Michael Schumacher. O Maior Piloto da Fórmula 1. Sua Trajetória na Mídia Brasileira. Sérgio de Paula

October 20, 2017 | Author: Neusa Elisa Álvares Quintão | Category: N/A
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Michael Schumacher O Maior Piloto da Fórmula 1

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Sua Trajetória na Mídia Brasileira Sérgio de Paula

SÉRGIO DE PAULA

MICHAEL SCHUMACHER: O MAIOR PILOTO DA FÓRMULA 1 (SUA TRAJETÓRIA NA MÍDIA BRASILEIRA)

FLORIANÓPOLIS - SC 2005

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO – CCE/FAED DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA - DEH

SÉRGIO DE PAULA

MICHAEL SCHUMACHER: O MAIOR PILOTO DA FÓRMULA 1 (SUA TRAJETÓRIA NA MÍDIA BRASILEIRA)

Monografia apresentada para a disciplina de Orientação de Trabalho Monográfico para a obtenção do título de bacharel em História. Orientadora: Msc Janice Gonçalves

FLORIANÓPOLIS – SC 3

SÉRGIO DE PAULA

MICHAEL SCHUMACHER: O MAIOR PILOTO DA FÓRMULA 1. (SUA TRAJETÓRIA NA MÍDIA BRASILEIRA)

Monografia aprovada como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel no Curso de História da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC.

BANCA EXAMINADORA

Orientadora: _______________________________________________________________ Mestra Janice Gonçalves, CCE/FAED - UDESC

Membro: __________________________________________________________________ Mestra Barbara Giese, CCE/FAED - UDESC

Membro: __________________________________________________________________ Doutora Márcia Ramos de Oliveira, CCE/FAED – UDESC

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AGRADECIMENTOS

Ao Gil e ao Gabriel, pelo dez anos de amizades, pelos consertos no computador e às coisas que dele me ensinaram. Ao Arno Luiz e ao Ricardo “Cadinho”, pelas revistas, jornais e conversas ao longo desses dez anos, sempre na Banca da Praça XV. Aos companheiros de aulas, trabalhos e conversas, nesses cinco anos de faculdade. Foram tempos que, independente de terem sido bons ou ruins, hoje são lembranças que nos fazem vê-los como bons tempos. Aos funcionários que sempre foram prestativos e profissionais amigos, pelos auxílios sempre prestativos e atenciosos. Vocês foram, muitas vezes, nossos melhores companheiros. Aos professores, sempre dispostos e gentis, por nos ensinar, orientar, ouvir e aconselhar, em qualquer hora e lugar, nesse pequeno grande mundo que é a FAED. Aos aqui esquecidos neste único momento, mas lembrados para sempre. Em especial: A Gustavo de Souza, colega de escola, que me inseriu no mundo dos vídeogames, e deles, para a Fórmula 1. Valeu, Rapaz! Ao professor Cechinel, pelo reconhecimento profissional tantas vezes mencionado, vindo da oportunidade inicial concedida em 2001, que me permitiu ter chego tão longe. Ao Doutor Schmitz, amigo de todos, pelas lições, incentivos e auxílios. À dona Janice, por ter sido professora, orientadora, modelo de profissionalismo e competência. À dona Salette, pelo apoio, compreensão, paciência, exemplos. Pela credibilidade, confiança, incentivo. Por todas as lições de organização, ética, competência, profissionalismo e vida. A senhora foi a pessoa mais importante da minha formação acadêmica.

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RESUMO

Com uma carreira marcada por extremos, controvérsias, contrastes e muita polêmica, com vitórias, títulos, recordes e brilhantes atuações nas pistas, Michael Schumacher caminha a passos largos para se tornar, ao menos pelos números de sua carreira, o maior piloto de Fórmula 1 de todos os tempos. Nesse trabalho pretende-se examinar como a trajetória do piloto alemão vem sendo representada e construída, através dos escritos da mídia brasileira – principalmente jornais, revistas especializadas e websites de automobilismo -, ressaltando a visão dos jornalistas especializados, passada ao público, sobretudo por meio de colunas periódicas. Depois de uma breve discussão sobre o surgimento do automobilismo e seu papel no mundo contemporâneo, onde são destacados aspectos gerais da Fórmula 1, são apresentados e comentados registros da imprensa escrita e virtual sobre os traços de personalidade e a vida privada de Michael Schumacher, bem como sobre sua carreira na Fórmula 1, nos anos de 1991 a 2004.

PALAVRAS-CHAVE: Michael Schumacher; Fórmula 1; imprensa.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figuras 1 a 6: Os familiares ..............................................................................................................

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Figuras 7 a 12: O círculo de celebridades.......................................................................................... 51 Figuras 13 a 18: Os acidentes de Senna e de Schumacher................................................................

52

Figuras 19 a 27: Momentos de luto da Ferrari e de Michael Schumacher.......................................

53

Figuras 28 a 33: Momentos de embriaguês de Räikkonen e Schumacher......................................... 54 Figura 34: A primeira conquista........................................................................................................

88

Figuras 35 a 40: O personagem Dick Vigarista e os acidentes que definiram os títulos de 94 e 97.

89

Figuras 41 a 47: As polêmicas trocas de posições em 2002..............................................................

90

Figuras 49 a 55: Momentos de vitórias e conquistas.........................................................................

91

Figuras 56 a 60: Os momentos da conquista do pentacampeonato...................................................

92

Figuras 61 a 68: Os adversários nas pistas......................................................................................... 93 Figuras 69 a 74: Momentos pessoais fora da pista............................................................................

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SUMÁRIO Introdução. .......................................................................................................... 8 1. Capítulo 1 O automobilismo e o Mundo contemporâneo................................ 16 1.1 Brasil: títulos e vitórias.................................................................................... 1.2 A importância do automobilismo no Mundo contemporâneo......................... 1.3 O automobilismo e a chamada Fórmula 1. ..................................................... 1.4 A Alemanha na Fórmula 1. ............................................................................ 1.5 O surgimento de Michael Schumacher. .........................................................

17 18 19 22 25

Capítulo 2. Michael Schumacher – O Homem: entre o público e o privado....... 28 2.1 Schumacher e a privacidade na imprensa. ...................................................... 2.2 Entre a preocupação humanitária e a burla ao fisco. ...................................... 2.3 Homem de caráter ou gênio de marketing? Cortes ou arrogante? ................. 2.4 Schumacher e a sombra de Senna. . ............................................................... 2.5 Imagens, mercadorias. ....................................................................................

29 31 34 39 44

Capítulo 3. Michael Schumacher – O Piloto: a trajetória nas pistas. .................. 55 3.1 Os números fazem o piloto.............................................................................. 3.2 “O rei está morto. Viva o rei”.......................................................................... 3.3 Nova fase. Nova imagem? .............................................................................. 3.4 A F1 busca emoção e dificulta o hexacampeonato......................................... 3.5 Algo mudou com o heptacampeonato?...........................................................

56 59 65 73 78

Considerações Finais. ......................................................................................... 95 Referências. ......................................................................................................... 98 Apêndices. ........................................................................................................... 101 Anexos................................................................................................................... 127

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Introdução A biografia cresceu muito, como gênero literário, nas últimas décadas. Para a exaltação das grandes figuras – muitas vezes só tornadas grandes pela construção que lhes foi imposta – escreveram-se muitas biografias. As livrarias exibem em suas vitrines e prateleiras vários títulos e opções de biografias para os mais variados públicos. Jornalistas, literatos, sociólogos e historiadores, entre outros profissionais, dedicam-se a escrever sobre pessoas famosas e outras nem tanto, para um público que consome avidamente esse tipo de trabalho. Os jogadores de futebol Pelé e Garrincha, o piloto Ayrton Senna, nos esportes, o apresentador de televisão Silvio Santos, o cantor Cazuza, a princesa inglesa Diana, são exemplos de indivíduos que se destacaram em suas profissões ou modos de vida, e ao morrerem ou afastarem-se de suas profissões, criaram um interesse por parte do público em saber de suas vidas privadas e públicas, gerando trabalhos de caráter biográfico.1 Como salientou Benito B. Schmidt: [...] não se pode deixar de lado, na explicação do sucesso das biografias, o delicioso pecado do “voyeurismo”. Conhecer a vida do outro, sobretudo de personagens destacados, nos mínimos detalhes, especialmente aqueles mais íntimos, tornou-se um passatempo para milhares de leitores.2

Especificamente na área de História e referindo-se à realidade brasileira, Magda Ricci ressalta, com base num estudo de caso, o quanto trabalhos de caráter biográfico vigoraram no Brasil de 1936 a 1960, com seu propósito parecendo um só: [...] ensinar aos presentes os passos de homens e mulheres que, vivendo em um passado menos civilizado, muitas vezes convivendo com uma dura realidade, conseguiram sobressair-se, avultando-se perante os demais. Eram homens e mulheres que, estando um passo adiante de seu tempo, serviam de exemplo aos historiadores do futuro.3

Como ressalta Ricci, naquele período - com mais ênfase no período do governo de Getúlio Vargas - prevaleceu a idéia de uma educação através dos exemplos dos grandes vultos da história do Brasil.4 Essas biografias, em geral tratando de personagens que podiam servir como exemplo de patriotismo, heroísmo ou algo positivo para os homens do presente, como 1

Sobre esses personagens, ver: RODRIGUES, Ernesto. Ayrton, o herói revelado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004; SILVA, Arlindo. A fantástica história de Silvio Santos. São Paulo: Editora do Brasil, 2002; XAVIER FILHO, Sérgio. Pelé – o atleta do século. São Paulo: Abril, 2000. 2 SCHMIDT, Benito Bisso. A biografia histórica: o “retorno” do gênero e a noção de “contexto”. In: GUAZZELLI, César Augusto Barcellos. Questões de Teoria e Metodologia da História. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2000. p.122. 3 RICCI, Magda. Como se faz um vulto na História do Brasil. In: GUAZZELLI, op. cit. p. 153-154. 4 Idem, p. 153. 9

Diogo Feijó, Tiradentes, Bento Gonçalves, José Bonifácio, entre outros, seguiam o que outra autora considera ser o modelo positivista, em que o método era o de “coletar dados, enfileirálos numa ordem cronológica para que, enfim, se pudesse, através de uma análise crítica, descrever a realidade objetiva, ou, o que 'realmente aconteceu' ”5. O sociólogo francês Pierre Bourdieu escreveu uma contundente crítica a este tipo de “método” em que se cria uma “ilusão retórica” de que a vida de um indivíduo seja uma trajetória linear e coerente, onde tudo leva a um fim determinado.6 Não se pode tratar a vida de um indivíduo como sendo um desenrolar coerente de fatos e acontecimentos. Uma existência individual não é linear. Uma vida tem descontinuidades, contradições, incoerências. Daí decorrem os problemas de construir uma biografia procurando encontrar ligações lógicas entre todos os atos e decisões de um indivíduo, dando a esta vida um sentido, uma linearidade sem desvios. Uma vida não deve ser narrada como se o indivíduo houvesse nascido e se preparado unicamente para os grandes momentos que marcaram sua vida adulta. Ninguém nasce com um destino pronto. Para evitar essa construção linear, Bourdieu ressalta a importância da reconstituição do contexto, da época, das relações sociais em que viveu e agiu o indivíduo estudado.7 É nesse meio que se formou a personalidade do indivíduo e onde se deram suas ações. É preciso ver como os espaços onde o indivíduo viveu podem tê-lo influenciado e como os códigos de conduta, de moralidade, além de outros fatores, fizeram parte de suas escolhas e ações. As novas propostas metodológicas para o trabalho biográfico levaram em conta a crítica de Bourdieu. Como ressalta Francisca Azevedo: Hoje a biografia é um modelo de escrita da história nitidamente definida. Há uma metodologia explicitada, na qual a biografia não se destina mais ao julgamento feito por seus autores, mas sim a uma construção relevante sobre hipóteses cujos pressupostos serão confirmados ou não. Seu objetivo é fundamentalmente levar à compreensão da época que, como a montagem de um quebra-cabeça, pouco a pouco vai revelando o que é permanente, indicando as diferenças, permitindo perceber a realidade dos problemas sociais através do concreto de uma vida.8

Neste sentido, o que traria compreensão de uma época, em um estudo que privilegiasse a vida de um indivíduo, seria o contexto reconstruído ao redor da vida deste mesmo indivíduo. Assim, poderiam ser compreendidos muitos acontecimentos que

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XAVIER, Regina Célia Lima. O desafio do trabalho biográfico. In: GUAZZELLI, op. cit., p.164. BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: AMADO, Janaína e FERREIRA, Marieta de Moraes (orgs.). Usos & abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Ed. da FGV, 1998. p. 183-191. 7 Idem. p. 190. 8 AZEVEDO, Francisca L. Nogueira de. Biografia e Gênero. In: GUAZZELLI, César Augusto Barcellos. op. cit. p. 133. 6

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aparentemente inexplicáveis ou estranhos em relação à vida do indivíduo estudado. O contexto, seja social, econômico, cultural, religioso etc, ajudaria a compreender suas ações, permitindo criar hipóteses para fatos e situações para as quais, durante a pesquisa, não foram encontradas respostas. O estudo do contexto auxiliaria assim, e muito, o desenvolvimento de um estudo sobre um indivíduo, as percepções que se poderia fazer sobre as ações deste, embora não possa jamais servir para definir ou esgotar o estudo da vida de um indivíduo. Giovanni Levi ressalta alguns tipos de contextualizações que têm sido explorados recentemente por historiadores em seus trabalhos. Há o contexto visto como algo que explica o comportamento social, dando ênfase à sua coerência entre ambos. Já a micro-história prefere se concentrar nas contradições dos sistemas que normalizam os comportamentos sociais: são as fragmentações, pluralidades e contradições que são investigadas.9 Um bom exemplo, neste sentido, é o trabalho de Carlo Ginzburg sobre um moleiro perseguido pela Inquisição no século XVI.10

Levi considera, no entanto, que uma vida não pode ser

compreendida somente por sua singularidade e por seus desvios, por mais única que seja. Fazse necessário mostrar que cada mudança em relação às normas acontece justificada pelo contexto histórico que a cerca.11 Outra abordagem é aquela que compreende o contexto “como o processo de se colocar uma idéia dentro dos limites prescritos pelas linguagens disponíveis”. O contexto é formado, então, pela linguagem e pelos idiomas disponíveis e usados por grupos de pessoas para situações particulares do seu grupo. Nesse caso, dá-se importância para as atividades e formas de comportamento, instituições, etc, que proporcionam os meios nos quais se compreendem os idiomas e linguagens. Nessa perspectiva, os melhores exemplos são os trabalhos influenciados por Clifford Geertz, onde se vêem os laços que ligam a história à antropologia. 12

Levi também comenta a contextualização que é a “colocação formal e comparativa de um acontecimento, de uma forma de comportamento ou de um conceito, em uma série de outros desses que lhe são similares, embora possam estar separados no tempo e no espaço”. Esse conceito pressupõe que as estruturas são comparáveis, agrupa itens individuais com aspectos comuns e os classifica baseados em similaridades de modo indireto, por meio de

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LEVI, Giovani. Sobre a micro-história. In: BURKE, P. A escrita da história. São Paulo: UNESP, 1992. p. 154. 10 GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. 11 LEVI, Giovani. Usos da biografia. op. cit. 176. 12 LEVI, Giovani. op. cit. p. 156. 11

analogias. Nesse contexto, ao se operar com analogias, vai-se muito além da identificação de conjuntos de objetos de estudo que compartilham similaridades.13 Levi comenta ainda que há estudos em que o contexto “serve para preencher as lacunas documentais por meio de comparações com outras pessoas cuja vida apresenta alguma analogia, por esse ou aquele motivo, com o personagem estudado”.14 Essa perspectiva mostra o contexto como algo um pouco ‘rígido’, onde a trajetória do indivíduo não age sobre o contexto modificando-o, sendo apenas um cenário imóvel que explica a vida do personagem. Ainda assim, tem bons resultados, mantendo o equilíbrio entre a trajetória do indivíduo e seu sistema social.15 Esse uso do contexto é feito por Natalie Davis em seu estudo sobre Martin Guerre16: utilizando informações sobre a época do personagem estudado, a autora pôde preencher lacunas na documentação pesquisada, formulando hipóteses baseadas no modo de viver e agir da época.17 Em um excelente artigo sobre as possibilidades atuais da biografia, Carlos Aguirre Rojas ressalta: “[...] se de um lado está o indivíduo e do outro se encontra o contexto, então o problema do historiador, do biógrafo, parece ser obrigatoriamente o de qual a relação do indivíduo com o contexto, ou, também, o de qual é a relação entre o indivíduo e o contexto”.18 E segue: [...] talvez seja possível sugerir que, para decifrar o complexo tema biográfico haveria que pensar que, mais que afirmar que o indivíduo se relaciona com o contexto, ou que há uma relação entre o indivíduo e o contexto, seria necessário conceber o indivíduo que está no contexto, o indivíduo que está dentro e que é parte orgânica constitutiva desse mesmo contexto, e que portanto o biógrafo ou o historiador devem analisar esse indivíduo como algo integrado e pertencente ao dito contexto. O que talvez mude radicalmente o modo de perceber e de analisar este tão velho e debatido problema.19

Seguindo suas reflexões sobre o assunto, Aguirre Rojas utiliza Braudel para demonstrar como indivíduo e obra se completam. Ao criar sua obra, O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo na Época de Felipe II, Braudel se torna, além de autor da obra, também produto e resultado do impacto social gerado por ela. Assim, diz que: Ao abordar o indivíduo no contexto, o indivíduo mesmo se apresenta como criador e igualmente como fruto desse mesmo contexto, o que abre a 13

