia sofrido ainda a reforma para se transformar num Centro Cultural. Encenei,

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então, o texto usando como espaço cênico o próprio local onde se haviam passado os acontecimentos que inspiraram a autora. No papel do protagonista (José Dirceu, com outro nome), Dan Stulbach. Como as duas estudantes – a alienada e a engajada –, Adriana Londoño e Graça Berman. Os dois primeiros atos eram assistidos em arquibancadas construídas no segundo e no primeiro andares. Quando o público chegava ao térreo para assistir ao terceiro ato – que culminava com a invasão do exército – encontrava o local tomado por sacos de areia, formando trincheiras. Nelas e nas cadeiras é que ele se acomodava para assistir à – e, ao mesmo tempo, participar da – discussão pública sobre se entregar ou não. A invasão do exército era também o final do espetáculo e era vivido pelo público como uma experiência entre o estético e o histórico. Espectadores mais velhos (cotidianamente recebíamos ex-alunos da época que nunca haviam voltado ao prédio) viviam o espetáculo como uma experiência catártica. Para os mais jovens era uma excitante ressignificação de experiências que só conheciam de livros. Havíamos há pouco vivido a experiência dos “caras-pintadas” e toda uma geração se perguntava sobre o verdadeiro significado e abrangência de uma “militância política”. A lembrança desses dois espetáculos leva à questão da ressignificação dos espaços públicos a partir de seu uso artístico. Numa sociedade patrimonialista, em que a distinção entre público e privado não é dada como certa, o espaço público é, em geral, um espaço indefinido. Utilizá-lo para uma experiência estética é, em si, uma forma de recuperá-lo para a polis. Que isso aconteça numa obra em que o conteúdo e a forma estejam diretamente ligados à história e aos símbolos associados àquele espaço é a chave para que o público possa – não só racional, mas também emocional e empiricamente – se reapropriar do que, teoricamente, é seu. Por outro lado, à medida que o espaço cênico foi banalizado – ou, segundo alguns, dessacralizado – a experiência de encenar fora da sala é um método para buscar novamente o específico do palco. As famosas duas tábuas e uma paixão podem estar no meio da praça e não no edifício burguês construído para o espetáculo. Mas, para que esse processo de dupla ressignificação se dê – entre os espaços público e estético –, é preciso também fugir à banalização e ao aleatório. É preciso, pelo menos num primeiro momento, que se busque o sagrado. Nem que seja o sagrado laico de uma experiência de cidadania que sempre esteve muito mais no imaginário que no social. Fui Assessor do Secretário de Cultura do Estado de São Paulo, Fernando Moraes, no final dos anos 1980. Entrei como assistente de Mário Prata; depois que este saiu, assumi seu lugar.

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Entre as muitas coisas que fizemos, então, a mais importante foi a criação e implementação de um projeto que, ao menos nominalmente, ainda existe: Didática da Encenação. As duas primeiras versões foram dirigidas por Roberto Lage e Cibele Forjaz. O estado tinha o hábito de apoiar a produção de espetáculos de grande porte, exigindo como contrapartida a realização de oficinas e workshops. O problema desse modelo é que as oficinas, em geral, não tinham nenhum embasamento pedagógico, nem tampouco se caracterizavam como verdadeiros estágios. Eram cursinhos, dados de qualquer maneira, para justificar a verba recebida pela montagem. É claro que existiam as exceções de praxe. Minha ideia foi mudar o foco do público-alvo. As oficinas seriam dadas para profissionais ou amadores que já tivessem experiência e estivessem tentando entrar no mercado. As oficinas teriam que ser diretamente relacionadas à montagem. E todos os envolvidos deveriam estagiar na montagem. A organicidade entre os dois momentos do projeto – oficinas e ensaios – bem como uma divisão temporal mais rígida entre as duas etapas garantiriam que a parte pedagógica fosse efetiva e que não se transformasse, por outra parte, em um escoadouro de energia para a produção do espetáculo. O grande sucesso do modelo levou a que eu fosse convidado em 2003 por outro secretário, Ricardo Ohtake, para expandir a experiência. O convite, formulado por esse grande agitador cultural que é Celso Cury, era para transformar a Oficina Cultural Amácio Mazzaropi num centro de atividades voltadas para o teatro. A escolha da unidade não poderia ser mais apropriada. A Oficina ficava perto da Estação Bresser do Metrô, entre a Móoca e o Belém. Eram dois galpões imensos, em formato de “L”, cada um tendo entrada por uma rua diferente. Na interseção, um teatro! Com palco, plateia, urdimento, tudo que se tem direito! Além disso, tínhamos também uma espécie de praça central coberta. Minha primeira decisão foi focar nos egressos das escolas de teatro. Pessoas que já passaram por alguma formação – e os profissionais, que necessitam, é claro de formação permanente. Para além do modelo de oficinas – interpretação, direção, voz, corpo, etc., procuramos outros formatos. A primeira luz veio do próprio Celso Cury que sugeriu um Pronto-Socorro Teatral. Profissionais de corpo, voz e interpretação comprometeriam algumas horas por semana para agendamento de atendimentos individuais. Ampliei a ideia genial de Celso para todas as áreas da criação. Profissionais como Walderez de Barros, Luis Alberto de Abreu, J.C. Serroni, Elias Andreatto, Lauro César Muniz, C.A. Sofredinni, Francisco Me-

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deiros – autores, diretores, iluminadores, atendiam com hora marcada jovens profissionais, para tratar de alguma questão específica ou simplesmente para falar de suas carreiras. Outra frente foi a formação de técnicos. Abrimos oficinas de costura, cenotécnica, etc. E oferecemos para as produções profissionais a possibilidade de ter nossos serviços de graça. Com isso, os alunos – em geral já com experiência na sua área, mas não com teatro – eram diretamente inseridos no mercado. A ideia central era a de sinergia. Todos os espaços não utilizados para atividades da Oficina eram cedidos para grupos ensaiarem. Como contrapartida, a possibilidade de ouvintes ou estagiários integrarem os processos. O próprio teatro, quando não utilizado para aulas, era utilizado para ensaios gerais ou apresentações fechadas de produções profissionais – sempre tendo como condicionante a possibilidade de serem acompanhados por ouvintes/estagiários. Isso sem burocracia. O que queríamos era que o próprio espaço da oficina se transformasse num local de troca, contacto, criação – num processo artístico e pedagógico que extrapolasse a estrutura de Oficina Cultural. E foi o que aconteceu. Durante o ano e meio que durou essa experiência, nos transformamos no centro nervoso do teatro paulista – ainda que geograficamente distantes. De Gianfrancesco Guarnieri a Gerald Thomas, de Bia Lessa a Cacá Rosset, de Barbara Heliodora a José Possi Neto – é difícil encontrar, em qualquer tempo, um espaço teatral tão eclético e de tanta qualidade. Os Parlapatões, então em início de carreira, ocuparam nossa praça central com uma estrutura de circo que servia para um programa extensivo de circo–teatro, linguagem então, de certa forma, em gestação entre nós. Esse mesmo espaço serviu, por exemplo, para uma oficina de teatro de rua, que durou um mês, com Amir Haddad e seu grupo carioca. Algumas ideias simples se provaram muito eficientes. Por exemplo, numa era pré-internet, passei a utilizar o painel de cartazes na entrada da Oficina para exibir também textos sobre teatro, nas só dos jornais nacionais, mas também do New York Times e Le Monde que eu por vezes lia. Com isso, as pessoas começaram a também pregar textos ou sugestões de leituras. Uma espécie de grupo de discussões off line. Tive irrestrito e inteligente apoio de Ricardo Ohtake, Celso Cury e toda a equipe da Secretaria. Mas o fundamental para o sucesso foi a existência de uma equipe mal remunerada, mas apaixonada. Um exemplo de que funcionário público não é necessariamente sinônimo de ineficiência e cinismo. Ao contrário, os funcionários (ao menos os que ficaram, quando viram como ia tocar a banda) vestiram a camisa e, contra todas as difi-

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culdades que a burocracia e o serviço público sempre criam, tornaram possível que essas ideias ganhassem corpo. Na impossibilidade de citar e agradecer a todos, faço questão de fazê-lo na pessoa que foi meu braço direito e verdadeiro gestor dessa experiência: Luiz Valcazaras, hoje prestigiado diretor teatral. A experiência bem-sucedida na Oficina Amácio Mazaroppi hoje não é nem história. Não está contada em nenhum livro e só sobrevive na memória de quem a viveu. Deixa reflexões importantes para quem pensa na gestão de espaços públicos para a cultura. Primeiro, deve-se sempre levar em conta a vocação dos espaços. Quando Ricardo Ohtake elegeu essa oficina para ser temática, estava levando avante o que foi sua bem-sucedida política na Secretaria, e que o levou, por exemplo, a revitalizar e redefinir os caminhos dos museus paulistas. Em segundo lugar, perceber como a oferta gera demandas. Não só quantitativas, mas qualitativas. Ao instaurar um processo de sinergia entre alunos, professores, amadores, profissionais e público, possibilitei o surgimento de um processo que, a partir de determinado momento, era parte importante da própria estruturação das atividades do semestre seguinte. Traduzindo: um processo, ainda que pedagógico, ligado à criação artística, tem variáveis que escapam ao racional e ao previsível. E, sendo necessariamente aprisionados pelo lugar comum, viramos interlocutores do Pequeno Príncipe: passamos a ser responsáveis por aquilo que "cultivamos". A qualidade dos profissionais envolvidos, o momento de revitalização da sociedade logo após a redemocratização, a vontade política de um secretário comprometido com a qualidade, tudo conspirou para que vivêssemos uma experiência excepcional - que poderia e deveria ser cotidiana. Como dramaturgo, diretor, tradutor, novelista, ensaísta ou gestor cultural improvisado, meu método é sempre o mesmo: identificar o que me une aos outros protagonistas do processo a que estou engajado e investir em nossos pontos em comum – e não em nossas diferenças. Não pela ingênua esperança de encontrar paz na Terra, mas por saber que apenas construindo tréguas provisórias é que poderemos criar microclimas favoráveis à criação. E à democracia. Que esse encontro não sirva de exemplo para ninguém. Mas de alento, para quem conseguir vislumbrá-lo.

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A arquitetura é, entre as artes, talvez a que mais precise saber lidar com a questão da permanência. Mais que um livro, mais que um filme, um evento ou uma exposição, a arquitetura – especialmente a pública – é onipresente. Impacta a vida das pessoas o tempo inteiro, de uma forma quase unilateral. Não há como esconder-se de um edifício ou de um desenho urbano, principalmente numa época da história da humanidade em que 50% da população mundial vivem nas cidades.⁶ Isso só aumenta a responsabilidade do arquiteto, que tem a formação, a competência e a atribuição de projetar espaços públicos e privados. Trata-se de uma função social cujos frutos devem ir além de reduções como o foco no planejamento apenas correto e funcional, ou no formalismo de uma grande composição escultórica. Como dar esse passo?

mau ro mu nhoz Convidado: mauro munhoz Diretor Presidente da Associação Casa Azul

A arquitetura só faz sentido quando reflete questões essenciais para quem vai habitá-la, quando leva em conta, ilumina e perpetua raízes culturais. A chave para esse êxito, portanto, é descobrir que questões são essas e fazer delas a matéria-prima do projeto. O grande desafio passa a ser a prospecção e a arqueologia desses elementos, que nunca estão explícitos e nem aparecem imediatamente nas respostas às perguntas sobre o programa de necessidades. Afinal, normalmente, as pessoas só conseguem imaginar um novo espaço a partir daquilo que já conhecem – a casa onde moram, o museu que acabaram de visitar. Mas o território que está para ser projetado é outro, diferente de qualquer referência preexistente – que, embora bem-vinda, não pode dominar essa fase tão importante.

/ Diretor da Mauro Munhoz Arquitetura. São Paulo – SP

A cultura que desenha a cidade.

⁶ Marca atingida em 2007. Segundo dados do programa Urban Age, da London

Na experiência de Paraty nasceu a Flip, como resposta aos obstáculos encontrados para a implantação de projetos de revitalização urbana.

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A experiência intermediária, nesse caso, é uma atividade cultural: a Festa Literária Internacional de Paraty. Por meio de seu programa educativo e de incentivo à leitura, o evento, agora em sua décima edição, conseguiu estabelecer um canal de comunicação permanente com a população, não só durante os cinco dias da festa. Trata-se de promover uma atividade enraizadora num espaço público, incentivando a população a se apropriar dele, mas não só: ao envolver escolas públicas, formar uma equipe de produção local e incrementar a economia do município, a Flip começou a construir a ponte entre as instituições e os paratienses. Ao transformar o tecido socioeconômico urbano, a Flip ajuda Paraty a encontrar dentro de si a solução para muitos de seus problemas, baseando-se no que a cidade tem de mais singular, criativo, na sua vocação e em um profundo entendimento de sua identidade cultural. Nesse contexto, ao atrair a atenção para a cidade por meio do evento, a Flip teve um grande mérito na escolha de Paraty como cidade-referência em turismo cultural, projeto do Ministério do Turismo que exigiu a elaboração de um plano estratégico. Para isso, montou-se um grupo gestor com 16 membros de 41 representações da sociedade civil, governamentais e não governamentais. Esse grupo, agora, é o espaço de negociação que faltava, suficientemente organizado, criativo, institucionalizado e desamarrado para a construção de consensos. A esse grupo, por exemplo, foi submetido o projeto de requalificação e restauro da Praça da Matriz, logo encampado coletivamente, o que respalda este e outros futuros projetos de revitalização urbana para a obtenção de recursos e, finalmente, sua implementação.

Esse desafio torna-se ainda mais complexo numa obra pública, em que o “cliente” é esse ser difuso presente na coletividade. Para saber o que uma população quer, o que a toca, quais são os seus desejos, não basta apoiar-se na objetividade das pesquisas de opinião ou na subjetividade da intuição. É preciso investir em rituais capazes de dar voz às pessoas e de fazer aflorar os aspectos mais relevantes e indispensáveis para a realização de um projeto público. Os dois projetos apresentados a seguir, a Festa Literária Internacional de Paraty e o Museu do Futebol, são, ao mesmo tempo, resultado de rituais anteriores e rituais para objetivos maiores. São vias de mão dupla que trabalham duas dimensões simultaneamente: a das conquistas imediatas e a dos longos horizontes de prazo, apoiando-se na ideia de que a cultura é dinâmica e capaz de criar inovações que conectam os indivíduos ao território. Assim, o fato de ambos se desenrolarem no ambiente da educação e da cultura não é mera coincidência. A experiência mostra que o terreno das manifestações culturais é o mais fértil para a realização dos rituais que, posteriormente, conferem identidade à arquitetura. Ao mesmo tempo, ambos os projetos podem ser entendidos como laboratórios, espaços balizados para fortalecer paradigmas e levá-los adiante.

Essa área, de interesse essencialmente público, é na realidade permeada por interesses privados. Ao entrar nesse território, fica clara a falta de espaços legítimos onde as vontades de cada grupo possam ser discutidas e consideradas de forma isenta. Isso resulta numa distância cada vez maior entre o plano das instituições e o da sociedade. Se transpor essa lacuna de uma só vez mostrou-se inviável, a solução foi partir para uma experiência análoga, baseada nos mesmos princípios e na mesma filosofia, mas direcionada a uma área mais leve e receptiva que necessitasse de recursos menores e pudesse ser implementada rapidamente.

School of Economics e da Alfred Herrnhausen Society, esse número chegará a 75% em 2050.

Já o futebol tem potencial para fazer pelo bairro do Pacaembu e por São Paulo o que a literatura está fazendo por Paraty. Na realidade, esse processo começou há quase um século, quando o arquiteto francês Joseph Bouvard, um dos fundadores da Cia City, percebeu que o vale tinha a proporção exata para abrigar um estádio. Desenhado em consonância com essa ideia, o bairro levou em conta uma poderosa manifestação cultural, o esporte, em sua criação. Esse conceito norteou todo o projeto do Museu do Futebol, que resgata essa veia e a fortalece por meio de um grande apelo: um museu multimídia, instalado num ícone paulistano, focado no esporte mais popular do país. A alta visitação do museu, aliada à forma com que a requalificação do Estádio do Pacaembu foi conduzida, contribuirá decisivamente para a revitalização da Praça Charles Muller,

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espaço de 30 mil metros quadrados que se encontrava subutilizado apesar de todo o seu potencial. E esse exemplo, numa escala mais ampla, pode tornar-se uma referência para lidar com outros espaços públicos em São Paulo atualmente carentes de uma solução urbanística.

evento um catalisador de mudanças profundas e comprova a hipótese de que um evento cultural pode ser uma poderosa ferramenta para a revitalização urbana sustentável. Entre os resultados mensuráveis está o impacto positivo na economia local: em 2009, o evento gerou indiretamente quase R$4,7 milhões durante seus cinco dias. A ocupação das pousadas chegou a 100%, e 30 mil visitantes estiveram na cidade – número que só perde para o carnaval e o réveillon e cria uma segunda alta estação em Paraty em pleno inverno. Além de movimentar hotéis, pousadas, bares e restaurantes, o evento utiliza mão de obra local, proporcionando uma renda significativa para as famílias paratienses. Segundo a economista e escritora Ana Carla Fonseca Reis:

a festa literária internacional de paraty

Em pouco tempo a Flip ficou conhecida como uma das principais festas literárias do mundo, caracterizada não só pela qualidade dos autores convidados, mas também pelo entusiasmo do público e a hospitalidade da cidade. Desde a sua criação, em 2003, contribui para a projeção do Brasil e de Paraty no cenário cultural internacional. Uma vez por ano, durante cinco dias, atrai pessoas de diversas partes do Brasil e do mundo. Amantes da literatura, editores, escritores, agentes literários, jornalistas, crianças, jovens e adultos, junto com os paratienses, se deixam levar, como num barco que navega o rio, pela arte da palavra que transforma experiência em conhecimento.

A Flip (...) elevou a então combalida autoestima da população local, ajudou a protagonizar a recuperação do tecido socioeconômico da cidade, promoveu a união entre as facetas visível e invisível da cultura paratiense, promoveu um fluxo contínuo de turistas com perfil qualificado e engajou a comunidade em um processo de protagonismo na transformação de seu futuro.⁷

Para além dos cinco dias de festa, a Flip potencializa também projetos enraizadores de caráter permanente. No campo da educação, a Flipinha atua junto às redes públicas e privadas de ensino de Paraty e região, tendo por objetivo capacitar as crianças paratienses a usar a palavra como ferramenta de transformação social, ressaltando a importância de aprender a ler as palavras, para, então, ler o mundo. Com atividades de incentivo à leitura e de valorização do patrimônio cultural local, a Flipinha, ao longo do ano escolar, desenvolve diversas atividades que começam a render bons frutos, como, por exemplo, a oficialização, pela Secretaria da Cultura de Paraty, da Hora da Leitura na grade curricular do município. ⁷ REIS, Ana Clara Fonseca (Org.). “Economia Criativa – como estratégia de desenvolvimento: uma visão dos países em desenvolvimento”, São Paulo: Itaú Cultural, 2008.

A Tenda dos Autores, montada todo ano às

⁸O Ponto de Cultura da Casa Azul é subsidiado pelo

margens do Rio Perequê-Açu, tem 1.800 metros

MinC e pela Secretaria de Cultura do Estado do RJ.

Há também a FlipZona, um programa continuado de inclusão digital e incentivo à leitura voltado aos jovens de Paraty e região. Utilizando as novas tecnologias de comunicação, oferece oficinas de produção e edição de áudio e vídeo, fotografia, teatro e animação. Ao longo do ano os trabalhos continuam no Ponto de Cultura da Casa Azul⁸ e, através de um blog, forma-se um canal de comunicação e integração aberto para as novas gerações paratienses se expressarem.

quadrados e acomoda 850 pessoas sentadas. Instalar o palco principal da Flip nesse espaço público é uma forma de evidenciar o seu potencial.

A Flip, um projeto da Associação Casa Azul, organização da sociedade civil de interesse público, não tem fins lucrativos e não está vinculada a nenhum grupo econômico. Sua missão é, por meio da cultura, articular a construção de consensos entre a sociedade e as instituições formais. Se a participação da população é um pressuposto para atingir resultados concretos na revitalização urbana sustentável, ela só se mobiliza no momento em que vê esses resultados concretos. Por meio da Flip, esse paradoxo se rompe e os resultados começam a aparecer, o que faz do

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Palco Flipinha 2010

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Cidade Partida, as duas centralidades de Paraty: à direita, o Bairro Histórico, e à esquerda, Ilha das Espaço Central FlipZona, 2010.

Cobras e Mangueira.

Num ciclo que se repete a cada ano, a Flip gera empregos, movimenta o comércio, atrai negócios e beneficia o setor turístico. Com isso, conseguiu mobilizar a população em torno de outros temas ligados à preservação do patrimônio material e imaterial de Paraty. Essa articulação era o elemento que faltava para fazer com que os projetos de infraestrutura, cujos ciclos são mais longos e os resultados, nem sempre imediatos, finalmente começassem a sair do papel.

O Projeto de Revitalização dos Espaços Públicos de Borda d’Água de Paraty nasce em 1994 e tem como pano de fundo o contexto da cidade partida. Como primeiro esforço, no sentido de aproximar as duas metades da cidade e aliviar seus problemas de infraestrutura urbana, sugere uma série de intervenções na zona costeira. Entre elas, destacam-se o restauro e a qualificação do calçamento e da drenagem original do centro histórico, a construção de uma Praça Biblioteca e o restauro e a requalificação da Praça da Matriz e da Santa Casa de Misericórdia. Vale destacar que os projetos em andamento fazem parte de um processo mais amplo que congrega não só os aspectos físicos do espaço, mas também a valorização dos aspectos mais relevantes e indispensáveis da cultura paratiense, recuperando e reunindo elementos da memória coletiva da cidade e fomentando debates sobre os usos, vocações e apropriações desses espaços.

os projetos da borda d’água

Por sua posição geográfica particular, um porto natural numa baía abrigada, Paraty foi escolhida pelos portugueses no período colonial como o porto para o escoamento do ouro produzido em Minas Gerais. A abertura de outros caminhos para a circulação de mercadorias, no entanto, tirou a cidade da rota econômica por um período de 119 anos, que terminou em 1974, com a construção da rodovia BR 101, a Rio-Santos. O isolamento econômico, somado à dificuldade de acesso à cidade antes da chegada do asfalto, possibilitou a preservação de seu rico patrimônio material (histórico e arquitetônico) e de um igualmente importante patrimônio imaterial (uma população que ainda hoje vive de seus saberes e fazeres tradicionais, ligados ao mar). Um processo natural de erosão e assoreamento, no qual os sedimentos são levados pelos rios até o mar, provocou o avanço da linha de borda d’água de Paraty. Essa situação foi potencializada por intervenções humanas sem planejamento, como o desmatamento de grandes áreas e a retificação dos leitos dos rios na década de 1950, que hoje têm provocado graves enchentes. O assoreamento, mais intenso a partir de 1960, gerou áreas de terra na borda da cidade, conhecidas como terras novas. Com o acesso facilitado pela rodovia, Paraty cresceu em ritmo acelerado na década de 1970. O inchaço populacional e a falta de políticas públicas resultaram na ocupação informal dessas áreas e na divisão da cidade em duas centralidades: de um lado há o Bairro Histórico ou a “cidade visível”, que guarda o patrimônio material e arquitetônico admirado por todos; do outro, há Ilha das Cobras e Mangueira, a “cidade invisível”, que, apesar da visibilidade muito reduzida tanto por parte dos turistas quanto por parte das autoridades, é onde está o “saber fazer” do paratiense, o patrimônio imaterial da cidade.

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O Projeto de Restauro e Requalificação da Praça da Matriz propõe a valorização dos aspectos históricos, a acessibilidade irrestrita e o enfoque na vocação social e identitária desse espaço público tão utilizado pelo paratiense.

Croqui para estudo da Praça Biblioteca como transposição do Rio Mateus Nunes. O projeto Praça Biblioteca propõe a construção de um centro cultural focado em educação e literatura na periferia do centro histórico de Paraty.

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medida em que atrai as pessoas para ele, além de conectá-las à cultura de maneira inovadora, apoiando um processo mais amplo de transformação da própria realidade social. E essa qualidade provavelmente não seria possível se o atrativo não estivesse tão diretamente ligado a uma das mais poderosas manifestações culturais brasileiras, o futebol.

Santa Casa de Misericórdia: o projeto de requalificação da Santa Casa da Misericórdia tem o objetivo de transformar esse espaço em um centro cultural e artístico.

o museu do futebol

Instalado sob a arquibancada norte do Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho – o Pacaembu, em São Paulo – numa área de 6.900 m2 de frente para a Praça Charles Miller, o Museu do Futebol, inaugurado em setembro de 2008, celebra o esporte que se tornou uma das mais conhecidas manifestações nacionais. Arquitetura, museografia e curadoria integram-se para mostrar como o futebol ajudou a formar a identidade do país e, ao mesmo tempo, deixou-se influenciar e aprimorar pela cultura brasileira. A relação entre esporte e cultura está presente no Bairro do Pacaembu desde seu surgimento, nas primeiras décadas do século XX. Barry Parker, urbanista inglês contratado pela Cia City para projetar o bairro nos moldes de uma cidade-jardim, levou em conta as observações de seu colega francês Joseph Bouvard e sugeriu que a grota rebelde, inadequada para a ocupação com casas, fosse utilizada para abrigar um estádio, já que as proporções do vale eram tão perfeitas para isso – os taludes laterais pareciam feitos sob medida para abrigar as arquibancadas.

Início das obras do estádio

Vista aérea do bairro e do estádio na década de 1940.

O projeto do escritório Severo Villares para o Estádio do Pacaembu, além de respeitar a topografia do terreno, sublinha a vocação daquele espaço para o uso coletivo. À frente do estádio, reservou um terreno de 30 mil metros quadrados para uma praça – que, com o passar dos anos e devido a políticas públicas que valorizaram o transporte individual em detrimento do coletivo, transformou-se num estacionamento. Através de uma leitura do território e dos aspectos sócio-históricos do bairro e do próprio estádio, propôs-se a instalação do Museu do Futebol no edifício frontal do estádio, voltado para a praça, permitindo que o projeto de arquitetura atual se conectasse com as intenções do projeto urbanístico feito no começo do século, resgatando suas propriedades para o uso coletivo. Distribuídas no térreo do edifício, diversas atividades independentes do Museu, como um auditório, um bar e uma loja, dão novo sentido à monumental galeria porticada e convidam os visitantes a permanecer naquele espaço, apropriando-se dele. Dessa forma, o Museu torna-se um instrumento de revitalização do espaço público urbano, na

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O projeto envolveu o restauro do edifício frontal do estádio do Pacaembu, inaugurado em 1940.