Idem. LEVI, Giovani. Usos da biografia. In: AMADO, Janaína e FERREIRA, Marieta de Moraes. p. 176. 15 Idem. 16 DAVIS, Natalie Zemon. O retorno de Martin Guerre. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. 17 SCHMIDT, Benito Bisso. op.cit., p. 127. 18 AGUIRRE ROJAS, Carlos Antonio. La biografia como género historiográfico: algunas reflexiones sobre sus posibilidades actuales. In: SCHMIDT, Benito Bisso (org.). O biográfico: perspectivas interdisciplinares. Santa Cruz do Sul (RS): EDUNISC, 2000. p. 30. A tradução é minha. 19 Ibidem. p. 31. 14

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possibilidade de restituir de uma maneira diferente e nova essa complexa dialética entre indivíduo e contexto, que está no centro da problemática do gênero histórico-biográfico.20

Além disso, para Carlos Rojas é hoje um desafio historiográfico realizar uma “biografia que não seja um simples relato apaixonado, cronológico, de acontecimentos engrandecidos falsamente, da história e da vida de um homem”.21 Embora a “tradicional biografia linear e factual [...] continue a existir e vai muito bem”.22 No presente trabalho, não se pretende elaborar propriamente uma biografia, mas examinar como trajetórias biográficas são construídas a partir de fragmentos de notícias, que são repetidas, distorcidas ou modificadas por uma multiplicidade de jornalistas e agências noticiosas. Mais especificamente, pretende-se examinar como a imprensa escrita e virtual, particularmente por meio de jornais, revistas e websites jornalísticos editados no Brasil, têm colaborado para construir, para o público brasileiro de Fórmula 1, uma biografia do piloto alemão Michael Schumacher. Para tanto, o trabalho tenta sistematizar as referências que, na imprensa brasileira, sobretudo a especializada em automobilismo, têm contribuído para consolidar uma ou mais imagens de Michael Schumacher. Neste sentido, o personagem Schumacher busca ser compreendido no contexto contemporâneo em que imprensa, publicidade e indústria de entretenimento se unem para criar personagens de destaque, celebridades, ídolos. Ao mesmo tempo, percebe-se Schumacher como alguém que atua também como agente neste processo de construção como destacou Carlos Aguirre Rojas, como “indivíduo que está dentro e que é parte orgânica constitutiva desse mesmo contexto”. Serão analisadas as notícias divulgadas em alguns dos principais veículos de disseminação de informações sobre o automobilismo, nos anos que coincidem com o da carreira de Michael Schumacher como piloto de Fórmula 1, de 1991 a 2004. Os principais websites aqui utilizados, que são “agências de notícias” especializadas em Fórmula 1, são: Warm up; F1naWeb e Grid-online. São fartos em notícias diárias, colunas de jornalistas especializados e pilotos de corridas (ativos ou já aposentados), fotografias, cobertura e informações diversas sobre as corridas de várias categorias, entrevistas com pilotos, seções dedicadas a matérias sobre assuntos passados da Fórmula 1 e seções para respostas às perguntas dos leitores.23 20

Ibidem. p. 33. AGUIRRE ROJAS. op.cit. p. 14. 22 LEVI, Giovani. Usos da biografia. op. cit. 179. 23 Os links para estes sites são: www.warmup.com.br; www.f1naweb.com.br; www.bestlap.com.br/index.asp www.grid.abril.com.br/index.shtml; www.gptotal.com.br. 21

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As revistas de cobertura de automobilismo também trazem diversas matérias e informações sobre o personagem Michael Schumacher. As revistas pesquisadas - a saber: Racing, Speedway e Quatro Rodas, que encontram-se ainda em circulação, e Grid e F1Racing, um suplemento da revista Carro, ambas já extintas - trazem em suas páginas muito material sobre o “piloto”, material esse que acaba servindo também para o trabalho de percepção do Schumacher “mito”. Os jornais de circulação nacional, como Folha de São Paulo, Estado de São Paulo e o jornal especializado em esportes Lance! são outras fontes que produzem um bom material para a pesquisa, pois me parece ser através deles que a maior parte do público tem acesso às informações, levando-se em conta a maior facilidade de consulta de um jornal, em uma biblioteca pública, um escritório comercial, uma sala de espera, do que o acesso diário a um computador com Internet, ou a revistas especializadas que custam entre R$ 6,00 e R$ 10,00. Por ser o personagem um cidadão europeu (nascido na Alemanha), e de residência européia (mora na Suíça, onde diz encontrar mais tranqüilidade: “A Suíça é um dos poucos lugares onde me sinto relaxado”24), todas as informações sobre ele vêm dos periódicos europeus, na maior parte. Muito do que se lê sobre Schumacher nos websites brasileiros tem referência a websites, revistas e jornais europeus (as equipes de Fórmula 1 têm suas sedes na Europa, onde ocorre a maior parte das corridas). Outras notícias e informações são creditadas a jornalistas que, fazendo a cobertura das corridas, enviam a matéria diretamente dos autódromos para serem publicadas nos websites. Isso ocorre principalmente nos fins de semana de corridas, estendendose até às segundas-feiras. Nas revistas nacionais citadas acima, o que se tem são as coberturas das corridas feitas por jornalistas brasileiros, muitas matérias sobre o perfil do piloto, suas impressões ou as de profissionais próximos sobre determinados aspectos do seu trabalho ou sua carreira, pontos importantes de sua trajetória e algumas entrevistas. Essas matérias são, em geral, baseadas em revistas européias e adaptadas. Poucas são as entrevistas conseguidas por jornalistas brasileiros. Nos jornais, fonte farta, há bem mais matérias que podem auxiliar as pesquisas sobre a carreira profissional. As coberturas das corridas feitas pelos jornais O Estado de São Paulo, Folha de São Paulo e O Globo são, entre os jornais de grande circulação, as melhores no país. Eventualmente, há matérias sobre o piloto ou entrevistas curtas obtidas pelos jornalistas. No entanto, para os fins desse trabalho, foram privilegiados os jornais especializados em esportes e, particularmente, automobilismo. O jornal esportivo Lance!, especializado em esportes, tem uma cobertura de Fórmula 1 bastante reduzida. É feita principalmente pelo jornalista Flávio Gomes, em uma ou duas páginas, 24

SAMSON, Stéphane. Tenho Cinco! F1RACING: Suplemento da Revista Racing, São Paulo, n. 99, ago/02. p.38. 14

que traçam um panorama geral do que foi a corrida e algo dos seus desdobramentos. E esses escritos podem ser encontrados quase que em sua totalidade no website do próprio jornalista, WarmUp, já citado acima. Deste jornal, apenas a coluna do ex-piloto Nelson Piquet pode ser considerada como algo original e exclusivo. Suas opiniões são sempre interessantes e escritas com bom humor e irreverência típicos de sua personalidade. Piloto por treze anos na Fórmula 1, com três títulos e muita experiência, sua opinião tem o peso de quem entende o que acontece dentro de uma equipe e de um carro de Fórmula 1. Entre os colunistas especializados, que trabalham há muito tempo com Fórmula 1 e escrevem constantemente, os principais são: Flávio Gomes, do website WarmUp; Reginaldo Leme, colunista do jornal O Estado de São Paulo e do website WarmUp (as colunas publicadas são as mesmas) e comentarista da Rede Globo, detentora exclusiva das transmissões da Fórmula 1 para o Brasil; Lemyr Martins, repórter free-lancer, escritor e colunista da revista Quatro Rodas, que também escreve no website Grid-online; e Nelson Piquet, que escreveu para a revista Racing, para o jornal O Globo e para o website F1naweb. Suas colunas foram priorizadas como fontes, neste trabalho. Outros colunistas, como Odnei Edson, da revista Speedway, Marcus Zamponi, da revista Racing, e Ricardo Perrone, do site F1naWeb, entre outros, terão seus escritos também utilizados para suplementar o material citado. No primeiro capítulo, procura-se refletir sobre o lugar do automobilismo no mundo contemporâneo, apresentando aspectos gerais do surgimento e do funcionamento da Fórmula 1, bem como sobre sua situação atual. Destaca-se a participação da Alemanha na Fórmula 1, no que se refere aos pilotos, às equipes, às empresas fornecedoras de equipamentos e combustíveis, aos patrocinadores. Quanto aos pilotos, salienta-se a importância de Michael Schumacher, onde também apresenta-se aspectos de sua vida antes de chegar à Fórmula 1. No segundo capítulo, tenta-se perceber, a partir dos registros da imprensa escrita e virtual, o que é informado e ressaltado da vida privada e dos traços de caráter de Michael Schumacher como o “homem” é apresentado ao público. No terceiro capítulo, discute-se como a imprensa vem cobrindo sua trajetória como piloto de corridas, tendo em vista os principais momentos de sua carreira. Analisando os “momentoschave” de sua trajetória de piloto, pode-se perceber como a imprensa repassa ao público a imagem do piloto. Por fim, no apêndice, situa-se a trajetória esportiva de Michael Schumacher na Fórmula 1 com base em dados estatísticos, sistematizados através de tabelas e listas de índices e recordes.

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Capítulo 1

O Automobilismo e o Mundo Contemporâneo 16

Capítulo 1: O automobilismo e o mundo contemporâneo 1.1 Brasil: títulos e vitórias. No Brasil, chamado “País do Futebol”, a Fórmula 1 tornou-se um esporte conhecido de todos devido ao sucesso de Emerson Fittipaldi nos anos 70 e dos pilotos brasileiros que o sucederam em vitórias e títulos nos anos 80 e 90. Com a conquista, por Emerson Fittipaldi, de 14 vitórias e 2 títulos mundiais em 1972 e 1974, e depois a criação de sua própria equipe, a Copersucar-Fittipaldi, que correu de 1976 a 1982, o Brasil acostumou-se a acompanhar a Fórmula 1 e torcer por pilotos brasileiros. Entre eles, apenas José Carlos Pace, junto com Fittipaldi, foi vencedor de corridas nos anos 70. Nos anos 80, quando Fittipaldi aposentou-se da Fórmula 1, Nelson Piquet o sucedeu nas vitórias, de 1980 a 1985, ano em que Ayrton Senna começou a vencer corridas com a equipe Lotus. De 1980 até 1993, Piquet e Senna foram os brasileiros vencedores na Fórmula 1. Conquistaram os campeonatos de 1981-83-87 (Piquet) e 1988-90-91 (Senna), obtendo juntos 64 vitórias – 23 de Piquet e 41 de Senna. “Nessas duas décadas, enquanto o futebol, tido sempre como a grande paixão nacional, entrava em parafuso, o automobilismo de competição foi ganhando pontos preciosos no coração – e na razão – da torcida”.25 Foi assistindo a essas conquistas que o Brasil acostumou-se a ver a Fórmula 1. Quando Ayrton Senna morreu, em 1994, não havia mais pilotos brasileiros em condições de disputar vitórias ou títulos na Fórmula 1. Rubens Barrichello estava na mediana equipe Jordan, e Christian Fittipaldi na pequena Minardi. As alegrias esportivas do Brasil ocorreram principalmente com a conquista da Copa do Mundo de Futebol, em 1994, nos Estados Unidos, e em 2002, na Copa do Mundo realizada simultaneamente no Japão e na Coréia. Na Fórmula 1, uma vitória de piloto brasileiro só voltou a ocorrer em 2000, quando Rubens Barrichello, com uma Ferrari, venceu o GP da Alemanha, em Hockenheim. Foram mais de 6 anos sem vitórias na Fórmula 1. E foi somente a partir de 2000, com Rubens Barrichello, que um piloto brasileiro passou a estar em uma equipe em condições de correr por vitórias. Desse modo, a Fórmula 1 hoje não é desconhecida dos brasileiros, e desperta 25

J.C. Esporte nacional: automobilismo faz campeões e desbanca o futebol. Isto É Senhor, São Paulo, n. 1151, p. 31. 16/10/1991. 17

neles uma certa nostalgia dos “tempos de Senna e Piquet”, quando as vitórias eram mais constantes. 1.2 A importância da Fórmula 1 no mundo contemporâneo. Um dos mais importantes papéis da Fórmula 1 no mundo contemporâneo é servir de vitrine para as fábricas de automóveis. “A Fórmula 1 é uma vitrine privilegiada de propaganda dos carros de passeio de marcas como BMW, Mercedes-Benz, Ferrari, Honda, entre outras”.26 Ao produzirem motores, no caso da Mercedes-Benz, BMW, Honda e Ford, ou terem sua própria equipe, no caso da Ferrari, Toyota e Renault, expõem sua marca na mídia, dentro de um evento assistido em vários países do mundo. Outro grande papel da Fórmula 1 é servir como laboratório para o desenvolvimento de tecnologias que são aplicadas em carros de rua. Muitos dos equipamentos que hoje estão embutidos nos carros de passeio foram criados para uma melhor performance dos carros de Fórmula 1 ou de outras categorias. Os freios ABS (Anti-Lock breaking Sistem), que impedem o travamento das rodas em terrenos irregulares ou de pouca aderência (areia, cascalho, água, neve), foram desenvolvidos para os carros de F1 na década de 80 e posteriormente fabricados para os carros de rua das fábricas européias. O controle de tração (ASR), que evita a derrapagem das rodas de tração, foi desenvolvido na década de 80 e utilizado na F1 por muito tempo até ser proibido em 2001. Impede que as rodas girem em falso em caso de aceleração mais forte. O combustível dos carros de Fórmula 1 deve ter as mesmas especificações da gasolina vendida nos postos da Europa. “A gasolina (da Fórmula 1) tem, em média, entre 300 e 350 componentes. Destes, 99% são idênticos ao do produto de rua”.27 As fornecedoras de combustível da Fórmula 1 atualmente são: Shell, Esso, Móbil, Elf, Castrol e Petrobrás. A maioria com postos no Brasil.28 A suspensão ativa, ou suspensão inteligente, desenvolvida pela Williams no final dos anos 80, foi incorporada nos carros de rua nos anos 90, auxiliando o controle do carro em curvas, inclinações e imperfeições do terreno, e preservando a vida útil de molas e amortecedores. 26

CUNHA, Rodrigo Vieira da. Sinal Verde. Você s.a, São Paulo, n. 29, nov. 2000. p. 47. RAMOS, Luiz Fernando. O sangue puro dos carros de F1. Racing, São Paulo, n. 158, nov. 2004, p. 10-11. 28 A Petrobrás, que fornece combustível para a equipe Williams, teve pilotos de teste brasileiros nos últimos anos: Max Wilson, Bruno Junqueira e, atualmente, Antônio Pizzonia. 27

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O câmbio automático, que permite a condução do veículo sem que seja preciso trocar constantemente de marchas, foi desenvolvido na Fórmula 1. Atualmente, carros de rua mais luxuosos possuem esse dispositivo. Na Fórmula 1, foi proibido no começo dos anos 90, sendo utilizado até hoje o câmbio semi-automático, que dispensa o uso de embreagem e é acionado por pequenas aletas atrás do volante. Muitos materiais desenvolvidos e usados na montagem dos carros de Fórmula 1 foram posteriormente incorporados aos carros de rua: a fibra de carbono, usada nas carrocerias; ligas de alumínio mais resistentes, usadas na fabricação de rodas; compostos de borracha mais resistentes e duráveis, resultado das pesquisas para desenvolvimento de pneus com maior performance nas pistas. Tais aperfeiçoamentos tecnológicos são constantemente repassados para os produtos vendidos ao público que, assistindo ou não a Fórmula 1, recebe dessa forma o benefício das pesquisas feitas nesse esporte. 1.3 O automobilismo e a chamada "Fórmula 1". As corridas de carro surgiram há mais de 100 anos, no final do século XIX. Em 11 de junho de 1895, houve, em Paris, a primeira corrida de carros oficial da história do automobilismo.29 Na Europa e nos Estados Unidos ocorreram as primeiras corridas de carros de que se tem registro. Na década de 10 do século XX, iniciou-se a construção de autódromos e pistas especiais para essas corridas, que antes aconteciam em estradas abertas, pondo em risco espectadores, animais e pilotos.30 Em 1950, em Silverstone, na Inglaterra, na pista do antigo campo de pouso de aviões britânicos da Segunda Guerra Mundial, iniciava-se o que viria a ser conhecido como Campeonato Mundial de Fórmula 1. Antes dessa data, existiam os torneios de Grand Prix, que eram corridas realizadas em circuitos construídos em florestas, como Hockenheim, na Alemanha, Nurburgring, em Luxemburgo, ou montados em ruas de cidades, como Monte Carlo, em Mônaco, Pau, na França, e Spa-Francorchamps, na Bélgica. Os Grand Prix foram agrupados em um campeonato pela FIA31, que queria diminuir o tom amadorístico das corridas da época, existentes desde 1906.32 Os pilotos eram mecânicos, aventureiros e nobres

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CAVALCANTI, Lito. Um século de corridas. 0Km, São Paulo, jun. 1995. p. 82. Idem. 31 Sigla da “Federação Internacional de Automobilismo”, entidade que rege o automobilismo mundial, sediada na Place de la Concorde, Paris, França. 32 PANDINI, Luiz Alberto. Fórmula 1, ano 45. Grid, São Paulo, n 23, mai. 1995. p. 20. 30