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A Sala da Exaltação, espaço numa das extremidades do edifício onde a estrutura da arquibancada se descola do talude que a apoia, é o momento em que mais se evidencia a intenção de colocar o visitante em contato direto com a arquitetura original e com a topografia que tanto

este vão fiúza

influenciou o desenho do bairro e do próprio estádio.

Convidado:

Ali, os taludes estão aparentes e o cheiro da terra

estevão fiúza

úmida completa a experiência sensorial.

Secretário-adjunto de Estado de Cultura de Minas Gerais e Gerente Executivo do Circuito Cultural Praça da Liberdade Belo Horizonte – MG

Um distrito criativo no coração das Minas Gerais. Já considerado um dos maiores complexos

As recentes experiências de requalificação de espaços urbanos, que vêm ocorrendo em todo o mundo, atestam a reciprocidade entre o antigo e o novo em um conceito atual de conservação patrimonial. Países recuperam espaços reiterando a força da tradição pelo olhar contemporâneo das intervenções, sempre realizadas por profissionais que permitem, em seus projetos, o diálogo entre as construções e a sociedade, por meio de ações inclusivas social, cultural e economicamente. E é assim que o Circuito Cultural Praça da Liberdade foi concebido e vem sendo implantado, graças à vontade política do Governo de Minas e à viabilidade de parcerias com a iniciativa privada. O desafio desse processo é articular esforços para que a identidade do Circuito seja não apenas edificada, mas percebida pela população como um todo. Não teremos meramente um conjunto de prédios com propostas isoladas, mas com múltiplas possibilidades de fruição que dialogam e se complementam. A governança do Circuito Cultural Praça da Liberdade é de alta complexidade pela diferente natureza dos atores envolvidos, pela diversidade das atividades e por seu caráter pioneiro. É importante que o modelo de gestão garanta a sustentabilidade e que concilie os interesses públicos e privados.

de cultura do país, o Circuito da Praça da Liberdade, em Belo Horizonte, consolidase como espaço inovador, capaz de unir os ideais de preservação da história aos modelos contemporâneos de gestão.

Desde 2003, quando foi lançado o conceito inicial do Circuito Cultural Praça da Liberdade, muito se caminhou, sobretudo, no sentido da construção de parcerias para viabilizar um dos Projetos Estruturadores do Governo de Minas. O diálogo, a mediação, a busca de soluções conjuntas para desafios em comum têm trilhado as ações desde o início até agora, pois se conta com parceiros de peso como a TIM, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a EBX, a Vale, o Banco do Brasil – por meio do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) – e a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig). Mais recentemente, novos parceiros se engajaram nesse projeto: a Fundação Roberto Marinho – por meio do Museu do Homem Brasileiro – e o Museu Clube da Esquina. Valores e visões diferentes – situação que é comum em um processo que engloba os setores público, privado e acadêmico – vão sendo harmonizados, respeitando-se identidades e esboçando, em um trabalho de equipe, a gestão participativa que visa a uma nova forma de apropriação dos espaços antes voltados à administração pública. O Circuito Cultural Praça da Liberdade será um dos maiores complexos de cultura do país, comparável ao Centro Cultural da Fundação SmithSonian, nos EUA, e à Ilha dos Museus de Berlim, na Alemanha, entre poucos no mundo. No novo espaço, a população irá interagir com a arte, a cultura, o conhecimento, a tecnologia, a ciência, o lazer e o turismo, potencializando a geração de emprego e renda na cadeia produtiva da cultura, com reflexos positivos em todo o estado. A Praça da Liberdade representa a síntese da evolução urbana da cidade, com construções das mais diversas épocas, como os edifícios ecléticos das secretarias e do Palácio da Liberdade, o art déco do Palácio Episco-

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pal, a arquitetura modernista do prédio do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG) e do Edifício Niemeyer, além da arquitetura pós-moderna da Rainha da Sucata. O espaço de sociabilidade e referência cultural está sendo incrementado com novos usos culturais, que abrirão as portas dos edifícios, permitindo à população uma intensa vivência pelo mundo do conhecimento e da memória. É importante ressaltar que o tombamento dos prédios não significa seu congelamento, acarretando, fatalmente, degradação em seu espaço. A transformação de um bem tombado para receber um novo uso é a maneira adequada e sancionada por especialistas para salvaguardar o patrimônio, com a garantia da conservação e revelação dos valores estéticos e históricos de cada monumento. O essencial, que está sendo almejado com total empenho dos profissionais envolvidos na implantação do Circuito Cultural Praça da Liberdade, é que cada projeto estabeleça um diálogo entre o passado e o futuro, potencializando as virtudes dos prédios. Outra premissa é resguardar os projetos originais com todos os seus valores. Assim, as propostas respeitam as partes originais das edificações, o entorno, o equilíbrio das composições e suas relações. São intervenções que consideram os prédios como documentos e que suas adaptações possuem contemporaneidade, não criando enganos de leitura que conduzam a deduções equivocadas. Essa é a maneira correta de se trabalhar em bens tombados. Do mesmo modo que a percepção das mudanças é fundamental para a preservação do patrimônio, é preciso alterar valores e modificar conceitos antigos prevalecentes por décadas, proporcionando as renovações necessárias ao novo contexto. Para tanto, torna-se necessário adotar uma nova abordagem de administração e incorporar definitivamente a lógica do sistema aberto, principalmente no que tange à possibilidade das parcerias com a iniciativa privada, que possibilitam a garantia de recursos necessários à viabilização e à sustentabilidade dos projetos, com agilidade e flexibilidade em sua implementação e gestão.

blica Luiz de Bessa, o número de visitantes sobe para mais de 400 mil pessoas, até outubro de 2010. Merece destaque o fato de que, para abrigar os novos espaços culturais, todas as intervenções de restauração e revitalização dos edifícios estão sendo supervisionadas pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA-MG). Os projetos também foram aprovados pelos órgãos responsáveis como o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município (CDPCM-BH), a Secretaria Municipal de Regulação Urbana (SMARU), o Conselho Estadual do Patrimônio (CONEP) e a Secretaria do Meio Ambiente (SMAMA). Mais essencial ainda a frisar é a importância das parcerias na concretização de cada espaço que vai sendo disponibilizado ao público. Não seria possível para o estado fazer projetos dessa magnitude sem parceiros como a TIM, a UFMG, a EBX, a Vale, a Cemig e o Banco do Brasil, além daquelas em fase de construção, como a Fundação Roberto Marinho. para conhecer mais o circuito cultural praça da liberdade:

espaço tim ufmg do conhecimento

Inaugurado no dia 21 de março de 2010, o novo espaço de divulgação e fruição científica de Minas Gerais é resultado da parceria do Governo de Minas com a empresa de telefonia TIM e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e ocupa o antigo prédio da Reitoria da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), na Praça da Liberdade. O prédio de cinco andares abriga um planetário de última geração – único em Minas –, um observatório astronômico e um conjunto de exposições temáticas interativas que abordam assuntos como o universo, a vida na Terra, o meio ambiente e os processos humanos de simbolização e trocas sociais, com cenários interativos e muita tecnologia. Projeto arquitetônico de Jô Vasconcellos. Museografia de Paulo Schmidt. museu das minas e do metal

- ebx

É importante ressaltar, neste momento, que a transformação do conjunto arquitetônico da Praça da Liberdade em um eixo propulsor da cultura, da arte, do conhecimento, de lazer e de entretenimento já se consolida como atração para turistas de várias partes do mundo. Desde a abertura ao público dos dois primeiros equipamentos inaugurados em 2010: o Espaço TIM UFMG do Conhecimento e o Museu das Minas e do Metal – EBX, já foram registradas, no âmbito do Circuito Cultural Praça da Liberdade, mais de 70 mil visitas de pessoas de países como Argentina, Itália, Estados Unidos, Peru, Portugal, Espanha, Chile, Hungria, Holanda, Guatemala, Canadá, Londres, Uruguai, Bolívia, Polônia, Dinamarca, Irlanda, Suíça, Panamá, Alemanha, Colômbia e México.

A relação da história do Estado de Minas Gerais com a riqueza de suas minas e a metalurgia é intrínseca e marcante desde as origens da região. Por essa razão, mais do que um acervo, o Museu das Minas e do Metal – EBX, antigo prédio da Secretaria de Estado de Educação, inaugurado no dia 22 de março de 2010, uma parceria do Governo de Minas com o Grupo EBX Investimentos, se propõe a ser o retrato do legado do processo de desenvolvimento econômico, social e cultural do Estado.

Se somadas as visitas ao Palácio da Liberdade – aberto ao público aos domingos, desde agosto –, ao Arquivo Público Mineiro e à Biblioteca Pú-

Terceiro equipamento aberto ao público, inaugurado em 30 de novembro de 2010, o Memorial Minas Gerais – Vale, viabilizado por meio da parceria

Projeto arquitetônico de Paulo Mendes da Rocha. Museografia de Marcello Dantas. memorial minas gerais

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- vale

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entre o Governo do Estado de Minas Gerais e a Vale, está instalado no antigo prédio da Secretaria de Estado da Fazenda. Sua proposta é reunir, em um mesmo espaço, toda a riqueza cultural do estado, desde o século XVIII até o cenário contemporâneo, incluindo uma perspectiva futurista. História, literatura, moda, patrimônio, tudo isso sob um recorte que apresenta o novo a partir da constituição da memória mineira. Projeto arquitetônico de Humberto Hermeto, Carlos Maia, Débora Mendes, Eduardo França e Igor Macedo. Museografia de Gringo Cardia. centro de arte popular

- cemig

O prédio do antigo Hospital São Tarcísio, localizado na Rua Gonçalves Dias, a poucos metros da Praça da Liberdade, será transformado no Centro de Arte Popular - Cemig. O espaço privilegiará a riqueza e a diversidade das manifestações culturais populares, valorizando o trabalho dos artistas que traduzem, no barro, na madeira e em outros materiais, o universo em que vivem. O centro terá também salas de exposição temporária para mostrar obras de artistas não só de Minas, mas de todo o país. O imóvel foi cedido pelo IPSEMG. Previsão de inauguração para 2011. centro cultural banco do brasil

O prédio da antiga Secretaria de Estado de Defesa Social vai abrigar o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Contribuirá para tornar Minas Gerais um dos mais importantes polos da cultura nacional. Assim como os demais, o CCBB Belo Horizonte promoverá atividades nas áreas de artes plásticas, artes cênicas, música, ideias e programa educativo. Com programação regular e diversificada, o CCBB contemplará áreas para exposições temporárias; teatro com capacidade para 300 lugares; espaços para atividade audiovisual, música, dança, teatro e espaços multiuso para debates, conferências, oficinas, palestras e atividades interativas e educacionais; espaços de convivência, lazer e alimentação, além de loja para comercialização de produtos culturais. A previsão de inauguração é para o final de 2011. palácio da liberdade

O Palácio da Liberdade é um dos principais cartões postais de Belo Horizonte e um dos espaços do Circuito Cultural Praça da Liberdade que já pode ser visitado. Aos domingos, o público pode conhecer a história de Minas contada a partir da sua vida política. Prédio central do conjunto arquitetônico da Praça da Liberdade, o Palácio foi construído em estilo eclético com influência neoclássica. Inaugurado em 1987, o edifício serviu de moradia a vários governadores. Entre 2004 e 2006, o Palácio passou pelo maior processo de restauração desde sua inauguração, com apoio do Instituto Oi Futuro, revelando verdadeiras obras de arte escondidas pelo tempo, como pinturas em paredes e forro, além de um belo pátio interno. Todo domingo o espaço é aberto para visitação, feita em grupos de 15 pessoas, seguindo roteiro definido por técnicos do IEPHA, para garantir a segurança do rico acervo. Dentro do Palácio, o trajeto da visita envolve 30 cômodos e dura, em média, 30 minutos – todo domingo, das 9 às 13 horas e, no último domingo de cada mês, troca da guarda a partir das 8h30.

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biblioteca pública estadual luiz de bessa

Projetada por Oscar Niemeyer em 1954, a Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa, também integra o Circuito Cultural Praça da Liberdade. Com cerca de 200 mil títulos disponíveis, entre livros, jornais correntes e históricos, revistas correntes e históricas para consulta, além de uma “Seção Braille” com obras para acesso de deficientes visuais, recebe diariamente 1.500 pessoas. arquivo público mineiro

Criado em Ouro Preto, em 1895, o Arquivo Público Mineiro – APM, que completa 115 anos em 2011, é a instituição cultural mais antiga de Minas Gerais. São milhares de documentos de origem pública e privada que remontam aos períodos colonial, imperial e parte do republicano. O acervo abrange desde o século XVIII até o século XX. Além de manuscritos e impressos, reúne mapas, plantas, fotografias, gravuras, filmes, livros, folhetos e periódicos museu mineiro

O Museu Mineiro, localizado na Avenida João Pinheiro, 342, ao lado do APM, é uma construção do final do século XIX e revela a arquitetura que marcou oficialmente a fase inicial da cidade: características ecléticas recuperam as linhas básicas da arquitetura greco-romana e renascentista e apresentam ornamentos de nítida aparência afrancesada. Atualmente, o espaço reúne 36 coleções vindas de diversas outras instituições e de particulares. Destacam-se: Coleção Arquivo Público Mineiro, Coleção Geraldo Parreiras, Coleção Pinacoteca do Estado de Minas Gerais, Coleção IEPHA-MG, Coleção Jeanne Milde, Coleção Hidelgardo Meirelles, Coleção Irma Renault, Coleção Rede Manchete e Coleção Servas. Ainda não foi aberto após a reforma. café

Dentro do Circuito Cultural Praça da Liberdade, o Museu Mineiro e o Arquivo Público Mineiro contarão com um agradável ambiente, que vai estimular a visita do público. Trata-se da construção de um café que ganhará também condições de acessibilidade universal. As obras estão em andamento, com instalação de elevador e escada, além de ampliação do anexo. O espaço será destinado a eventos, convivência e apoio ao Museu Mineiro e ao Arquivo Público Mineiro, incluindo uma praça interna. Ainda não há previsão de data de inauguração. rainha da sucata

Popularmente conhecido como “Rainha da Sucata”, o prédio onde funcionou o Centro de Apoio Turístico – CAT – Tancredo Neves e, posteriormente, o Museu de Mineralogia Professor Djalma Guimarães foi construído no final dos anos 1980 a partir de um projeto pós-moderno de autoria de Éolo Maia e de Sylvio Podestá. Foi inaugurado em 1991. É a sede administrativa do Circuito Cultural Praça da Liberdade e também vai abrigar o Centro de Informações e Apoio ao Turista – CIAT. O acervo do Museu de Mineralogia migrou para o Museu das Minas e do Metal – EBX.

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novas parcerias

Museu do Homem Brasileiro – em março de 2010, foi feita a assinatura de um protocolo de intenções com a Fundação Roberto Marinho para a criação do Museu do Homem Brasileiro, a ser instalado no antigo prédio da Secretaria de Viação e Obras. O museu será um espaço de conhecimento, divulgação e interpretação da memória sobre a origem do povo brasileiro. O espaço apresentará a diversidade étnica e cultural do brasileiro, traçando um mapa da miscigenação no país. Em ambientes virtuais e interativos, o museu mostrará ainda como o homem brasileiro convive com a natureza e suas relações com a história, a cultura, a ciência e o futuro. Hotel Cinco Estrelas – O edital de concessão onerosa do prédio do IPSEMG, na Praça da Liberdade, onde será implantado um Hotel Cinco Estrelas, no modelo de Parceria Público-Privada – PPP, foi lançado no dia 22 de novembro, pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico e pelo referido órgão. O prazo vai até 18 de janeiro de 2011 para as empresas manifestarem interesse no processo licitatório. O prédio de 11 andares foi inaugurado em 1965 e foi projetado pelo arquiteto Raphael Hardy Filho. Com 11,4 mil metros quadrados de área construída, o prédio pode abrigar até 90 apartamentos.

Curiosidade: durante a construção de Belo Horizonte no final do século XIX, o projeto do construtor Aarão Reis previa a implantação de um hotel no local onde foi construído o prédio do IPSEMG.

Museu do Automóvel – Também em março de 2010, o ex-governador Aécio Neves anunciou a intenção de implantar o Museu do Automóvel, em um galpão de dois mil metros quadrados que faz parte do complexo do Palácio da Liberdade. O espaço servia de estacionamento para veículos do Gabinete Militar do Governador de Minas Gerais. Com a transferência das atividades do Palácio dos Despachos para a Cidade Administrativa, o espaço foi desocupado. Museu Clube da Esquina – O prédio do Serviço Voluntário de Assistência Social (Servas) também vai integrar o Circuito Cultural Praça da Liberdade. Será a sede do Museu Clube da Esquina, que promoverá a implantação do Centro de Referência da Música de Minas, juntamente com a Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais. A instalação do espaço contará com R$ 8 milhões, destinados pela bancada mineira na Câmara Federal, por meio de emendas ao Orçamento Geral da União – OGU – de 2010.

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mar tí pe ran

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Convidado: martí peran Professor Titular de Teoria da Arte da Universidade de Barcelona – Espanha.

La llamada Crítica Institucional representó en sus orígenes una aproximación muy severa con los roles autoritarios que ejerce el Museo en calidad de agente único para sancionar e inscribir el objeto estético. Sin embargo, la segunda generación de la Crítica Institucional, alcanzados ya los años noventa del siglo XX, malbarató la tarea realizada hasta entonces. La causa del descalabro hay que encontrarla en el proceso de cooptación por el cual el propio Museo se dispuso a capitanear el discurso crítico consigo mismo, garantizándose así que ninguna bacteria pudiera hacer tambalear los cimientos de la institución. En esta tesitura, llevamos un tiempo reclamando la necesidad de refundar la Crítica Institucional y articular así una tercera generación de discursos críticos que devuelvan una perspectiva exterior al análisis de las instuciones culturales⁹. La premisa todavía es la misma : urgen herramientas para preservar la capacidad del arte para escuchar y producir la diferencia, en lugar de comportarse como un instrumento auxiliar para la imposición de las narrativas hegemónicas. La controversia conocida como la Querelle que abrió la estética del siglo XVII hacía sus derroteros ilustrados y modernos¹⁰, en realidad podría resumirse como la disputa entre dos modos muy distintos de concebir la Tradición. Por un lado, los anciens se manifestaron partidarios de interpretarla como un principio de autoridad, hasta tal extremo indiscutible, que no cabía más posibilidad que su reproducción fiel y mecánica; por el otro, los modernes se inclinaron por defender que el único modo de garantizar la continuidad de esa misma Tradición, exigía plantearla como un punto de partida que obliga a una permanente actualización de su esencia. En cualquier caso, para ninguno de los bandos se trataba de romper con la Tradición sino, por el contrario, de asegurar su eficacia, ya fuera por una estrategia de reproducción o de adecuación. Esta misma disyuntiva es precisamente la que, de algún modo, se está reproduciendo hoy en la gestión del canon artístico occidental en el contexto de la nueva geopolítica del saber.

/10 Conferência A necessidade para o pensamento crítico ainda pode ser canalizada através da rota tradicional de cultura? Qual é o escopo para a produção e difusão dentro da geopolítica do conhecimento cultural local? Quem e onde se produzem as teorias? Podemos construir novas teorias? Qual seria a educação mais eficaz para não reproduzir o modelo de spin? Vocês usam as teorias para pensar no futuro? Devemos pensar no futuro?

Lugares y agentes para la producción de teorías. La Geopolítica del arte como otra Querelle.

⁹ Sobre todas estas cuestiones puede consultarse Gerald Rauning / Gene Ray (eds). Art and Contemporary Critical Practice. Reinventing Institutional Critique. MayFlyBooks. London, 2009.

¹⁰ Anne-Marie Lecoq, La Querelle des Anciens et des Modernes. Gallimard. Paris, 2001.

En efecto, de unas décadas a esta parte, hemos asistido a una proliferación de movimientos mediante las cuales el sistema del arte supuestamente abandona sus sesgos eurocéntricos y ensaya una apertura hacia los quehaceres locales y diversos. La atención hacia los artistas procedentes de contextos periféricos y la exportación del modelo de las bienales en territorios remotos, más allá de ilustrar la redistribución global del poder cultural, se han desplegado con un halo de bondad y generosidad hacia la diferencia que, sin embargo, ha de ser analizado con cautela. Nuestro propósito es dar a entender que, en realidad, toda esta atención hacía otros contextos debería interpretarse como una operación de aproximación acorde con la lógica de un capitalismo cultural deslocalizado y una nueva división internacional del trabajo. Desde esta perspectiva, el sistema del arte estaría, sencillamente, desarrollando los protocolos necesarios para garantizar su hegemonía en el perímetro global y, para ello, se debate, cual una nueva Querelle, entre la simple articulación de instrumentos para exportar el canon occidental y favorecer su reproduc-

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ción o, mucho más sibilino, adecuando ese mismo canon sobre las historias locales para facilitar su expansión. En las notas que siguen vamos a definir los procesos de los que se sirven cada una de estas estrategias [véase el cuadro adjunto], pero cabe avanzar que, como sucediera con la victoria de los modernes sobre los anciens, también hoy se están imponiendo las más complejas dinámicas expansionistas partidarias de la adecuación local del canon occidental.

La exportación del canon artístico occidental hacia los territorios periféricos ha sido durante años el proceso más generalizado para garantizar la hegemonía del modelo. Al fin y al cabo, se trataba de aplicar en el sistema del arte las técnicas del colonialismo más ordinario y convencional: la ocupación y el control directo del territorio. Bajo este prisma pueden interpretarse las primeras exportaciones del modelo Bienal en Istambul y La Habana en los años ochenta y, siguiendo después su estela, en Johannesbourg, Taipei, Sharhaj o Dakar y, de manera imparable, hasta el Fin del Mundo¹¹. Naturalmente, en cada una de estas impostaciones del modelo occidental mediadas por el formato de las bienales, se conceden determinados grados de protagonismo para los creadores locales, pero siempre con aportes perfectamente adecuados a las tendencias dominantes en el orden global. La apoteosis de este tipo de de concesiones se produjo, de forma harto elocuente, en la canónica Bienal de Venecia de 2003, cuando distintos curadores “periféricos” fueron invitados a orquestar una plural dictadura del espectador¹² que sólo alcanzó a poner en evidencia la reversibilidad de todos los trabajos en el interior de un relato muy homogéneo.

formación de cuadros en la metrópolis que, una vez instruidos, puedan comandar la exportación del canon a sus territorios de origen. Este proceso puede ilustrarse muy facilmente con numeros ejemplos: los artistas y, sobre todo, los jóvenes comisarios de arte de El Cairo se forman en Londres, los de Istambul en Berlin o en Frankfurt, los de Mèxico en Los Angeles o en New York y los de Santiago de Chile en Houston o, si no hay más remedio, en Madrid o Barcelona. Mediante distintos programas de colaboración se resuelven así dos expectativas al mismo tiempo: se instruye en el modelo que de inmediato ha de exportarse sobre la producción local de destino y, en clave doméstica, se satisface la necesidad psicologica, literaria y económica de vincular el espacio central donde se construye el relato con los territorios que han de aportarle diferencia y exotismo. La operación perfecta y sin poner en cuestión el protagonismo y la centralidad del lugar donde se producen las teorías. Según una visión demasiado amable de la geopolítica del saber, la cultura occidental, envejecida y agotada, tendría su única perspectiva de supervivencia en la obstinación de otras culturas por imitarla y prolongarla. El diagnóstico contiene retazos de acierto y de verdad, pero probablemente sea ingenuo en exceso. Esta supuesta imitación voluntaria esquiva el papel fundamental que pueden ejercer los agentes locales, formados en la metrópolis, en calidad de instrumentos para una interiorización local del canon occidental hasta garantizar una suerte de autoimposición del mismo. La cultura occidental, de acuerdo a esta dinámica, ya no puede interpretarse como algo dañado y en extinción sino, por el contrario, como un todopoderoso modelo capacitado para gobernar un territorio global mediante la sibilina articulación de protocolos de autogobierno. Mientras esos procesos de exportación del canon artístico occidental hacia otros territorios operan mediante un control directo sobre el lugar de destino, la adecuación del mismo canon a las historias locales ejerce el control a distancia, con una incidencia menos ruidosa y menos palpable a simple vista, pero mucha más efectiva en relación a los mecanismos de producción y gestión de conocimientos. En efecto, como veremos de inmediato, la adecuación del canon se resuelve mediante dos procedimientos directamente vinculados con las historias locales: su gestión como materia prima para un proceso de producción dirigido desde el centro hegemónico, y la conexión de la imaginación que atraviesa esas historias con las redes globales de la información por las cuales se acelera una homogeneización narrativa. Veamoslo aunque sea con trámite de urgencia.

¹¹ En 2007 se celebró la I Bienal del Fin del Mundo en Ushuaia, en la Patagonia argentina, patrocinada por la Fundación estatal Patagonia Arte & Desafío.

¹² La Bienal de Venecia de 2003, comandada por

Pero las estrategias de exportación del canon no se detienen en la abrupta promoción de bienales previsibles allá donde haya un mercado ansioso por incorporarse al circuito global. Hay otro modo más efectivo de acelar esa misma exportación que podríamos interpretar en clave de “colonialismo interno”¹³. En esta ocasión, de lo que se trata es de garantizar el control del territorio mediante la participación de agentes locales adecuadamente disciplinados en el modelo occidental. Para ello, es menester que se articulen adecuadamente los mecanismos para una eficaz

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Francesco Bonami, se organizó mediante distintas secciones arropadas todas ellas bajo el epígrafe “La dictadura del espectador”.

¹³ Concepto acuñado por Walter D. Mignolo (véase

¹⁴ Homi Bhabha. “The Other Question: Stereotype

Historias locales/ diseños globales. Colonialidad,

and Colonial Discourse”. Screen 24, 6. November-

conocimientos subalternos y pensamiento fronterizo. Akal. Madrid, 2003)

December 1983. Véase tambien H.Bhabha. The Location of Culture. Routledge. New York , 1994.