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milionários que arriscavam a vida em carros inseguros e velozes. Era a chamada “era romântica” da Fórmula 1. Nos anos 70, a profissionalização tomou conta da Fórmula 1, e os salários dos pilotos tornaram-se elevados para os padrões da época. Os patrocínios começaram a surgir e passaram a sustentar algumas equipes, de modo que estas puderam iniciar uma renovação tecnológica na categoria. A Fórmula 1 é atualmente um campeonato de automobilismo restrito, por regulamento, a 12 equipes, que podem correr com dois carros cada uma. Cada equipe tem dois pilotos titulares e um reserva, para o caso de um dos titulares não poder disputar um GP. O campeonato tem entre 16 e 19 etapas, sendo realizadas em países diferentes, em intervalos de uma a três semanas. Os carros são construídos seguindo normas técnicas de regulamentação e segurança, que são determinadas pela FIA, a mesma entidade que rege os mais importantes campeonatos de automobilismo do mundo. Existem medidas máximas e mínimas na construção de um carro, bem como níveis de segurança e capacidade de potência de motores para que haja, em certos aspectos, um nivelamento entre as equipes. São disputados dois campeonatos: o de pilotos e o de construtores. O piloto que ao final do campeonato obtiver mais pontos é declarado campeão da temporada. A equipe que ao final da temporada tiver obtido mais pontos com seus dois carros, independente dos pilotos que os conduziram, é declarada campeã de construtores. O campeonato de pilotos existe desde 1950, ano da primeira temporada. O de construtores, desde 1958. O campeonato de construtores nunca mereceu grande reflexão por parte de especialistas e torcedores. Ele só parece importante para os donos de equipes. É o campeonato de pilotos que sempre motivou as discussões e foi registrado com mais destaque na história da Fórmula 1. O contrário acontece com o futebol, onde, para os torcedores, os jogadores são importantes, mas nunca mais do que os times, que são lembrados pelos títulos que conquistam, bem mais do que os jogadores que os ajudam a obter esses títulos. São considerados grandes pilotos da Fórmula 1 aqueles que obtiveram expressivos resultados na carreira, conforme o contexto em que correram e os adversários que enfrentaram. Até há pouco tempo - 2002 -, Juan Manuel Fangio, da Argentina, era considerado o maior campeão da história da Fórmula 1. Com 5 títulos conquistados na década de 50, foi considerado o maior de todos os pilotos e detentor de um recorde praticamente inalcançável.33 Com a conquista do pentacampeonato, em 2002, Michael Schumacher igualou-se à maior

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lenda da Fórmula 1. Nos dois anos seguintes, 2003 e 2004, Michael Schumacher superou Fangio, obtendo mais dois títulos mundiais e tornando-se heptacampeão de Fórmula 1. Um feito que era considerado quase impossível há pouco mais de três anos. Junto com Michael Schumacher e Juan Manuel Fangio, há outros pilotos que, detendo vários títulos, são apontados como grandes na Fórmula 1. Alain Prost, francês, detentor de 4 títulos nos anos 80 e 90, Ayrton Senna e Nelson Piquet, brasileiros que, junto com Jack Brabham, australiano, Jackie Stewart, escocês, e Niki Lauda, austríaco, são detentores de 3 títulos cada um, e figuram entre os maiores pilotos que já correram na Fórmula 1. Outros pilotos, detentores de 2 títulos, também são considerados grandes pelos seus títulos e feitos nas pistas, sobretudo os competidores de uma época em que a Fórmula 1 era considerada “romântica”, por não depender de tanta tecnologia e ter no esporte um certo glamour, em função da paixão pela velocidade e pelo perigo34. Nos anos 50 e 60, até a metade dos anos 70, a segurança era uma preocupação mínima por parte dos organizadores das corridas. Correr nessa época era considerado um ato de arrojo e coragem, e obter vitórias e títulos colocava os pilotos na condição de heróis e super-homens. Alberto Ascari, italiano, Jim Clark, escocês, Graham Hill, inglês, Émerson Fittipaldi, brasileiro, e Mika Hakkinen, finlandês, são os detentores de 2 títulos de Fórmula 1 na carreira. As vitórias obtidas pelos pilotos também os classificam como “grandes”. O maior vencedor da Fórmula 1 nos anos 50 foi Fangio, com 24 vitórias. Nos anos 60, Jim Clark o superou conquistando 25 vitórias. Nos anos 70, Jackie Stewart superou Clark, com 27 vitórias. “Jackie Stewart sentiu praticamente perpetuado seu recorde de vitórias no dia em que venceu pela 27º vez um GP”.35 Em 1973, Stewart aposentou-se da Fórmula 1. Apenas em 1988, quando Alain Prost venceu sua 28ª corrida, o recorde de vitórias de Stewart foi superado. Ainda nos anos 80, Ayrton Senna e Nigel Mansell superaram Stewart, chegando a 41 e 31 vitórias, respectivamente. Alain Prost, com 51 vitórias, era o maior vencedor da categoria até 2001, quando Michael Schumacher o igualou, superando-o no mesmo ano, e detendo, até o final de 2004, a impressionante quantia de 83 vitórias na Fórmula 1. É hoje o maior vencedor da história da categoria. Não há um consenso sobre quem é o maior piloto da Fórmula 1. Não há uma entidade, grupo ou indivíduo que, fazendo um “registro oficial” de índices e recordes, eleja este ou aquele piloto como o melhor do mundo em todos os tempos. Os resultados conquistados são

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LEME, Reginaldo. Lá se foi o mito do pentacampeonato. Speedway, São Paulo, n.60, out. 2003. p.16. A um passo da unanimidade. Speedway, São Paulo, n.60, out. 2003. p. 31. 35 Idem. Cit. p. 16 34

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reconhecidos por quem acompanha o esporte: jornalistas, pilotos, público. Como no futebol, quem ganha mais, aparece mais. Além disso, são muitas as diferenças entre cada época e seus carros. Se considerarmos os números como referencial, podem ser feitos muitos rankings dos “maiores pilotos” da Fórmula 1. Mas sabe-se que os números, apenas, não refletem a realidade e as diferenças entre os pilotos e suas façanhas. É preciso perceber o contexto de cada piloto e as tecnologias de que dispunham, as diferentes condições de competitividade das distintas fases e décadas da Fórmula 1. Sobre isso, o jornalista Flávio Gomes comenta: Mas a cifra obtida pelo alemão [Michael Schumacher] merece algumas considerações, na eterna e quase sempre infrutífera discussão sobre quem foi, ou é, o maior piloto de F-1 de todos os tempos. Muita gente discorda do uso das estatísticas para esclarecer a questão, sob o argumento aceitável de que não é justo comparar pilotos de épocas diferentes. Assim, quem viu Nuvolari, Rosemeyer, Fangio e Clark pode ter seus motivos para achar que nem Schumacher, nem Senna, nem Prost, os três maiores nomes da F-1 contemporânea, chegam aos pés daqueles tremendos ases dos tempos em que se pilotava sem cinto de segurança ou célula de sobrevivência. Da mesma forma, "sennistas" e "prostistas" podem sempre questionar a qualidade dos adversários de Schumacher, para desmerecer seus números impressionantes.36

1.4 A Alemanha na Fórmula 1. A Alemanha ingressou na Fórmula 1 representada por carros fabricados por sua mais famosa fábrica, a Mercedes-Benz, em 1953. Em 1954, criando os carros que ficaram conhecidos como “Flechas de Prata”, a fábrica alemã fez o argentino Juan Manuel Fangio campeão do mundo. E repetiu o feito em 1955. Para 1956, a Mercedes-Benz preparava o alemão Karl Kling (que já corria de F1) para ser campeão com seus carros. Um trágico acidente, nesse mesmo ano, nas 24 Horas de Le Mans37, onde um carro da Mercedes voou de encontro ao público e matou 55 pessoas, fez a montadora se retirar do mundo das competições automobilísticas.38 A Mercedes-Benz só voltaria para a Fórmula 1 nos anos 80, quando começou a equipar, com seus motores, os carros da equipe suíça Sauber. Depois, compraria parte da equipe McLaren, tornando-se sócia majoritária. Esse retorno se deu após conquistar

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GOMES, Flávio. Ninguém fez mais que Michael. 06/09/01. www.warmup.com.br. Acesso em 18/11/03. As 24 Horas de Le Mans são disputadas por carros protótipos, ajustados especialmente para provas de longa duração (nesse caso, 24 horas); têm início às 12h de um sábado e terminam às 12h do domingo seguinte. Esta corrida é disputada na região de Le Mans, França, e junto com as 500 Milhas de Indianápolis, disputada no Estado de Indiana, EUA, e o Grande Prêmio de Mônaco, disputado nas ruas de Monte Carlo, Principado de Mônaco, ao sul da França, constituem as três mais famosas corridas do mundo. Apenas o inglês Graham, Hill, nos anos 60, disputou e conquistou vitórias nos três eventos, obtendo assim a chamada “Tríplice Coroa”. 38 MARTINS, Lemyr. A Alemanha contra Michael Schumacher. www.grid-online.com.br, acesso em 23/11/2001. 37

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vitórias e títulos nas principais categorias de Esporte Protótipos39, nos anos 80 e 90, e na Fórmula Indy 40, nos anos 90. A BMW, outra grande fábrica alemã, competiu com sucesso no início da década de 80, obtendo dois títulos com a equipe Brabham, que tinha um de seus carros pilotado pelo brasileiro Nelson Piquet. Retirando-se em meados dessa mesma década, associou-se em 2000 à equipe inglesa Williams, após também obter sucesso nas competições de Esporte Protótipos durante os anos 80 e 90; fornecendo à Williams seus motores, considerados os mais potentes atualmente, passou a fazer parte da mais famosa categoria do automobilismo mundial. Mas não foi só com carros e motores que a Alemanha marcou sua presença na Fórmula 1. Desde o início dos anos 50 até hoje, 40 alemães correram na Fórmula 141. Destes, apenas cinco obtiveram vitórias: Wolfgang von Trips, Jochen Mass, Michael Schumacher, Heinz-Harald Frentzen e Ralf Schumacher, sendo que somente um, Michael Schumacher, conquistou o título mundial, embora outro tenha chegado muito perto. Um nobre alemão, escondido sob o pseudônimo de Axel Linther, se tornou famoso, em meados dos anos 50, vencendo corridas de longa distância, como as Mille Miglia e a Targa Flório, disputadas na Itália, e as 24 Horas de Le Mans, sendo campeão europeu de subida de montanha, um tipo de corrida automobilística muito comum na época. Em 1957 começou a disputar corridas de Fórmula 1, e em 1961, pela Ferrari, chegou a estar a uma corrida de se tornar o primeiro alemão campeão mundial. Um acidente impediria esse feito. O conde Wolfgang von Trips, na segunda volta do Grande Prêmio de Monza, na Itália, em 1961, chocou seu carro contra a Lotus de Jim Clark, voando contra a tela de proteção e matando 14 pessoas. O alemão foi atirado para fora do carro e caiu na pista já sem vida. Von Trips e a Alemanha perderam aquele título, por um ponto, 34 a 33, para o norte-americano Phil Hill.42 O conde von Trips foi o primeiro grande piloto alemão na Fórmula 1. O outro só viria a surgir em 1991. Nesse intervalo, e quase 15 anos depois da morte de von Trips, Jochem Mass, correndo pela McLaren, equipada com um motor Ford, venceria o GP da Espanha, em

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As corridas de Esporte Protótipos são disputadas com carros fabricados com características distintas dos carros esportivos de série, sendo fabricados em quantidades limitadas e preparados para estes tipos de provas. 40 A Fórmula Indy é uma categoria similar à Fórmula 1, que disputa suas principais corridas nos Estados Unidos. Os carros são maiores e mais pesados que os de Fórmula 1, e usam motores turbocomprimidos. Suas corridas também são disputadas em circuitos ovais, ausentes na Fórmula 1. Sendo considerada uma categoria "top" do automobilismo mundial, só perde em prestígio para a Fórmula 1. 41 Timo Glock, no Grande Prêmio do Canadá, em 13 de junho de 2004, correndo pela equipe Jordan, se tornou o 40º piloto alemão a disputar uma corrida de Fórmula 1. In: www.formulanews.com.br/conteudo.do?id=644, acesso em 14/10/2004. 42 MARTINS, Lemyr. op.cit. 23

1975. Foi, aliás, outra corrida trágica. O também alemão Rolf Stommelen bateu espetacularmente, sofrendo leves ferimentos, mas matando cinco espectadores.43 Somente 17 anos depois da vitória de Jochem Mass outro alemão voltaria a vencer na Fórmula 1: Michael Schumacher, na Bélgica, em 1992. Ele obteria nova vitória após um ano, em Portugal, em 1993. De 1992 até o final de 2004 foram 92 vitórias de pilotos alemães na Fórmula 1, sendo 83 de Michael Schumacher, 6 de seu irmão, Ralf Schumacher, e 3 de HeinzHarald Frentzen. Hoje, a Alemanha tem na Fórmula 1 uma participação talvez maior do que a de qualquer outro país. O controle acionário da Fórmula 1 pertence hoje, em 50%, à empresa alemã EM TV, uma das maiores empresas televisivas do mundo. A situação econômica da Alemanha na Europa e no mundo hoje é destacada, e seu poderio tecnológico, principalmente no ramo automobilístico, é notável e de longa história. Alguns dos maiores patrocinadores atuais da Fórmula 1 são alemães. Nos últimos cinco anos os carros que disputam a categoria tiveram, pintados em suas carenagens, os nomes de algumas das maiores empresas alemãs: entre outras, a tabacaria West; as cervejarias Warsteiner, Veltins e Beck’s; as empresas de artigos de informática Compaq e Siemens; o Deutsche Post (Correio alemão); a empresa de telefonia D2 Mannesman; o Banco Morgan Grenfell; o site de apostas Eurobet. Mas duas empresas ganharam mais destaque nesse mundo milionário que é a Fórmula 1: as indústrias de automóveis BMW e Mercedes-Benz.44. No início de 2005, Nick Heidfeld esteve, junto com o brasileiro Antônio Pizzonia, em período de testes pela equipe Williams, sendo efetivado piloto titular da equipe em 31 de janeiro, dia da apresentação do carro que disputará a temporada. De acordo com a cobertura da imprensa, a escolha de Heidfeld, em detrimento de Pizzonia (tido como favorito pelos proprietários da equipe Williams), foi praticamente imposta por Mario Thiessen, representante da BMW, que é fornecedora dos motores da equipe. Dessa forma, garantiu-se na Fórmula 1 um motor alemão empurrando um piloto alemão, já que Heidfeld ocupa o cockpit que era de Ralf Schumacher, hoje na Toyota45. Percebe-se neste caso o poder de uma empresa alemã no meio esportivo da Fórmula 1, e as preocupações existentes, nesse meio, em articular esporte e nacionalismo. O comentarista esportivo Flávio Gomes afirma:

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Idem. SIQUEIRA, Rodolfo. Ninguém segura a turma de Schumacher. O melhor de F1Racing - suplemento da revista Autoesporte, São Paulo, n. 420, maio de 2000. p. 21. 45 GOMES, Flávio. Exclusivo: como a BMW impôs Heidfeld. www.warmup.com.br, acesso em 01/02/2005. 44

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A Alemanha hoje é o país que mais se empolga com a F-1. Seus torcedores cruzam a Europa aos milhares em trêilers e trens para tomar cerveja e cantar Über Alles em qualquer autódromo num raio de mil quilômetros. São grosseiros, beberrões e mal-educados, na maioria, mas muito animados. Torcem de verdade para Schumacher e pela Ferrari. Vibram a cada vitória ou pódio. Estão por cima e a gente tem que ficar quieto, nós, os italianos, franceses e ingleses. 46

Michael Schumacher seria, portanto, o principal fator de interesse dos torcedores da Alemanha pela Fórmula 1. Seguramente, o piloto alemão também mobiliza o interesse de milhares de torcedores de outros países. Junto com Valentino Rossi, Michael Schumacher figura como “fenômeno” do esporte a motor.47 Rossi detém seis títulos na motovelocidade, sendo quatro na categoria máxima, a MotoGP. Disputou os últimos nove campeonatos sendo campeão em seis e vice nos outros três. Schumacher disputou diretamente nove dos últimos onze campeonatos de Fórmula 1. Foi vencedor em sete e vice em dois. Marcas assim os fazem figurar entre os maiores expoentes de suas categorias.48 A competitividade atual não tem permitido que muitos pilotos disputem, com possibilidade de sucesso, vitórias ou campeonatos. Em 1998, apenas dois dos 48 lugares do pódio, ao longo das 16 corridas do campeonato, não tiveram um piloto das chamadas “quatro grandes equipes” à época - Williams, Ferrari, Benetton e McLaren. Em 2000, foi apenas um lugar no pódio, dos 51 que houve. De 1987 até hoje, apenas 6 das mais de 300 corridas disputadas não foram vencidas por uma das “quatro grandes equipes”: Ferrari, Williams, McLaren e Benetton, atual Renault. Em 2000, apenas Ferrari e McLaren venceram corridas, e entre 2000 e 2002, apenas Ferrari, McLaren e Williams. Deve-se considerar, no entanto, que mesmo nas primeiras décadas da Fórmula 1 (anos 50, 60, 70) houve a hegemonia de determinadas equipes ou de pilotos ao longo das temporadas.49 Poucos pilotos disputam com chances um lugar no pódio, menos ainda disputam as vitórias, e somente dois ou três disputam efetivamente o título de campeão mundial de Fórmula 1, a cada temporada. As atuações de Michael Schumacher, alicerçadas pelo magnífico trabalho de sua equipe, por duas vezes (2003 e 2005) levaram a FIA a mudar drasticamente as regras da Fórmula 1, de modo a conter a mais absoluta hegemonia já vista na categoria. A excelência da Ferrari serve de parâmetro para as outras equipes em seu desenvolvimento. Nunca uma equipe dominou a Fórmula 1 de forma tão absoluta e por tanto tempo. 46

GOMES, Flávio. Deve ser o chucrute. 04/07/1997. www.warmup.com.br. Acesso em 18/11/04. Rossi carimba o título e dá adeus. Speedway, São Paulo, n. 60. nov. 2003. 48 MotoGP: Valentino Rossi. Speedway, São Paulo, n. 54, dez. 2002. 49 Sobre as hegemonias na Fórmula 1, ver apêndice A. 47

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Michael Schumacher, mesmo quando não disputa vitórias ou títulos, mantém a “coroa” de grande piloto, aquele que dá o espetáculo, o que não se deixa ofuscar, “o que faz a diferença”, como costuma dizer o narrador televisivo Galvão Bueno. Assim também era Ayrton Senna. O piloto que quebrou a barreira da vitória na Bélgica, em 1992, tornou-se um ganhador constante de corridas (média de 7,3 vitórias por temporada), campeão mundial, e deu o passo seguinte: tornou-se o Grande Senhor das Pistas. Para Eduardo Corrêa, ele é “é um ponto de inflexão, um ponto estável do universo, alguém que indica novos rumos para o futuro e arbitra as demandas do presente”. 50 Schumacher, “ponto estável” do “universo” da Fórmula 1, é tido como o “homem a ser batido”, é a ele que os outros querem vencer. Sua trajetória de recordes e conquistas tornou-o o referencial a ser seguido. 1.4 O surgimento de Michael Schumacher Em 1991, um taxista londrino envolveu-se em uma briga de trânsito com um piloto belga de Fórmula 1, da equipe Jordan. O piloto, chamado Bertrand Gachot, viu-se em desvantagem e usou gás paralisante contra o motorista. Foi preso e condenado à prisão. A partir desse fato, surgiu a oportunidade para Michael Schumacher estrear na Fórmula 1. Segundo Flavio Gomes: A penitenciária ganhou um hóspede famoso e a Jordan perdeu um piloto. E a F-1 ganhou seu futuro. Todos se lembram que no lugar do presidiário Gachot, no GP da Bélgica de 91, a Jordan colocou um alemãozinho queixudo, magrinho e disponível, de nome Michael e sobrenome Schumacher,que quer dizer sapateiro (em inglês é parecido: shoe maker, ou fazedor de sapatos). Ele nunca tinha guiado um carro de F-1 na vida e jamais havia pilotado em Spa. Deu uma volta de bicicleta pela pista na véspera e no sábado se classificou em sétimo no grid. A Jordan era estreante, ele também. O sujeitinho parecia ser um fenômeno, porque além de rápido, descobriu-se depois, era bancado pela Mercedes-Benz, que pagou U$ 300 mil para lhe arrumar um carro.51

Naquele fim de semana do GP da Bélgica, a presença de Schumacher para a corrida “é recebida com risinhos irônicos nos boxes. Os pilotos alemães não tem boa fama na F1. além do que Schumacher não fizera nenhum teste prévio com o carro, nem tampouco conhecia a pista”.52 Schumacher impressionou ao classificar o carro da Jordan em 7º lugar no grid de largada. Na corrida, o carro sofreu uma quebra do câmbio na primeira volta. Mas, a 50

CORRÊA, Eduardo. Fórmula 1: pela glória e pela pátria. São Paulo: Globo, 1994. p. 99. GOMES, Flavio. O taxista que mudou a F1. 13/11/1996. www.warmup.com.br, acesso em 25/10/2003. 52 CORRÊA, Eduardo. Fórmula 1: pela glória e pela pátria. São Paulo: Globo, 1994. p. 203. 51

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demonstração foi o suficiente para que Flávio Briatore, chefe da equipe Benetton, o contratasse para as quatro corridas restantes da temporada. Schumacher correu pela Benetton até 1995, quando se transferiu para a Ferrari em 1996. Michael Schumacher nasceu em 03 de janeiro de 1969, em Hürt-Helmühlhein, Kerpen- Mannhein, Colônia, na Alemanha. “Os Schumachers levavam uma vida simples e modesta, e a infância de Michael foi preenchida com os hábitos e tradições de todas as famílias alemães tipicamente suburbanas”.53 Com quatro anos de idade, seu pai, Rolf, montou um kart para que ele brincasse no quintal. Como era zelador da pista de kart de Kerpen, permitia que o pequeno Schumacher treinasse lá, mais tarde. Sendo de origem modesta, Schumacher enfrentou dificuldades para prosseguir na carreira. Sem dinheiro para correr ou viajar, Michael precisou da ajuda de terceiros, que apostaram em seu talento. Sua performance no início da carreira logo atraiu donos de equipes de kart, permitindo que o alemão competisse nas categorias nacionais. Seus vários títulos chamaram a atenção de um astuto empresário, Willi Webber, dono de um time de F-3 alemã. Ao garantir uma vaga para o piloto em sua equipe, em 1988, Webber ofereceu a ele um contrato de gerenciamento de carreira, que lhe garantiria dali em diante uma gorda fatia de tudo que o alemãozinho conquistasse.54

Com uma carreira pouco expressiva nas categorias de base, como a Fórmula Konig e a Fórmula 3 alemã, Schumacher foi, ainda assim, escolhido para fazer parte da equipe Junior da Mercedes-Benz na categoria de Sport-Protótipo. Nessa categoria, aprendeu e desenvolveuse como piloto, tendo a oportunidade de estrear na Fórmula 1, apenas 18 meses depois de começar a correr com a Mercedes. Com um rendimento anual de aproximados US$ 80 milhões55, segundo a revista Forbes, detém um patrimônio em torno de US$ 3,2 bilhões.56 É um dos esportistas mais bem pagos do mundo. Alvo de críticas e polêmicas, é constantemente notícia na mídia esportiva, de onde vem as informações para que se conheça o personagem Michael Schumacher. Como a imprensa representa o “homem” e o “piloto” Schumacher? Como procura alimentar a curiosidade do público de Fórmula 1 pelo seu mais importante personagem, na atualidade? É uma pergunta que os dois próximos capítulos tentam responder.

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COLLINGS, Thimoty. Schumacher: a vida do novo campeão de Fórmula 1. Lisboa: Talento, 1995. p. 28. CORASSA, Rafael. Pai de Schumacher era zelador de pista de corrida. 29/06/2004. http://esportes.aol.com.br, acesso em 16/08/2004. 55 Schumacher, mais bem pago do mundo. 23/06/2004. www.warmup.com.br, acesso em 25/06/2004. 56 Racing. São Paulo: nº 122, julho 2003. p. 08. 54

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Capítulo 2

Michael S chumacher O H o m e m: entre o público e o privado 28

Capítulo 2: Michael Schumacher – o homem: entre o público e o privado 2.1 Schumacher e a privacidade na imprensa. Ayrton Senna é considerado o grande herói do automobilismo brasileiro. Conquistou três títulos mundiais, 41 vitórias e obteve a espantosa marca de 65 pole-positions. Foi um dos mais populares esportistas brasileiros. Também zelou por sua imagem fora das pistas: apareceu na revista Caras pilotando seus jet-skis, seu helicóptero, voou de F5 da Força Aérea Brasileira, tinha o japonês Norio Koyke como seu fotógrafo oficial. Schumacher, porém, parece adotar outra estratégia, como mostra a citação abaixo, do jornalista Flávio Gomes: Muita coisa se escreveu sobre Schumacher, o hepta, nos últimos dias [agosto/setembro de 2004]. Gostei de uma análise do Luiz Fernando Ramos, o Ico, colega que vive na Áustria. Schumacher é um anti-herói porque não se comporta como super-homem. Joga bola, esquia com os filhos e não aparece na "Caras", não pilota aviões, não anda de jet-ski e não tem fotógrafo oficial para registrar seus momentos de intimidade. Não se acha um predestinado e preserva sua vida privada porque ela é isso mesmo, privada. Ao contrário de zilhões de esportistas que adoram a vida de celebridade, mas, mais do que isso, adoram reclamar que a vida de celebridade é dura e que ninguém respeita sua privacidade.57

A vida privada de Michael Schumacher é algo difícil de ser estudado. Sua vida pessoal não é revelada, não aparece nas revistas de personalidades. Ele não costuma levar sua esposa para todas as corridas, e seus filhos raramente são vistos. Em meados de 2004, por meio de seus advogados, pediu a todos os meios de comunicação da Alemanha que: [...] Gina Maria e Mike, os rebentos em questão [,] sejam privados da perseguição da mídia. Schumacher alega "motivos de segurança" para proibir que as crianças sejam fotografadas, e pede também que eles sejam poupados pela imprensa "para garantir a eles uma vida familiar serena e tranqüila".58

Desse modo, nenhuma fotografia das crianças “pode ser publicada sem autorização, sob pena de processo judicial” 59.

57

GOMES, Flávio. Temas avulsos. 03/09/2004. www.warmup.com.br, acesso em 03/09/2004. Schumacher proíbe imagens dos filhos. 23/07/2004: www.warmup.com.br, acesso em 23/07/2004. 59 Idem. 58

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Em 2003, quando lhe perguntaram “por que suas crianças jamais foram a um grande prêmio”, Schumacher respondeu: “minhas crianças merecem uma vida calma. As pessoas não conhecem onde moramos, assim, elas são tratadas apenas como crianças normais”.60 Essas informações foram retiradas de um website de notícias e de uma revista de Fórmula 1. Encontram-se dados sobre a vida pessoal de Michael Schumacher em poucos trechos de entrevistas publicadas em jornais, revistas e websites, notas publicadas em websites e artigos de revistas de automobilismo. O personagem não torna pública sua vida fora das pistas. Conforme declarou no início de 2004, preferiria o anonimato e deixa isso bem claro: “Ser famoso nunca foi o meu objetivo. Ser anônimo seria um sonho pra mim (...) Eu não me sinto confortável com a comoção em torno de mim. Para ser honesto eu nem entendo, porque não me vejo como algo especial (...) Talvez eu possa dirigir um pouco mais rápido que os demais, mas por outro lado eu sou um cara normal tentando viver em família”.61

Schumacher reclama que “gostaria de viver uma vida em família mais tranqüila”. E completa dizendo que “se pudesse escolher, gostaria de ser o mesmo piloto, rápido e campeão, mas sem ser reconhecido em público”.62 Em 1992, ainda início de sua carreira, já demonstrava que a fama o estava incomodando. Lemyr Martins escreveu sobre isso: Schumacher já demonstra certo enfado pela fama. Queixa-se da falta de privacidade e lamenta não poder passear em Kerpes, onde mora atualmente, com o sossego de antes. “A privacidade acabou, a caça de autógrafos me impede de sair com minha namorada. E pensar que isso vai continuar no futuro...”, resigna-se.63

Lemyr Martins ressaltou essa aversão do alemão em falar de sua vida privada também em 1994, na entrevista que fez com Schumacher, após a conquista do primeiro título. “Michael revelou-se personalíssimo em suas opiniões, mas detesta falar da vida particular, principalmente da financeira”.64 Como seria possível o maior vencedor e mais vezes campeão da Fórmula 1 ser anônimo? Alguém que tem sua imagem veiculada em todos os jornais esportivos dos países que acompanham a Fórmula 1, e que é constantemente notícia, não ser reconhecido em público? Segundo afirma Antoine Prost: “(...) Com efeito, certas atividades se caracterizam por tornar seus executantes ‘públicos’, porque se dirigem por definição ao ‘público’: as 60

Piloto: Michael Schumacher. F1RACING: Suplemento da revista Racing. São Paulo, n. 134, dez 2003. p. 42 Schumi confessa: a fama o incomoda. 02/03/2004. www.warmup.com.br, acesso em 02/03/2004. 62 Racing, São Paulo, n. 140, março 2004. p. 08. Sobre isso, é citado que “(...) o alemão gosta de viajar para o GP dos EUA vários dias antes da prova, pois é o único país pelo qual a F-1 tem corrida e o hexacampeão não é reconhecido nas ruas ou tratado como celebridade” (In: Schumi confessa: a fama o incomoda. op. cit.). 63 MARTINS, Lemyr. Michael Schumacher: a hora da afirmação. Quatro Rodas. São Paulo, set 1992. p. 102. 61

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atividades do espetáculo e da política”65. A Fórmula 1, espetáculo esportivo transmitido para todo o planeta, ao vivo, onde os protagonistas duelam pela vitória e tornam-se ídolos e heróis, não poderia também deixar de despertar no público o desejo de melhor conhecê-los. Pois, ainda segundo Prost: O sucesso de um ator, de um cantor, de um campeão - na medida em que o esporte é um espetáculo - ou de um político é medido pela sua notoriedade, isto é, pelo número de pessoas que os conhecem. Mas esse conhecimento distante não basta: o público deseja avidamente um conhecimento mais pessoal, e quer entrar na vida privada dos homens públicos.66

É justamente nesse ponto, a vida privada, que Schumacher procura impedir que a mídia entre. 2.2 Entre a preocupação humanitária e a burla ao fisco. Nas fontes consultadas, a vida profissional, a vida do “Schumacher piloto” parece ser mais rica em informações. Schumacher consegue manter sua vida pessoal preservada da imprensa. Nos jornais e revistas brasileiras pesquisados, assim como nos websites consultados, pouco foi encontrado que possa ser percebido como “vida privada de Michael Schumacher”. Um dos poucos aspectos do “homem” Schumacher que procura ser visibilizado são suas preocupações humanitárias, freqüentemente também associadas a seus rendimentos. Em uma de suas colunas, Flávio Gomes analisa um pouco o “homem” Schumacher através de um gesto seu: “A doação de US$ 10 milhões de dólares de Michael Schumacher às vítimas dos tsunamis no sudeste asiático, em que pesem as opiniões dos eternos detratores de seja lá quem for, que dirão se tratar de demagogia, marketing ou algo do gênero, leva a uma reflexão sobre essa figura aparentemente conhecida de todos, mas que encerra, no íntimo, uma personalidade complexa e ímpar”.67

Michael Schumacher doou a quantia mencionada por meio de seu empresário, Willy Webber, em um programa de televisão alemão. Sobre o assunto, Schumacher declarou: “É horrível o que está acontecendo na Ásia. Ninguém pode ficar cego diante de tais fatos”. Para esta mesma tragédia, outros esportistas e entidades fizeram doações, mas nenhuma chegou a dar um valor sequer próximo ao de Schumacher. A Federação Alemã de Futebol doou US$ 2 64

MARTINS, Lemyr. O novo herói da Alemanha. Quatro Rodas. São Paulo, dez 1994. p. 109. PROST, Antoine. Fronteiras e espaços do privado. In: PROST, Antoine, VINCENT, Gérard (org.). História da vida privada - v.5: Da Primeira Guerra a nossos dias. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p.149. 66 Idem. 65

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milhões68. As fábricas japonesas Bridgestone, de pneus, e Toyota, de carros e motores, doaram US$ 900 mil cada uma, e a Vodafone, empresa italiana de telefonia, doou US$ 1, 87 milhões para a mesma causa.69 A única crítica encontrada sobre a ação de Schumacher foi a de um político alemão: Segundo Franz Muentefering, chefe do Partido Social Democrata, Schumacher não paga impostos na Alemanha - o heptacampeão mora na Suíça. 'Eu não gosto de alguém que doa milhões e não paga impostos', falou Muentefering em entrevista à emissora de TV N24. 'Eu prefiro pessoas que têm pouco e doam 50 centavos, mas pagam seus impostos', disse.70

Com sua calma habitual, “Schumacher garantiu que não é verdade que deixe de pagar impostos na Alemanha. 'Não é uma afirmação correta, mas cada um tem o direito de expressar suas opiniões', falou o piloto”.71 Outras ações desse tipo já foram registradas sobre o personagem. Em 2003, Schumacher foi nomeado Embaixador da República de San Marino. “O cargo é um reconhecimento às ações beneficentes realizadas pelo pentacampeão, sobretudo às crianças”.72 Em novembro de 2003, Schumacher doou US$ 1 milhão para a UNESCO, entidade internacional da qual também é embaixador. Em 2004, a doação foi de US$ 2 milhões. O dinheiro foi destinado ao desenvolvimento de programas para as crianças em países em desenvolvimento.73 Em entrevista concedida a Livio Oricchio, em 2001, Schumacher falou que gostaria de poder se dedicar mais a esses projetos, e não o faz por causa de seus compromissos profissionais.74 Sendo pedido que falasse sobre os projetos com a UNESCO, disse: Mantemos três hospitais infantis. Um em Sarajevo, outro na Índia e um terceiro na África. [...] Participo de jogos beneficentes para arrecadar fundos. Além disso, toda a renda das minhas fotografias, e há muitas requisições, também é destinada a bancar despesas.75

Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet e Ayrton Senna também têm registros de doações feitas a entidades assistenciais e ações correlatas. 67

GOMES, Flávio. Schumacher, o desconhecido. 06/01/2005: www.warmup.com.br, acesso em 06/01/2005. Schumacher anuncia doação de US$ 10 mi às vítimas do tsunami. 04/01/2005. http://esporte.uol.com.br/f1, acesso em 05/01/2005. 69 Bridgestone e Toyota doam US$ 900 mil. 06/01/05. www.warmup.com.br, acesso em 06/01/05 70 Doação feita por Schumi é alvo de crítica. 23/01/2005. www.warmup.com.br, acesso em 24/01/2005. 71 Idem. 72 Schumacher, Embaixador de San Marino. 23/07/2003. www.warmup.com.br, acesso em 23/07/2003. 73 Schumi doa cerca de US$ 2 mi à Unesco. 08/11/2004. www.warmup.com.br, acesso em 08/11/2004. 74 ORICCHIO, Livio. O homem por trás do cavaleiro das pistas. O Estado de São Paulo, São Paulo, 01/04/01. p. E8. 75 Idem. 68

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Fittipaldi comenta em uma de suas biografias que “durante anos ajudei uma organização chamada The Miami Project (...) um dos maiores centros de pesquisa de traumatismo e paralisia da coluna vertebral”. E ressalta: “Conheço o Dr. Steve há anos, e certa vez ele me levou por uma tour na UTI, me mostrando onde havia sido aplicado o dinheiro que eu a ajudara a levantar”.76 Fittipaldi sofreu dois graves acidentes que atingiram sua coluna vertebral: em 1996, na Fórmula Mundial, em Michigan, e em 1997, no Brasil, caindo de ultraleve em terras de sua fazenda em São Paulo, sendo atendido no mesmo centro que ajudara a manter. Nelson Piquet falou a Lemyr Martins, em entrevista em 1992, que adotou quatro meninos de rua, em Brasília: “(...) talvez sirva para dar um exemplo, ajudar essas crianças que cheiravam cola, viviam drogadas na rua. Fiz uma casa pra eles em Ceilândia. Damos estudo, comida e contratamos uma assistente social para orientá-los. São meus quatro filhos pobres”.77 Ayrton Senna fazia doações freqüentes a muitas instituições. APAEs, o Hospital do Câncer, em São Paulo, a Associação de Apoio à Criança Deficiente, entre outros. Até mesmo para as crianças vítimas da guerra na Bósnia, no início dos anos 90, Ayrton Senna enviou ajuda78. Mas é o Instituto Ayrton Senna, fundado e dirigido por sua irmã, a psicóloga Viviane Senna, que procura demonstrar a dimensão da preocupação que o piloto tinha com as causas sociais.79 Gestos desse tipo são costumeiramente revelados em entrevistas, ou apenas em biografias. No caso de Ayrton Senna, o instituto foi a concretização de um projeto que o piloto idealizava antes de morrer. Declarações sobre isso não são destacadas em websites, no caso de Emerson ou Piquet, nem de Senna. Já a doação de Schumacher para as vítimas do recente maremoto na Ásia foi feita em programa de televisão. Até mesmo as pequenas doações são noticiadas, como a doação de “um macacão que usou pela Ferrari para a Catedral Anglicana de São Paulo. O objeto seria leiloado e o valor revertido para a creche Lina Rodrigues, localizada na favela de Paraisópolis”.80 E também muito comentadas são suas partidas de futebol com outros atletas e pilotos, cujas rendas são “revertidas para ações