Como analizara tiempo atrás Homi Bhabha, el discurso colonial se legitima atribuyendo a la producción de conocimiento de colonizadores y colonizados unos roles estereotipados y antitéticos, que garantizan la supremacía jerárquica del primero sobre el segundo¹⁴. Esto que es perfectamente visible, por ejemplo, en la oposición entre la idea de mujer producida en Occidente frente a la misma categoria producida según las convenciones del “tercer mundo”, se hace más complejo en el ámbito del arte contemporáneo. En este sector parece que todo es más sinuoso y

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confuso pues, en efecto, desde la perspectiva del canon occidental, las historias locales son atendidas en calidad de datos genuinos sobre la diferencia lo que, de antemano, no parece presuponer ninguna relación jerarquica sino todo lo contrario; sin embargo, esta fascinación por la diferencia (tantas veces identificada con la fascinación por la subalternidad y las prácticas informales de subsistencia) en última instancia se limita a satisfacer la necesidad de nueva materia prima para ser editada según los códigos de la narración dominante. En otras palabras, la diferencia local facilita los recursos mientras que el canon hegemónico continua siendo el encargado de controlar el proceso de edición del producto final. Esta dinámica exigiría ser analizada con especial sosiego a dia de hoy, cuando el escenario cotidiano para las formas de vida en la cultura occidental se ha detenido en un modelo de bienestar banal y de ciega acumulación material incapaz de alimentar a la imaginación, de forma que, en demasiadas ocasiones, solo una apelación a territorios remotos garantiza el reencuentro con una materia prima cruda y dispuesta para ser cocida¹⁵ en nuestros aposentos aburridos y vacíos.

Moderno padeció en las antiguas colonias europeas¹⁶. Naturalmente que es pertinente cuestionar el colonialismo mediado por la arquitectura y el urbanismo modernos, pero esta reconstrucción del fracaso del modelo europeo en territorios caribeños o en desiertos africanos, no deja de poner en evidencia el protagonismo de un relato hegemónico que, a fin de cuentas, está más interesado por el diferencial modernista, por la distancia que imposibilita la eficacia local del modelo moderno, que por la diferencia misma; es decir, que a pesar del registro indiscutiblemente crítico de este tipo de proyectos, lo que prevalece es una autoreflexión sobre el propio relato central que, de este modo, conserva su preeminencia.

No son necesarios demasiados ejemplos para ilustrar esta adecuación del canon que estamos planteando al modo de relación jerarquica entre la posición de la historia local como materia prima y la posición del propio canon como responsable del proceso ultimo de producción. La misma miopía que supone insistir en la reducción de identificar la diferencia con la subalternidad da suficiente cuenta de ello. Mientras el acento en la aproximación a lo periférico continue obnubilado en su focalización de lo mísero, más allá de fundar un acto de justicia, lo que se fortalece es la relación antitética que instala la perspectiva occidental en una situación de privilegio frente a cualquier otra realidad y, este mismo privilegio, es el que acaba por legitimar que sea la perspectiva dominante la encargada de dar forma a todos los relatos. No puede desestimarse la importancia de los modos del habla y, en esta perspectiva, aún cuando el arte se comprometa a dar visibilidad a lo distinto o a lo distinto injusto, en última instancia no hace sino recaudar esas realidades en el interior de sus registros linguísticos, de sus protocolos estéticos y de los supuestos ideológicos desde los que estos se establecen.

¹⁶ Podrían mencionarse muchos ejemplos de esta temática recurrente en el arte contemporáneo.

Este privilegio de la metrópolis (ahora rebajada al eufemismo de “la perspectiva occidental”) en el control del proceso de producción, convierte a la indústria artística en un ejemplo más de la economía deslocalizada. El territorio de destino es aquel donde se hallan los recursos (temas atractivos), la mano de obra ( cuadros de artistas y curadores prestos a incorporarse al circuito) y, cuando es factible, incluso la producción final (mediante bienales y eventos variados); pero el libro de ruta para todo este proceso se redacta en orígen, allí donde los costes serían excesivos y donde, además, supuestamente queda muy poco por contar. Pero sucede a veces que esta deslocalización de la producción, aparentemente animada por un interés real y horizontal por la diferencia, deja al descubierto su inevitable condición jerárquica. Así ocurre, por ejemplo, con la recurrente apelación y exámen de las visicitudes que el Proyecto

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Para dar una sola noticia al respecto, véase por ejemplo como esto que llamamos “diferencial modernista” planea sobre distintos trabajos de la exposición Modernologías. Artistas contemporáneos investigan la modernidad y el modernismo. MACBA,2009.

¹⁷ Arjun Appadurai. Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization. University of

La adecuación del canon occidental, lo que estamos reconociendo como un neocolonialismo capaz de ejercer el control a distancia, más alla de la lógica de una producción deslocalizada, desarrolla otro recurso en lo que podría reconocerse como cooptación de la imaginación en el interior de las redes de la Información. Este mecanismo, como veremos de inmediato, representa algo así como la cancelación de las expectativas que tiempo atrás se prometía Arjun Appadurai cuando confiaba en la imaginación como una práctica social, capaz de vertebrar fuerzas de resistencia compensatoria que reordenaran las diferencias culturales frente al proceso de homogeneización¹⁷. En efecto, Appadurai expresaba la esperanza de que el propio proceso de globalización sirviera de inspiración para el despertar de determinadas historias locales y que estas, en su mismo despliegue, acabaran por convertirse en ingredientes ineludibles de la propia globalización. Sin embargo, la nueva geopolítica del saber, como hemos visto, incluso organizando de forma transnacional la producción de conocimiento mediante la utilización de las diferencias como materia primera, prioriza el modelo único de una Sociedad de la Información basada en la distribución global y totalitaria de un solo relato. Efectivamente, la perspectiva occidental que controla la producción y el mantenimiento hegemónico del canon, lo distribuye mediante la compleja trama de redes de la sociedad informativa que, para garantizar la eficacia de su distribución expansionista, en última instancia, solo exige una simple conexión con los nodos principales de las mismas redes. Se trata de la apoteósica confusión entre la Información – aquello que deberia facilitar el acceso a narrativas plurales – y la Conexión – aquello que reduce las historias locales y la diferencia a la condición de agente conectado con el conjunto de las teorías dominantes – en otras palabras, la geopolitica del saber, disfrazada con atuendos de la sociedad informativa, acelera el acceso al conocimiento canónico pero no garantiza la auténtica producción de conocimiento. Mediante la conexión no se multiplican los interlocutores sino que se resuelve la mera expansión informativa del canon. En este despotismo comunicativo¹⁸ pudiera ser que las redes se hayan convertido ya en calles de dirección única y todas ellas procedentes del mismo y único centro de la metrópolis.

Minessota Press. Minneapolis/Londres.1996.

¹⁵ Claude Lévi-Strauss. Mitológicas I. Lo crudo y

¹⁸ Véase sobre esta cuestión Mario Perniola. Contra

lo cocido. FCE. México, 1968.

la Comunicación. Amorrortu. Buenos Aires, 2006.

La consecuencia de ello, a pesar del optimismo de Appadurai, es que las diferencias locales, reducidas a un punto de conexión receptora, quedan desactividas como puntos de emisión de narrativas singulares con imagi-

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narios propios. Las redes de la imaginación que habían de articular los encuentros constantes entre historias distintas para una verdadera producción de saberes, al final del camino quedaron cooptadas en el interior de las redes de una Información convertida en simple propagación del canon. En definitiva, si es cierto que el canon occidental garantiza su hegemonia mediante estas estrategias para su banal reproducción o para su estudiada actualización, entonces, en el interior de esta supuesta Querelle, solo se apuesta por imponer un modelo de visibilidad global o por la necesidad de adecuarlo mediante una sospecha intervención in-situ. En cualquier caso, en el debate planteado desde estos supuestos, no hay modo de preservar para el arte su hipotética capacidad para escuchar y producir diferencia. Es necesario superar la falsa demarcación de la Querelle tal y como ya protagonizara la vanguardia historica frente a la modernidad moderada de la Ilustración. Para ello, el único horizonte posible exige convertir lo local, ya no en un objeto de estudio ni en un punto interconectado, sino en un enclave desde el cual y a partir del cual operar cual potencia de pensamiento. Es menester liberar las redes de la imaginación fuera del espacio de la información que se limita a propagar un modelo. Puede que tampoco sea suficiente apelar a una variante de la intervención site-specific, más allá de lo fenomenológico y lo institucional, al modo de inserción en los “vectores discursivos” genuinos que condecen a lo local la naturaleza de espacio social¹⁹. Así como la verdadera superación de la Tradición que pretendía conservar la Querelle académica sólo fue posible tardíamente y mediante una estética del shock, quizás ahora solo sea posible cuestionar al canon occidental desde lo local fuera del propio campo disciplinar del arte. Mientras la intervención en el territorio de la diferencia, a pesar de actuar con ella de un modo colaborativo, se mantenga en la logica del arte, la historia y la imaginación local continuaran siendo subsidiarias, y no por la posible debilidad de sus temas frente a la soberbia lingüística del canon occidental, sino por el mero hecho de su propia práctica disciplinar. Se trata de exactamente la misma paradoja que impedia, al parecer de Dipesh Chakrabarty, que los Estudios subalternos pudieran prosperar desde la óptica del campo disciplinar de la Historia, definido y ordenado por la perspectiva colonial.²⁰ Recientemente, Mathew Rampley ha puesto en evidencia como incluso la mayor amplitud de miras de la Cultura Visual respecto de la tradicional Historia del Arte,tampoco alcanza a superar las “dificultades de equivalencia” entre la economia occidental de la imagen y la que impera en otros regímenes culturales²¹.

traducción o de postproducción, es en el ámbito de lo que la lógica occidental solo puede reconocer como saberes subterráneos. Hay una larga tradición del interés occidental por esos saberes (modos de intercanvio, practicas artesanales, discursos orales y rumores,..) pero se nos antoja muy difícil que, en nombre del arte, puedan incorporarse a una red infinita de relatos.

¹⁹ Esta sería la tercerca noción de arte site-specific acorde con las trsis de Miwon Kwon (One place alter another: site-specific art and locational identity. The MIT Press. Massachussets, 2004)

La salida del campo disciplinar del arte no es, desde luego, algo que pueda promoverse con ligereza. Un giro demasiado acelerado de estas características podría, simplemente, conducirnos hacía la disolución del arte en los marcos, también ortodoxos, de la antropología. La impaciencia por preservar una aproximación fiel a la creatividad que atraviesa las historias locales, obliga a atender una zona de habilidades y prácticas muy diversas y, desde luego, ajenas a la idea canónica de lo artístico. En cualquier caso, donde la diferencia se libera de cualquier tentativa de

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²⁰ Dipesh Chakrabarty. Provincializing Europe. Postcolonial Thought and Historical Difference. Princeton University Press. Princeton/Oxford, 2000.

²¹ Mathew Rampley. “ La Cultura Visual en la era postcolonial: el desafío de la antropologíaa”. Estudios Visuales. 3, 2006. pp.186-211.

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nata cha rena Mediadora: natacha rena

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Arquiteta e designer, professora dos cursos de Arquitetura e Designer da UFMG e FUMEC, coordenadora de projetos socioambientais do JA.CA Belo Horizonte – MG

/10 Mesa Redonda A influência do projeto arquitetônico na concepção do espaço cultural como lugar de ocupação e de intervenções urbanas. O que pode ser a experiência desse espaço sobre o qual se realiza uma intervenção? O espaço pode ser mediador entre sujeito e obra? A experiência da arquitetura depende da experiência estética, mas também da experiência do cotidiano. Como lidar com essas linguagens? O impacto socioeconômico e cultural a partir da requalificação de áreas urbanas.

O convite dos participantes desta mesa ARQUITETURA DO ESPAÇO E SUAS LINGUAGENS foi pautado pelo entendimento de que a arquitetura com finalidades culturais e artísticas deve compreender o espaço da nossa arquitetura, mais precisamente de uma arquitetura latino–americana, que se estabelece cada vez mais fora das condições impostas pelos processos colonizadores. Apresentamos aqui espacialidades que se relacionam com o contexto e com o usuário incorporando o tempo não voltado somente para o futuro, o que levaria a uma produção arquitetônica sempre em busca de uma novidade lançada nos países ditos desenvolvidos, mas um tempo que se expande no presente, realização de arquiteturas que ofereçam, além da linguagem, programas de atividades que se produzem fora da constante necessidade de se relacionar com a produção realizada nos “países desenvolvidos”, como se esta arquitetura sempre mais nova que a nossa fosse algo a se atingir e está sempre para além do nosso alcance como uma eterna miragem. Acredita-se ser possível deixar de lado as velhas dicotomias geradas nos processos civilizatórios fortemente relacionados com a ideia de progresso, e através do mergulho em contextos e realidades específicas, ser possível criar linguagens culturais pensando o espaço dentro de contextos específicos e concretos. Na contramão da espetacularização que poderíamos chamar também ironicamente de “efeito bilbao” e da consequente gentrificação que alguns espaços culturais estabelecem com o contexto, apresentamos aqui, em vez da legitimação do poder das forças hegemônicas, sejam elas institucionais, governamentais ou privadas, algumas propostas que possuem uma generosidade premeditada com a cidade, e, mais precisamente, com o usuário.

Natacha Rena Arquiteta e designer, professora dos cursos de Arquitetura e de Design da UFMG e FUMEC. Coordenadora de projetos socioambientais do JA.CA. – Belo Horizonte (MG)

A arquitetura do espaço e suas linguagens.

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Ao refletir sobre arquitetura e espaços culturais, retomo a leitura do pequeno conto “Achadouros”, contido no livro “Memórias Inventadas”, de Manoel de Barros. Como nos lembra o poeta, nossa percepção dos espaços é mediada pela intimidade que temos com eles. À medida que lhes somos mais íntimos, integramos determinados espaços ao nosso cotidiano, e os reconhecemos como muito próximos. Chegam mesmo a nos parecer maiores do que realmente são. O estado de intimidade que uma pessoa desenvolve sobre um espaço decorre das noções de pertencimento e de domínio, ao mesmo tempo que delas se alimenta. A relação de real intimidade, entretanto, ocorre sem que se perceba, ou sem que haja esforço para que aconteça, para que se atestem pertencimento ou domínio sobre um espaço. No momento de real intimidade é que as delimitações físicas impostas por um espaço deixam de ser tão relevantes, e o que passa a importar é a capacidade que ambientes que nos são familiares têm em transcender tais limites físicos. Pretendo, a partir do conceito de intimidade, relativizar as dimensões e o caráter privado ou público dos espaços, do quintal à cidade, e abordar aspectos subjetivos gerados por determinadas configurações arquitetônicas, os quais podem indeterminar a noção precisa de escala, bem como os próprios limites da ação de um espaço sobre as pessoas.

fer nando ma culan Convidado: fernando maculan Diretor da A&M Arquitetura Belo Horizonte – MG.

Arquitetura, intimidade, cultura. Acho que o quintal onde a gente brincou é maior do que a cidade. A gente só descobre isso depois de grande. A gente descobre que o tamanho das coisas

O ambiente construído, criado pelo homem, é uma das manifestações culturais mais contundentes. A cidade é o espaço cultural por excelência e é a esta camada da cultura que se orienta o presente texto. Cada intervenção realizada na cidade – seja uma casa, um edifício, arruamento ou praça, estabelece novas relações de maior ou menor intimidade dos moradores com o ambiente urbano, tornando-o mais ou menos acessível, ou apropriável, pela população.

O trabalho consiste em uma videoinstalação, na qual são exibidos vídeos gravados em diversas partes do mundo entre 1998 e 2007, em paralelo a novos vídeos feitos na cidade de Belo Horizonte em 2008, ano da realização do trabalho.

há que ser medido pela intimidade que temos com as coisas. (...) Assim, as

Foram escolhidos lugares na cidade pela correspondência de seus nomes aos de várias localidades do mundo já filmadas. O mapa formado pelos lugares escolhidos em Belo Horizonte é tomado como uma alusão ao mapa resultante das viagens internacionais, a despeito da enorme diferença da escala dos deslocamentos. Pretende-se revelar um mundo inscrito nos limites da cidade, ainda a ser descoberto e explorado. Um estímulo para que se conheça melhor o lugar em que se vive.

pedrinhas do nosso quintal são sempre maiores do que as outras pedras do mundo. Justo pelo motivo da intimidade. Manoel de Barros

Através do fortalecimento do conceito de intimidade, a arquitetura pode promover o engajamento natural das pessoas no espaço da cidade, e assim reconciliá-las com sua própria cultura. São apresentados, a seguir, alguns exemplos de intervenções arquitetônicas que, de diferentes maneiras, buscam contribuir para a aproximação e a identificação das pessoas com o contexto em que estão inseridas, com a cidade e com a cultura. aeurásia

O projeto surge da exploração, de quatro moradores de Belo Horizonte, de seu vasto acervo de vídeos formado pelo registro de viagens, a trabalho ou passeio, a diversos países nas Américas, Europa e Ásia. A reunião e a avaliação desse material os levam à constatação de que a crescente mobilidade da vida contemporânea, que lhes permite fazer grandes deslocamentos no planeta, nem sempre encontra um paralelo na escala da cidade. A curiosidade por conhecer novos destinos normalmente supera a curiosidade que temos em relação ao território que habitamos.

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Na videoinstalação, quatro conceitos conduzem a experiência do público: diferença, distância, tempo e mobilidade. As imagens de Belo Horizonte são captadas e editadas a partir da interpretação do acervo existente pelos participantes, e as aproximações com enfoques diversos – plásticos, comportamentais, ambientais ou urbanos – são apresentadas em uma sucessão de oito dípticos animados.

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ambiente escolar multicultural na cidade de Londres e contempla ações possíveis, relacionadas ao espaço construído, que possam favorecer o reconhecimento, a valorização e o convívio das diferenças.

Exposição Aeurásia no 104

Em uma das telas, o visitante é convidado a “visitar” os lugares apresentados, tanto da cidade de Belo Horizonte quanto do exterior. Um sistema composto por uma câmera de vídeo e uma tela de chroma-key permite a gravação em tempo real e a superposição da imagem dos viajantes nas imagens projetadas. Após o passeio, as pessoas podem acessar, em um computador, as imagens gravadas e enviá-las por email.

Villiers School

A intervenção aqui apresentada resulta de um workshop realizado em duas etapas, em dois anos consecutivos, na Villiers High School, situada na região oeste de Londres. O título Designing Across Boundaries refere-se não só às características multiculturais dos alunos da Villiers, mas também ao grupo de orientadores e participantes do workshop.

Postal

Viabilizado através de seleção pelo edital Filme em Minas, o projeto foi realizado em 2008 no Espaço 104, em Belo Horizonte; em 2009 no Festival Internacional de Artes Eletrônicas e Vídeo – Transitio_MX, no Centro de Arte Alameda da Cidade do México; e no ano de 2010 como integrante da exposição itinerante Geografias Imaginárias, nas cidades de Cataguases, Diamantina, Tiradentes e Guaxupé. designing across boundaries

O projeto aborda, essencialmente, a questão da coexistência de diversas experiências de vida, comportamentos e expectativas de alunos em um

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Na primeira etapa do projeto, realizada em 2007, foram envolvidos um arquiteto e duas designers brasileiras, uma arquiteta chinesa e dois videoartistas holandeses residentes em Londres, um grupo de estudantes de graduação em design da FAAP e do Royal College of Art, além de um grupo de alunos da Villiers. Essa etapa consistiu no exercício do afloramento das percepções dos alunos da Villiers sobre os ambientes internos e externos da escola, o que foi amparado pelo método desenvolvido por Bas Raijmakers denomi-

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nado Design Documentaries (www.designdocumentaries.com). Os alunos são equipados com câmeras de vídeo para, através de filmes, registrar e comunicar aos demais participantes do workshop e orientadores suas visões, positivas ou negativas, sobre o espaço. A seguir, os participantes são distribuídos em três grupos para formular propostas de intervenção no espaço, como respostas à pesquisa inicial. Os trabalhos, realizados com papelão corrugado, apontaram para três motivações dos alunos: observação, comunicação, e apropriação.

fit

Neste ano o Festival Internacional de Palco e Rua de Belo Horizonte – FIT 2010 teve sua 10ª edição. Paulo Pederneiras, diretor artístico do Grupo Corpo, é convidado pela Fundação Municipal de Cultura para a criação de uma obra que, além de conter autonomia e significado próprios, estabelece parâmetros para a formulação de novos conceitos e identidade visual para o festival.

A etapa seguinte resulta na criação coletiva de uma intervenção para o pátio interno da escola, espaço apontado pela maioria dos alunos como carente de uma ambiência adequada a seu uso e sua apropriação. Opta-se por fazer uma intervenção gráfica, com desenhos feitos pelos próprios alunos. A partir de uma sessão de desenho livre, algumas figuras são escolhidas, “escaneadas” e vetorizadas para, posteriormente, gerar arquivos de corte para a confecção digital de estênceis.

Foto montagem sobre imagem do Google

O projeto realizado, no qual trabalhamos juntos, é composto de duas intervenções urbanas construídas em pontos-cegos resultantes do cruzamento de algumas avenidas de Belo Horizonte. Um dos cruzamentos é o das avenidas Afonso Pena e Amazonas, que forma a Praça 7, no centro da cidade; o outro é o das avenidas Getúlio Vargas e Cristóvão Colombo, que forma a Praça da Savassi. Nos pontos-cegos, normalmente não acessados pelos pedestres, são criadas estruturas de arquibancadas pintadas na cor vermelha, ligadas aos passeios centrais das avenidas por faixas pintadas no asfalto, com a mesma cor. Assim, permite-se ao pedestre acessar com segurança as arquibancadas, ali permanecer e se entreter com o movimento da cidade, a partir de um ponto de vista inusitado.

O desenho final é o de uma mandala, representação que, pela forma circular, cria nova centralidade para o pátio, ao mesmo tempo que simboliza a reunião harmônica das diferenças.

Foto: Gabriel Castro

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Além da função contemplativa, esses novos territórios demarcados em vermelho são concebidos como palco para curtas apresentações espontâneas, cujo tempo de duração é definido pela programação dos semáforos.

originalmente pela fragmentação e descontinuidade. O nivelamento do piso térreo do Arquivo Público com o piso superior do Museu Mineiro é a chave para a definição da cota da cobertura da nova edificação. O café é construído parcialmente em subsolo, com acesso pelo ponto mais baixo do alinhamento frontal, e sua cobertura origina uma ampla praça gramada que conecta em um mesmo nível o Museu e o Arquivo Público.

Abertos à livre apropriação pelo público, esses espaços são, durante o tempo de duração do festival, um convite a observar a própria cidade como um espetáculo.

Foto: Gabriel Castro

café arquivo público e museu mineiro

3D: Superfície.org

Convidados para projetar um café no espaço existente entre as edificações que abrigam o Arquivo Público Mineiro e o Museu Mineiro, exemplares centenários do casario executado pela Comissão Construtora da nova capital, preocupa-nos especialmente a ocupação de um espaço vazio e de uso público, situação cada vez mais rara no contexto urbano central da cidade.

Em vez de ser suprimido, o espaço vazio é ordenado e ampliado, e faz com que a instalação de um equipamento acessório avance para a reformulação e revitalização do ambiente externo, proporcionando a integração espacial do conjunto arquitetônico. Embora semienterrado, o espaço interno do café comunica-se diretamente com a rua e com o Museu Mineiro, a partir da abertura triangular gerada entre a laje de cobertura e o talude frontal, e também através do generoso recuo lateral, dado em relação a esta instituição. A abertura circular no teto permite que o espaço interno também se comunique visualmente com o Arquivo Público.

Croqui: Fernando Maculan

Por outro lado, a inserção de um café constitui fator significativo para a atração de público para as instituições, ao mesmo tempo que proporciona um espaço de encontro e troca de informações, a justificar sua instalação. Parte-se, portanto, de uma proposta para que a edificação do café atue como elemento integrador espacial, visto que os terrenos de ambas as instituições, além de separados por um muro baixo, caracterizam-se

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Foto: Gabriel Castro

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Completam a intervenção os projetos para o interior da sala multiuso na edificação do Museu Mineiro, em sua porção contígua à rua, e para uma caixa de concreto aparente, a qual abriga a circulação vertical que articula o conjunto ao edifício da Superintendência de Museus.

Ofícios; a revitalização do Cine Brasil e do Cine Palladium, com a criação de dois novos espaços culturais, ainda em construção; a criação do Museu Inimá de Paula e, mais recentemente, do Centro de Arte Contemporânea e Fotografia.

A caixa de circulação vertical ocupa uma lacuna no perímetro edificado, mantendo-se coerente com a altimetria estabelecida pelas edificações vizinhas. Ainda que se comporte como elemento distinto das edificações existentes, pela geometria abstrata e cega, torna-se mais um integrante de uma reunião amistosa em torno de uma praça.

No caso do 104, a ideia fundamental do projeto de requalificação é a preservação da configuração arquitetônica que caracteriza a tipologia fabril do edifício, de 1906, desde sua criação por Edgar Nascentes Coelho para abrigar a “Companhia Industrial Belo Horizonte”. Ao longo dos mais de 100 anos de existência do edifício, várias intervenções foram realizadas, em particular nos trechos paralelos às avenidas dos Andradas e do Contorno, com prejuízos para a integridade plástica do volume original.

Foto: Gabriel Castro Esquema da intervenção sobre

104

ocupações posteriores

O edifício que abriga o 104 ocupa a totalidade do quarteirão delimitado pelas ruas da Bahia e Guaicurus e pelas avenidas do Contorno e Andradas, na região central de Belo Horizonte.

Para abrigar o programa previsto para a nova ocupação do edifício, focado em educação e cultura, e ao mesmo tempo preservar a estrutura e a articulação espacial originais, propõe-se a construção de novo bloco metálico sobre os acréscimos construídos junto às avenidas dos Andradas e do Contorno. O novo bloco tem por função principal receber todos os cômodos e instalações de apoio aos demais espaços do centro cultural, que podem desfrutar livremente das dimensões generosas e da qualidade arquitetônica dos espaços da antiga fábrica. O espaço interno do 104 pode ser entendido como um fractal da cidade: uma verdadeira rua interna corta longitudinalmente o conjunto, e a ela estão ligados diversos espaços – como lotes ou quadras – por um lado, mais baixos e de menor dimensão, correspondentes aos acréscimos feitos ao longo dos anos; pelo outro, mais amplos e altos, sob a sucessão de telhados de duas águas, originais do edifício. Ocupação inicial

Em 2008 é iniciado o projeto para o restauro do edifício e intervenção de acréscimo de área. Oportunamente, o período coincide com várias outras ações ocorrentes no centro da cidade: a revitalização da praça e do edifício da estação ferroviária, que abriga o recém-criado Museu de Artes e

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Por essa configuração que lhe dá ares de espaço urbano delimitado pela arquitetura, e pela falta de compartimentações, ambas situações corroboradas pelo projeto de intervenção, o 104 é rapidamente reconhecido como lugar que participa e que está aberto à participação. Em outras palavras, pode-se afirmar que os eventos realizados no 104 desde 2008 so-

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 85

frem influência significativa do espaço físico da antiga fábrica de tecidos e das novas intervenções, ao mesmo tempo que nele são sustentadas a liberdade e a dinâmica de sua manifestação.