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Fittipaldi, Emerson. Uma vida em alta velocidade. Rio de Janeiro: Objetiva, 2003. p. 249. MARTINS, Lemyr. Só volto para ser campeão. Quatro Rodas, São Paulo, set. 1992. p.96. 78 RODRIGUES, Ernesto. Ayrton: o herói revelado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004. p. 604. 79 Sobre o Instituto Ayton Senna, ver: http://jbonline.terra.com.br/destaques/senna/mat_05.html, acesso em 12/07/2004. [O vínculo de esportistas (ou mesmo de outras figuras de projeção da mídia) com atividades de cunho social tem sido cada vez mais constante: ver, no caso brasileiro, o caso do jogador de futebol Raí (e sua Fundação Gol de Letra) ou do jogador Ronaldo.] 80 Schumacher ajuda creche de São Paulo. 26/04/2004. www.warmup.com.br, acesso em 26/04/2004. 77

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humanitárias da UNESCO”.81 Por que esse destaque? Seria simplesmente por Schumacher ser atualmente o piloto mais visado pela imprensa, em função de estar no auge da carreira? Segundo Flávio Gomes, Schumacher: Foi o único piloto, em 2001, que se manifestou sobre os atentados de 11 de setembro da maneira mais eloqüente possível, primeiro pedindo para não correr, depois decidindo que naquela prova (GP da Itália) chegaria, no máximo, em quarto, por considerar um desrespeito subir ao pódio. E fez isso. Anos depois [em 2003], mesmo diante da morte da mãe na véspera, fez questão de correr e ganhar em Ímola, como se desse um recado: seu drama pessoal não deveria prejudicar quem estava no autódromo ou vendo a prova pela TV. Não, um drama pessoal, individual, não justificaria sua ausência. Um drama coletivo, como o de 11 de setembro, ou o dos tsunamis, a esses o cidadão Michael Schumacher dá atenção e importância. É gente que faz, como dizia aquele anúncio da TV.82

Quanto aos incidentes de 11 de Setembro de 2001, nos Estados Unidos, Schumacher se mostrou muito abalado. Reginaldo Leme ressaltou esse fato quando falou dos motivos da baixa motivação que Schumacher passava no mês em que sucederam os atentados.83 Flávio Gomes continua, para explicar o que entende ser uma “personalidade complexa e ímpar”: O pouco que se sabe dele é o que se vê nas pistas, aos domingos. A pilotagem, a vibração no cockpit e no pódio, as entrevistas curtas e objetivas, e acabou ali. No mais, é um sujeito pacato e caseiro, não aparece em revistas de celebridades, se esconde na Noruega no inverno, mora na Suíça, não em Mônaco, casou-se há bastante tempo, constituiu uma família que a todo custo procura preservar dentro dos limites da normalidade, tem um Fiat 500, joga bola, toma cerveja e fuma charuto.84

2.3 Homem de caráter ou gênio de marketing? Cortês ou arrogante? Nas revistas, jornais e websites, pouco se pode ler sobre sua vida pessoal. É sobre o piloto que mais se tem notícia. Esse comportamento reservado é muitas vezes julgado como antipatia ou arrogância. Para Flávio Gomes: "Acusado", e uso as aspas porque nada mais besta do que tal termo para descrever um tipo de personalidade, de ser frio e calculista, antipático, arrogante, não é nada disso — quem convive com ele sabe.85

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Schumacher reforça time de Ronaldo em amistoso beneficente. 14/12/2004. www.f1naweb.com.br, acesso em 14/12/2004. 82 GOMES, Flávio. Schumacher, o desconhecido. op.cit. 83 LEME, Reginaldo. Atingido em cheio. 21/09/2002. www.warmup.com.br, acesso em 15/08/2002. 84 GOMES, Flávio. Schumacher, o desconhecido. op.cit. 85 Idem. 34

Num chat, onde fãs de Fórmula 1 puderam conversar com Reginaldo Leme em 1999, também surgiu uma questão a este respeito: Celso pergunta: Não gosto do estilo arrogante do Schumacher. Você que já fez muitas entrevistas deve ter ficado cara a cara com ele em um dia de fúria, qual a aparência dele nesses casos e, após algumas perguntas que possam tê-lo irritado, o que ele diz???? Reginaldo Leme: Celso, os alemães me desculpem pela generalização, mas a arrogância do Schumacher é apenas aquela característica dos seus compatriotas. Nada mais do que isso. Quantas vezes eu já vi o Senna e o Piquet serem mais, ou no mínimo, iguais, na arrogância? Depende do momento. Nas vezes que falei com ele cara a cara, ele se mostrou, antes de qualquer coisa, muito profissional. Nunca é muito amistoso, mas também não é de recusar respostas. Tipo Alain Prost. Só que o francês era mais simpático, pelo menos comigo. Além de leal.86

Mas, em sua coluna no website WarmUp, no mesmo ano, meses depois, ao falar sobre a declaração que Schumacher deu para os fãs enquanto se recuperava do acidente sofrido na Inglaterra, Reginaldo se contradiz: “Schumacher não consegue falar a língua do país da Ferrari. Esta é uma das razões pelas quais, mesmo com o reconhecimento que a torcida tem pelo que ele faz na pista, a imagem de Schumacher anda meio desgastada na Itália. Quanto aos jornalistas, nem se fala. O alemão não faz questão nenhuma de tratá-los com consideração”.87

Ricardo Perrone, do website F1 na Web, comenta em sua coluna: (...) Schumacher por exemplo: Ele fala com a imprensa antes da corrida? Não, é o jeito dele. Ele dá autógrafo enquanto trabalha? Não, e nem tentem pedir. Ele nega ajuda, entrevista, sorrisos e autógrafos após seu trabalho feito? Não, ele é o Mr. Simpatia dos boxes, dizem 100% dos que estão lá em todos os GPs. Isso eu chamo de personalidade, caráter. Caráter, repito, não entrando no mérito de ser bom ou ruim, mas daquele que é o que é, conquistou o respeito dos demais pelo que é, e que não mente pra parecer outra coisa. Vocês acham que o alemão não tem condição de contratar uma equipe melhor que a do Lula para mudar a imagem dele? Claro que tem, mas não. Ele aceita e ouve as porradas, não responde, fica na dele, e desde que o vi pela primeira vez, só vejo uma resposta: Resultados. Nunca vejo ele brigando, falando demais, entrando em polemicazinha de mídia, etc. Claro, as vezes acontece, ele é famoso, tudo o que fala vira notícia. Mas pro nível de popularidade dele, ele até que fica muito longe de polêmicas pelo que fala (...).88

Na conversa no chat, anteriormente citada, Reginaldo Leme fala do profissionalismo de Schumacher, não sendo de “recusar respostas”, em um ano (1999) em que ele havia sofrido 86

Chat com Reginaldo Leme, em 13/04/1999: http://educaterra.terra.com.br/vestibular/chat/reginaldo_ leme.htm, acesso em 05/06/2003. 87 LEME, Reginaldo. Só quer o que é dele. 06/08/1999. www.warmup.com.br, acesso em 15/08/2002.

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um acidente, tendo perdido dois títulos nos anos anteriores. No mesmo ano de 1999, Leme se contradiz, referindo-se à dificuldade de Schumacher em falar italiano e da falta de consideração pelos jornalistas. Depois, em 2000, menciona a simpatia de Schumacher, dessa vez com a imprensa, a torcida e seus mecânicos. O alemão, muito menos simpático na vida real, sabe comportar-se melhor nas entrevistas. Ganhando ou perdendo, ele responde com serenidade. Sem contar a alegria que ele sempre leva para os pódios nas vitórias. Aquela sua forma de reger o hino italiano dirigindo-se aos mecânicos da Ferrari é atitude típica de um gênio de marketing. Mas é o que o torcedor espera de seu ídolo.89

Em dezembro de 2001, Reginaldo Leme reforça o que disse no ano anterior. Ele ressalta muitas atitudes admiráveis de Schumacher como pessoa, dentro do conturbado ambiente da Fórmula 1, e após citar exemplos e casos, diz que “quem já trabalhou de perto com Schumacher fica impressionado com o respeito que ele tem pelos jornalistas”.90 Um bom exemplo das atitudes de Schumacher frente aos jornalistas foi dado numa entrevista após o pódio de San Marino, em 2004. Na corrida, houve uma disputa de posição entre Michael Schumacher e Juan Pablo Montoya. Schumacher se saiu melhor e Montoya, irritado, segundo conta Flávio Gomes, se comporta na entrevista: [...] de maneira pouco cortês, chamando Schumacher, sentado ao seu lado, de "cego e estúpido". Michael permanece impassível, quase perplexo. Alguém pergunta se ele quer responder ao destemperado latino com sotaque de Miami e ele, simplesmente, diz "não".91

Nessa mesma coluna, Flávio Gomes ressalta o comportamento de Schumacher em situações de pista anteriores, sendo que nada reclamara de manobras de Montoya nos anos em que passaram a disputar corridas juntos (a partir de 2001), achando normal o que acontecera na pista, em situação de corrida. Nos relatos acima pode-se perceber que Schumacher tenta mostrar a imagem pública de alguém sereno que, no seu meio profissional, não desacata ninguém, e procura ser cortês e educado nas entrevistas. Reginaldo Leme é o único que comenta, em 1999, falta de “consideração” de Schumacher para com os jornalistas (seria só por ele não saber falar italiano?), mas suas colunas têm comentários contraditórios a este respeito.

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PERRONE, Ricardo. Romário, Tyson, Schumacher... 20/05/2004. www.f1naweb.com.br, acesso em 20/05/2004. O texto de Ricardo Perrone é uma discussão sobre caráter, focalizando diferentes esportistas. 89 LEME, Reginaldo. Rubinho tem razão. 23/05/2000. www.warmup.com.br, acesso em 22/05/2002. 90 LEME, Reginaldo. Campeão da boa vontade. 14/12/2001. www.warmup.com.br, acesso em 15/08/2002. 91 GOMES, Flávio. O curto caminho para a burrice. 29/04/2004. www.warmup.com.br, acesso em 30/04/2004. 36

Flávio Gomes conta em uma de suas colunas sobre sua primeira entrevista com o alemão, que estava em seus primeiros meses na Fórmula 1, no final de 1991. Diz que Schumacher foi educado, demonstrou “um inglês muito bom” e declarou ser fã de Senna (algo em que Gomes não acreditou muito, mas que pôde confirmar anos depois, em 2000, ao vê-lo chorar em Monza, Itália, após igualar as 41 vitórias de Ayrton Senna).92 Nessa primeira entrevista com Schumacher, Flávio Gomes não ficou impressionado: “Sequer o achei muito inteligente, apesar da segurança nas respostas”93, disse em 2002. Mas, em 1995, havia sido um pouco mais sarcástico, dizendo que: O alemãozinho não perde uma oportunidade sequer de ser deselegante, apesar do raciocínio de protozoário que expõe em suas enfadonhas entrevistas coletivas. Ameba que é, Michael costuma abusar de clichês e frases feitas e raramente diz mais do que ‘Im very happy’ quando ganha ou ‘Im very disappointed’, quando perde.94

Seu discurso sobre Schumacher mudou com o passar dos anos. Ainda nos anos 90, Gomes não parecia ter grande admiração por Schumacher, como mostra uma de suas colunas de 1997, em que fala da possibilidade de Barrichello ser contratado pela Ferrari; os jornalistas italianos iriam gostar mais dele do que do alemão “antipático”: No íntimo, os colegas torcem para que Rubinho assine mesmo e ande na frente de Schumacher logo de cara. O povo italiano vai-se apaixonar por ele na hora, diz um deles. Com Michael não é assim. Para gravar um comercial da Fiat, ele ficou ensaiando um mês e só disse duas palavras em italiano, com um sotaque horrível. Só faltou dublarem, completa outro. [...] Em resumo, Schumacher, para a Itália, é um chato intragável. Rubinho, uma figura agradável, um garoto de boa índole, humilde e simpático. Como era Alesi, que não ganhava nada, mas todos amavam de paixão. Só que Michael é o melhor do mundo, e todos reconhecem que transformou a Ferrari numa equipe vencedora. Por isso ninguém ousa desancá-lo em público.95

Em uma conversa com Lemyr Martins, em 2003, enquanto este divulgava e autografava seus livros, na Feira de Rua do Livro, em Florianópolis, perguntei sobre o comportamento de Schumacher nos primeiros anos de carreira na Fórmula 1. Ele disse que o alemão estava então deslumbrado com o que vivia. A condição de campeão do mundo, em 1994, havia chegado muito cedo e de uma forma inesperada. Schumacher aprendeu com o tempo e com as pessoas e soube administrar o deslumbramento que as vitórias e títulos lhe trouxeram, disse-me Lemyr Martins. Esse mesmo deslumbramento foi percebido por pilotos, e citado por Lemyr Martins, em 1995: “Seus colegas são unânimes em constatar que 92 GOMES, Flávio. Por que o cara é bom. 25/07/2002. www.warmup.com.br, acesso em 20/11/2003. 93 Idem. 94 Gomes, Flávio. A FIA acertou. 20/03/1995. www.warmup.com.br, acesso em 18/11/2003. 95 GOMES, Flávio. Sonho italiano. 13/08/1999. www.warmup.com.br, acesso em 18/11/2003. 37

Schummy mudou de um ano pra cá. Na opinião deles, empavonou-se demais com o título de campeão. O conterrâneo Heinz-Harald Frentzen, por exemplo, não lhe dirige a palavra”.96 Em 2004, o canal de TV alemão ZDF, em pesquisa feita com mais de 100 mil de seus telespectadores, elegeu Michael Schumacher o esportista alemão do século XX.97 O não comparecimento de Schumacher à cerimônia de premiação, por estar de férias na Noruega, gerou polêmica entre os esportistas alemães e a imprensa. Considerado “arrogante”, por um dos premiados pela pesquisa, e “mal agradecido ao esporte” por outro esportista também premiado, foi defendido pelo tablóide alemão Bild: “Schumacher realmente é arrogante ou são os outros que estão com ciúmes?”. Willy Webber, empresário do piloto, respondeu: “Todo mundo que conhece Michael sabe que ele não tem nada de arrogante”.98 Pode-se perceber que a imagem de arrogância que acompanha Schumacher não está presente apenas na imprensa brasileira. Seus conterrâneos também o julgam por ações as mais simples, como a ausência a uma das muitas premiações às quais ele é indicado regularmente. Na única obra literária editada em português sobre Schumacher, consta, em 1996, que: “Lançado no Brasil há um ano e meio, o livro vendeu menos da metade da tiragem de 5000 unidades, [...] segundo a distribuidora Edipromo, as baixas se devem à antipatia dos brasileiros pelo alemão. A leitura, porém, desfaz a imagem arrogante de Schumacher”.99 2.4 Schumacher e a sombra de Senna. Em uma matéria da revista semanal Lance a Mais, do jornal esportivo Lance!, Bernardo Ferreira afirma: “Schumacher passa a imagem de um típico alemão - frio e calculista. Mas quem o acompanha no dia-a-dia jura que ele é diferente. - Schumacher é sensível e calmo. Ele vive chorando ao assistir a filmes com sua mulher, Corinna – conta Helmut Ujl, que cobre a Fórmula 1 para o jornal Bild.”100 O lado “sensível” de Schumacher pôde ser percebido publicamente em Monza, Itália, em 2000. Michael Schumacher nunca havia derramado uma lágrima em público. Fosse por vitórias ou por títulos. Nunca se havia visto seu rosto molhado que não fosse da champanhe que ele estoura, quase sempre como vencedor. Assim foi por dez anos. 96

MARTINS, Lemyr. Uma questão de estilo. op. cit. p. 118. Michael, o esportista alemão do século. 20/11/2004. www.warmup.com.br, acesso em 21/11/2004. 98 ISHIKAWA, Marcio. Schumacher não comparece em cerimônia e gera polêmica. 23/12/2004. www.grid.abril.com.br/index.shtml, acesso em 23.12.2004. 99 GONÇALVEZ, Daniel. O surgimento da estrela alemã. Quatro Rodas. São Paulo, setembro 1996. p. 140. O livro em questão é: Schumacher: a vida do novo campeão de Fórmula 1, do jornalista inglês Timothy Collings, publicado pela editora Talento, de Portugal, em 1995. 97

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No dia 10 de setembro de 2000, após vencer o Grande Prêmio da Itália, Michael Schumacher derramou lágrimas no pódio. Alguém o lembrou que havia alcançado as mesmas 41 vitórias de Ayrton Senna, e ele não se conteve. Ernesto Rodrigues, em sua biografia de Senna, descreve as palavras de Schumacher sobre esse momento: “É verdade. Quando me lembraram que eu estava igualando as vitórias de Senna, tudo voltou. Foi uma mistura de muitas coisas. Eu estava sobre uma pressão inédita, mas claramente aquilo aconteceu por causa da memória de Ayrton. É uma pena que a gente não tenha corrido um contra o outro por todos esses anos”.101

Na entrevista coletiva dos três primeiros colocados, Schumacher não controlou seu pranto. Flávio Gomes comentou, à época: Ele vibra, sim, quando ganha uma corrida. Soca o ar, abraça os mecânicos, beija a bochecha do Jean Todt e rege o hino da Itália no pódio. Tudo isso é normal. Anormal foi vê-lo começar a soluçar quando comparado a Senna por ter chegado nas mesmas 41 vitórias do brasileiro, um dos maiores nomes de todos os tempos na F-1, aquele que deixou a herança emotiva mais forte, pela forma como morreu.102

Para a imprensa brasileira, aquele momento tornava-se particularmente relevante, pois permitia a conexão com a memória de Ayrton Senna. Reginaldo Leme também registrou sua impressão, acreditando que, mais do que o simples fato de ter igualado seu maior ídolo, Schumacher desabou também pela pressão que sentira durante o campeonato, tendo sua capacidade posta em dúvida pela imprensa européia, enquanto Mika Hakkinen, seu adversário nas pistas, se distanciava no campeonato. Era pressão demais, e a lavagem da alma foi aquela imagem inusitada do super-homem, tão imune às tensões quanto aos ataques dos adversários na pista, desabando em cima da mesa a ponto de desconcentrar o grande rival e o irmão mais novo, durante os minutos de satélite pagos a preço de ouro pelas televisões do mundo todo, para ouvir respostas que nenhum deles conseguiu dar. Vi o jeito de Hakkinen e Ralf, assustados, tentando consolar Michael. E vi Corina, mulher de Schumi, contando que o viu chorar assim no dia da morte de Senna.103

Michael Schumacher se mostrou frágil. Tendo sempre carregado a fama de arrogante, frio, antipático, mostrava-se, agora, sensível. Flávio Gomes considera que: No caso de Schumacher, talvez mais do que as lágrimas, tenha sido significativo o desviar de olhos quando eu mesmo perguntei a ele, na coletiva para a mídia impressa minutos depois do chororô diante das 100

FERREIRA, Bernardo. Fórmula dos 6. Lance a Mais!: São Paulo. n. 164, 19 a 26/09/2003. p. 18. RODRIGUES, Ernesto. op. cit. p. 611. 102 GOMES, Flávio. De choros e lágrimas, 14/09/2000. www.warmup.com.br, acesso em 17/10/2003. 103 LEME, Reginaldo. A briga esquentou de novo. 13/09/2000. www.warmup.com.br, acesso em 16/09/2003. 101

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câmeras da FOA TV, se aquilo tudo tinha algo a ver com Senna. (...). Schumacher não olhou nos meus olhos, como costuma fazer com todo jornalista que lhe pergunta qualquer coisa. Abaixou a cabeça, falou que não queria entrar em detalhes sobre o assunto e pediu desculpas. Eu já não achava que ele tinha fingido quando chorou, Michael não me parece um ator. Mas, se tinha ainda alguma dúvida quanto à autenticidade de seus soluços incontroláveis, ela se foi naquele olhar desviado para o chão.104 Flávio Gomes ainda ressalta: Nove anos atrás, em Monza, fiz a primeira entrevista longa que Schumacher concedeu a um jornal brasileiro. Ele disse com todas as letras que Senna era uma espécie de deus, um ídolo, o máximo. Todos querem se aproximar de seus deuses, poucos conseguem se igualar a eles. Michael conseguiu. Por isso chorou. E não precisou citar o nome de Senna nenhuma vez para que todos entendessem do que se tratava. Mesmo aqueles que o consideram um bufão.105

Interessante avaliar que, três anos depois, após o falecimento de sua mãe, Elisabeth Schumacher - ela morreu em abril de 2003, aos 55 anos – Schumacher não chorou em público. Era o fim de semana do GP de San Marino, domingo de Páscoa. Michael Schumacher largou na pole, duelou com seu irmão na primeira volta e liderou o primeiro quarto da corrida. No final, Michael venceu e Ralf chegou em quarto. Schumacher foi ao pódio com a faixa preta de luto no braço, e não derramou uma única lágrima. Sobre isso, Flávio Gomes escreveu: A postura de Schumacher, ereta, olhando para o alto, depois de uma vitória impressionante, era algo mesmo de emocionar. Michael fez muita força para se mostrar forte. Nem precisava. O que conseguiu na pista bastava. Nem ao pódio precisaria ir, mas fez questão. Talvez porque o mundo ainda não tivesse visto seu olhar, a tristeza dentro daquele capacete, atrás daquela viseira.106

Seguindo a coluna de Flávio Gomes, percebe-se como ele se abstém de comentar a corrida e somente fala de Schumacher e seu silêncio quanto à morte da mãe: Ele mostrou com seu olhar a grandeza de um esportista e homem raros. Não, não acho que tenha sido nenhum ato de heroísmo vestir o macacão e vencer a corrida de Imola. Não, ele não foi para a pista para provar nada, para que o mundo enaltecesse sua frieza, seu profissionalismo, sua competência. Não foi à pista para homenagear ninguém, não usou a morte de sua mãe para ganhar pontos com a opinião pública, não tocou no assunto. Apenas colocou uma tarja negra no braço e, calado, fez o que achava que tinha de fazer. Michael não costuma chorar. Nem de alegria, nem de tristeza. Só vi uma vez, em Monza/2000, quando igualou as 41 vitórias de Senna. Desabou, soluçou, perdeu o controle, e não quis explicar nada, pediu desculpas e, mais 104

GOMES, Flávio. De choros e lágrimas. op.cit. Idem. 106 GOMES, Flavio. Só mostrar seu olhar. 24/04/2003. www.warmup.com.br, acesso em 24/11/2003. 105

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uma vez, optou pelo silêncio. Foi assim, domingo. Talvez por não saber chorar, ele só queria mostrar seu olhar.107

Flávio Gomes enfatiza o profissional e o homem forte, que faz o que acredita que deve fazer. Destacando que Schumacher raramente chora, lembra o choro de Monza, em 2000, como único exemplo desse gesto em público. E, como já citado, destacou em 2005 que Schumacher dá mais atenção aos dramas públicos, como os Tsunamis e os atentados de 11 de setembro, nos EUA. Ao seu drama pessoal, não. Por isso correu, em respeito ao público que estava em Ímola, na Páscoa de 2003. Quanto às

lágrimas pela lembrança de Senna, por muitas vezes Schumacher

expressou sua admiração por ele. Poucas vezes, porém, expressou seus sentimentos como o fez nessa ocasião. É plausível, como fala Flávio Gomes, que a explosão emocional fosse causada por estar igualando os feitos de um ídolo. Foi o que os jornalistas, e talvez os telespectadores que assistiram a entrevista dos ocupantes do pódio (que é passada, ao menos no Brasil, em TV fechada), puderam imaginar. A Rede Globo encerra a exibição da Fórmula 1 após a cerimônia do pódio. Raras vezes a entrevista dos três primeiros colocados é levada aos telespectadores. Nesse dia, ela seria importante, pois, como cita Schmidt: “(...) o grande público busca conhecer sobretudo a vida dos mitos que, mostrados em sua humanidade, com seus tormentos e fraquezas, tornam-se gente como a gente”.108 O choro de Schumacher o mostraria “gente” como a gente que assiste a Fórmula 1, e que nunca o vira expressando-se de forma diferente das alegrias pelas vitórias ou da irritação pelas derrotas. De modo pouco controlado, parecendo sincero e sentido, Michael Schumacher demonstrou suas emoções. Não apenas por mais uma vitória, por um título – o terceiro, que ele iria conquistar duas corridas depois – ou coisas assim. Mas, talvez, por saber que pôde ser tão grande como aquele que tanto admirava. Por vencer tantas vezes como venceu seu ídolo, o rival que não pôde enfrentar plenamente. Pois os pilotos estão imersos no imaginário que projeta e inventa os heróis do automobilismo, e também estão sujeitos às suas seduções. O respeito por Ayrton Senna viria, supostamente, desde o início da carreira, embora algumas vezes a imprensa tenha dito o contrário. Em 1993, quando Senna, então na McLaren, procurava outra equipe para correr na temporada seguinte, a revista Grid publicava uma nota dizendo que Schumacher fazia “campanha aberta contra Senna”, para que o brasileiro não

107

Idem. SCHMIDT, Benito Bisso. Luz e papel, realidade e imaginação: as biografias na história, no jornalismo, na literatura e no cinema. In: SCHMIDT, Benito Bisso (org). O biográfico: perspectivas interdisciplinares. Santa Cruz do Sul (RS): EDUNISC, 2000. p.54

108

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fosse para a Benetton, a equipe do alemão na época. E terminava a nota dizendo que: “Schumacher morre de raiva de Senna e não esconde isso de ninguém na Fórmula 1”.109 Schumacher tivera desentendimentos com Senna nas pistas em 1992, mas nada indicara que houvesse a “raiva” citada pela revista. O próprio Schumacher comentou sobre isso em 2003: “Houve muitas circunstâncias em que eu senti que não era respeitado por ele e algumas vezes ele tentava me ensinar uma lição nas pistas. [...] Mas a partir daí, no começo de minha carreira na F-1, eu acredito que eu me tornei respeitado por ele e fico orgulhoso que nos demos muito bem no fim.”110 Em sua primeira entrevista após o título de 1994, Schumacher deixou clara a Lemyr Martins a admiração que tem por Ayrton Senna: Quatro Rodas – Você foi ou é fã de algum piloto em especial? Schumacher – (sem hesitar) Ayrton Senna, não há dúvidas.111

Ernesto Rodrigues, em sua biografia sobre Senna, relata como foi o primeiro contato de Schumacher com Senna, em 1991. Rodrigues escreve, baseado no depoimento de Cristine Ferracciu, uma namorada de Senna na Europa, que, em uma festa, a aproximação de Schumacher a Senna “foi quase uma reverência”, onde ele dissera: “- Ayrton, um dia quero ser igual a você.” Senna devolvera o gesto e recomendou: “- Treina bastante. Vale a pena.”112

Sendo o trecho com o diálogo supostamente travado entre Senna e Schumacher baseado em depoimento com pessoa que estivera afetivamente envolvida com o piloto brasileiro, e tendo o livro de Rodrigues sido publicado em 2004 - momento em que Schumacher estava no auge de sua carreira -, o relato deve ser bem considerado. Não seria mais um mecanismo de valorização de Ayrton Senna, também? É certo que não foram encontradas declarações de Schumacher em que ele se mostrasse “intolerante” a Senna, ou que o “desprezasse” publicamente, ao passo que mais de uma vez declarou respeito e admiração pelo piloto. Flávio Gomes destacou, em uma de suas colunas, como já mencionado, os termos que Schumacher usou para falar de Senna, ainda em 1991: “Ele disse com todas as letras que Senna era uma espécie de deus, um ídolo, o máximo”.113

109

Alemão Raivoso. Grid. São Paulo. n. 3, set. 1993. p. 9. Michael se culpou por acidente em 1994. 21/04/2004. www.warmup.com.br, acesso em 21/04/2004. 111 MARTINS, Lemyr. O novo herói da Alemanha. op.cit. p. 111. 112 RODRIGUES, Ernesto. op.cit. p. 381-82. 113 GOMES, Flávio. De choros e lágrimas. op.cit. 110

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Sobre a morte de Senna, ao que tudo indica seu grande ídolo e referência, Schumacher foi muito reservado, tendo falado a respeito apenas em 2000, seis anos após o acidente. E somente depois de passar por momentos nos quais demonstrou um lado seu que nunca a imprensa houvera presenciado antes (justamente, o seu choro convulsivo após a vitória no Grande Prêmio da Itália, em 10 de setembro de 2000, anteriormente comentado). O momento em que revelou ser o “homem” atrás da “máquina”. Em entrevista a Livio Oricchio, Schumacher recusou identificar-se a uma “máquina de vencer”: Certamente que não sou uma máquina de vencer. Primeiro por que não sou máquina e sim um ser humano. [...] choro, amo e tenho momentos de elevação emocional e de tristezas também. Mas ninguém vê isso. O que aparece é o Michael Schumacher dos autódromos, que não é o Michael Schumacher da vida privada.114

Nessa afirmação, Schumacher demonstra perceber que a imagem de si mais veiculada pela mídia é a do piloto. Ao ser perguntado por Oricchio se o Schumacher dos autódromos era muito diferente do Schumacher da vida privada, respondeu que : Minha imagem vem do que é exposto nas pistas, onde estou concentrado ao máximo em meu trabalho. Não poderia ser de outra forma. Há muitos sócios nesse projeto, investe-se uma quantia elevadíssima de dinheiro. Minha função é corresponder ao que essas pessoas esperam de mim. Quando estou fora dessa ambiente, não tenho mais o desafio de vencer.115

Ayrton Senna teve também sua imagem de “trabalhador”, de piloto dedicado, mais acentuada do que qualquer outra. Apenas mais “acentuada”. Pois era complementada pelas imagens de “bom moço” e homem “religioso”, também veiculadas na mídia como parte de sua construção como “herói nacional.” Bastante condizente com o que diz Edgar Morin, usando o conceito de “olimpianos”: [...] olimpianos são sobre-humanos no papel que eles encarnam, humanos na existência privada que eles levam. A imprensa de massa, ao mesmo tempo que investe os olimpianos de um papel mitológico, mergulha em suas vidas privadas a fim de extrair delas a substância humana que permite a identificação.116

Já Schumacher teve agregada, à reiterada imagem de arrogante, à de desleal, trapaceiro. Esta última Schumacher adquiriu ao longo dos anos 1990, após ter decidido o título de 1994 em uma colisão com Damon Hill, que foi enfatizada em 1997, quando a colisão 114

ORICCHIO, Livio. O homem por trás do cavaleiro das pistas. op.cit. p. E8. Idem. 116 MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX - O Espírito do tempo I, Neurose. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. p. 107. 115

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se repetiu, dessa vez mais deliberadamente, contra Jacques Villeneuve, no Grande Prêmio da Europa, em Jerez de La Frontera, Espanha. A manobra não deu certo e Schumacher teve sua imagem profundamente arranhada. “Além de derrotado, o alemão saiu do episódio de Jerez de la Frontera com a fama de 'Dick Vigarista' que, até hoje, ainda não conseguiu apagar completamente”.117 O que não é muito lembrado, quando se compara Senna e Schumacher, é que, nessa situação de Jerez em 1997, Schumacher usou o mesmo artifício que Senna contra Prost, em 1990, no Japão. Com uma colisão premeditada, Senna eliminou Prost da corrida ainda na largada e conquistou o título do ano. 2.5 Imagens, mercadorias. Em dezembro de 2004, o piloto Kimi Raikkönen, em férias pelas ilhas Canárias, foi fotografado bêbado em uma boate, e o assunto divulgado na imprensa européia.118 Recebeu advertência dos responsáveis por sua equipe, a McLaren. Um mês depois, foi outra vez notícia nos tablóides ingleses por estar embriagado nas “baladas” inglesas em Londres. A imagem do piloto está associada a das várias multinacionais que investem na McLaren, e Raikkönen foi advertido novamente pelos diretores da equipe.119 Em abril de 2005, novas fotografias suas, embriagado, saem nos jornais ingleses.120 O comportamento extra-pista do piloto mereceu uma defesa de Flávio Briatore, chefe da equipe Renault, dizendo que Raikkönen não é “robô”: “Se o Raikkonen fosse meu piloto e estivesse em uma boate para beber e se divertir, eu não teria problemas com isso” [...] “Já que ele não estava bebendo na noite anterior a uma corrida, qual era o problema?”.121 O comportamento dos pilotos quando estes não estão correndo é geralmente comentado. Como toda pessoa famosa, são vistos como notícia em qualquer situação. Por serem profissionais representantes de marcas e produtos de multinacionais que anunciam na Fórmula 1, devem preservar uma imagem condigna com a dos produtos aos quais estejam ligados. Pois, como afirma Antoine Prost: “Legitimadas por seu uso documental, as imagens 117

LEME, Reginaldo. A bola da vez. 30/04/2004. www.warmup.com.br, acesso em 31/12/2004. Dick Vigarista é o personagem que sempre tentava trapacear para ganhar as corridas, no desenho animado “Corrida Maluca”, criado por Hanna & Barbera nos anos 60. 118 Raikkonen envolve-se em confusão nas férias. 01/12/2005.www.formulanews.com.br, acesso em 02/12/2005. 119 Briatore defende "bebedeira" de Kimi Raikkonen. 20/02/2005.www.formulanews.com.br, acesso em 21/02/2005. 120 Pilotos da McLaren se envolvem em confusão. 01/04/2005.www.formulanews.com.br, acesso em 03/04/2005. 44

se prestam a outras finalidades. Principalmente publicitárias”.122 Alguns, mais famosos, têm suas ações mais destacadas. Caso de Raikkönen e Schumacher. Michael Schumacher tem sua imagem ligada a muitos produtos e, atualmente, à equipe Ferrari, acima de tudo. Entre esses, o consórcio alemão Dekra, a empresa italiana de telefonia Vodafone, a grife esportiva Puma. Seu comportamento extra-pista é muito reservado, e raramente é notícia polêmica quando não está num circuito. Parece procurar preservar-se para não afetar sua imagem de profissional sério. No entanto, em 2003, após a conquista do hexacampeonato, no Japão, Michael Schumacher embriagou-se e foi flagrado pelos repórteres em cenas inesperadas para quem não é astro de rock. Com seu irmão, Ralf, e o piloto da equipe Toyota, Olivier Panis, Schumacher destruiu o escritório da Toyota enquanto festejava o hexacampeonato, no domingo à noite. Segundo o The Sun, citado pelo website Warmup: Na companhia de Ralf Schumacher e Olivier Panis, entre outros “convidados”, Michael transformou o local em uma “zona de guerra”. De acordo com a reportagem, Ralf atirou uma TV pela janela - que ficou arrebentada, já que estava quebrada. Uma testemunha deu seu depoimento. “Eles pareciam animais selvagens”. Ricardo Zonta [brasileiro, piloto de testes da Toyota] também esteve presente ao “encontro”, em que, junto com Panis e Schumacher, saiu ovado e cheio de mostarda e catchup. Além disso, as pessoas que tiveram contato com o hexacampeão disseram que jamais o viram tão embriagado, “fumando um charuto enorme” e, junto com o francês da Toyota, “quebrando mesas e cadeiras, atirando tudo pela janela”.123