Para nós, entretanto, a opção construtiva é fator decisivo. Se o dia a dia dos frequentadores do Animaparque é pautado pela virtualidade das relações de trabalho e de comunicação, cabe à arquitetura constituir o contraponto, a representação material da ocupação de um lugar. Por trás de todo o ambiente aparelhado pelas novas tecnologias digitais, busca-se estabelecer um modelo frutífero de relações humanas, favorecido pela rede de percursos e de espaços prontos para a livre apropriação, para o encontro. A constituição da estrutura física do Polo deverá, por princípio, se abster do arsenal tecnológico que irá abrigar, e se posicionar como contraponto, como um referencial que reafirme às pessoas sua inevitável e, cabe dizer, desejável relação com a matéria e os elementos primordiais. Caberá à arquitetura proporcionar aos operários do futuro a atmosfera terrena, plena dos estímulos sensoriais e vivenciais que os afastarão do risco da alienação resultante da superexposição ao ambiente digital.

Seja pelo caráter dos projetos realizados dentro do edifício, seja pelas ações externas que o conectam ao entorno imediato e ao centro da cidade, é cada vez menos relevante o peso material das paredes que tentam delimitar esse espaço em expansão. animaparque

Quanto à relação da obra na paisagem, recorremos à referência das realizações arquitetônicas coletivas contidas no catálogo da exposição Architecture Without Architects, realizada no MoMA, Nova York, em 1965. Segundo Bernard Rudolfsky, que assina os textos do catálogo:

A concepção do ANIMAPARQUE, Polo de Audiovisual, Animação e Novas Mídias de Cataguases, representa uma das principais ações da Fábrica do Futuro na cidade (www.fabricadofuturo.org.br). O novo espaço constitui um território de interface de diversos estudantes, profissionais, empresas e instituições culturais em torno dos campos do audiovisual, da animação e das mídias digitais. A despeito das especificidades das duas instituições, o nome Fábrica do Futuro é tomado como pressuposto conceitual para o projeto arquitetônico do ANIMAPARQUE.

há muito a aprender com a arquitetura antes que se tornasse uma arte feita por especialistas. Construtores no espaço e no tempo demonstraram um admirável talento em ajustar seus edifícios ao contexto natural. Ao invés de tentar dominar a natureza, como fazemos, eles tinham como bemvindas as adversidades climáticas e os desafios da topografia.

O conceito proposto para a criação do ANIMAPARQUE baseia-se em um modelo de intervenção ao mesmo tempo arquitetônico e paisagístico, no sentido em que não parte da pura formulação de arranjos volumétricos que se imponham ao sítio, tão comuns ao campo da arquitetura. Ao contrário, é do sítio que se originam, como desdobramentos das próprias curvas de nível da topografia encontrada, os planos horizontais que definem a arquitetura do Polo, para abrigar os espaços destinados a escola, incubadora, produção, convívio e hospedagem.

Anfiteatros de Muyu-uray, Peru. Fonte: Catálogo da exposição Architecture Without Architects, MOMA, NY, 1965

O filósofo tcheco Vilém Flusser, que viveu no Brasil entre 1940 e 1972, avalia possibilidades para esse ambiente em seu ensaio “A Fábrica”: A fábrica do futuro deverá ser aquele lugar em que o homem aprenderá, juntamente com os aparelhos eletrônicos, o quê, para quê e como colocar as coisas em uso. E os futuros arquitetos fabris terão de projetar escolas ou, em termos clássicos, academias, templos de sabedoria. Como deverá ser o aspecto desses templos, se estarão materialmente assentados no chão, se flutuarão como objetos semimateriais, se serão quase totalmente imateriais, é uma questão secundária.

86 – Mesa Redonda: a arquitetura do espaço e suas linguagens - Fernando Maculan

Foto montagem: Tiago Viegas

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 87

Propõe-se uma abordagem cuidadosa para a ocupação de encostas, alterando minimamente a topografia e proporcionando uma total continuidade do espaço construído com o solo, reforçando o caráter de parque, lugar de domínio público por excelência, a ser descoberto, experimentado e vivido.

fichas técnicas dos projetos

aeurásia idealização e realização:

Alessandra Soares, André Amparo, Cláudio Santos, Fernando Maculan captação e edição de vídeos:

Alessandra Soares, André Amparo, Cláudio Santos, Fernando Maculan e Pedro Veneroso arquitetura, iluminação e design:

A&M, Hardy e Voltz programação:

Projeto Marginália _ André Mintz e Pedro Veneroso produção:

Aline Xavier e Silvia Oliveira 3D: Tiago Viegas

projeto selecionado no edital filme em minas em

2007

104 _ belo horizonte , 2008

Se a vídeo-instalação Aeurásia inspira alguém a olhar com outros olhos a Vila Paris, o Jardim Canadá, o Jardim Zoológico; a querer conhecer melhor esses lugares e a visitar, com curiosidade de turista, outros recantos de Belo Horizonte;

centro de arte alameda

_ cidade do méxico, 2009

projeto geografias imaginárias

_ diamantina, cataguases, tiradentes, guaxupé, 2010

designing across boundaries realização:

Se o tapete em forma de mandala convida a se sentarem juntos uma indiana, um afegão, um inglês, uma japonesa, um brasileiro, um árabe;

Bas Raijmakers, Clara Gaggero, Fernando Maculan, Geke Van Dijk, Paula Dib, Renata Mendes, Yanki Lee participação:

Se as arquibancadas criadas para o FIT revelam histórias extraordinárias, antes imperceptíveis, dos moradores comuns da cidade; e se as arquiteturas em volta da Praça Sete, antes um pouco despercebidas, passam a mostrar sua graça;

Alunos do Curso de Design da FAAP e do Royal College of Art e Alunos da Villiers High School apoios:

Embaixada do Brasil em Londres, Royal College of Art, Helen Hamlyn Centre, Fundação Armando Álvares Penteado, British Council Brasil.

Se na grama sobre a laje do café pessoas se deitam e tomam sol no intervalo do trabalho e se dão conta da qualidade do azul do céu de Belo Horizonte;

2007/2008 fit2010_intervenções urbanas idealização:

Se visitantes do 104 se sentem motivados a passar de público para atores de uma ação cultural;

Paulo Pederneiras projeto:

Paulo Pederneiras e Fernando Maculan

Se a rede de percursos horizontais e verticais do Animaparque e seus cruzamentos contribuem para que se estabeleça uma correspondente rede de relacionamentos;

desenvolvimento:

Fernando Maculan, Mariza Machado Coelho, Alexandre Nagazawa, Guilherme Peluci montagem:

São acontecimentos, por vezes imprevistos, que recompensam os arquitetos, artistas e designers autores desses projetos que, de diferentes maneiras, investem para que suas obras ganhem significado para além de seus limites físicos e que, assim como nosso quintal, se tornem espaços em expansão, espaços da imaginação.

Objeto Design fotos:

Gabriel Castro realização:

Fundação Municipal de Cultura 10º festival internacional de teatro, palco e rua de belo horizonte. agosto 2010

88 – Mesa Redonda: a arquitetura do espaço e suas linguagens - Fernando Maculan

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 89

café do arquivo público e museu mineiro

pai sajes emer gentes

arte y arquitectura

104

Convidado:

Elaboramos procesos que puedan ser atravesados por el arte pero finalmente pocos productos arquitectónicos alcanzan esa condición. Este reto lo trazamos para divertirnos con el trabajo, para tomar un camino lateral al de la producción gráfica y técnica de la arquitectura. Por esto nuestros dibujos muchas veces resultan inútiles para la construcción, pero tenemos claro que su papel es servir como modelos intuitivos de realidades deseadas. Creemos que esa diversión desprevenida, e incluso arbitraria, se transfiere a las personas, al entablar una relación con el proyecto construido. El arte también es una manera eficaz de construir un puente entre la arquitectura y otras disciplinas. Evidenciar o explotar un fenómeno natural cuando no te lo piden es siempre un acto lateral y expresivo y por lo tanto cercano al arte.

projeto:

Mariza Machado Coelho e Fernando Maculan

luis callejas edgar mazo

clima y atmósfera

levantamento, diagnóstico e diretrizes de restauro:

Paisajes Emergentes

Lizandro Melo Franco

Medellín – Colômbia

projeto:

Fernando Maculan e Mariza Machado Coelho desenvolvimento:

Fernanda Amaral de Souza, Lawrence Solla, Janaína Nogueira imagens:

Superfície.org fotos:

Gabriel Castro conclusão:

2010

Los fenómenos naturales son la materia prima para dar origen al paisaje, a un paisaje proyectado; de esta manera, la arquitectura no se separa del fenómeno, no lo contiene o lo evita: simplemente se deja atravesar. Cuando no se presenta un fenómeno natural expresivo en un lugar, o simplemente no nos interesa, validamos la posibilidad de descontextualizar un fenómeno ajeno a ese lugar e insertarlo artificialmente.

coordenaçâo:

Inês Rabelo colaboração:

Jaqueline Duarte, Carolina Miranda, Ellen Fernandes, Samuel Ângelo, Junior Abreu proprietário:

IAMG. Grupo BMG. João Annes Guimarães Junho 2008 animaparque idealização:

Fábrica do Futuro projeto:

Fernando Maculan e Mariza Machado Coelho colaboração:

Marija Krsmanovic, Alexandre Nagazawa imagens:

Thiago Viegas, Pulso Arquitetura Fotos extraídas do catálogo da exposição Architecture Without Architects; MoMA, NY, 1965 Julho 2009

Proyecto: Venecia. Fenómeno: ciclos de las mareas.

90 – Mesa Redonda: a arquitetura do espaço e suas linguagens - Fernando Maculan

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 91

pedro men des

ecosistemas tras el programa

Otro tipo de arquitectura del paisaje que nos interesa especialmente es aquélla que tiene como fin disolver el programa tras un nuevo ecosistema, es decir, la que hace de la arquitectura una infraestructura que posibilita dar soporte a ecosistemas que de otro modo no tendrían como existir en ese territorio y que se vuelven especialmente pertinentes en un medio urbano.

Convidado: pedro mendes Diretor Artístico do JA.CA.

É um prazer estar aqui com vocês debatendo o presente e o futuro de espaços culturais. Falarei brevemente sobre o projeto que nós construímos, o JA.CA, Centro de Arte e Tecnologia. O nome é um trocadilho com “Jardim Canadá” e também com a fruta “jaca”. Eu queria começar com algumas ideias sobre residências. Eu fiz uma pequena pesquisa sobre o que escritores, poetas e artistas entendiam por residência, em lato sensu. Eis o que descobri: Pablo Neruda, em “Residencia en La Tierra”, vê a residência como um locus-lar, a terra de todos nós, a Mãe-Terra. Para ele, como o próprio nome do livro indica, residir é estar em transição.

Belo Horizonte – MG.

JA.CA

Proyecto: Parque del Lago, complejo acuático. Ecosistema insertado: humedal natural.

paisajes emergentes

La arquitectura reacciona ante los lugares. No nos interesan las relaciones poéticas, pictóricas o nostálgicas con el lugar; en cambio, buscamos las cualidades emergentes del mismo, hacer visible a una audiencia mayor aquello que está de cierto modo oculto en el paisaje. Los proyectos pretenden volverse sistemas para manifestar lo no evidente. Estas manifestaciones pueden ser violentas, salvajes, lentas o simplemente no ocurrir en lo absoluto. Admitimos que la arquitectura es limitada para predecir el comportamiento de la naturaleza en el tiempo; admitimos ese riesgo y permitimos que sea parte del proyecto. modelos

La mayoría de los fenómenos que alteran el devenir de un proyecto de paisaje suceden a escalas ininteligibles y ajenas a los modelos tradicionales de la arquitectura. Aquí vale apoyarse en modelos de otras disciplinas, para intentar dar fundamento a los principios e intentar, sólo intentar, predecir el comportamiento del los fenómenos.

Para Schopenhauer, residir é estar em confronto com a essência do mundo. A residência, o mundo, é representação de uma vontade além de nós mesmos (das wille). Uma das formas de manifestar essa vontade genuinamente é através da arte, da música, da arquitetura. Para Walter Benjamin, residir é viver junto, é deixar de sermos nós mesmos para sermos um pouquinho o outro. Já para Le Corbusier, residir, dentro de sua ideia de funcionalismo, é co-residir, é habitar dentro de algo construído pelo homem. Para Nietzsche, a residência pode ser um quarto pequeno onde se possa pensar e escrever... ser nômade ao mesmo tempo e se desprender dos valores de uma terra, de uma nação. Para o americano pragmatista William James, residir é estar em produção conjunta para modificar o mundo a partir do plano imanente. Para Platão, a residência perfeita é a república: é a organização do poder dentro do coletivo. Para Vitor Grippo, artista argentino, não sei qual é o seu ideal de residir, mas convido a todos para ver sua obra no Inhotim e chegar às suas próprias conclusões... Para Marcel Duchamp, acho que o ideal de residência seria a biblioteca, onde se possa jogar xadrez, mas não sei ao certo... Mas, para nós, o que interessa agora é a residência artística como instituição. Talvez a mais antiga que a gente conheça comece em 1889, na Alemanha. Um dos primeiros que conceberam a ideia foi Rainer Maria Rilke, poeta austríaco. A ideia naquele momento era criar uma colônia de artistas que pudessem trocar impressões, ideias e poemas... Esse sistema recriava, de certa forma, a figura grega do rapsodista, aquele que contava a poesia em voz alta para os outros. Esse grupo então se juntava em pequenos vilarejos no interior da Europa. Um deles ficou conhecido como “The Corporation of Yaddo”. Em um segundo momento, a residência de artista e seus programas começam a se oficializar por volta de 1960. Surgem um pouco em função dos grandes motes dessa década, dentre eles o questionamento da sociedade burguesa e o sentido de produzir arte dentro dos grandes centros urbanos. O Land Art Movement ganha força e os artistas que escolhem criar colônias em geral buscam certa reclusão e a vastidão do campo.

92 – Mesa Redonda: a arquitetura do espaço e suas linguagens - Paisajes Emergentes

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Em um terceiro momento, surge uma espécie de internacionalização da residência artística (“artist in residence” se difunde como denominação internacional). Essa instituição surge talvez como um sintoma de uma aldeia cada vez mais global onde os artistas buscam transcender os centros impositivos dos sistemas de arte. O sistema da arte perde cada vez mais suas fronteiras. Com a multiplicação das bienais e das feiras de arte, a arte viaja pelo mundo com enorme velocidade. O público também se expande. Bom, voltemos ao JA.CA. Essa instituição tem um ano de idade. Seu desenho permite que os artistas locais passem oito meses trabalhando em conjunto e, concomitantemente, recebe nove artistas internacionais divididos em três turnos. Esses residem, pensam e produzem na comunidade do Jardim Canadá. O primeiro resultado foi bastante interessante.

Liberdade” e consistia em uma instalação sonora realizada no Coreto da Praça da Liberdade. “Manutenção da Liberdade” fala sobre esse monumento construído no início do século passado. A artista dá voz ao coreto, difundindo uma gravação do interior do mesmo. As pessoas se sentavam por ali para escutar a história e começavam a refletir um pouco sobre a passagem do tempo nesse lugar. Refletiam sobre esse monumento como metáfora de liberdade, mas a artista atenta para sua existência como dinâmica de poder: a esfera de controle, afinal de contas, a praça sempre foi sede do governo de onde emergiam as leis, etc. O palácio do governador olhava de frente para o coreto.

Uma dupla de artistas locais – Roberto Andrés e Fernanda Regaldo – propôs a construção de um jardim utópico. O projeto partia da premissa de que o Jardim Canadá é, de certa forma, uma zona de alienação na qual existe uma estranheza entre os condomínios de luxo do entorno e os bairros simples que ali coabitam. Roberto Andrés e Fernanda Regaldo propuseram a construção de um jardim. A dupla começou por gramar um pedaço de terra, onde existe o galpão, onde o chão é de terra e não há pavimentação. O galpão fica entre a zona pobre e a zona industrial do bairro. A partir daí buscaram chamar a atenção da prefeitura e dos próprios transeuntes para aquela intervenção, conseguindo criar um diálogo sobre o urbanismo do lugar. Realizaram, então, uma feira de artesanato em que colocavam um cartaz convidando os locais, os habitantes do bairro, para trazer seus produtos para vender. A surpresa foi boa e inusitada: os residentes do Jardim Canadá aparecem no tal domingo vendendo desde Havaianas a sacos cerzidos e caixas de morangos orgânicos. Emerge, então, uma reflexão sobre o vácuo entre prefeitura, os centros pensantes, a arte e a população local. Outro artista, chamado Zak Fabri, húngaro-jamaicano crescido no Harlem em NY, tinha como projeto performances que criavam estranhezas sutis em que o espectador se deslocava do seu lugar comum e, então, sua gravidade confortável ruía. Zak é um homem alto, negro, bastante bonito, e se veste de branco sempre. Ele andava pelo Jardim Canadá se sujando de terra vermelha. As pessoas começaram a refletir sobre a presença desse transeunte bastante atípico vestido de branco que vai se sujando com a terra desse lugar (que é uma espécie de “Bagdá Café”) onde a arte é bastante distante da realidade das pessoas que moram ali. Um terceiro projeto que também aconteceu nesse período é da islandesa Berglind Jona. Essa artista islandesa chegou ao Jardim Canadá com seus quase um metro e oitenta de altura, branquíssima feito neve. Ela impressiona a todos com sua eloquência e seu traquejo, falando um português mais ou menos bom. Seu projeto se chamava “Manutenção da

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lu cas bam bozzi

07

Convidado: lucas bambozzi

A frase de Brecht é provocativa. Aqui também, intencionalmente, desafia as novas tecnologias em relação a práticas criativas atuais. Voltemos a essa frase mais tarde, no decorrer deste texto. Convidado para falar no encontro Espaços Culturais - 2º Seminário Internacional de Gestão Cultural, não poderia deixar de falar sobre questões que atualmente me inquietam e que se relacionam com o festival Vivo arte.mov do qual sou um dos criadores e coordenadores. O festival e suas atividades refletem pesquisas que fazemos há cerca de cinco anos em torno das perspectivas das chamadas “artes locativas”. Nesse período passamos a enxergar nessas tecnologias uma possibilidade de criação artística séria, com reflexos marcantes nas tramas urbanas e com extensão para aspectos sociais relevantes.

Artista e curador do Vivo arte.mov São Paulo – SP

/10 Entrevista

O lugar genérico e as especificidades da negociação. (as artes locativas em uma visão de dentro da turbulência) “Épocas novas não as fizeram os automóveis,

Ambientes expositivos e processo de curadoria: a relação do sujeito com a obra. Quais são as questões contemporâneas mais relevantes? Como se educa esteticamente no mundo de hoje? Se educa? O uso das tecnologias e a relação com as mídias.

nem os tanques, nem os aviões sobre os telhados, nem os bombardeiros. As novas antenas continuam a difundir as velhas asneiras. A sabedoria continuou a passar de

Israel do Vale

boca em boca.”

Jornalista, produtor e empreendedor cultural – Florianópolis (SC)

Desde 2007 passamos a vislumbrar formas de apoio a projetos inéditos realizados por artistas brasileiros, e viabilizamos de forma tímida um projeto de ‘realidade aumentada’, concebido por Bruno Vianna (“Invisíveis”, realizado para espaços específicos do Parque Municipal de Belo Horizonte). A partir de então criamos o edital de mídias locativas, um mecanismo para um apoio aberto a participantes de todo o Brasil, de forma mais consistente e regular, na expectativa de que a cada ano pudéssemos viabilizar ao menos um projeto nessa linha que utilizasse o potencial de uma tecnologia atual, porém ainda desconhecida nos circuitos da arte, para explicitar possibilidades e tensões entre os dispositivos portáteis e os espaços públicos de circulação e compartilhamento na cidade. Comparando esses meios a outro conjunto de tecnologias que engendraram euforias anteriores, como a que acompanhou a realidade virtual ou a net. art, as mídias locativas acumulam a simpatia de ter escapado dos limites da tela do computador desktop e permitir o vagar na trama da cidade.

Bertold Brecht, 1927

Artes, expressões artísticas e linguagens

Há, claro, problematizações em processo: se as mídias locativas clamam o mundo para além das galerias ou das telas de computador como territórios, como preconiza Marc Tuters, em “Beyond Locative Media” (2004), onde estão esses trabalhos hoje? Por que não vemos nessas perspectivas o surgimento de uma produção realmente consistente e mais presente em nossas expectativas de confluência entre o virtual e o real? Se esse tipo de proposta guarda relações intrínsecas com práticas potentes no campo da arte, como o conceito de site-specific e da arte relacional, que envolvem os espaços físicos e suas tensões, por que a apatia do circuito da arte vem a projetos dessa natureza? Dentre as práticas correntes, subvencionadas na maioria das vezes, espontâneas em sua minoria, que consistência podemos esperar para essa ‘arte locativa’? Não há necessidade de arriscar conclusões precipitadas. Não são poucos os projetos que foram apresentados no arte.mov, e juntos formam um panorama bastante consistente das possibilidades nesses meios: além de “Invisíveis” (2007), de Bruno Vianna, tivemos “Tactical Sound Garden” (2006-2007), de Mark Shepard, apresentado efetivamente, e com upgrades, no Parque Municipal de Belo Horizonte; “AIR” (2007), do grupo Pre-

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 97

Mas, de um ponto de vista mais teórico, vamos percebendo como os postulados mais eufóricos caem por terra, e que as tecnologias e os conceitos a ela associados começam a apresentar efeitos colaterais. Dentre as possíveis distopias (tema amplificado no simpósio do arte.mov 2007) estão as expectativas de participação social e as crenças de que os avanços tecnológicos estariam promovendo mobilidades nunca antes vistas, dada a crescente popularização desses dispositivos.

emptive Media, atualizado e adaptado especialmente para o festival, a rede “Zexe.net” (2005-2009), de Antoni Abad, todos apresentados na forma de instalação e documentação, a partir do canal Motoboys, desenvolvido em São Paulo; “Burro Sem Rabo” (2006-2007), do Hapax, que foi implementado com novas técnicas de visualização de deslocamentos aplicados a uma performance; “Locative Painting” (2007), de Martha Gabriel Cruz; “Filosofia da Caixa Prata” (2008), de Giselle Beiguelman, projeto não estritamente locativo, mas agenciador de ações a partir de dispositivos móveis; “The Head” (2004), de Laura Bellof, e, finalmente, o pioneiro “Can You See Me Know?” (2001-2008), do grupo britânico Blast Theory, um trabalho seminal que já alcançou o título de clássico, em uma mídia que mal completa oito anos de possibilidades integradas entre recursos de localização, visualização e transmissão de dados em alta velocidade.

equalizando euforias

Por exemplo, quando se fala em mobilidade, muitas vezes surgem pensamentos sugestivos acerca das possibilidades de deslocamento e das facilidades de dar conta do espaço físico, em escala global. Paul Virilio, em seus pensamentos menos céticos com relação à tecnologia (1997)²² nos dizia que a infografia nos ajudaria a percorrer espaços, que os intervalos constituintes da história e geografia de nossas sociedades seriam preenchidos pelas interfaces que operam em tempo real. Os problemas de distância espacial foram suplantados por problemas temporais, de tempo vencido ou faltante. Assim, quando pensamos em deslocamentos, não apenas físicos, mas experimentados em condições subjetivas, somos incitados a imaginar uma condição ‘nômade’, criativa, excitante pelo desconhecimento das especificidades dos espaços transitoriamente habitados.

Além disso, tivemos showcases com trabalhos do grupo Proboscis, do Reino Unido, o projeto “Murmur”, do Canadá, representado por Gabe Sawhney na forma de workshop, “Loca” (2006), do grupo de Drew Hemment, apresentado no arte.mov como documentário; e a apresentação dos projetos brasileiros “Descontínua Paisagem” (2008), da dupla Velazquez/Carboneras, e do projeto “Culture Robot 4.0” (2009), de Ricardo Palmieri e Kruno Jost. Esse conjunto forma certamente um painel significativo do que de melhor se produziu no mundo nessas mídias, em que pesem desdobramentos sociais, mapeamento de dados, compreensão de ‘interfaceamento’ e mediação tecnológica, desdobrando-se em experiências lúdicas ou de deriva, mesmo que de forma transitória ou fugaz e tornando mais possível entender as urgências de participação na chamada vida pública.

Gostaríamos de acreditar nos prazeres desse estado em deslocamento, em constante porvir (uma atualização do ‘vir-a-ser’ em função do espaço). Para Jordan Crandall (2005), essa seria uma condição de readiness, um alerta contínuo, que desprezaria toda inexatidão ou ineficiência do mundo em sistemas de busca ou nas redes otimizadas para o capitalismo 2.0. Tal estado de alerta é incompatível com sistemas precários, com a iniquidade social, com as gambiarras do terceiro mundo.

Mas talvez esperássemos por maior número de projetos sendo disparados em redes 3G pelo mundo, para que a potencialização entre arte e vida pudesse ser melhor amparada pela tecnologia em idealizações menos utópicas. Gostaríamos, talvez, de ver as grandes bienais ou feiras de arte absorvendo essa produção e produzindo as novas estrelas de uma arte do posicionamento e da localização. Em algum ponto, no âmago de nossas expectativas ou na própria tecnologia, há uma sensação sutil de que talvez possamos nos decepcionar. Ou, talvez, não estejamos equalizando bem nossas euforias.

Os espaços a serem percorridos pela infografia envolvem junções heterogêneas, como uma configuração de periferia e centro juntos, a favela em rede, o local em conflito com o global. Nesse contexto, que tipo de nomadismo, por exemplo, pode ser caracterizado por uma tecnologia que não permite uma comunicação telefônica minimamente cômoda entre países vizinhos na América do Sul? Que tipo de nomadismo pode ser concebido para um contexto de cerceamento de liberdades civis por tecnologias que se apuram em controle, posicionamento e biometria?

Do ponto de vista operacional, os problemas são mais fáceis de detectar: Projetos ditos locativos demandam uma logística que associa interesses nem sempre confluentes. Eles dependem de subsídios, de uma estrutura lateral, paralela, que implica “negociações”, investimentos de programação e de manutenção, envolvendo produtores, agenciadores, fabricantes, operadoras de comunicação, corporações. Tais iniciativas não acontecem sem um pretexto, às vezes efêmero, eventual, por assim dizer – e investirmos num festival se justifica em grande parte por alargarmos essas vias necessárias.

98 – Entrevista: artes, expressões artísticas e linguagens - Lucas Bambozzi

²² Open Sky, 1997, Verso, pp. 10, 19, 30.