Schumacher teria feito todo o estrago ajudado por integrantes da Toyota, entre eles o piloto Olivier Panis, e colegas de outras equipes. Schumacher estava vestido com uma camisa e um boné oficiais da Toyota, e depois da bagunça feita, passeou com uma empilhadeira pela área dos boxes.124 Num ambiente onde a imagem dos profissionais procura ser preservada, esse comportamento, embora noticiado, não parece ter reflexos maiores do que o de ilustrar um website ou uma página de revista. O que os pilotos fazem nas pistas parece ter mais importância. Os acidentes que decidiram os títulos de 1994 e 1997 são mais comentados e lembrados quando se fala do caráter de Schumacher do que os charutos que ele fuma ou do “vandalismo” que promoveu, com Panis e Ralf, em Suzuka, enquanto festejava embriagado seu sexto título mundial. Venício Zambeli comentou:

121

Briatore defende "bebedeira" de Kimi Raikkonen. op. cit. PROST, Antoine. Fronteiras e espaços do privado. op.cit. p.15. 123 Alemão destrói escritório da Toyota. 13/10/2003. www.warmup.com.br, acesso em 13/10/2003. 124 Comemoração extra... Racing, São Paulo, n.131, outubro 2004. p. 4. 122

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Suas ações podem ser encaradas como puro ato de festa e Schumacher tinha todo o direito de comemorar aquele dia, apesar de ter exagerado. Não estou querendo dizer que acho certo certos atos como alcoolismo ou fumo, e nem de baderna e quebradeira. Só estou querendo dizer que pilotos, com suas vidas extremamente regradas, podem também se divertir sem machucar ninguém.125

Não foi encontrado nenhum registro de que a equipe Toyota tenha reclamado ou de alguma forma protestado contra Schumacher. Talvez tenha apreciado a exposição de seu nome junto à imagem do piloto hexacampeão. Para a manutenção dos contratos com as equipes, o comportamento nos boxes e nas pistas parece mais fundamental - sobretudo algumas características, como objetividade, capacidade de concentração, determinação. A frieza de Schumacher, considerada muitas vezes arrogância, é um dos requisitos principais para a profissão de piloto de corridas, hoje. Kimi Raikkönen é chamado “o homem de gelo”, por ser muito compenetrado no trabalho e muito econômico nas palavras que pronuncia à imprensa.126 A capacidade de concentração é uma característica de todos os grandes pilotos da Fórmula 1. Ayrton Senna tinha seus momentos de extrema concentração, onde não falava com ninguém, apenas esperando o momento de entrar no carro e sair para o grid de largada.127 O assédio dos fãs e da imprensa também colabora para valorizar ainda mais essa capacidade. Sobre isso, Schumacher disse em entrevista: [...] passo meu tempo mais ou menos escondido no motor-home. Eis porque você vê menos e menos pilotos nos dias de hoje no paddock. Sempre me sinto um pouco incomodado quando sou perseguido para dar um autógrafo. [...] Você tem que se proteger no paddock. É um ambiente hostil e cada um tem um jeito de resolver os problemas que surgem.128

Outro aspecto é a capacidade de trabalhar em equipe. A imagem atual de Schumacher está associada, na mídia, ao seu profissionalismo e à sua ótima relação com toda a equipe Ferrari. Um bom exemplo desse profissionalismo pode ser o “pacto com Jean Todt, de que jamais criticaria a equipe”, feito quando nela ingressou, em 1996.129 Schumacher, que “ao final de cada vitória cumprimenta, um por um, os mecânicos da Ferrari, que sempre se refere ao companheiro Rubinho com muita consideração, seja do lado técnico ou do lado pessoal”130, sempre valorizou, publicamente, o trabalho de sua equipe e dos que trabalham 125

ZAMBELI, Venício. Pilotos são humanos. Racing. São Paulo. Nº 131, outubro 2004. p. 03. O jovem mais rápido do oeste. F1RACING: Suplemento da Revista Racing, São Paulo, n. 117, p. 36-41. 127 SANTOS, Francisco. Ayrton Senna do Brasil. São Paulo: Edipromo, 1994.p. 226. 128 Piloto: Michael Schumacher. F1RACING, op.cit. p.42 129 RAMOS, Luis Fernando. Schumacher fenomenal. Racing. São Paulo. Nº 153, ago 2003. p. 15. 130 LEME, Reginaldo. Campeão da boa vontade. 14/12/2001. www.warmup.com.br, acesso em 13/15/2003. 126

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indiretamente para que ele possa vencer. “Meus mecânicos merecem mais respeito do que eu. Eles às vezes têm de trabalhar em horas horríveis e ver seus entes queridos ainda menos que eu.”131 A dedicação complementa esse traço. Ao ser “sempre o primeiro a chegar aos treinos e o último a sair, faz com que seus companheiros de equipe trabalhem mais, aperfeiçoando os carros.”132 Flávio Gomes escreveu: “A Ferrari o adora. Trata os mecânicos pelo nome, pergunta sobre suas famílias, dá presentes e sempre agradece ao time após as vitórias.”133 Seu trabalho em direção à vitória começa muito antes do domingo de corrida. Começa nos treinos particulares, na sede da Ferrari, em que busca desenvolver ao máximo o desempenho do carro. Na conquista do hexacampeonato, a revista Speedway ressaltou: Não por acaso, Schumacher deu o crédito pelo hexa à equipe. “É uma conquista do time. O pentacampeonato de construtores da Ferrari, algo que nenhuma outra equipe alcançou, é mais importante do que a minha conquista pessoal”, exagerou. Schumacher elogiou o poder de reação da escuderia. “Quando disseram que nós estávamos decadentes, nunca desistimos. O time brigou sempre e essa é a sua força. Somos uma grande família e podemos nos orgulhar de fazer parte dela.”134

Essas demonstrações do valor que Schumacher dá à equipe para a qual pilota, comentadas por alguns profissionais da imprensa, ajudam a relativizar a imagem do “alemão frio e arrogante”.

Nos comentários da imprensa escrita (virtual e impressa), portanto, destacam-se certos caracteres que demonstram os modos como o personagem é tratado. Na mídia (em revistas especializadas e websites), são apresentados fragmentos da vida privada de Michael Schumacher e traços de sua personalidade. Na visão da mídia, percebe-se bem como os comentaristas têm opiniões bastante distintas sobre Schumacher e os pilotos em geral, entre si e no modo de falar. É bem clara a passionalidade dos comentários: as atitudes dos pilotos são aprovadas ou desaprovadas (os pilotos são bons ou maus) e nem sempre em função de questões técnicas relacionadas à pilotagem (há referenciais - embora elásticos - sobre o que “vale” ou não em uma corrida); alguns jornalistas “torcem” nitidamente por certos pilotos, ou os admiram passivamente, comportando-se como fãs, o que pode-se perceber na linguagem utilizada por eles. Desse lado, a passionalidade é articulada à adoção dessa linguagem 131

Piloto: Michael Schumacher. F1RACING. op. cit. FERREIRA, Bernardo. Fórmula dos 6. op. cit. p.19. 133 GOMES, Flávio. Qual é o melhor? Quatro Rodas, São Paulo, set. 2002. p. 131. 134 Até a última volta. Speedway, São Paulo, n. 60. p. 23. 132

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coloquial (inclusive com uso de palavrões), próxima do cotidiano dos leitores, ou da informalidade que em geral é associada aos esportes de grande público, como a Fórmula 1. Por fim, a ênfase nos estereótipos, que simplificam a percepção do complexo mundo da Fórmula 1: há mocinhos e bandidos; há “latinos” destemperados (excessivamente alegres ou grosseiros, como Montoya); há “alemães frios e calculistas” (excessivamente controlados, como Schumacher). São marcas do jornalismo esportivo, cuja abordagem parece procurar maior proximidade com os aficionados dos esportes quando transforma os atletas em modelos simples, compactados em seus “supostos” padrões étnicos. A lógica dos estereótipos certamente está também ligada à proximidade da linguagem do jornalismo esportivo com a linguagem publicitária. Ambas têm como horizonte a emoção do público – um público torcedor, e, mais importante, consumidor. Isso justifica os altíssimos investimentos em publicidade, feitos pelos produtos que patrocinam e anunciam na Fórmula 1. As corridas precisam despertar paixões, os pilotos precisam ser amados ou odiados. Mas heróis e vilões não são criados apenas em função do domínio de determinadas habilidades técnicas - daí também a busca dos gestos que possam demonstrar generosidade, companheirismo, altruísmo, ou mesquinhez, egoísmo, deslealdade. Nos textos dos jornalistas brasileiros, Schumacher transita entre essas duas esferas, herói-vilão que, admirado, não consegue ser amado. É reconhecido como grande campeão, mas não teria o “carisma” que parece ser tão importante para ser o herói amado. Perseguindo a emoção para o público, os jornalistas especializados parecem às vezes serem enganados pela própria lógica da mída, que é a do espetáculo. Perguntam: o que, no comportamento de Schumacher, pode ser visto como autêntico? o que seria fingimento? Buscam sorrisos e lágrimas - sobretudo as lágrimas - de Schumacher. Nem elas às vezes são suficientes: Flávio Gomes chegou a duvidar delas, e só se satisfez com um desvio de olhar, entendido como mais um indício de fragilidade daquele que sempre encara os jornalistas nos olhos. Diante de elementos que tornam negativa a imagem do herói em construção (especialmente se a referência é o “bom moço” Ayrton Senna), Ricardo Perrone encontra a franqueza, a honestidade, a firmeza de um caráter que não se dobra às exigências do marketing - pois, afinal, Schumacher não teria “condição de contratar uma equipe melhor que a do Lula para mudar a imagem dele?”. Menos propenso a incensar o “homem” Schumacher, Reginaldo Leme enfatiza: é tudo espetáculo, e o piloto alemão seria ainda “muito menos simpático na vida real”, sendo a sua alegria nas vitórias a alegria estudada de um “gênio de marketing”. Talvez seja também este tipo de exposição, a de sua vida privada, que faça 48

Schumacher não ser tão bem aceito pela mídia e público brasileiros. Como expõe Daniel Soares Lins: “O ídolo, para ser amado pelas multidões, precisa, na sua representação imaginal ou fenomenal, mostrar-se humano”.135 Talvez falte, para a mídia e público, um algo mais que o torne tão humano quanto o era Ayrton Senna para estes. O que se observa, portanto, é a difícil construção de uma única imagem para Schumacher, ao menos pelos jornalistas brasileiros que acompanham as corridas de Fórmula 1. Afinal, Schumacher é mocinho ou bandido? Muito provavelmente a dificuldade de considerá-lo apenas positivamente, no caso dos jornalistas brasileiros, prende-se também a elaborações simbólicas anteriores - quando, no início da carreira, Schumacher apresentou-se como um adversário de Ayrton Senna, a ser devidamente "demonizado" na contraposição com o piloto já então idolatrado. Provavelmente qualquer piloto que ameaçasse Senna nas pistas ganharia esse rótulo. Schumacher foi o último a duelar com Senna, vencendo-o nas duas corridas que disputaram em 1994, antes da morte do brasileiro. Talvez, com essa morte abrupta, Schumacher tenha herdado sem querer esse estereótipo, a ponto de não mais conseguir se livrar dele. Questões que poderemos compreender melhor no próximo capítulo.

135

LINS, Daniel Soares. Ayrton Senna: a imolação de um deus vivo. Fortaleza: EUFC, 1995. p. 60. 49

Figuras 1 a 6. Os familiares. 1. Com a Esposa, Corina Betsch Schumacher.

4. Nos boxes da Ferrari.

5. Festa da Ferrari – Janeiro de 2000.

2. Os Filhos: Gina Maria (de branco) e Mick.

3. Com o irmão, Ralf Schumacher. GP da Áustria – 2003.

6. No pódio do GP do Canadá – 2003.

50

Figuras 7 a 12. O circulo de celebridades. 7. Com Pelé. Interlagos, Brasil – 2002.

8. Com Ronaldo e Zico, em jogo beneficente da Campanha Criança Esperança – 2003.

10. Com Roberto Baggio, do Milan – 2001.

11. Com Valentino Rossi, o “Schumacher” das motos, em Fiorano – 2004.

12. Com Kate Moss, em Cannes – 1999. 9. Com o Papa João Paulo II, no Vaticano – 1999.

51

Figuras 13 a 18. Os acidentes de Ayrton Senna e Michael Schumacher.

A Tragédia de Ímola,

O Acidente de Schumacher.

San Marino – 1994.

Silverstone, Inglaterra – 1999.

13. Senna vai de encontro ao Muro

16. Schumacher perde os freios e bate na proteção de pneus.

14. A batida fatal de Senna.

15. O socorro médico. Inútil.

17. O resgate médico. Fratura na perna direita.

18. O Ferrari nº 3, com a frente destruída.

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Figuras 19 a 27. Os momentos de luto da Ferrari e de Michael Schumacher. O luto da Ferrari pelas vítimas do atentado de 11 de setembro de 2002 nos Estados Unidos. Monza, Itália – 2001. 19

20

O luto pela morte da mãe na madrugada anterior à corrida de Ímola, San Marino -2003.

O luto pela morte de Giovanni Agnelli, presidente da FIAT. Nurburgring, Luxemburgo - 2004.

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Figuras 28 a 33. Momentos de Embriagues de Räikkonën e Schumacher Kimi Räikkönen, embriagado em uma danceteria das Ilhas Canárias, em dezembro de 2004. 31 28. Revista Finlandesa 7 Päivää. Fonte: www.formulanews.com.br

Michael Schumacher, embriagado após a conquista do hexacampeonato. Suzuka, Japão – 2003. 29 32

30 33

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Capítulo 3

Michael Schumacher O P i l o t o: a trajetória nas pistas 55

Capítulo 3: Michael Schumacher – o piloto: a trajetória nas pistas Para o historiador Nicolau Sevcenko, na contemporaneidade: “[...] os esportes se baseiam no desempenho físico medido contra o cronômetro, em modalidades de equipe adaptadas à rigorosa coordenação coletiva, articulam-se em organogramas de classe, categorias e rankings e são programados por tabelas progressivas de recordes [...]. Nesse sentido, os esportes da nossa época são, de fato, exercícios de produtividade, em perfeita sintonia com os princípios econômicos e os valores morais que regem a nossa sociedade.”136

Na Fórmula 1 não é diferente: entre os aspectos econômicos, o mais importante na Fórmula 1 é o de veicular a imagem de um produto de modo a torná-la conhecida por ser extremamente ligada ao sucesso decorrente da equipe ou piloto à qual é vinculada. Em alguns casos, o produto é responsável por parte do sucesso obtido. É o caso dos produtos da indústria automobilística, como autopeças, motores, combustíveis. Para muitos, o sucesso está nos resultados mensuráveis, e a carreira de um atleta ou equipe é avaliada pelos números que apresenta. Como exemplos, pode-se citar Pelé, com seus mais de 1.000 gols; a Seleção Brasileira de Futebol, com seus cinco títulos em Copas do Mundo; atualmente, Valentino Rossi e seus quatro títulos no mundial de MotoGP; e obrigatoriamente, Michael Schumacher com seus sete títulos de Fórmula 1.