As fronteiras físicas nessa nova equação espaço-temporal não se esvaneceram, pelo contrário, parecem estar cada vez mais rígidas. Há 20 anos caiu o muro de Berlim, mas hoje se complica o controle alfandegário, entre Brasil e Espanha, entre França e seus territórios ultramarinos, entre os Estados Unidos e o resto do mundo, e, em especial, nos grandes hubs aéreos internacionais como Heathrow, J. F. Kennedy, Miami, Charles de

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Gaulle, Frankfurt e Narita - mesmo entre países do ConeSul, parece haver mais desconfiança do que facilitação de fluxo. Pergunta-se: o ir e vir, o trânsito entre fronteiras, o deslocamento entre culturas têm sido de fato facilitados, ou vêm se tornando mais complexos, mais desconfiados, sujeitos a medições biométricas, dadas as ferramentas de escrutinização que utilizamos, talvez, conscientes como cookies, pequenos Cavalos de Tróia, sabendo da inutilidade de colocarmos na balança os prós e contras, cientes talvez de que em algum momento podem se voltar contra nossas escolhas (nem tanto vigilância, mas de fato rastreamento, como enfatizado por autores nem tão apocalípticos como Thomas Levin, David Lyon, Felix Stalder ou Brian Holmes)?

A portabilidade e as qualidades dos fluxos que caracterizariam um novo nomadismo implicariam muitas vezes um desprezo às particularidades do contexto. Creio que essas exacerbações são em parte consequências do crescimento do chamado “espaço informacional’, não como planejamento da arquitetura, mas na própria condição de arquitetura, como efeito de determinadas estruturas urbanas constituídas a partir da informação e comunicação. De um modo ou de outro, o “lugar” se mostra novamente em pauta. Diante da vastidão de possibilidades entre uma obra de Richard Serra, uma projeção de Jenny Holzer e um projeto de realidade aumentada para um espaço específico da cidade, surgem também pontos em comum. As possibilidades ‘entre’ uma noção e outra de ocupação do espaço não evitam a pergunta: como foram “negociados” esses trabalhos?

Problematizações como essas podem ser, para muitos, um tanto redutivas, de fácil impacto, especialmente em países onde o digital é mais solução do que questão. A multidão hiperconectada em um país como o Brasil (160 milhões de aparelhos celulares em uso) envolve inevitavelmente a participação, em rede, dos “homens lentos” delineados por Milton Santos²³. São forças que ensaiam inadvertidamente formas de resistência centradas na deserção ou na evacuação dos lugares de poder, algo que se mostra também como elemento de desmantelamento, de reversão e esvaziamento do poder formalmente constituído. Essas seriam “as forças subjetivas implicadas, as vontades e os desejos que recusam a ordem hegemônica, as linhas de fuga que forjam percursos alternativos”, como interpreta Peter Pál Pelbart (2004:88) a respeito das ‘forças do império’ de Hardt e Negri.

Que tipo de obras ainda surgirão nesses novos e movediços ‘lugares’ que tomam forma no mundo e que demandam cada vez mais a explicitação de acordos ou mecanismos de negociação? Dada a dificuldade de os trabalhos locativos apresentarem uma forma reconhecível para apreciação estética no campo da arte, nos resta apontar qualidades de outra ordem. Armin Medosch, em palestra de abertura do simpósio do arte.mov 2007, nos incitou a pensar o quanto ainda podemos estar repetindo euforias anteriores. Utopias com relação à transmissão sem-fio já houve algumas: na transmissão de energia elétrica sem fio por Nicola Tesla, nos manifestos futuristas em que Marinetti elegia as ondas de radio como benéficas, estimulantes para o cérebro. E, até o presente momento, o curso da história das mídias móveis parece ter caminhado em direção contrária à expectativa de Bertold Brecht, por exemplo, tendo em vista que as emissões de rádio e televisão se consolidaram não de muitos para muitos, mas de poucos para muitos.

Poderíamos, então, entender que lugares não são mesmo rígidos em sua constituição física e que estar sob a égide de um mundo que visa à eficiência não implica apenas conivência ou cooptação. Isso significa acreditar em potencias micropolíticas, em subjetividades advindas da percepção do espaço físico não apenas em suas peculiaridades ou especificidades. É por essas frestas que se pode imaginar que viver em estado de nomadismo pode ser uma acentuação do potencial de fluxo entre dois contextos. O nomadismo poderia, assim, ser um espaço de invenção, “pode ser uma condição disparadora de processos criativos e investigativos”, como descreve Fabiane Borges²⁴.

É fato, porém, que o caráter potencialmente distributivo e aberto de sistemas de comunicação em rede sem fio ainda está sob configuração e haveria, portanto, um mundo de possibilidades ainda por serem exploradas.

lugares móveis

É no mínimo curioso observar que, a partir de experiências percebidas pela portabilidade, pela miniaturização de câmeras e processadores da computação ubíqua, passamos a imaginar com maior insistência, o lugar “lá fora”, o espaço exterior. Com certeza aí estão os aspectos mais salientes desse novo nomadismo, de um lugar que se habita transitoriamente, e por isso se generaliza, se torna qualquer.

Afinal, o que será feito com os 160 milhões de aparelhos celulares em uso no Brasil? Essa base se reverterá em alguma plataforma, em algo para uso comum? ²³ A natureza do espaço, 1996, pgs 50, 75, 204.

²⁴ Domínios do Demasiado III, Reverências e

Haveria então um quase-paradoxo: a especificidade do lugar demanda reconhecimento, envolvimento, atenção concentrada para um contexto.

100 – Entrevista: artes, expressões artísticas e linguagens - Lucas Bambozzi

Andrajos, 2008, pgs 1, 6.

Na realização do arte.mov, nos acompanha nesse percurso não apenas o desafio de enfrentarmos um sistema de forças e fraquezas ainda em turbulência, mas também uma noção de responsabilidade: para que a realidade social não seja mediada de forma a se tornar inócua, lisa, sem os relevos e as intensidades da vida.

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 101

Nesse sentido, dentre os projetos socialmente relevantes que apresentamos, tanto “AIR”, do Preemptive Media, quanto “Can You See Me Know?”, do Blast Theory, como “Snout”, do Proboscis (previsto para 2010), não foram ‘trazidos’, mas adaptados ao contexto brasileiro no sentido de produzir uma conscientização com relação ao contexto e ao meio ambiente, numa visão ampla e distante da superficialidade ou de oportunismos que permeiam alguns projetos nessa linha.

O que aconteceu ao longo da exposição foi que a obra, que não envolve nenhum tipo de imagem técnica ou artística, ganhou uma ambivalência que pôde ser interpretada como uma qualidade crítica que explicita os diferentes tipos de negociação implícitos no projeto. Ao fazer ver os poderes e as forças envolvidos nos caminhos percorridos pela informação típica dos tempos da mobilidade e pautados pela necessidade crescente de comunicação em grandes cidades, adquiriu os contornos de um canal que conecta o público e o privado de forma direta e seca. Não apenas assumindo a condição de troca que lhe é dada, mas também participando dos conflitos, gerados por uma espécie de ‘mais-valia comunicacional’, o público negocia sua privacidade, ou, na maioria dos casos, abre mão dela por falta de opções.

Já nos projetos de Antoni Abad (arte.mov 2007) fica nítido o agenciamento das tecnologias móveis como forma de gerar empoderamento para comunidades, periféricas ou excluídas (como taxistas na Cidade do México, Ciganos em Leon e Lleida, prostitutas em Madrid, pessoas com problemas de acesso físico em Barcelona ou Motoboys em São Paulo). Tais projetos, tidos como dos mais contundentes já realizados em termos de inserção social, são na realidade formas de capacitação de indivíduos com relação ao uso de ferramentas de publicação on-line. Para realizá-los, o artista se envolve com as comunidades por vários meses, como forma de garantir não apenas uma confiança recíproca, como também para estimular a continuidade do projeto em longo prazo, ou seja, na maioria dos casos, mais uma vez, o artista aparece como mediador, como negociador, como agente entre contextos.

“Ouvidoria” explicita um reposicionamento de uma tecnologia simples e renegocia o social, que ressoa na sala vazia e vaza para além do espaço expositivo. E acaba sendo transferido para o público o dilema da negociação, aspecto guardado ao artista, até então tornado invisível para o público. Temos, assim, a negociação, a mediação, o agenciamento e a troca de valores entre o artístico, o comercial e o entretenimento. Ao assumir de forma mais explícita esses processos, talvez as artes da comunicação alcancem outros patamares. Dada a dificuldade de os trabalhos em rede, das mídias locativas, por exemplo, apresentarem uma forma reconhecível para apreciação visual ou de outros sentidos no campo da arte, talvez a ética funcione como definidor também de um conjunto estético, em um tipo de obra que nem sempre produz imagens, mas nos faz ver o que circula entre elas.

Mas cabe ressaltar aqui uma obra externa ao conjunto de ações promovidas pelo arte.mov. Para comentar algumas formas de agenciamento típicas das tecnologias de comunicação, destacaria o projeto “Ouvidoria”, dos pernambucanos Lourival Cuquinha e Thelmo Cristóvão, apresentado na exposição “O Lugar Dissonante” (2009), na Torre Malakof, em Recife. O projeto visava a ofertar ligações telefônicas gratuitas ao público em geral, em telefones públicos (orelhões) localizados no entorno do espaço expositivo, em troca do direito ao uso do conteúdo telefônico particular. Uma forma de gift economy²⁵ aplicada à telefonia: os usuários seriam notificados de antemão sobre os benefícios e eventuais prejuízos à privacidade desencadeados pela ação. Conforme enfatiza a crítica de arte Clarissa Diniz²⁶, “mais do que promover a “interação” do público, ‘Ouvidoria’ transforma o público em cúmplice da obra”. Não seria uma co-autoria, evitando um jargão típico do boom da interatividade, mas sim uma forma de co-responsabilidade.

²⁵ Conceito detalhado por Richard Barbrook em seu ensaio The Hi-Tech Gift Economy (1998)

Não há aqui, contudo, uma versão ingênua da ideia de cumplicidade: aqueles que telefonam, apesar de se co-responsabilizarem pelo caráter

²⁶ A curadoria de O Lugar Dissonante é assinada

aparentemente transgressor do trabalho diante dos tradicionais limites

por Clarissa Diniz e Lucas Bambozzi, sendo que

entre o público e o privado, não são os que o pautam em inteireza. Ainda

partes do texto relativo à obra Ouvidoria foram

que o público, por meio de suas ligações, sugira timbres, tempos e assuntos

redigidos especificamente por Clarissa, como é o

para “Ouvidoria”, são os artistas que, por meio de seu software e, portanto,

caso do trecho retirado do catálogo da exposição.

sob a “proteção” da “aleatoriedade”, rearticulam essas informações de modo a pôr em negociação sua autonomia no seio da também autonomia

²⁷ Texto crítico publicado no catálogo da exposição

do trabalho²⁷.

(Fundarpe, PE, 2008)

102 – Entrevista: artes, expressões artísticas e linguagens - Lucas Bambozzi

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 103

bibliografia

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mar cello dan tas Convidado: marcello dantas Magnetoscópio

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Esse pensamento deriva da constatação do esgotamento de um modelo de instituição que visa a pensar a história como evidência material de uma sociedade e que pensa em educação no formato de aglomerar essas evidências em nichos intocáveis, recheados de conteúdos cifrados e feudos de saber. Minha dedicação a repensar esse modelo surgiu da vontade de criar experiências mais interessantes para vivenciar história, arte e ciência. Ateve-me o desejo de poder contribuir para esse território com a possibilidade de inventar novas linguagens e novas gramáticas. Isso me seduz muito.

São Paulo – SP

of Surveillance from Bentham to Big Brother ZKM Centre for Art and Media Karlsruhe: ZKM/MIT Press

A minha proposta com essa conferência é a de explorar a nossa imaginação a pensar um novo modelo de instituição cultural e educativa para uma sociedade em mutação.

Novas catedrais

Não é de surpreender que existam esgotamentos em muitas frentes neste momento histórico. Mídias muito mais recentes, como Televisão e Jornal, estão sofrendo nitidamente com a obsolescência de suas linguagens. Não seria diferente com os Museus. A obsolescência da linguagem não decreta o fim de uma mídia, ela apenas a exclui do território fronteiriço de invenção, no qual podemos contribuir para um novo tipo de contato com sensibilidades e informação (o Louvre deve sempre existir, assim como o rádio e o mural). Museu é templo de Musas, museu não é armário de esqueletos. Lugar de inspiração, lugar de reflexão e ponto de aprendizado. Sobre de onde viemos e para onde apontamos.

acessado em 21/09/2008 Tuters, Marc e Varnelis, Kazys (2006) Beyond Locative Media. Networked Publics.

Ambas as direções, não apenas uma: Museus são as Catedrais do nosso tempo. A pergunta é: que grau de protagonismo queremos para nossos templos de cultura, queremos ser faróis para uma nova sociedade ou apenas lanternas de um passado nostálgico?

acessado em 23/06/2009

É consenso que todos querem museus e espaços culturais cheios, democráticos, inclusivos e acessíveis. Mas não existe ainda um consenso de como fazer isso. O desafio, na realidade, não está na intenção, o desafio está na Linguagem. Eu fiz uma opção preferencial pelos jovens. Não vejo outra coisa que possa fazer mais sentido do que se comunicar com os jovens. Para isso preciso falar a linguagem deles. Se seguíssemos o modelo do século XIX de museus, talvez nunca mais fosse possível construir um novo museu no mundo. Aquele modelo era possível pela oportunidade de reunir grandes coleções de objetos que nunca antes haviam se reunido de forma pública e universal. Mas nem só de objetos vivem a história, a arte e a ciência. Vivemos em uma era de histórias, narrativas e processos. O desafio é resgatar um sentimento e encontrar formas de fazer o público se aproximar das razões e das condições em que um evento, obra ou

104 – Entrevista: artes, expressões artísticas e linguagens - Lucas Bambozzi

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 105

fenômeno aconteceram. Essa aproximação é o que chamo de imersão total. Um elemento de linguagem que reúne sensorialidade, narrativa, interatividade, percepção e a dinâmica de um sistema aberto, vivo e mutante. Precisamos propor novas formas de envolver, de narrar, de criar afetividade, de incluir e de incitar ao pensamento. Muitos reclamam da cultura jovem de hoje com baixo índice de atenção, baixa concentração e alta dispersão. Mas, na realidade, o jovem hoje tem velocidade, tem informação, tem múltiplas habilidades, acuidade visual, domina a linguagem audiovisual e não tem muita paciência para os prolixos. Precisamos levar em conta essas características e trabalhar como o potencial desse público ao desenvolver as possibilidades de linguagem. Precisamos ser generosos em traduzir os códigos cifrados de anos de curadorias herméticas para princípios claros, universais e inclusivos, em que podemos pegar as novas gerações pela mão e lhes permitir sentir que a história é algo deliciosamente palpável e não proibitivo e intocável. Por favor, toque a obra e seja tocado por ela. A interatividade não é apertar botões, mas sim um conceito inclusivo, no qual o espectador conclui e é parte protagonista de uma obra. Um conceito aberto e que deve ser gerido com generosidade e acessibilidade, que nos permita pensar a cultura imaterial como a evidencia maior do nosso tempo. Vivemos uma sociedade que se relaciona audiovisualmente e precisamos prover a cultura material de narrativa, signo e interpretação.

pectador é o foco principal dos ambientes sensíveis inventados. Neles, questões como percepção, escala, cognição, luz, interatividade e resposta sensorial são tão fundamentais quanto abordagens mais convencionais, quais a narrativa, a preservação e a exatidão histórica. É a combinação desses elementos que nos permite criar experiências essencialmente únicas, que os expectadores tendem a não esquecer. A ideia é enfrentar o espaço da exposição não como uma moldura, mas sim como uma obra de arte por si, com seu próprio discurso, estética, língua e design. A tecnologia é uma parte central do mundo de hoje e devem-se incluir as tecnologias mais avançadas disponíveis, muitas vezes desenvolvendo novas tecnologias para o design das exposições. O desafio é criar um design que reconheça a presença e a intenção do visitante, incluindo o uso de dispositivos interativos muito sofisticados e de interfaces invisíveis e ubíquas. O ponto fundamental das exposições não é a intenção dos curadores, mas como tocar no coração das pessoas, envolver suas emoções e criar um senso de surpresa engenhoso. Abordamos essas questões tentando sempre humanizar os conteúdos, por mais frios e ásperos que eles sejam em origem; enfrentamos o desafio de tentar aproximá-los, o quanto mais possível, das pessoas simples de todas as idades. Acreditamos que sempre existe uma maneira simples de contarmos as histórias mais complexas.

Nesse prisma precisamos criar oportunidades para usar a tecnologia como aliada em criar instituições que se multipliquem; em conteúdos que se renovam; em linguagens que se reinventem. É a importância da mistura, da multidisciplinaridade. Aprende-se algo através de outra coisa / Poesia e Artes Visuais, Ciência e História, História e Educação Física. A tecnologia não muda a essência das coisas. A vida ainda é a única matéria-prima da arte e a cultura é substrato da vida. Mas existem algumas zonas cinzentas na forma de pensar o tempo em novos suportes tecnológicos para a cultura. O tempo é o campo de maior importância de tradução de linguagens. O tempo literário da prosa é um tempo “introspecto”, com forte linearidade e sequência de constâncias, difícil de ser implementado de forma coletiva. O tempo da poesia, com sua métrica, seus fragmentos e seu ritmo, flui naturalmente para os novos suportes. O tempo da televisão é demasiado acelerado para uma apreciação presencial “imersiva”, precisa ser “ralentado”. O do cinema costuma ser melhor. A música é sempre grande aliada, assim como a fotografia. O grande trabalho hoje é investigar formas de estabelecer contato entre os universos criativos matrizes e as novas formas de construir pontes de percepção e, principalmente, como estruturar narrativas para meios mutantes e plateias tão diversas e dinâmicas. A Imersão Total - conceito no qual a vivência da percepção é plena sensorial e espacialmente. As exposições que desenvolvemos usam uma gramática que chamamos de Imersão Total. Nela, entende-se que o es-

106 – Entrevista: artes, expressões artísticas e linguagens - Marcelo Dantas

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 107

antô nio sar tini

08

Podemos rezar, meditar, nos elevar espiritualmente em qualquer parte, em qualquer local, mas, certamente, quando o fazemos em uma igreja, um templo, uma sinagoga, um terreiro, uma mesquita ou qualquer outro sítio “consagrado”, certamente nossa conexão com o “divino” será mais forte e nossas rezas e meditações serão mais proveitosas, pois tais ambientes (espaços) estão preparados para tanto. No meu entender, podemos traçar um paralelo com os Espaços Culturais nesse sentido. O aprendizado, a reflexão e a produção artística podem ocorrer em qualquer local, mas os Espaços Culturais propiciam vivência e convivência mais completas e produtivas.

Convidado: antônio carlos de moraes sartini Diretor do Museu da Língua Portuguesa São Paulo – SP

/10 Mesa Redonda Refletir sobre espaços culturais a partir dos desafios da contemporaneidade: linguagens, repertórios, características programáticas, gestão e organização institucional, tendo como parâmetro os temas refletidos durante este encontro. Destacam-se a concepção de sustentabilidade financeira, construção de parcerias, trabalhos de cooperação e, ainda, o que se refere à composição e formação de recursos humanos. Hannah Drumond Especialista em produção e crítica cultural – Belo Horizonte (MG)

o espaço como experiência: repertório e gestão

Reflexões sobre os espaços culturais – O espaço como experiência, repertório e gestão.

No ano 2000, a convite do então Secretário da Cultura do Estado de São Paulo Marcos Mendonça, elaborei o primeiro esboço do projeto “Fábricas de Cultura”, que atualmente se encontra em fase final de implantação e conta com recursos do BID e do próprio Governo do Estado de São Paulo. À época um grupo de consultores do referido banco desenvolveu um interessante projeto de acompanhamento e observação de vários projetos aplicados pela Secretaria de Estado, tais como as Oficinas Culturais, Projeto Guri e Projeto Arquimedes (todos eles de formação cultural para a população em geral). Um dos pontos levantados que mais me chamaram a atenção tratava exatamente do aproveitamento de cada uma dessas ações a partir de espaços diferenciados. Os consultores do BID observaram que, aplicados dentro de Espaços Culturais, os projetos sob análise e estudo eram mais bem aproveitados por seus participantes. Já quando os mesmo projetos se realizavam em espaços outros (sedes de ONGs, Clubes Comunitários e outros), o aproveitamento verificado era menor. Assim, pode-se perceber a importância dos Espaços Culturais nos processos de formação e difusão cultural e a responsabilidade que isto acarreta aos administradores e agentes culturais responsáveis por tais equipamentos. Em um mundo congestionado de informações e possibilidades de acessá-las, é normal que as mesmas se apresentem muitas vezes superficiais, truncadas e descoladas de seus próprios contextos. A enorme oferta, que em alguns casos propicia novos caminhos para o conhecimento, em muitos acaba por confundir, criar a falsa sensação de “saber” e pode, mesmo, atrofiar a curiosidade, criando um falso estado de satisfação. Desse modo, a responsabilidade de agentes culturais que se encontram responsáveis pela implantação e administração de Espaços Culturais é enorme, pois a eles cabe lutar contra a banalização do conhecimento superficial e inconsequente, criando verdadeiras “ilhas” de incentivo à curiosidade e à inquietação, sempre de maneira prazerosa e descontraída, já que não há mais espaço para o ilógico aprendizado recheado de “sangue, suor e lágrimas”.

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 109

Em um mundo tão complexo e dinâmico os Espaços Culturais de hoje não se enquadram perfeitamente em apenas uma modalidade de ação cultural (formação, difusão ou preservação), pois, cada vez mais, tais ações se comunicam, dependem uma das outras e se complementam incessantemente. Logo, os agentes responsáveis por Espaços Culturais devem absorver e incorporar toda essa complexidade em seus programas e projetos, propiciando aproveitamento otimizado das atividades realizadas. Nosso dia a dia está repleto de signos e símbolos e a transversalidade de temas aparentemente incomunicáveis se faz presente com força total. Linguagens diferentes e diversas não vivem mais estanques e isoladas, tendem a transitar uma pelas outras, umas sob e sobre as outras, influenciando e se deixando influenciar, criando mesclas surpreendentes, inventivas e que, se bem aproveitadas, são determinantes para um aproveitamento mais completo e potencializado. Tal deve ocorrer com os diversos Espaços Culturais que, por mais específicos que possam ser, devem trabalhar múltiplas e diferentes linguagens, inclusive experimentando todas as possibilidades e apontando outras ainda desconhecidas ou não testadas. Nesse sentido, o Museu da Língua Portuguesa, inaugurado no ano de 2006 na cidade de São Paulo, pode servir como exemplo de instituição que trabalha de forma bem-sucedida com linguagens diversas e que, ao longo de sua curta existência, vem experimentando e aplicando esta diversidade em suas múltiplas atividades. Tais experiências têm origem na própria tipicidade do acervo da instituição: a língua portuguesa, um patrimônio imaterial. A partir desse dado, a equipe de criação do museu, ao trabalhar com sua mostra de longa duração, teve que apostar nas linguagens múltiplas que permitissem o aprofundamento dos conteúdos apresentados e sua exibição ao público. Assim, a mostra de longa duração do museu usa linguagens as mais variadas para que os objetivos da instituição sejam atingidos, e é interessante ressaltar como tais linguagens podem valer-se de um suporte altamente tecnológico e moderno ou de um suporte mais tradicional e usual. É interessante observar como tradição e modernidade, desde que bem aplicadas e aplicadas dentro de um objetivo claro, convivem harmoniosamente e se complementam perfeitamente. Entretanto, as experiências de uso de linguagens diversificadas no Museu da Língua Portuguesa não se restringem à sua exposição de longa duração, mas de alastram para as mostras temporárias, ações educativas e atividades paralelas. Ressaltando que a instituição tem um olhar muito focado em seus objetivos museológicos, é interessante verificar como as diversas linguagens

110 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - Antônio Carlos Sartini

contribuem para despertar no público um interesse maior e uma postura crítica e investigativa crescente. Artes cênicas, música, dança, artes visuais e todas as demais, são incorporadas ao dia a dia das programações do Museu com o propósito de reforçar seus conteúdos, mas acabam despertando a atenção e o interesse de um público que há aproximadamente cinco anos se mantém na ordem de 1.500 pessoas por dia. Além das linguagens artísticas experimentadas, o Museu da Língua Portuguesa aposta fortemente na busca de escritas expositivas mescladas, em que se procura aproveitar toda a experiência acumulada com sucesso em outras instituições e experimentar novas possibilidades com apoio tecnológico, mostrando, mais uma vez, que há espaço para todas as soluções, sejam elas mais modernas e experimentais ou mais testadas e tradicionais. Devemos observar que não existem ou não devem existir fórmulas prontas e acabadas, mas, sim, que para cada situação deve-se buscar a melhor possibilidade, dentre todas as possibilidades que atualmente se colocam. Portanto, os Espaços Culturais são territórios especialíssimos para a busca de novas soluções, para a experimentação de novas linguagens e escritas e, assim sendo, a responsabilidade dos mesmos é enorme, tanto junto ao seu público como junto ao universo artístico e cultural como um todo. Espaços Culturais acabados, resolvidos não podem existir e, se assim se enxergarem, serão, inevitavelmente, espaços que caminham em passos largos para o esquecimento e o fracasso, é claro, guardadas as características de cada espaço em si. O dinamismo e a busca constante devem fazer parte da vida e da história de qualquer Espaço Cultural, por mais tradicional que o mesmo possa ser ou parecer. O dinamismo de um equipamento cultural pode ser medido através de seu poder de comunicação e interação com sua comunidade mais próxima e com o mundo atual. Equipamentos que não mantêm diálogos amplos e constantes e que não se questionam incessantemente não podem atender e cumprir seus objetivos de maneira satisfatória. repertório

Os Espaços Culturais dependem muito dos repertórios que oferecem aos seus públicos distintos e, por vezes, acabam definindo suas influências e seu significado no universo cultural a partir do repertório explorado. Mais uma vez devemos lembrar que vivemos em um mundo de transversalidades no qual tudo se mescla, se encontra e se confunde também. Assim, definir um repertório ou seus repertórios é uma tarefa das mais importantes para equipamentos culturais de qualquer natureza e tipologia.

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 111

Normalmente, o repertório se dá a partir da linguagem tratada pelo Espaço Cultural ou unicamente a partir de seus conteúdos, mas devemos lembrar que as possibilidade e necessidade são mais amplas. É claro que manter o foco, como já dissemos anteriormente, é extremamente importante, mas o foco pode ter vários espectros de modo a ampliar o poder de diálogo do Espaço Cultural com seus públicos e sem perder seus objetivos. Assim, ao definir seu repertório, um equipamento cultural deve priorizar seus conteúdos e as possibilidades que deles emergem – diríamos que este seja o repertório principal, mas outros podem perfeitamente ser enquadrados nos escopos dos espaços culturais, tendo como base sua localização espacial e territorial.

carnaval de rua e foi se tornando, nos últimos anos, um ponto de atração do carnaval paulistano. Logo, os Espaços Culturais, sempre focados, devem ter sensibilidade quando da definição de seu repertório, pois suas ações podem e devem ser potencializadas, atraindo mais frequentadores e, principalmente, atraindo usuários que normalmente não estariam dispostos a frequentar um espaço de aprendizado, difusão e convívio cultural. Como alerta deixamos a questão do foco, pois ampliar desordenadamente o repertório de um espaço cultural pode transformá-lo em um equipamento sem personalidade e sem identidade, criando sérias dificuldades para sua comunicação e para a ampliação de seus públicos. humanização dos espaços

O Museu da Língua Portuguesa, que tem por repertório principal os diversos temas relacionados ao nosso idioma, também trabalha questões relacionadas ao patrimônio histórico e arquitetônico, já que se encontra instalado dentro do centenário prédio da Estação da Luz, marco referencial para paulistanos e paulistas. Várias ações educativas e atividades paralelas do museu abordam o próprio prédio da Estação da Luz e seu rico entorno, como o Jardim da Luz, primeiro parque público da capital paulista. Ainda no caso do Museu, incorporou-se ao seu repertório, a partir da população que circula por suas vizinhanças o tema da saúde e da prevenção às DST/Aids. Em muitos casos o Museu atua em parceria com a Secretaria Estadual de Saúde, e a municipal também, e ONGs que desenvolvem importantes programas na área, já que existem parcelas significativas de população em seu entorno que vivem da prostituição ou que se expõem muito devido ao uso de drogas. Logo, fruto de uma constatação de necessidade e possibilidade de otimizar seus serviços, o Museu acabou incorporando aos seus repertórios um tema que, à primeira vista, nada teria em comum com a instituição. Outro exemplo importante de repertório ampliado é o projeto de resgate do Carnaval de Rua que o Museu da Língua Portuguesa desenvolve desde 2007 e que já virou uma pequena tradição em sua programação e na programação de Carnaval do Bairro da Luz. No mês de janeiro o museu desenvolve um curso de construção de bonecões de carnaval, atividade cultural muito típica do Estado de São Paulo, principalmente no Vale do Paraíba. Tal curso, para além da simples confecção de tais bonecões, é um curso de arte popular e cultura de raiz. No sábado que antecede a terça-feira de Carnaval, o Museu promove um desfile dos bonecões confeccionados, sempre acompanhados de um grupo musical que executa musicas típicas, como marchinhas, e de um grupo convidado de carnaval de rua de alguma cidade da Região Metropolitana. Assim, a instituição trabalha com a preservação da memória do

112 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - Antônio Carlos Sartini

As questões relativas à gestão e à administração dos Espaços Culturais são determinantes para o sucesso ou não de uma instituição. Necessário se faz uma equipe capacitada tecnicamente e comprometida; é necessário um planejamento antecipado de ações; é necessário ter clareza quanto aos objetivos e metas a serem atingidas; é necessária uma constante avaliação de resultados atingidos; é necessário um constante diagnóstico de problemas e soluções possíveis; é necessária uma formatação jurídica que permita a plena execução de atividade com otimização de recursos que são sempre reduzidos para o setor cultural; é necessário o desenvolvimento de um plano de comunicação eficiente para a instituição; e são necessárias todas as ações, enfim, que profissionalizem ao máximo a administração e seus agentes nos Equipamentos Culturais. Entretanto, devemos ressaltar que Equipamentos Culturais trabalham com seres humanos, com seus sonhos, desejos, aspirações e, principalmente, com sentimentos e imaginação. Assim, a humanização nas relações existentes em um Espaço Cultural, sejam as relações com o público interno, externo ou mesmo virtual, é absolutamente decisiva para o sucesso ou não de uma instituição. Ainda que necessários, as planilhas e os formulários não podem e não irão jamais substituir o calor humano, a criatividade e a sinceridade que deve permear um Espaço Cultural. Talvez a afirmação acima possa soar a alguns como romântica, mas, sem romantismo, sem sonho e sem fé na humanidade, não há Espaço Cultural que resista ou que cumpra minimamente suas funções dentro de uma sociedade cada vez mais insensível e distante. Todo recurso tecnológico é muito bem-vindo como ferramenta de grande utilidade para o trabalho dos Espaços Cultural, mas nada poderá substituir o contato face a face, o calor humano que toda linguagem artística traz em si há milhares de anos!

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 113

o plug minas no âmbito das políticas públicas do estado de minas gerais

No Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI) 2007-2023 os jovens foram identificados como um dos destinatários prioritários das políticas públicas, sendo incorporados à estratégia de governo. Dentre os projetos integrantes da área de resultados destinada ao Protagonismo Juvenil na revisão do Plano Plurianual de Ação Governamental – PPAG para o período de 2008/2011 foi instituído o Projeto Estruturador “Centro da Juventude de Minas Gerais”. O objetivo desse Projeto Estruturador era criar um espaço inovador e de referência para os jovens, capaz de estimular a postura proativa, com o intuito de propiciar o acesso a uma formação distinta da educação formal. Esse espaço formativo seria caracterizado por uma linguagem própria e que fornecesse os meios suficientes para que esses jovens se tornassem protagonistas e agentes da sua própria transformação. Os dois eixos norteadores desse novo modelo de formação seriam arte e cultura digital. Visando a estabelecer uma interlocução direta com o seu público-alvo – o jovem –, o então denominado Centro da Juventude adotou o nome Plug Minas – Centro de Formação e Experimentação Digital.

car los gradim ana caro lina lara Convidado:

O escopo de atuação do Plug Minas prevê a realização de uma intervenção integrada entre setor público, iniciativa privada e terceiro setor, com a criação de um espaço de referência para a juventude, tendo como parâmetro a importância da educação para essa parcela da população. a política da juventude e o projeto plug minas

O ponto de partida para a implementação de políticas públicas voltadas para a juventude é que o jovem não deve ser tratado como um problema. São inúmeras as tentativas de combate direto dos comportamentos de risco associados à juventude atualmente que têm se demonstrado ineficientes ou mesmo inócuas. Nesse sentido, apostamos num conceito de formação mais abrangente, que trabalha as múltiplas facetas e os múltiplos âmbitos da existência, com foco no empoderamento. Acreditamos que esse modelo de formação é capaz de munir os jovens das ferramentas necessárias para que ele aja de forma proativa, vivenciando as descobertas da sua trajetória e sabendo lidar com essas questões cotidianas relacionadas a si mesmo e ao mundo ao seu redor. Essa abordagem traduz de forma concisa essa nova perspectiva que norteia as políticas públicas destinadas à juventude.

carlos gradim Diretor de teatro e cinema, produtor e professor formado pelo Curso Artes Cênicas

podem colaborativamente construir. (Minas Gerais, 2007, p.3) (...) desejamos dos projetos sociais que valorizem o protagonismo juvenil, as aprendizagens significativas e a inovação educacional como diretrizes para a construção de um presente que já é parte do futuro. (Minas Gerais, 2007, p.4)

Uma das fontes de dados e referências utilizadas na elaboração do projeto foi uma pesquisa do Observatório da Juventude (UFMG), realizada em 2003, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O estudo aponta dados desanimadores sobre o estímulo à participação juvenil na gestão dos projetos sociais desenvolvidos à época: apenas 5% dos casos. Segundo a mesma pesquisa, cerca de 45% dos projetos possuíam um formato semelhante, voltado para o desenvolvimento de atividades pontuais e esporádicas, tais como oficinas, palestras e cursos de pequena duração, sendo que quase 60% dos projetos adotavam uma abordagem muito próxima ao modelo clássico de ensino – motivo, aliás, já apontado como um dos principais fatores de êxodo escolar no país. A proposta do projeto do Centro da Juventude está alinhada a um novo olhar, no qual o jovem é entendido como solução e sujeito social, agente de seu próprio desenvolvimento. O foco central é atuar no desenvolvimento das potencialidades da juventude e, assim, mais que uma representação de futuro, os jovens do Plug Minas são co-produtores de um presente concreto, baseado em suas competências emergentes em domínios das artes e da tecnologia e se tornam agentes mobilizadores de forças políticas e sociais.

da UFMG, Empreendedor Público. Gerente do Projeto Estruturador Plug Minas.

eixos organizacionais do plug minas

Belo Horizonte – MG

O Centro da Juventude será organizado de acordo com três eixos principais: o primeiro relacionado aos resultados que pretendemos alcançar (educação, trabalho, participação social); o segundo eixo, no qual tratamos as vocações a serem desenvolvidas com os jovens (artes, esportes, tecnologia); e o terceiro, que se refere à natureza das atividades (formativas, produtivas, experimentais). O resultado do arranjo desses eixos traduz a orquestração almejada para o Plug Minas, conforme a figura abaixo:

ana carolina lara Advogada, Mestre em Direito Público pela PUC/MG e Gerente de Projetos do Instituto Cultural Sérgio Magnani - ICSM

Apresentação do Projeto Plug Minas. Centro de Formação e Experimentação Digital

O Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI) 2007-2023 traz uma análise comparativa de algumas das políticas públicas e dos projetos sociais para a juventude e constata: (...) parte considerável das leis e projetos para a juventude enfatiza seus problemas, enquanto desconsidera os jovens e as soluções que eles

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2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 115

nascidos na era digital. Por mais que um imigrante manipule e interaja bem com as ferramentas tecnológicas, ele sempre vai estar imbuído de um “sotaque” analógico; já os nativos não só lidam organicamente com as ferramentas, como têm toda sua relação com o mundo a partir de um universo digital.

Nesse sentido, o Plug Minas pode ser entendido como um projeto para o jovem e por ele protagonizado, que contempla, simultaneamente e de forma articulada, resultados em três áreas: Educação, voltada à construção de conhecimentos ao mesmo tempo amplos e localmente relevantes, bem como ao desenvolvimento de habilida-

Portanto, quando falamos em desenvolver um projeto que tem como público-alvo jovens de 14 a 24 anos de idade, temos que considerar que todo o processo de aprendizado, de interação social e relação de construção de sentido desse jovem se dá integralmente pelo mundo digital.

des e repertórios sólidos; Trabalho, com ênfase na qualificação, inserção profissional empreendedorismo juvenil; Participação social, através da formação de agentes multiplicadores do

o projeto plug minas

desenvolvimento e de jovens atores políticos e comunitários.

princípios constitutivos

Além desses resultados, dois outros eixos de atuação são enfatizados no acolhimento ao jovem: o das vocações (nas artes, nos esportes e na tecnologia) e o das atividades oferecidas. Esse último articula atividades em três dimensões: (1) Formativa, de longa duração, com ênfase na empregabilidade e certificação técnica; (2) Produtiva, de média duração, voltada ao desenvolvimento de artefatos para uso no mundo do trabalho; e (3) Experimental, de curta duração, com foco no despertar de vocações. o fio condutor das atividades do plug minas: a cultura digital. Em todas as atividades trabalhadas e vocações desenvolvidas no Plug Minas a cultura digital é tida como um eixo essencial. Muitos indicadores recentes apontam a cultura digital como um cenário crítico para o diálogo e articulação das dimensões formativa, produtiva e experimental, particularmente entre os mais jovens. Vista como uma área importante de profissionalização e empregabilidade no Brasil e no mundo, a cultura digital tornou-se um campo propício de diálogo entre os jovens e com os jovens. Mas o que é cultura digital?

O projeto Plug Minas tem como missão construir novas formas de convivência social baseadas no protagonismo e na inovação para o mundo do trabalho, atuando em diálogo com o jovem na criação de oportunidades educacionais e aprendizagens significativas em domínios da cultura digital. Seis princípios constituem as diretrizes pedagógicas do projeto: a)

O desenvolvimento de projetos: trata-se de uma orientação segundo a qual a construção de conhecimentos e competências práticas emerge no desenvolvimento de soluções para um conjunto articulado de problemas, ou seja, um projeto;

b)

A resolução de problemas complexos: sob a perspectiva de que as demandas se organizam em um sistema complexo, resultado de muitos fatores interrelacionados, propõe-se o engajamento do jovem na resolução de problemas a partir de práticas de investigação e pesquisa;

c)

A transdisciplinaridade: este princípio pontua a necessidade de uma visão holística dos processos de construção de conhecimentos, favorecendo perspectivas flexíveis e inovadoras, não segmentadas pelas disciplinas acadêmicas;

d)

O dialogismo didático: construção de um ambiente que favoreça o engajamento dos educandos e educadores em práticas discursivas diversificadas, nas quais suas vozes se tornem centrais para os processos de resolução de problemas complexos, fazendo-os responsáveis pelos projetos em desenvolvimento;

e)

A aprendizagem colaborativa: a aprendizagem é um processo pelo qual o sujeito expande suas possibilidades para produção de sentidos, através dos usos que faz da linguagem, do diálogo e da interação com o outro; e, por fim,

f)

O protagonismo juvenil: trata-se da prática de incentivar a participação dos jovens como fonte de iniciativa, ação e compromisso, tornando-os responsáveis por seus projetos de vida.

Cultura digital é qualquer prática na qual a produção de sentidos, os modos de fazer e se comunicar, os usos da linguagem são mediados por artefatos computacionais, por telas que virtualizam e semiotizam as relações humanas. (C.E.S.A.R edu, p.5)

Pode-se dizer que o universo da cultura digital torna-se um importante espaço para a emergência de produção de sentidos muito alinhados à linguagem dos jovens de hoje. A cultura digital surge como um novo paradigma no mundo contemporâneo. Essa realidade, tão premente e irrefutável, não pode mais ser negligenciada. É impossível pensarmos o mundo hoje sem a obrigatoriedade de interação com o universo digital, principalmente quando falamos das novas gerações de jovens, nascidos na década de 1990. Marc Prensky, um dos principais teóricos da cultura digital, divide o mundo em duas categorias: “os nativos e os imigrantes da cultura digital”. Imigrantes são aqueles nascidos na era analógica e são nativos os

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2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 117

Ressalta-se que a aplicação de todos os princípios pedagógicos acima citados perpassa a perspectiva do protagonismo juvenil. O protagonismo é um tipo de ação que busca responder a problemas complexos e significativos para o sujeito, e que exige intervenção colaborativa e dialogada em contextos sociais, políticos e econômicos específicos. A partir da aplicação, em conjunto, desses princípios pretende-se orquestrar as práticas dos diversos núcleos que compõem o Plug Minas. modelo de gestão

A finalidade do Plug Minas prevê uma intervenção integrada entre setor público, privado e terceiro setor. A concepção de gestão do projeto é inter-setorial, de maneira que, para sua viabilização, são imprescindíveis as parcerias com outras esferas de governo, empresas privadas e organizações da sociedade civil. O projeto desenvolvido pela Secretaria de Estado de Cultura, com interveniência da Secretaria de Esportes e Juventude, é gerido por instrumento contratual denominado Termo de Parceria, celebrado entre o estado e a OSCIP estadual, Instituto Cultural Sérgio Magnani – ICSM. Essa parceria destina-se à gestão do projeto como um todo, zelando para que a missão do Plug Minas mantenha-se alinhada na ação cotidiana de cada núcleo, unidade menor e finalística do projeto. A concepção original do projeto prevê a implantação de 12 núcleos, com vocações distintas, que possuem em comum o público-alvo (os jovens) e prevê no escopo das atividades a serem desenvolvidas a interface ou diálogo com a cultura digital. No âmbito da gestão de cada um dos 12 núcleos do Plug Minas, há um desenho de gestão que prevê a parceria entre uma entidade gestora específica, responsável por sua implementação e uma entidade ou empresa mantenedora. Em alguns casos, como o do Núcleo de Empreendedorismo Juvenil, a entidade executora e a mantenedora são uma única: o SEBRAE. As entidades gestoras são selecionadas entre entidades que atuem na área específica do núcleo a ser gerido, e serão acompanhadas sistematicamente pelo ICSM por meio de um instrumento de contratualização de resultados. Esse instrumento está embasado na metodologia de acompanhamento e avaliação do Governo de Minas, no qual são explicitadas as regras da relação, as metas e os indicadores para acompanhamento e os critérios de permanência da entidade na gestão do núcleo. Além dos núcleos que são geridos por entidades específicas existe a figura de um Núcleo de Planejamento e Gestão – NPG do Plug Minas, que atua como coordenador e mediador de todos os processos que envolvem o projeto como um todo, bem como o articulador dos interesses de todos os stakeholders do Centro, tendo sua ação sempre em observação à missão, visão e diretrizes pedagógicas do Plug Minas.

118 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - Carlos Gradim

O NPG é formado, de um lado, por representantes do Governo que atuam para realizar a articulação externa do projeto com o aparato burocrático do Estado, além de dar apoio técnico e metodológico para implementação de ações no Centro; e, de outro lado, por representantes da OSCIP gestora do projeto, que tem como função executar os recursos repassados através do Termo de Parceria e articular internamente a rede de parceiros e colaboradores dos núcleos. O NPG, Núcleo de Planejamento e Gestão funciona, portanto, como um órgão de suporte a apoio à rede dos núcleos, conforme representado na figura abaixo:

A arquitetura organizacional do Plug Minas está disposta sob a forma de estruturas em rede e não hierárquicas, em que o centro não é necessariamente de comando e controle, mas apenas parte dos mecanismos de planejamento, suporte e apoio. O relacionamento entre núcleos e deles com outras entidades e projetos se dá de forma direta, sem a mediação do centro. Ao mesmo tempo, nas relações entre centro e os núcleos (suas bordas), a ideia é que, em vez de se olhar para cima, se olhe e se converse com os lados, propondo, discutindo e fazendo, a par, nos mesmos níveis de competência. Percebe-se, portanto, que o modelo de gestão do projeto Plug Minas tem um caráter inovador e arrojado, condizente com as propostas contemporâneas de governança social, onde a inter-setorialidade é vista como uma característica determinante para a sustentabilidade de projetos. Além disso, a presença do Núcleo de Planejamento e Gestão reforça e institucionaliza o modelo de parceria entre o poder público e o Terceiro Setor no fomento e execução de uma política pública. Destacamos ainda o Núcleo Caminhos do Futuro, criado para dar visibilidade à produção, à reflexão e ao conhecimento gerados pelos demais Núcleos do Plug Minas. Esse núcleo funciona ao mesmo tempo como uma vitrine, onde os artefatos e produtos gerados pelos jovens no seu processo de aprendizado são expostos, buscando uma aproximação com a comunidade do entorno e projetos que possuem propostas similares. Outra função do Caminhos do Futuro é de trazer experiências e projetos que possuem interface com as atividades desenvolvidas pelos núcleos

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 119

do Plug Minas e fazer com que eles se apropriem do espaço, gerando um diálogo contínuo com a sociedade. considerações finais

O Plug Minas - Centro de Formação e Experimentação Digital é um projeto do Governo do Estado de Minas Gerais que articula diversas forças políticas, sociais e comunitárias, voltadas ao mundo da educação, do trabalho, do entretenimento e da cultura digital. Trata-se de um projeto que se pretende orgânico, no qual a orquestração das partes e parcerias deve gerar uma missão compartilhada e normas compatíveis com seus valores e objetivos.

sér gio vaz Convidado: sérgio vaz O poeta Sérgio Vaz fundou a Cooperifa, em

A proposta do projeto é que as práticas e habilidades experienciadas no Plug Minas impactem de forma significativa na formação cidadã, acadêmica e profissional do jovem, potencializando a participação dos jovens na sociedade civil organizada; criação de um ambiente propício ao aprendizado pelo trabalho; geração de um ambiente de socialização com difusão cultural; construção de um espaço de diálogo informado entre a juventude e o setor público; disseminação da postura empreendedora entre os jovens; e a identificação e divulgação de jovens talentos. Arrojado e inovador, o Plug Minas, certamente, será um projeto de grande destaque entre as ações do Governo de Minas e um grande avanço no âmbito das políticas para juventude. referências bibliográficas

C.E.S.A.R.edu, Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife. Plug Minas: Diretrizes Pedagógicas. Belo Horizonte, 2008.

O 2º Seminário tinha como proposta ampliar a discussão sobre o lugar onde a cultura se realiza. O papel transformador da poesia sempre ocupará um lugar muito especial na cultura e no mundo. Sérgio Vaz, poeta paulistano e criador da Cooperifa, foi um dos convidados a participar do debate na mesa sobre “O Espaço como experiência: repertório e gestão”. Além de marcar presença com a apresentação do projeto cultural da Cooperifa e a experiência única dos saraus poéticos, que mobilizam centenas de pessoas na periferia da capital paulista, ele ofereceu, no último dia do Seminário, sua poesia ao público presente, que o aplaudiu, emocionado.

2000, com o objetivo de envolver artistas da periferia em atividades como exposições de fotografia e performances teatrais em

A contribuição de Sérgio Vaz para esta publicação não poderia ser outra senão uma de suas poesias, que deram ao nosso Seminário o tom da alegria e do otimismo que, esperamos, possam alimentar a cultura e com ela se renovar em todos os encontros.

lugares que, segundo ele, são os verdadeiros centros culturais da periferia, como praças,

Receita para um novo dia*

bares e galpões. Ao final de 2002, começou a promover os Saraus da Cooperifa em uma

Pegue um litro de otimismo,

fábrica abandonada, em Taboão da Serra,

duas lágrimas – de preferência

município de São Paulo. Atualmente, os

escorridas no passado.

saraus acontecem no Bar do Zé Batidão, que fica na Rua Bartolomeu dos Santos, nº 797,

Duas colheres de muita luta

Jardim Guarujá – Periferia (SP).

e sonhos à vontade.

Para saber mais sobre a Cooperifa,

Duzentos gramas de presente

acesse o blog:

e meio quilo de futuro.

http://colecionadordepedras1.blogspot.com

Pegue a solidão, descasque-a toda C.E.S.A.R.edu, Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife. Plug Minas: Planejamento e Gestão. Belo Horizonte, 2008.

Cooperifa

e jogue fora a semente. Coloque tudo dentro do peito

COSTA, Antônio Carlos Gomes. Educação para o Desenvolvimento Humano.

e acenda no fogo brando das manhãs de sol.

São Paulo: Saraiva, 2004. Mexa com muito entusiasmo. FAZENDA, Ivani. Interdisplinaridade: História, teoria e pesquisa – Campinas, SP:

Ao ferver, não esqueça de colocar

Papirus, 1994 – (Coleção Magistério: formação e trabalho pedagógico).

uma dose de esperança e várias gotas de liberdade.

Minas Gerais. Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado 2007-2023, Belo Horizonte, 2007.

Sorrisos largos e abraços apertados, para dar um gosto especial. Quando pronto, assim que os olhos começarem a brilhar, *do livro Colecionador de pedras (Global Editora)

sirva-o de braços abertos. Sérgio Vaz

120 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - Carlos Gradim

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 121

chris tian jar dón

una construcción de cultura desde el faro de oriente.

Hoy en día esta bien comprobado que la educación artística y la cultura son una de las armas más efectivas en la lucha por sacar a la sociedad de un letargo histórico en la que la mayoría de los gobiernos neoliberales las han sumergido. Existen esfuerzos realmente loables por su labor a lo largo de los años en el ámbito cultural para intentar mejorar dicha situación. De entre todos estos procesos y esfuerzos por brindar arte y cultura a la sociedad, hay casos palpables del buen funcionamiento de políticas culturales.

Convidado: christian jardón Coordenador de Comunicação e Difusão do Faro do Oriente Cidade do México – México

Convertimos las necesidades en oportunidades.

Uno de estos esfuerzos, que hoy se ve cada vez más como una realidad evidente es sin lugar a dudas el FARO de Oriente, lugar que nació sin pretensiones, mas allá de brindar un espacio físico donde cientos de jóvenes tuvieran una opción ante las problemáticas sociales en las que estaban inmersos. La principal Misión de este proyecto, era bajar el arte de la torre de marfil en la que equivocadamente siempre se ha situado, siendo siempre para unos cuantos doctos . Además se busca que el arte y la cultura llegara a una población carente de estos servicios. En un solo sentido, formar nuevos públicos para el disfrute de todo tipo de manifestaciones culturales o artísticas. antecedentes o contexto.

El FARO está ubicado en el oriente de la Ciudad de México, en un sitio que geográficamente ha sido estratégico para el desarrollo de la delincuencia, no solo de Iztapalapa si no también de los municipios circunvecinos a esta. Esta zona es un fiel espejo de la realidad nacional, la Delegación Iztapalapa es el tercer lugar a nivel nacional en índice de habitantes solo después de los municipios de Guadalajara y Ecatepec. hasta el censo poblacional del año 2000 esta delegación contaba con 2 millones de habitantes en 117 km2. En ellos el 57% vive en condiciones de hacinamiento. El 68% subsiste con un promedio de 50 pesos al día (4 dólares) y con un promedio escolar de 6º año de primaria” La consecuencia de esta situación son los altos índices de delincuencia, falta de nutrición en la mayoría de las personas, violencia intrafamiliar, embarazos juveniles al por mayor. Y sobre todo esta delegación cuenta con el no honroso primer lugar en menores infractores dentro de la Ciudad.

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 123

A tres calles del FARO se encuentra el municipio de Nezahualcoyotl, una Ciudad también densamente poblada, no hay una calle sin una familia que no tenga un miembro migrante. El pandillerismo es otro de los problemas que aqueja las casi 200 colonias populares de Iztapalapa, incentivado por el narcotráfico, ya que esta demarcación ocupa el tercer lugar en narcomenudeo.

actores y funcionamiento.

El FARO de oriente surge dentro de lo que era el Instituto de Cultura de la Ciudad de México el cual pertenecía a su vez a la Secretaria de Desarrollo Social, actualmente el FARO forma parte de la Secretaria de Cultura de la Ciudad de México, secretaria creada en el año 2001 solo un año después del nacimiento del FARO de Oriente.

El oriente de la Ciudad de México y su área conurbana, lo mismo le llaman: “...Iztapalacra, Iztapamata, Iztaparata, Santa Rata, Nezayork, Nezapolvo, Chimalhualodo, Chimalhuarache, Ecatebache, Ecatapunk.

En su nivel de operación interna está dividido en una Subdirección encargada de todo lo relacionado a la cuestión institucional con las diversas dependencias de gobierno y organismos privados y civiles además de supervisar el trabajo de las diversas coordinaciones del FARO.

Por si no fuera poco de esta situación, los medios también reclaman ¡mano dura! contra la delincuencia, quieren poblar la región con un policía por centímetro cuadrado. Y por supuesto reclaman un mayor presupuesto para la Seguridad Pública, para la compra de más armamento, patrullas, y balas. Es también propuesta electorera por los partidos políticos de todo signo en pos del voto popular. ..”

Una coordinación de Talleres Infantiles las cual opera 25 talleres infantiles de iniciación artística, en los cuales cerca de 700 niños desde los 3 meses a los 15 años se inscriben trimestre a trimestre en sus diversos cursos además de contar con una serie de servicios a la comunidad como jornadas de salud, apoyo psicológico, canalización de personas con problemas psicológicos, emocionales o físicos.

Así, en medio de lo que la policía considera una de las zonas de mayor inseguridad del país. Nace La Fábrica de Artes y Oficios de Oriente – FAROimpulsado por el primer gobierno democrático de la Ciudad de México.

La coordinación de Talleres de Artes y Oficios la cual cuenta con 51 talleres divididos en talleres de artes escénicas, artes visuales, comunicación, música y oficios, en donde cerca de 1200 personas de 16 años en adelante reciben la preparación básica y profesional para desempeñarse en los ámbitos culturales y artísticos en que están inmersos.

Un programa piloto por demás ambicioso que buscaba tener en un mismo sitio una gran escuela de artes y oficios y a su vez un centro cultural, libre y gratuito para la población de la zona oriente, así en el año 2000 nace el FARO de Oriente en ese primer impulso por recuperar nuestra Ciudad y buscar dar certidumbre y rumbo a una zona olvidada por los diversos gobiernos que con anterioridad siempre menospreciaron a ese zona. Además se llevó a cabo una política cultural en la Ciudad que desarrollo una serie de acciones para recuperar las calles, los espacios públicos, plazas urbanas, centros culturales, museos y edificios gubernamentales en desuso. Surgieron diversos programas como “la calle es de todos”, “teatro en atril”, 1200 libroclubs, jugares y juglares para el público infantil, conciertos masivos de todo tipo en el zócalo capitalino, en las explanadas delegacionales, en los barrios populares, la feria del libro de la Ciudad de México. Y un programa piloto por demás ambicioso que buscaba tener en un mismo sitio una gran escuela de artes y oficios y a su vez un centro cultural, libre y gratuito para la población de la zona oriente, así en el año 2000 nace el FARO de Oriente en ese primer impulso por recuperar nuestra Ciudad y buscar dar certidumbre y rumbo a una zona olvidada por los diversos gobiernos que con anterioridad siempre menospreciaron a ese zona.

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Una coordinación de Servicios culturales la cual es la encargada de coordinar los diversos eventos culturales y artísticos que semana a semana el FARO programa en sus instalaciones y en ocasiones fuera de este como exposiciones en nuestra galería, festivales, conciertos, obras de teatro, danza,eventos masivos, espectáculos infantiles etc. Uno de los pilares, la coordinación de Difusión encargada de difundir las actividades del FARO por medio de carteles, la creación de la revista bitácora, la operación de Radio y Tv FARO y el enlace con los diferentes medios de comunicación y la población aledaña al espacio y la coordinación de Servicios Generales encargada de dar el mantenimiento continuo a nuestras instalaciones además de proporcionar la logística necesaria para cada evento del FARO desde los talleres a los conciertos masivos. Cada coordinación es la encargada de programar y supervisar sus actividades de acuerdo a la demanda de la misma población asistente al FARO y en base a las necesidades del espacio, así mismo cada una de ellas en conjunto con la dirección del espacio busca los recursos y los acuerdos necesarios con las diversas dependencias y organizaciones culturales, gubernamentales o civiles para el mejor desarrollo de sus actividades. gestión cultural.

El Faro de Oriente es un centro cultural no como cualquiera, pero eso poco importa en épocas de crisis, ya sean políticas, económicas y socia-

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 125

les; ya que la cultura siempre sufre la primera embestida de la baja de presupuestos, los recursos destinados para los proyectos que se generan en estas instancias se ven golpeados por estas desventajas. Además de la poca visión y sensibilidad de funcionarios que desafortunadamente no la comprenden y creen que es un gasto suntuoso.

Se logro conformar un equipo multidisciplinario de trabajo, un Antropólogo Social-Comunicólogo, un Mercadologo-Publicista y un Diseñador Gráfico, con un gran apoyo de voluntarios provenientes de distintas escuelas de nivel medio superior, que realizan su servicio social.

Sin embargo las necesidades y proyectos como el FARO tenían que crecer, y por supuesto no se podía abandonar el compromiso social y cultural que se tiene con la comunidad.

Las estrategias de guerrilla son acciones de guerra diseñada para debilitar al enemigo a través de una larga serie de ataques menores. Más que comprometerse en grandes batallas, una fuerza de guerrillas se divide en pequeños grupos que atacan de forma selectiva el objetivo en sus puntos más débiles.

Todas estas clásicas problemáticas por las que circula siempre la cultura, y si a esto le sumamos los contextos sociales, geográficos y políticos en donde se encuentra ubicado el FARO, podría complicar la existencia de cualquier gestor cultural; en una zona difícil en todos los sentidos. Pero es bien dicho que en épocas de crisis el arte es cuando mayor crea, y en FARO es así, en sus primeros años de vida tuvimos que lidiar con los ataques presupuestales de una nueva administración que no lo veía como proyecto suyo, nuevos funcionarios territoriales, delegacionales, locales y federales. De la noche a la mañana de aquel primer Gobierno de izquierda, ya no quedaba, seguía siendo la camiseta del mismo color pero con distintos jugadores. El proyecto se había quedado solo, con un equipo guerrero y con muchos amigos en el medio cultural que no dejarían que naufragara ese gran barco que navegaba por los difíciles mares del Salado (es el nombre original, de la zona, lo que fue anteriormente una laguna, llamada así por sus aguas). Con estas difíciles lluvias, y tempestades, nadando a contra corriente teníamos que accionar un plan o realmente el proyecto podría hundirse. Una de varias acciones fue implementada desde la coordinación de Difusión. Teníamos que plantear la creación de un detonador que llevara la magia de este espacio, a que lo conocieran mas personas primero en el lugar donde estábamos y replicarlo a toda la ciudad, teníamos que comenzar una labor guerrillera, es decir comenzamos un ataque mediático, una manera de expansión de la labor social en varias etapas. Sabíamos que quedarnos en este primer círculo no podría llevarnos a un margen de negocia fuerte para poder lograr el cometido de la misión del proyecto, ni tener una mayor comunidad beneficiaria con la idea de arte y cultura para todos. A la par teníamos que desarrollar una estrategia, utilizando las mismas herramientas del Sistema pero con un fin distinto. Es así que comenzamos a realizar un Marketing Social desde la Coordinación de Difusión utilizando la metáfora de guerra militar para diseñar una estrategia efectiva en comunicación y por ende un mayor impacto.

126 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - Christian Jardón

la guerrilla desde su origen.

Para ser efectiva, los equipos de guerrillas deben ser capaces de replegarse entre ataque y ataque. La forma genérica de estrategia comprende una secuencia repetida de ataques, retiradas y ocultaciones practicadas en series. Se dice que las “fuerzas de guerrilla nunca ganan las guerras, pero que sus adversarios generalmente las pierden”. primer embestida

¿Cómo aplicamos estas estrategias? primera etapa

Se abarcaba un radio comunitario, la primera zona aledaña, donde la comunidad a través de un cartel se enteraría de la actividades, de la oferta con las que contábamos, es decir, se atacaban los puntos vulnerables y de mayor congregación de la comunidad. Este tenía que estar colocado en todos los puntos donde convergerá toda la comunidad, mercados, tiendas, escuelas primarias, pre-escolar, secundarias, postes de luz, lugares comunes para todos. Imágenes interesantes realizadas por un equipo de diseñadores de servicio social que se acercaban con nosotros y les pedíamos diseños dangerescos, estos se animaban ya que eran sus primeros trabajos masivos y le echaban más ganas. segunda etapa

Una vez acaparada la atención del primer sector de la comunidad, se determinaba que otro público importante era el estudiantil, aquellos puntos donde llegaran y confluyeran jóvenes, que por su interés intelectual y cultural siempre están a favor de apoyar este tipo de iniciativas, así mismo algunas casas de cultura más alejadas, estaciones de metro, parques, delegaciones y subdelegaciones, avenidas principales, de la zona de Iztapalapa y municipios aledaños. tercera etapa

La expansión debía de ser la zona que había monopolizado la oferta cultural, el triangulo cultural histórico de la Ciudad por excelencia la zona centro, sur y poniente. centros culturales del primer cuadro de la ciudad, los grandes teatros del poniente y las escuelas de arte y universidades

2º Seminário Internacional de Gestão Cultural – 127

del sur. Esta otra Ciudad de México debía conocer al FARO de Oriente, y a su vez se crean alianzas importantes con medios de comunicación que ayudan a la difusión masiva del centro cultural. Universidades, avenidas principales del sur, poniente y norte, todo igual con la misma técnica, todo esto se lograba con una plantilla de voluntarios de servicio social, que en otros lugares no los querían ya que eran de escuelas con un bajo perfil, como son los CONALEP, escuelas técnicas, Bachilleres, CETIS y CEBETAS, una serie de colegios que el Estado neoliberal los prepara con una formación técnica, en unos cuantos años para ser profesionales en ramas operativas, es decir obreros calificados. Todas estas escuelas las tenemos en su gran mayoría en las periferias de la zona, estos chicos muchas veces desconocen el estado alienación y conciencia social en que el Estado los a encapsulado. la relación con los medios de comunicación

En cuanto a los medios de comunicación, estos solo llegaban al FARO cuando se tenía algo demasiado vistoso, ya fuera un concierto masivo por algún aniversario o alguna galería que les interesara. Era muy difícil que nos hicieran caso con nuestras actividades cotidianas. Solo teníamos unos cuantos amigos de diarios que nos eran fieles, nosotros los sensibilizábamos, principalmente dándoles a entender que el proyecto había surgido de una propuesta de izquierda y así muchos de ellos entendían la importancia que tenía un lugar como el FARO, y no como otros, que en su gran mayoría, sirven a quien este en ese momento en el poder si es la derecha conservadora o el partido que gobernó durante tanto tiempo, solo teníamos y tenemos hasta ahora un diario La Jornada que siempre se a caracterizado por ser diario sensible a causas como lo era el FARO un centro en una de las zonas de la ciudad más conflictiva en todos los sentidos y olvidada por distintas gestiones gubernamentales que habían pasado pero que no habían volteado a ver a esa comunidad. pero…

¿qué podíamos hacer?

Ante este hecho, lograr ajustarnos, comenzar a diseñar estrategias, como ir a las redacciones y recoger a estos para que lo conocieran, y después volverlos a llevar, regalarles algún grabado ex profeso para ellos, saturarles el correo y hablarles, teníamos además de captar a las televisoras con la oferta de las carteleras que teníamos como las construcción de los alebrijes monumentales, festivales de graffiti o talleres para los niñas teníamos que vender bien la idea, cabezas interesantes, fotos del trabajo de lo que se hacía, todo esto a la larga sirvió ya que eran ellos los que comenzaban a hablarnos para lograr notas no tan clásicas en cultura como las que podían lograr con otros espacios ya consolidados, pero a la par comenzamos a construir nuestros propios medios con la política de, SI LOS MEDIOS NO IBAN CON NOSOTROS, NOSOTROS CREARIAMOS LOS PROPIOS.

128 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - Christian Jardón

Comenzamos con la idea de armar nuestra propia Radio, “Radio FARO 90.1 FM”. Lo idea era localizar un transmisor que pudiera dar la suficiente potencia para llegar al primer circulo, a los primeros kilómetros en los que estábamos envueltos, con programas donde los alumnos del este espacio pudieran reflejar las inquietudes de su barrio, de su entorno, de su ciudad, combinados con los gustos musicales que ellos prefirieran. Sabíamos desde un principio que si el proyecto se encierra en si mismo nunca creceríamos por eso desde el primer momento apostamos por un área de comunicación y como fue creciendo el proyecto a la par esta iba creciendo, el FARO era de toda la ciudad, y por eso se debía dar a conocer, la gente tenía derecho a saber que existía un lugar en donde pudieran encontrar un sin fin de actividades para desarrollar sus inquietud artística y que no necesitaban ser un expertos para ello, porque no sirve de nada tener excelentes talleres, o actividades si no se tiene un publico cautivo y el proyecto se convertiría en un elefante blanco como muchos recintos de la ciudad, sin vida. Así fue como dimos con alguien que pudiera tener este transmisor, y como siempre, hay locos igual a nosotros y como el dicho dice: “Dios los hace y ellos se juntan”, se aplico en nosotros, un chico llamado Emiliano tenía un transmisor en desuso y después de comenzar a conversar con él, se logro la primera fase de la estación de radio a la par de un taller de radio comunitaria donde los asiduos a éste, se les daban las primeras bases para poder hacer radio y guión. Con esa misma idea comenzamos la construcción de una revista llamada caja de salitre, que fue el antecedente de la revista actual llamada BITACORA09, esta tendría que mostrar todo lo que se hacia FARO, los talleres, y la comunidad; hecha por ellos, donde talleres como el de poesía, de periodismo comunitario, dieran salida a todas sus inquietudes, contando desde los conciertos, las historias que ahí fluían y que solo debían tener un mecanismo: “El de expresar sin temor algunos sus inquietudes”. Lo más difícil era el cómo realizar un medio de esta magnitud sin ningún presupuesto y más aún, que pudiera ser gratuito para el público. Es en ese momento cuando las necesidades nos enseñan que toda complicación trae de tras una gran oportunidad; fue el antecedente para aprender cuestiones de patrocinadores que emplearíamos años más tarde. Con estos ensayos y errores nos dimos cuenta que el FARO de Oriente tenía todo un proyectote para poder logra el apoyo de algunas empresas,, es así que Convertimos las necesidades en oportunidades. tocando puertas

Es importante tener definido los principios de nuestra institución y que empresas pueden ser las idóneas para generar vínculos de colaboración.

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Desarrollar programas y proyectos sociales -culturales que ayuden a la realización de estos proyectos. Las empresa y las marcas siempre van a tener un gran necesidad, la de llegar siempre a todo público posible. Aprovechar este tipo de necesidades es muy importante, ya que los centros culturales son una gran oportunidad para acaparar este mercado, siempre teniendo muy en claro que los principios e ideales culturales no se transgredan. Es importante sensibilizar a las empresas de lo importancia que se tiene al apoyar este tipo de causas y más aún, el impacto y posicionamiento que le dará más allá de los productos y servicio que ofrece. alianzas estratégicas

Este tipo de actividades se desarrollan entres instituciones que ayudan a la difusión y posicionamiento del FARO, generando un vínculo de apoyo entre estas instancias, los recursos de difusión son pocos es por eso que a través de estos apoyos se pueden generar campañas de difusión masivas, por su parte las empresas que apoyan esto, se sensibilizan por el proyecto y a su ves se ven beneficiados al tener preencia o desarrollar programas de apoyo a la comunidad en nombre de su empresa. Formar identidad a través de estrategias de Marketing.Visualizar a nuestra institución como un empresa generadora de cultura, donde se tiene productos y servicios, y nuestros clientes principales es la comunidad. A través de esta lógica se generan alianzas con distintas empresas que aportan recursos necesarios para el desarrollo de los proyectos. relato del caso

En el FARO ponderamos la recuperación del Espacio Público a través de tender puentes entre la comunidad cultural y la vecinal, desde la conceptualización de cualquier concierto, exposición, proyección de película, lectura en voz alta, presentación artística, etc., promovemos la creación de una sociedad más igualitaria, más equitativa, más justa, en donde cada persona asistente a nuestras instalaciones sienta suyo el espacio, tenga confianza en si mismo y en su labor creativa, que crea que el solo hecho de estar ahí está modificando su entorno, a su comunidad, a su familia para bien. Nuestra experiencia nos dice que la cultura puede incidir en la transformación del entorno social y económico, recuperando el espacio público que rodea a nuestra comunidad, pero no partiendo del concepto de la alta cultura selectiva, sólo para unos cuantos, sino, en la riqueza de la diversidad cultural de las diferentes tribus urbanas conviviendo con nuestros niños, abuelos, amas de casa, obreros, madres solteras. Hoy la comunidad es la máxima autoridad de nuestro espacio, ellos nos indican el camino, nos abren brecha, caminan codo a codo con cada promotor cultural, con cada tallerista, con cada colectivo artístico y cultural

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que asiste a nuestro espacio, la comunidad es también nuestro principal aliado, la fuerza vital con la que se nutre el FARO. Ahí es en donde está la fortaleza del espacio público, en llenarlo de vida, a través de una oferta cultural que permita el acceso gratuito a la población que nos circunvecina, que son los sectores que a través de los años han sido marginados de ella. Creando nuevos públicos, que despierten el sentido de identidad y pertenencia a su comunidad. Es gratificante ver como los conciertos masivos de más de 20,000 jóvenes han pasado a ser parte de la memoria colectiva de nuestra comunidad, en donde al termino de cada concierto o evento en el FARO, la secretaria de seguridad pública que en muchas ocasiones nos ha dejado solos a pesar de nuestras peticiones de ayuda de brindar seguridad en las inmediaciones del FARO, aunque claro nunca les hemos pedido ni pediremos que estén dentro de nuestras instalaciones en los grandes eventos por que muchas veces más que una ayuda son un elemento de provocación hacia los jóvenes siempre contestatarios, a pesar de eso, ellos mismos se sorprenden al reporta cero violencia, cero robo a comercios o transeúntes, la gente se va con tranquilidad y seguridad a sus casas después de estar todo un día disfrutando de las actividades en el FARO. Para nosotros cada concierto masivo es una aventura compartida por todo el equipo que opera el espacio, por la gente de servicio social y los brigadas de paz, todos voluntarios, alumnos del lugar y vecinos de la zona, conformados sobre todo de amas de casa y padres de familia, antes y durante los conciertos la adrenalina fluye, pues el más mínimo error pudiera causar la renuncia de todos los que operamos el FARO, pero el alma nos regresa al cuerpo cuando vemos llegar las diferentes tribus urbanas, en una actitud propositiva, de respeto hacia el espacio, lo sienten suyo porque se identifican con él, es su territorio, el lugar para su ritual de purificación, se han apropiado de él, con respeto y por admiración, y el FARO les responde tratándolos bien, asistiéndolos, compartiendo con ellos de igual a igual, sin prepotencia, con tacto, siempre en actitud amable, al fin y al cabo por ellos estamos ahí, por ellos hacemos todo eso. Así, en medio de este contexto tenemos que crear, generar, gestionar y operar una oferta cultural, plural, diversa, tolerante e incluyente. Esto lo hacemos a través de la Coordinación de Servicios Culturales cuyo principal objetivo es generar y promover servicios culturales en beneficio de la comunidad del oriente de la ciudad, que difícilmente tiene acceso a la oferta cultural que se genera en el centro, sur y el poniente de esta Ciudad. Buscamos formar públicos, despertar y ampliar las posibilidades del disfrute estético. Ofreciendo un foro abierto a diversas propuestas de artistas y colectivos independientes que a pesar de realizar un trabajo serio, carecen de espacios para darlo a conocer.

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En estos ya 10 años de vida que tiene nuestro espacio, se está dando un fenómeno interesante en nuestros alumnos, se están agrupando de nuevo, pero ya no en la pandilla de la esquina, sino en colectivos artísticos, creando una nueva forma de acompañarse en su renovada vida cultural. Organizados de esta manera son capaces de tomar hasta el Zócalo de la Ciudad de México, con esqueletos monumentales de 11 mtrs., el juego de pelota prehispánico, las diversas noches de los alebrijes. Estas acciones están pensadas en retejer el delgado hilo social tan devastado en nuestro entorno, además de fortalecer los lazos familiares; con ello se aumenta el sentimiento de autoestima e identidad. Pero sobre todo han aprendido a vivir de lo que aprendieron en los talleres del FARO. Sin saberlo se han convertido en industrias culturales potenciales, el futuro del FARO pasa porque se convierta en una enorme industria cultural independiente, por ello hace dos años ante la sobrepoblación que la nave principal tenia se inauguro nuestra nueva nave industrial la cual ha permitido ampliar los espacios de trabajo para los diversos talleres de producción y los colectivos independientes que trabajan dentro de él. acciones y resultados

Cada acción emprendida desde el FARO en beneficio de su comunidad a sido acogida de diversas maneras por la comunidad del mismo espacio, a 10 años de conformado el mismo, las dinámicas de trabajo se han multiplicado y dinamizado semana a semana, se cuenta con un plan de acción general como principio básico en cada coordinación de acuerdo a los intereses de la población del FARO pero este plan de acción es flexible de acuerdo a los nuevos intereses y gustos de esta comunidad variando y ampliando las posibilidades de acción del espacio, generando nuevos talleres, exposiciones, conciertos o festivales que satisfagan las necesidades del lugar, si en un principio el FARO solo buscaba ser un modelo de atención juvenil que a la postre se convirtió en un modelo integral para todo tipo de públicos en la actualidad por el mismo sistema metodológico empleado se a ha convertido poco a poco en un nuevo semillero de alternativas artísticas jóvenes y comunitarias lo que le ha llevado a promover e impulsar los proyectos individuales, de diversos colectivos y agrupaciones artísticas que se han formado dentro del FARO y que actualmente siguen trabajando dentro del espacio en beneficio del mismo y apoyando la generación de industrias culturales auto sustentables que permitirán a la larga una mayor proyección del espacio y sus alumnos en los ámbitos culturales y artísticos nacionales e internacionales. Y que en este momento han rendido frutos con la presencia del FARO, sus colectivos o alumnos tanto niños, jóvenes y adultos en diversas experiencias artísticas fuera del país como a sido la presencia de estos o de sus obras, en lugares como la ciudad de Marsella, Nagoya, Boston, Berlín, Bogota, Barcelona, la Provincia de Quebec y en diversas ciudades y festivales del interior del país, así mismo a recibido el premio Coming up taller 2002 otorgado por el comité de arte de Norteamérica por ser

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el mejor proyecto cultural en zonas marginales en América, así como el reconocimiento conjunto de parte del Museo de ciencias de Boston, el Tecnológico de Massachussets (MIT) a través de su media lab y la empresa Intel con la creación y puesta en marcha de un Clubhouse Computer Center dentro de nuestras instalaciones el cual forma parte de una red de mas de 120 clubs con presencia en 21 países, todos estos logros son reflejo del constante trabajo cultural que el FARO realiza en una de las zonas mas marginadas de la Ciudad de México. reflexiones

Desde sus inicios y en la actualidad el FARO de oriente a buscado y busca dar una alternativa de oferta cultural acorde a la demanda de una población que por lo regular a sido menospreciada en cuanto a su desarrollo artístico y que por el contrario, en este espacio a encontrado una vertiente para canalizar sus emociones y dar pie al desarrollo pleno de su creatividad con la conformación de colectivos de diversa índole como cartoneros, agrupaciones musicales, compañías de teatro y danza, colectivos de artes visuales, literatos, fotógrafos entre otros, en los cuales participan niños, jóvenes y adultos, hombres y mujeres, sin distinción de genero, buscando siempre entre ellos la igualdad y el desarrollo pleno en las artes y la cultura, desarrollando trabajos serios y profesionales que buscan caminos, espacios, foros donde presentarse, diversos alumnos ahora ya adolecentes que han pasado por el FARO a raíz de su experiencia en este espacio en uno o varios talleres cursados a través de los años buscan su profesionalización artística en las escuelas oficiales, claro sin descuidar su propia educación y el seguimiento de las opciones que el FARO les sigue ofreciendo y que aun ellos valoran sobre manera, por el arraigo y el sentimiento de pertenecía que ellos han generado hacia el mismo, ya que lo sienten suyo. En el FARO la búsqueda de nuevos métodos de atención derivados de sus propias necesidades son constantes, la generación y visión primaria solo de formar públicos para las artes está siendo rebasada por la generación de jóvenes talentos y de proyectos propiciados por la educación del mismo espacio, los cuales se vuelven cada vez más ambiciosos e interesantes por parte de los alumnos tanto infantiles como juveniles y adultos que han despertado de un letargo cultural y artístico, que buscan darse a notar y generar la identidad propia del oriente de nuestra Ciudad, dejar de lado ante los medios de comunicación y la sociedad la mala imagen de esta zona, para buscar el rostro amable, social, cultural y creador del mismo, actualmente se busca que estos proyectos emanados del propio espacio y particularmente de los talleres tengan cabida en otros sitios, que los financiamientos públicos y privados, gubernamentales, institucionales y civiles en materia cultural y artística vuelquen sus ojos y sus recursos hacia las producciones artísticas que en el FARO surgen día a día, aunque el proceso en si es lento, acceder a diversas convocatorias o becas de financiamiento es complicado, por un lado la falta de talleres o cursos de generación de proyectos escritos a sido poco recurrente en el espacio, por lo cual se busca propiciar este tipo de acciones, dar asesorías prácticamente individuales o colectivas

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según sean los casos, se busca que no solo los diversos colectivos se profesionalicen en las cuestiones prácticas si no también que en materia teórica y escrita puedan sustentar sus propuestas, para que estas en sí mismas accedan a diversos fondos y recursos monetarios para el mejor desarrollo de estos, tanto de colectivos, agrupaciones artísticas o talentos individuales. Las opciones que en materia de espacios culturales que ofrece la Ciudad y el país para el FARO a raíz de los años empiezan a ser por demás interesantes y abundantes, pero en muchos casos aun quedan de lado debido a los requisitos de auto sustentabilidad que se requieren no tanto en cuestión de calidad de las propuestas que pueden presentarse, sino en relación a los financiamientos con los que se cuentan para solventar los gastos mínimos que una presentación o exposición implican, los recursos gubernamentales que se ofrecen para tales fines son mínimos o escasos por no decir que nulos en la mayoría de los casos, al parecer estos solo están destinados a cubrir superproducciones o exposiciones de renombrados artistas o agrupaciones que en algunos de los casos carecen de un real beneficio cultural y artístico para la sociedad y nuestro entorno, y que solo generan el recuerdo por el impacto espectacular, mediato y mediático de dicho acto, pero que a la larga solo es eso un recuerdo más de un acontecimiento en el cual los recursos públicos se emplearon con grandes costos sociales y sin beneficio primario y secundario. Las opciones con la iniciativa privada en algunos de los casos han sido exitosos como es el actual caso de la exposición realizada con el apoyo del Museo Soumaya, en otros tantos se cree que por ser el FARO parte de la Secretaria de Cultura de la Ciudad de México no necesita de este tipo de apoyos monetarios o materiales, por lo cual en ciertas ocasiones el buscar o conseguir recursos de todo tipo nos obliga a redoblar o triplicar esfuerzos por parte de gestores, promotores, talleristas y alumnos del FARO, siempre buscando el objetivo común de hacer que el espacio y sus usuarios cuenten con las mejores condiciones para acceder a los apoyos con los que iniciativa privada pueda proporcionar.

damos dar en conjunto, reflexiones y posibles soluciones a las series de problemáticas que el arte y la cultura pueden aminorar en beneficio del desarrollo potencial del ser humano. impacto social

El FARO es un ente social desde la cultura el cual ha cumplido la misión de reconstruir el tejido social en una zona altamente conflictiva y marginada, tendiendo nuevos puentes entre la sociedad civil y el gobierno, que a partir de la cultura y este proyecto a apostado a dar una alternativa de vida a miles de personas que han pasado por sus instalaciones. Actualmente la zona oriente de la Ciudad y su área metropolitana cercana a la que el FARO se ubica, a sufrido una seria modificación cultural y artística, en sus inicios el FARO se encontraba prácticamente solo brindando atención cultural en la zona, al paso de los años los centros culturales que se han conformado en los alrededores se ha multiplicado favorablemente, así como también la recuperación de espacios públicos para la convivencia diaria ha ido en aumento, nuevos FARO´s, centros culturales, plazas publicas, jardines, zonas infantiles y festivales culturales han surgido en el Oriente, dando significado a aquel primer slogan del FARO “Una luz nace en el Oriente” y que hoy esa luz a sido motivo para que otras muchas se prendan en beneficio de la cultura y el arte en esa zona y en otros puntos de la capital y el oriente del estado de México Para concluir, resulta gratificante para el espíritu saber que existen en este país y en muchos otros esfuerzos que defienden la pluralidad, la diversidad, la tolerancia y el desarrollo de proyectos comunitarios artísticos, culturales y de educación artística que son los principios que han dado vida al FARO, hoy sabemos que no estamos solos y que cada día se suman a este esfuerzo nuevos socios y cómplices culturales nacionales e internacionales, gubernamentales, de la sociedad civil y la iniciativa privada, que hermanados con nuestro espacio y nuestra comunidad caminan con cada uno de los proyectos del FARO de la mano para propiciar nuevos encuentros, festivales, talleres, exposiciones, conciertos y espectáculos, para que el publico de la zona Oriente de la Ciudad se sume de manera igualitaria en materia cultural a las demás zonas de esta metrópoli.

Por otro lado desde el FARO consideramos que el desarrollo de proyectos similares como ya son los casos de los FARO’s surgidos en la misma Ciudad en Milpa Alta, Tlahuac y recientemente en Indios Verdes y por otro lado el ahora casi extinto FARO del Viento en el municipio de Ecatepec en el Estado de México, deben de estar enmarcado en el contexto social y particular donde se ubiquen, buscando no solo una cuestión artística si no ser un modelo de atención comunitario desde el ámbito cultural, en el cual todas las manifestaciones artísticas que beneficien a la comunidad tienen que tener un reflejo de su accionar para dar nuevas vertientes del quehacer cultural y comunitario en su sociedad, dar apertura al desarrollo de niños, jóvenes y adultos en un ambiente creativo y propositivo en el cual el arte y la cultura estén a la par los problemas mas inmediatos que a quejan a esa población, para que desde esta nuestra trinchera, po-

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retos de los espacios

Manejo de la información, se retroalimenta, actitud frente al conocimientos y los saberes, darle cabida a nuevos formatos y lenguajes, la vinculación con el mundo del conocimiento, toma prioridad la información, la educación a la luz de las nuevas competencias que son más interpretativas. Se tienen unos saberes previos y se ordenan y confrontan con los medios de comunicación y las nuevas tecnologías. La multiculturalidad gana sus espacios, la lectura debe ser más comprensiva, la preocupación es más por el hacer que por el ser, el ser en el nuevo paradigma.

glo ria inés Convidado: gloria inés

Otro de los retos es cómo afrontar la comunicación pública, cómo hacer cada vez espacios innovadores, el crecimiento del lenguaje y las mayores oportunidades de entender. El proyecto de Medellín en toda su integridad, además de tener presente lo anterior y muchos otros elementos, centró su interés en superar la exclusión como factor de pobreza, inequidad, aislamiento, seguridad, con el propósito de crear ciudadanos y ciudadanía. Igualmente de hacer que los bienes públicos sean considerados, tratados, manejados y soportados como bienes sociales. Todo ello dentro de un marco que es lograr transformación por medio de la educación; se ha trabajado tan bien en una nueva forma de gobernar lo público y lo privado, haciendo procesos de ciudad y de responsabilidad, se ha logrado que lo público sea más propio, creando sociedad se crea entendimiento, objetivos comunes, cooperación, se hace la búsqueda de un interés público común.

Diretora da Biblioteca Pública Piloto de Medellín para América Latina Medellín – Colômbia

El espacio como experiencia: repertorio y gestión Alcaldía de Medellín se basó en la educación. Por ello la ciudad se ha proclamado como “Medellín la más Educada”. Esta prioridad ha logrado una transformación de la comunidad en lo social, lo polítiproyección nacional e internacional y en bano; se pasó del miedo a la esperanza. De este proyecto, hace parte el Plan de Bibliotecas, que consiste en desarrollar

los espacios culturales en medellín.

¿qué son?

Son espacios físicos, imaginarios, construcciones sociales, redes temáticas o de interés. Son espacios de encuentro y para el encuentro para construir desarrollo humano, ciudadanía, comprensión, conocimiento,

136 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - Glória Inês

organización institucional

La propuesta como señalé fue política y alrededor de ella se sumaron todos los otros intereses. Se ha tenido como línea la corresponsabilidad, la cooperación y hoy se tiene una nueva meta de región: Metrópolis sostenible en lo social, económico… El modelo es el desarrollo social incluyente, articulación de procesos, tejer lo público y lo privado, competitividad, pero con cohesión social, gestión conjunta del territorio. El estado debe generar las condiciones y ello es lo que se ha hecho; se han creado nuevas centralidades, se ha corrido el velo de los sectores en desventaja, se ha puesto el recurso donde según estudios para cumplir las metas del milenio se deben hacer las inversiones. Todo ello ha sido basado en principios, se ha creado proximidad, se hacen accesibles los espacios y los recursos.

nuevos espacios de encuentro, educación, formación y recreación; se incrementó en servicios y recursos con la construcción y puesta en operación de cinco Parques Biblioteca y cuatro que están en construcción.

La relación con la sociedad civil se ha hecho de otra manera y lo cultural y lo educativo se ha vinculado a lo político y lo económico. El proceso de transformación de Medellín tiene características políticas, económica, educativas, sociales y la sociedad es su actor, pero lo es también los actores productivos y económicos. Para ello se han tenido que generar espacios para procesos institucionales o formales que satisfagan y desarrollen nuevas maneras de pensar y de hacer.

características programáticas de gestión,

co, lo económico, en la seguridad, en la

estrategias que permitan la apertura de

La contemporaneidad nos exige enfrentarnos a nuestra propia realidad y así determinar nuestros propios espacios y reconocer nuestras propias riquezas y fortalezas para avanzar y también como desafío influenciar para transformar apoyados en la fuerza que tiene lo propio; siempre con autonomía e independencia.

Haciendo una mirada desde lo construido y en el marco de los desafíos de la contemporaneidad. En estos espacios se encuentran diferentes edades, generaciones, mundos, disciplinas, velocidades de desarrollo, acercamientos por medios de comunicación, desequilibrios sociales, pero con una intensión que es la equidad, la inclusión, las nuevas formas educativas y fortaleciendo la institucionalidad; de manera concreta se propicia la producción de conocimiento para avanzar e incidir en la transformación social.

El proyecto político y administrativo de la

la integración social y el desarrollo ur-

Los espacios culturales, no sólo se limitan a lo físico, está gobernado por la expresión espiritual, es un espacio público que tiene limitaciones políticas, religiosas o sociales.

saberes, para proyectar, para alimentarse y retroalimentarse, entre estos tenemos: PUI, las Bibliotecas, los colegios, las ludotecas. Son espacios pensados para corresponder con todo el ciclo de vida con énfasis en los niños y los jóvenes.

Los espacios culturales han permitido que la gente reflexiones y se hagan preguntas y se formulen propuestas colectivas. El modelo de asignación de presupuesto participativo es otro de los ejes de sostenibilidad. La sostenibilidad financiera está a la par de la social, por ello en este escenario se cuenta con cooperación, legitimidad, liderazgo, participación, procesos educativos, apropiación, correspondencia con contexto y con propósitos de ciudad y de región. En todo ello es determinante la conformación de los grupos sociales que tienen necesidades y demandas, pero también ofertas desde los gobiernos y los sectores productivos. Algunos ejemplos: redes, mesas de trabajo, etc. Los espacios que se han conformado son de interacción humana, con propósitos definidos, con una cultura organizacional propia (una gran creación) y situados en sectores que aprenden. Veremos a continuación un vídeo y una presentación de imágenes de estos espacios.

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parques biblioteca

Son espacios culturales para la convivencia que promueven la inclusión social y la participación de la comunidad dentro de espacios físicos confiables con la infraestructura requerida para la ejecución de programas y proyectos de ciencia, cultura, entretenimiento, diversión, nuevas tecnologías y principalmente el fomento del respeto hacia las ideas y opiniones de los otros. los principios orientadores tienen como finalidad

Trabajar por una mayor equidad e inclusión social de las poblaciones de sus áreas de influencia, facilitando su acceso a los diferentes programas y proyectos y contribuir a mejorar las condiciones de la cultura ciudadana para la convivencia y el reconocimiento de las diversidades culturales. También Aportar elementos de información y conocimientos para acceder a mejores condiciones de calidad de vida y desarrollo humano Se trata de un proyecto novedoso que genera espacios culturales con un concepto integrador de servicios: Parque, biblioteca; centro de información, de proyección cultural, de emprendimiento, etc. y que se desarrolla dentro de las siguientes líneas programáticas: Desarrollo humano sostenible. Diversidad cultural. Dimensión social del conocimiento, la información y la lectura. Plataforma tecnológica y conectividad. Participación ciudadana y comunitaria. Comunicación para el desarrollo y trabajo en red. Emprendimiento de las comunidades.

maría del valle Convidado:

Muchas gracias a todos los que han hecho posible este encuentro y a todos los asistentes. Es un placer compartir esta mesa con los profesionales de Colombia y Méjico que nos presentan unos proyectos tan interesantes, con una gran vitalidad y fuerza que producen un impacto enorme en las comunidades donde operan, que es al fin y al cabo lo que todos los proyectos culturales deben perseguir; por esto me parece muy acertado el uso del concepto de experiencia de la cultura y, por consiguiente el espacio. El espacio receptor de contenidos culturales, ha de presentarse al público, a los beneficiarios, en fin a todos los implicados como una experiencia en si mismo.

maría del valle Diretora do Centro de Creación de Las Artes de Alcorcón. Alcorcón – Espanha

Nadie discute ya que la cultura es un motor de desarrollo, que el sector cultural genera y de una forma u otra mejora la calidad de vida de los ciudadanos. Y esto es así también en aquellas localidades y ciudades que podemos considerar desarrolladas. Se trata además de un sector con muchas externalidades positivas, su dinamismo, su carácter participativo, su nada desdeñable aportación al PIB nacional, contribución a la creación de empleo. En este sentido son numerosos estudios sobre el impacto de la cultura y de las cuentas satélites que dan cuenta del dinamismo y la aportación del sector cultural a las cuentas nacionales. Es interesante por tanto tomar en consideración algunos ejemplos de políticas donde la apuesta por la cultura ha sido uno de los ejes de desarrollo de un municipio como Alcorcón en el sur de Madrid, tal y como explicaré de forma breve. Si hace algunos años los profesionales de la gestión cultural reclamábamos con insistencia la consideración de la cultura como un sector productivo más, hoy la situación y el contexto en que vivimos son otros muy distintos, la industrialización y mercantilización de la cultura (quizás de una manera especial del arte contemporáneo) ha puesto también de manifiestos sus más perversas consecuencias. Las ferias de arte, bienales, los “mercados” de las artes escénicas se multiplican, y nos han abocado a la proyección de la producción casi exclusivamente hacia el mercado. Ahora todo parece estar marcado por las lógicas del mercado y aunque esto en sí mismo no sea pernicioso, al contrario, en el sector cultural como veremos, sería recomendable adoptar algunas prácticas del sector industrial que podrían tener beneficios para las industrias culturales y creativas; si creo que estamos en un momento idóneo para hacer algunas reflexiones, pensar hacia donde vamos en un contexto donde vivimos de alguna forma bajo la presión del consumo y también en consecuencia en el consumo masivo de la cultura. Expuestas estas críticas creo de todos modos que la cultura, el arte, el conocimiento tienen sin ninguna duda el poder de sacar lo mejor de nosotros mismos. ¿Cuál es el contexto en que nos encontramos? Contamos con equipamientos culturales de máxima calidad, y la mayoría de éstos son iniciativas impulsadas por las administraciones públicas, pero que apenas

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nuestros sistemas de gestión, no lo es menos que hemos permanecido al margen y de espaldas a procesos que pueden ser útiles en la gestión de espacios culturales.

pueden sostener y demandan nuevas formas de gestión. ¿Cómo llegamos a un equilibrio? Un equilibrio entre el servicio público que para cumplir sus metas requiere de una gran apuesta por la educación y la formación, no sólo en las audiencias el público para quienes trabajamos, sino en los artistas y creadores y en los profesionales del sector cultural, y la necesidad de atraer al sector privado para lograr la sostenibilidad de estos proyectos.

Sin que el objetivo último sea la obtención de un determinado sello o certificado de calidad²⁸ si podemos tener en consideración algunos aspectos extraídos de diferentes modelos o planes de gestión de calidad. Es frecuente en cultura hablar de calidad para referirnos sólo a los contenidos (el nivel de ejecución en las artes escénicas por ejemplo), pero la gestión de la calidad debe encontrarse en todos los puntos y momentos de la cadena.

En los últimos años han proliferado en España los espacios culturales. De los tradicionales museos, teatros y auditorios localizados en las grandes ciudades, hemos pasado a un mapa donde existe una variada tipología de centros culturales en la totalidad del territorio, la novedad es que ahora existe cierta descentralización y encontramos propuestas y alternativas prácticamente en todas las ciudades medianas situadas en las periferias.

►El desarrollo de la misión, visión y valores, y la forma en que se logra, el compromiso ético, la política y la estrategia.

Se hace necesario sin embargo hacer algunas reflexiones ante este fenómeno: el nacimiento y la iniciativa fruto más de una voluntad política de mostrar quien tiene el centro más moderno, más grande y con contenido más contemporáneo y vanguardista, que de una necesidad o una demanda ciudadana constatada. Nos encontramos en un momento incierto con unas infraestructuras y unos modelos a veces contradictorios. El propio concepto de contemporaneidad está en opinión de muchos devaluándose. Por otra parte nos encontramos en estos momentos en una situación económicamente complicada con recortes presupuestarios de las administraciones que en el sector cultural son en muchos casos dramáticos y esto ocurre en países donde la cultura tiene una dependencia del sector público enorme. A pesar de esta situación, pienso que no es una locura sostener que precisamente el sector creativo es sin duda uno de los pilares en los que debe asentarse una nueva economía y un nuevo sistema productivo. Desde diferentes estamentos como el Consejo Europeo ya se pone de manifiesto el potencial de la cultura en tanto que catalizador de la creatividad y la innovación para el crecimiento y el empleo y lo que es muy importante, la necesidad de reforzar el vínculo entre la formación, la educación y las industrias culturales y creativas.

►En las estrategias a medio y largo plazo enfocadas en los actores o agentes (stakeholders), en sus necesidades y expectativas. Las relaciones de la organización con las personas que la constituyen, y establecimiento de alianzas y complicidades con los proveedores. ►En la gestión de procesos: - Diseño y gestión - Mejora continua, medición y análisis de la misma. - Desarrollo de productos y servicios - Relaciones con los “clientes”, percepciones (utilidad, uso, relación con organizaciones); indicadores (satisfacción, objetividad, calidad, número de reclamaciones, etc.) ►Cumplimiento y responsabilidades de la organización: resultados - Con la sociedad: medida de las percepciones • Indicadores: impacto (nivel de empleo, contribución a la comunidad) ²⁸ Modelos ISO 9001, UNE 165011

- Con el personal: percepciones subjetivas • Indicadores: absentismo, formación, participación.

algunas consideraciones sobre la gestión

Como decía en el contexto actual sería deseable en mi opinión, tomar en consideración en la gestión de los nuevos espacios culturales una dimensión social y de función pública por un lado y, por otro, una clara integración del sector cultural con el sector industrial. En el proceso de pensar y proponer el plan para el centro me he encontrado con algunas cuestiones interesantes, como considerar la incorporación, probablemente con matices, de algunos conceptos utilizados en el sector privado empresarial, como pueden ser los procesos de control de calidad y benchmarking aplicados al sector cultural. Decía que estábamos inmersos en una producción totalmente dirigida al mercado y sin embargo en la mayoría de los casos no hemos utilizado las herramientas existentes en ese entorno. Si bien es cierto que no toda lógica es siempre aplicable a

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- Con los clientes: percepciones sobre utilidad, uso de las instalaciones. • Indicadores: satisfacción, calidad, número de reclamaciones.

►Rendimiento: cumplimiento de metas y objetivos

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En cuanto al benchamarking en el sector de la cultura hay muy poca documentación, por lo que su aplicación a la gestión de espacios culturales constituye un campo relativamente nuevo. Bechamarking consiste en aquel método sistemático y continuo que consiste en identificar, aprender e implantar aquellas prácticas y capacidades más efectivas en otros centros u organizaciones para así mejorar las propias actuaciones en materia de oferta o contenidos culturales, y también prácticas de gestión.

La gestión del futuro centro cultural que espera abrir sus puertas el último trimestre del próximo año se ha encomendado a una fundación creada al efecto, esta organización con personalidad jurídica independiente de la municipalidad favorece la gestión autónoma y la capacidad de generar recursos propios mediante donaciones, convenios, la recaudación procedente de la taquilla y la explotación comercial de los espacios mediante alquileres, la organización de ferias y congresos, así como las concesiones de tienda y el restaurante y cafetería.

¿Por qué benchmarking? Con el objetivo de ser el mejor entre los mejores, es básico dar importancia al aprendizaje exterior y tender o formar redes activas con el objetivo de intercambiar información entre el sector privado, organizaciones del sector público, el tercer sector y la academia.²⁹

Tener el privilegio de participar en un proyecto de nueva creación, exige precisamente entre otras cosas, estudiar estos otros modelos ya existentes y extraer aquellas prácticas que pueden ser transferibles y aplicables. Entre estos son muy interesantes las propuestas holandesas en ciudades medianas por el equilibrio del que hablábamos entre el contenido más convencional, y el más atrevido y arriesgado; en la atracción de públicos de lo más diversos y un balance entre el rendimiento y explotación comercial y el servicio público a través de las artes escénicas.

El estudio de las instituciones con mejores prácticas para mejorar los propios resultados surge como medio para la búsqueda de una situación ventajosa. En este proceso resulta prioritario tener un conocimiento amplio de uno mismo y de los superiores de su “clase” y determinar mecanismos de transferencia de las mejores prácticas. Benchamarking y búsqueda de las mejores prácticas resultan sinónimos.

La propia configuración del espacio ya determina y condiciona en algunos casos tanto el modelo de gestión como la programación de contenidos. En este sentido de los 58.000 metros cuadrados de equipamiento en el CREAA casi la mitad está destinada a espacios de formación, con escuela de circo, de danza, música y teatro. A esto se une la ubicación del Centro de Tecnología del Espectáculo (CTE) unidad dependiente del Instituto Nacional de las Artes Escénicas y Música (INAEM) del Ministerio de Cultura de España que forma a técnicos de las artes escénicas (sonido, iluminación, maquinaria, escenografía, etc.)

Hasta ahora la entrada del benchmarking en el sector público (y como consecuencia el sector cultural fundamentalmente sustentado por el sector público) es prácticamente nulo, en este sentido coincide como hemos visto con la lenta introducción de técnicas de gestión de calidad. Por último otro de los retos a los que nos enfrentamos es el desarrollo de audiencias, ante tanta oferta y tantas propuestas ya no sólo basta la diferenciación en los contenidos y la calidad que se da por supuesta, la fidelización del público y el dominio en la utilización de métodos de comunicación cada vez más sofisticados se hace esencial.

La firme apuesta por la formación y la enseñanza y el refuerzo del aspecto de innovación y el desarrollo de la creatividad está en la esencia de nuestro proyecto. El proceso de convergencia al Espacio Europeo de Educación Superior es inexorable, en éste el reconocimiento de las enseñanzas artísticas de grado superior se producirá de forma inevitable; algo semejante ocurrirá con la formación profesional que está en un momento muy interesante de cambio. Todo esto nos obliga a lograr que la reforma de las enseñanzas artísticas que defendemos evolucione a una fase de productividad en la investigación. En un momento en que todo o está por definir o está definiéndose, como el plan del I+D cultural que genere un capital cultural también por definir, posicionarse en este momento específico en la línea de salida, así como formar parte de los círculos de toma de decisiones nos proporcionará una situación de ventaja competitiva que debemos aprovechar.

CREAA (centro de creación de las artes de alcorcón) El proyecto de crear un equipamiento cultural en terrenos dotacionales del Ayuntamiento estaba en el proyecto estratégico de la ciudad del año 1999, con una estrategia de invertir la plusvalías obtenidas del desarrollo urbanístico en equipamientos culturales se ha conseguido financiar la construcción de un equipamiento cultural que impresiona. El proyecto arquitectónico fue el resultado de un concurso resuelto a favor del estudio de los jóvenes arquitectos madrileños Camacho & Bustamante, varios edificios que entre sus principales características están la integración de las cubiertas verdes transitables para su incorporación al parque anexo, y la posible utilización bien de forma aislada, bien de forma simultánea de los tres espacios escénicos, un auditorio con un aforo de 1,400 espectadores; una sala configurable de 400 y una sala estable de circo de 600. Zonas comerciales de restauración, tienda y espacios especialmente dotados para congresos, conferencias o ferias y por último el espacio destinado a aulas y espacios para la formación.

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²⁹ Robert C. Camp. Benchamarking the Search for Industry Best Practices that Load to Superior Performances. ASQC Industry Press. Milwakee, WI, 1989

Junto con la formación y la investigación y como consecuencia de ésta, el apoyo a la creación es otro de los pilares en los que se sustenta nuestro proyecto, esperamos acompañar a los artistas y creadores en el proceso de desarrollo de sus iniciativas, en la superación de los obstáculos con el objetivo final de la comunicación y presentación al público.

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referencias y recursos

SINERGIAS ENTRE EDUCACIÓN Y CULTURA

Está en la vocación del CREAA favorecer la interacción entre las distintas disciplinas artísticas y creativas (los subsectores), así como la relación entre el ámbito económico, y la intervención en todos los puntos de la cadena de producción.

http://ec.europa.eu/culture/our-policydevelopment/doc2240_en.htm. Las buenas prácticas determinadas por estos grupos se mencionan en notas a pie de página en diferentes partes del documento. «A Creative Economy Green Paper for the Nordic Region» (Consejo Nórdico,2007),

Hay que destacar la importancia y la necesidad de los procesos de coproducción y colaboración entre organizaciones y la cooperación y el intercambio internacional, importancia por el enriquecimiento que supone, y necesidad por las dificultades que en la financiación encontramos todos los gestores culturales. Por esto una vez más incido en la importancia de este tipo de encuentros internacionales, y todas aquellas actividades de “networking” donde se producen relaciones que pueden dar lugar en algunos casos a interesantes proyectos comunes y sobre todo a establecer complicidades fundamentadas en objetivos compartidos.

«Creative Britain – New Talents for the New Economy» (Reino Unido, 2008), «Cre-

Aunque empezábamos estas líneas de alguna forma demonizando el mercado, es obvio que no se puede vivir al margen de éste, por ello es otro de los objetivos del CREAA impulsar la búsqueda de espacios compartidos de encuentro y mutuo beneficio entre el ámbito empresarial e industrial y el sector creativo. Hemos de encontrar nuevos modelos de colaboración con el sector privado, en este sentido creo que debemos superar el modelo tradicional de patrocinio o esponsorización y nuevamente volvemos a las relaciones de complicidad, en este caso con el sector privado. Perseguimos que la empresa se involucre en proyectos de innovación y desarrollo en el sector cultural.

www.rotterdamseschouwburg.nl

ativeValue – Culture and Economy Policy Paper» (Países Bajos, 2009) y «Potential of Creative Industries in Estonia» (2009). http://www.create2009.europa.eu/ambassadors.html

CENTROS CULTURALES DE REFERÊNCIA HOLANDA

http://www.theaterstilburg.nl www.fontys.nl http://www.chasse.nl www.deberenkuil.nl www.yo-opera.nl GRAN BRETAÑA

www.roundhouse.org.uk www.bac.org.uk www.barbican.org.uk

Por último entre las otras líneas de trabajo ajenas o no tanto, a la cultura está la explotación comercial de los espacios, restaurante, café, tienda, alquileres que ayudarán a la sostenibilidad financiera del centro.

USA

www.bam.org (Brooklyn Academy of Music) www.ybca.org (Yerbabuena Cultural Center, CA)

En definitiva, no renunciamos a explorar y aplicar todos aquellos medios y vías de posible financiación que ayuden a la consecución de los fines y objetivos de la fundación.

ESPAÑA

www.centroparraga.com www.circulobellasartes.com

Termino con algo de tremenda importancia, y es el equipo humano necesario para llevar a cabo este y cualquier otro proyecto cultural. Hoy nuestro sector cuenta con varias generaciones de profesionales con un elevado grado de formación y con un potencial creativo enorme. El éxito de nuestro trabajo depende sin ninguna duda de la capacidad de formar un sólido equipo de trabajo donde la aportación de todos y cada uno sea apreciada y valorada en su medida.

144 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - María del Valle

www.lacasaencendida.es www.teatenerife.es www.cccb.org www.laboralcentrodearte.com www.creaa.es

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146 – Mesa Redonda: o espaço como experiência: repertório e gestão - María del Valle

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Esta publicação foi composta na fonte Flama e suas variações. A impressão foi executada pela Gráfica Formato, em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, com tiragem de 1000 exemplares, impressos em papel Reciclato 90g, capa em Supremo 300g, para DUO Informação e Cultura em fevereiro de 2011

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