3.1 Os números fazem o piloto. A trajetória de Michael Schumacher como piloto de corridas é a mais bem sucedida entre todos os pilotos que já competiram na Fórmula 1. Detentor do maior número de títulos, vitórias, voltas mais rápidas, entre outros recordes, só não detém, ainda, o de 65 polepositions, pertencente a Ayrton Senna. Mas, para superar essa marca faltam apenas três poles, que poderão ser obtidas nos dois anos que ainda tem de contrato com a equipe Ferrari. Desde sua estréia, em 1991, competiu em 13 temporadas, disputou efetivamente o título em 9 campeonatos, tendo vencido 7 e sido vice-campeão em dois. Das 731 corridas disputadas na Fórmula 1 entre 1950 e 2004, Schumacher venceu 83, “o que significa mais de

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10 por cento de todas as corridas válidas pelo Mundial.”137 A superação dos 5 títulos de Juan Manuel Fangio, algo considerado “impossível, inalcançável, inatingível”138, foi conseguida por Schumacher, em uma seqüência de conquistas jamais vista na Fórmula 1. A imagem do piloto, como grande profissional, é hoje enfatizada pelos jornalistas pesquisados, na imprensa escrita e virtual. “Garantem que nenhum piloto é mais aplicado, mais interessado, mais trabalhador.”139 Em 2000, quando da conquista do primeiro título com a Ferrari (o terceiro de sua carreira), não só a dedicação ao trabalho, mas sua superioridade frente aos outros pilotos, eram afirmadas: “o melhor do mundo naquilo que faz. Pilotar. Acelerar. Pensar em alta velocidade.”140 Hoje, com cinco títulos conquistados pela Ferrari, além de dois pela Benetton, “Michael Schumacher é um fenômeno. Não há sombra de dúvida. O fato de possuir quase todos os recordes da Fórmula 1 é uma prova incontestável disso.”141 A imagem de Schumacher mudou bastante desde 1991, quando ingressou na Fórmula 1, e principalmente desde 1994, quando da conquista de seu primeiro título, pela equipe Benetton. Naquele ano, a Fórmula 1 havia passado por vários acidentes graves, inclusive com vítimas fatais, e procurava-se adotar medidas de segurança que pudessem evitá-los. Em Ímola, república de San Marino, em maio daquele ano, Rubens Barrichello acidentou-se gravemente na sexta-feira de treinos livres, ficando de fora da corrida. No sábado, o austríaco Roland Ratzemberger morreu ao chocar-se contra o muro da curva Villeneuve do circuito Enzo e Dino Ferrari. Havia oito anos um piloto não morria na Fórmula 1 (Elio de Angelis fora o último, em 1986). Ayrton Senna foi a próxima vítima. Na sétima volta da corrida, no domingo, a coluna de direção de seu Williams quebrou, seu carro não fez a curva Tamburello e bateu contra o muro a 200 Km/h. O maior piloto da época morria em um acidente de corrida. Foi uma tragédia, no âmbito esportivo, de impacto mundial. No livro Ayrton Senna do Brasil, lançado no mesmo ano, o autor relata como “a imprensa de todo o mundo tratou o acidente de Ayrton Senna e o seu desaparecimento como o acontecimento mais importante dessa semana [01 a 07 de maio de 1994], relatando bem a comoção internacional.”142 Depois dessas tragédias, a Fórmula 1 mudou em muito as medidas de segurança e as modificações nos circuitos contribuíram para que acidentes como os de Ímola 94 não 136

SEVCENKO, Nicolau. A corrida para o século XXI: no loop da montanha-russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. (Virando séculos, 7) p.107-108. 137 LEME, Reginaldo. Mudanças urgente. 26/03/2004. www.warmup.com.br, acesso em 24/11/2004. 138 EDSON, Odnei. Um quadro de cores vivas. Speedway, São Paulo, n. 60, novembro 2003. p. 28. 139 ZAMPONI, Marcus. Talento de Deus. Racing, São Paulo, n. 131, outubro 2003. p. 82. 140 EDSON, Odnei. Polêmico, sim, mas o melhor. Speedway, São Paulo, n. 35, dezembro 2000. p. 35. 141 RAMOS, Luiz Fernando. Schumacher fenomenal. Racing, São Paulo, n. 153, setembro 2004. p. 13. 57

voltassem a acontecer. Há onze anos um piloto não morre na Fórmula 1, embora acidentes violentos ainda aconteçam, como o de Olivier Panis, no Canadá, em 1997, onde o piloto fraturou as duas pernas, mas voltou a competir meses mais tarde, e o de Mika Häkkinen na Austrália, também em 1997, quando teve trauma craniano, e mesmo com problemas faciais, conseguiu superar as dificuldades e tornar-se bicampeão em 1998 e 1999. O próprio Schumacher bateu forte e fraturou a perna direita na Inglaterra, em 1999, ficando sete corridas afastado. Seu irmão, Ralf Schumacher, sofreu o mais forte acidente desde então, nos Estados Unidos, em 2004, chocando seu carro contra o muro do circuito de Indianápolis. Fraturou uma vértebra e ficou cinco corridas afastado.143 Graças às modificações visando a segurança dos pilotos, após as mortes de 1994, a Fórmula 1 tem sido, senão mais segura, menos perigosa. A única morte registrada depois de Senna foi a do bombeiro Paolo Gilisberti, atingido por um pneu, em Monza, 2000.144 Após Ímola 94, toda a segurança da Fórmula 1 foi revista e melhorada, o que foi reconhecido na imprensa especializada já no ano seguinte: Toda tragédia cria alguma conscientização. A morte de Ayrton Senna não foi exceção a essa regra. A Fórmula 1 vive hoje uma fase onde, mais do que tudo, o que importa é a segurança – mesmo que muitas coisas ainda precisem ser feitas. Os carros ficaram um pouco mais resistentes, aumentou um pouco (bem pouco) a influência dos pilotos nas discussões sobre segurança. E vários circuitos foram modificados – entre eles, evidentemente, o de Ímola.145

Assim, em uma Fórmula 1 mais segura, teoricamente, os pilotos seguiram fazendo o que sempre fizeram: acelerar ao máximo seus carros. Afinal, “o show não pode parar.” Nesse recorte temporal pós-morte de Ayrton Senna, denominado na imprensa de “Era Schumacher”146, a Fórmula 1 sofreu um vazio de pilotos campeões: Piquet e Prost estavam aposentados, Mansell estava na Fórmula Indy, Senna estava morto. Os detentores dos últimos nove títulos mundiais não mais faziam parte do “circo” da Fórmula 1. Vencedores de corridas, apenas Alboreto, na fraca equipe Minardi, Gerhard Berger, na Ferrari em seus “anos de jejum” de títulos, Damon Hill na favorita Williams e Michael Schumacher na Benetton, a surpresa da temporada 1994. Juntos, esses pilotos somavam 20 vitórias. Só Ayrton Senna tinha 41. Jamais a Fórmula 1 deixara de ter um campeão nas pistas. Era como um recomeço, 142

SANTOS, Francisco. Ayrton Senna do Brasil. São Paulo: Edipromo, 1994. p. 241. GOMES, Flávio. Ralf pode ficar fora da próxima corrida. Lance!, São Paulo. 21/06/2004. p. 29. 144 Tragédia na festa da Ferrari. Speedway, São Paulo, n. 35, setembro 2000. p. 62. 145 Legado de um campeão. Grid, São Paulo, n. 22, 1995. p. 3. 146 Dez anos da era Schumacher. 25/03/2004. http://jbonline.terra.com.br/destaques/senna/mat_09.html, acesso em 17/08/2004. 143

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uma nova fase onde surgiria um novo campeão mundial, que poderia tornar-se o novo “Rei”, pois, na cobertura da primeira corrida sem Senna, na revista Grid, a matéria tinha um destaque em negrito que dizia: “Sem Ayrton Senna, começa uma nova era na Fórmula 1 – o posto de rei está vago.”147 3.2 “O rei está morto. Viva o rei!” Na primeira corrida sem Senna, em Monte Carlo, Mônaco, Schumacher dominou de ponta a ponta e iniciou efetivamente a mais bem sucedida carreira de um piloto na Fórmula 1. No comentário sobre a corrida, o jornalista Wagner Gonzalez escreveu: “Baixar em 2 segundos o recorde de Mônaco, num ano em que se esperavam tempos piores, é coisa de mestre. Michael Schumacher ainda não pode ser chamado de mestre, mas mostrou que caminha rapidamente para isso.”148 Era o primeiro indício do talento que tanto os jornalistas iriam comentar e escrever nos anos seguintes. Até então, nada de tão enfático havia sido escrito sobre o alemão. Schumacher credenciava-se, na cobertura da imprensa, a ocupar o posto de “rei” ou “Grande Senhor das Pistas”. Mas o percurso para alcançá-lo seria sinuoso. Pois a temporada de 1994, além de trágica, foi polêmica. Trágica pelas mortes de Senna e Ratzemberger, pelos acidentes de Barrichello, Wendlinger (em Mônaco), o incêndio no carro de Vestappen (na Alemanha). Polêmica pelas suspeitas de irregularidades no carro de Schumacher, ao longo da temporada. “Até hoje pairam dúvidas sobre a legalidade do seu equipamento em 1994.”149 Suspeitas de controle de tração e o sistema de largada automática, nunca devidamente comprovadas. Houve também a suspensão de duas corridas por atitude antidesportiva no GP da Inglaterra: Schumacher ultrapassou Hill na volta de apresentação. Foi desclassificado em plena corrida, mas continuou a correr devido a um acordo do chefe de equipe, Flávio Briatore, com a direção de prova, que lhe aplicou apenas a punição de parar por dez segundos no box. Ainda assim, Schumacher retornou à corrida e chegou em segundo. O problema, para a FIA e para quem estivesse investindo na Fórmula 1, era que o interesse do público no campeonato pudesse acabar caso houvesse sua conquista antecipada por Schumacher, como ocorrera com Mansell em 1992. Schumacher tinha uma grande vantagem de pontos sobre Damon Hill (66 a 29, na metade da temporada). Esse problema foi aparentemente solucionado com as punições a Schumacher. Sendo desclassificado na

147

GONZALEZ, Walter. O rei está morto. Viva o rei. Grid, São Paulo, n. 10, maio 1994. p.23 Idem. p. 24. 149 GONZALEZ, Wagner. 2003: o ano da consagração. Racing, São Paulo, n. 130, outubro 2003. p. 20. 148

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Inglaterra, Schumacher deixou de marcar 6 pontos. Na Bélgica, após ter vencido, foi novamente desclassificado por estar com o carro fora das especificações técnicas exigidas, ao final da corrida. A vitória foi para Damon Hill, que já somava 16 pontos contra 0 de Schumacher, em duas corridas. No julgamento pela atitude antidesportiva na Inglaterra, Schumacher foi suspenso por duas corridas, vencidas por Hill, na Itália e em Portugal. Damon Hill obteve, desde a etapa da Inglaterra, com as desclassificações e a suspensão de Schumacher, 36 pontos. Schumacher, tendo pontuado apenas na Hungria, obteve, no mesmo período, 10 pontos. A vantagem de Schumacher na pontuação foi reduzida para um ponto, e o campeonato, após duas outras corridas, teve a decisão adiada para a última etapa do ano, na Austrália. Lá, Schumacher perdeu o controle do carro, bateu contra o muro e voltou à pista. Em sua aproximação, Hill, que não viu o acidente e tentou a ultrapassagem, recebeu uma “fechada” e os carros bateram, indo Schumacher para fora da pista. Hill foi aos boxes para tentar consertar a suspensão, mas não era possível. A Fórmula 1 tinha seu novo campeão mundial. O fato de o título ser decidido num acidente - para muitos, intencional - gerou polêmica e pôs em dúvida o mérito da conquista.150 Na construção da imagem de Michael Schumacher, nesse episódio, a imprensa dividiu-se entre elogios e críticas. Para alguns, um piloto genial, talentoso e de grande futuro. Para outros, um piloto antipático, arrogante, “sujo”, que só venceu por trapacear e jogar o carro contra o adversário. Lemyr Martins escreveu que Schumacher “num lance de reflexo – e esperteza – transformou um erro de pilotagem numa manobra que lhe valeu o campeonato. Um golpe de mestre”. E que a manobras foi “uma atitude que qualquer um dos outros 25 pilotos – inclusive Damon Hill – teria tomado naquela fração de segundo”.151 Na Folha de São Paulo152, a matéria que cobriu a decisão não tratou o acidente como “proposital”, de forma a acusar Schumacher de “trapaceiro” ou “sujo”.

150

Algo semelhante aconteceria novamente com Schumacher em 1997, mas ele então perderia o título. Títulos anteriores haviam sido decididos em acidentes supostamente premeditados, como em 1989 e 1990, em corridas no Japão, envolvendo Prost e Senna (Prost foi campeão em 1989, Senna, em 1990). Em 1989, Prost tinha a vantagem dos pontos e foi auxiliado pelo presidente da FIA, Jean-Marie Balestre, que desclassificou Senna (porque retornou à pista, após o acidente, cortando caminho por uma chicane) que ganhara a corrida. No ano seguinte, também no Japão, Senna tinha a vantagem, e deixou seu carro ser tocado por Prost na primeira curva após a largada, tirando os dois da corrida; era a “vingança” pelo ano anterior. 151 MARTINS, Lemyr. Um golpe de mestre. Quatro Rodas. São Paulo, dezembro 1994. p. 114. 152 Folha de São Paulo. São Paulo. 14/11/1994. Caderno de Esporte. p. 7-8. 60

Com o tempo, o “talento” e a “genialidade” do piloto passaram a prevalecer sobre sua “arrogância e antipatia”,

nos comentários dos profissionais da imprensa. Alguns, como

Wagner Gonzales, desde 1994 enfatizaram o Schumacher talentoso: Logo após a morte de Ayrton Senna, pouquíssimas coisas ficaram tão claras na Fórmula 1 quanto a superioridade do alemão Michael Schumacher e o seu conseqüente favoritismo ao título da temporada. [...] Até não importa muito se as punições impostas a Schumacher foram justas ou injustas (no mínimo, a sua equipe também deveria ter sido punida, o que não aconteceu). Mas, o fato é que, piloto por piloto, campanha por campanha, o veloz Schumacher é muito mais merecedor do título de campeão da temporada que o obscuro Damon Hill.153

Comentando que a Fórmula 1 tinha em sua matéria-prima uma “liga composta de emoção, imagens e interesses comerciais em nível planetário”154, Gonzales antevê um pouco do que viria a ser a imagem ambígua de Schumacher: Num ano em que acidentes e perdas inesquecíveis se misturam com manobras políticas inacreditáveis, Schumacher é até agora o único perdedor. Enquanto as equipes se salvaram de complicações maiores através do pagamento de multas, o alemão descobriu que o título mundial, que já parecia estar debaixo do braço, agora pode escorregar entre os dedos. E, pior: se ficar provado que ele sempre esteve a par de todas as irregularidades que sua equipe andou cometendo até aqui, o piloto pode até ganhar o rótulo permanente de trapaceiro. Por outro lado, caso a Benetton volte a andar na frente com a simples volta do alemão ao volante do carro número 5, ficará mais do que provado que ele sim é que faz a diferença.155

Em seu retorno às pistas, após as punições suspensórias, Schumacher comprovou a hipótese de Gonzalez, venceu o GP da Europa, fez uma excelente corrida na chuva, no Japão, chegando em 2º lugar, e liderava a ultima corrida, na Austrália, até bater contra o muro e provocar o acidente com Hill, que definiu o campeonato. Essas atuações fortaleceriam opiniões como as de Wagner Gonzales a respeito de Schumacher “fazer a diferença”. Por outro lado, a imagem de “trapaceiro”, presente na após a conclusão da temporada de 1994, não seria completamente apagada, e tornaria a ser bastante enfatizada três anos depois devido à manobra proposital, bem mais implícita, que Schumacher faria contra Jacques Villeneuve, na decisão do mundial de 1997.. A regularidade do sucesso de Schumacher nas corridas seria fundamental para o predomínio de uma imagem positiva do piloto. A conquista do bicampeonato em 1995 serviu para tirar a dúvida quanto à capacidade do piloto de vencer sem as supostas ilegalidades do carro da Benetton. Schumacher foi 153

GONZALES, Wagner. Schumacher ameaçado. Grid, São Paulo, n. 14, setembro 1994. p. 30. Idem. p. 32. 155 Ibidem. p. 32. 154

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campeão de 1995 com 33 pontos de vantagem sobre Damon Hill e duas corridas de antecedência. Igualou o recorde de 9 vitórias em uma temporada, de Nigel Mansell, e marcou 102 pontos, 4 a menos que Mansell marcou em 1992. Luiz Alberto Pandini, na matéria sobre o bicampeonato de Schumacher, escreveu: “Podem dizer tudo sobre Michael Schumacher, mas um fato é inquestionável: ele é o melhor piloto da Fórmula 1 no momento. A temporada deste ano provou isso.”156 A seqüência de comentários do jornalista manifesta um procedimento importante na construção da imagem positiva do piloto que “faz a diferença”: a semelhança, em algumas características, com outros campeões. Pandini ressalta na matéria que Schumacher é centralizador na equipe, querendo para si todas as atenções de técnicos e engenheiros, lembrando que Senna e Prost eram assim, também. A imagem de herói também começa a ser enfatizada. Lemyr Martins comenta, no primeiro GP do ano, que Schumacher fora outra vez “punido por ser herói”, ao fazer uma corrida perfeita e ser desclassificado por ter gasolina adulterada em seu carro, quando a punição deveria ser dada à equipe, que é a responsável pelo carro.157 Ao final do ano, em matéria sobre o estilo polêmico de Schumacher, Lemyr Martins ressalta-o como “gênio, super homem das pistas”.158 Em 1996, a Ferrari contratou Michael Schumacher por três anos, pelo mais alto salário da história da Fórmula 1 - “estima-se que ele vai ganhar cerca de US$ 25 milhões”159 – e conseguiu três vitórias neste ano. Isso era mais do que conseguiram entre 1991 e 1995: uma com Berger e outra com Alesi. Escreveu Geraldo Simões: “Michael Schumacher devolveu a alegria aos italianos. Suas vitórias nesta temporada, especialmente a de Monza, foram muito além do script ditado por Jean Todt (o francês, chefe de equipe da Ferrari) e colocam a Ferrari na condição de favorita para o campeonato de 1997.”160 E continou: “As vitórias pela Ferrari em 1996 podem calar qualquer comentário quanto à competência do alemão.”161 Flávio Gomes ressalta com mais ênfase o desempenho de Schumacher em 1996: Estou acompanhando um dos mais belos campeonatos dos últimos tempos e vendo de perto um semideus do volante, esse tal de Michael Schumacher, que se mantiver o ritmo nos próximos cinco ou seis anos será o maior de todos os tempos. Não é heresia nenhuma, não estou esquecendo do Senna, nem do Prost, nem de ninguém. É verdade que Schumacher não tem adversários à altura, mas há que se ponderar o rigor nessa avaliação. Os maiores adversários de Schumacher podem não ser de carne e osso, mas são

156

PANDINI, Luiz Alberto. Para Schumacher, tudo. Grid, São Paulo, n. 28, novembro 1995. p. 23. MARTINS, Lemyr. Michael Schumacher outra vez punido por ser herói. Quatro Rodas. São Paulo, abril 1995. p. 135. 158 MARTINS, Lemyr. Uma questão de estilo. Quatro Rodas. São Paulo, dezembro 1995. p. 120. 159 PANDINI, Luiz Alberto. Para Schumacher, tudo. op. cit. 160 SIMÕES, Geraldo. Schummy. Racing, São Paulo, n. 3, setembro 1996. p. 20. 161 Idem. p. 22 157

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de fibra de carbono e metal, levam o nome da Williams no bico e não são de se desprezar.162

Os comentários de Flávio Gomes destacam outro aspecto da construção da imagem do piloto pela imprensa brasileira, pois uma das mais enfáticas “explicações” para o sucesso de Schumacher em sua carreira foi a “falta de adversários”. Hill, Villeneuve, Häkkinen, Coulthard, Montoya, Räikkönen e Barrichello, embora tendo disputado corridas e campeonatos com Schumacher, para alguns nunca foram adversários do nível de Prost, Senna, Mansell, Piquet. A comparação com Senna é a mais freqüente de todas. Schumacher nunca ganharia tanto se Senna estivesse vivo.163 Em 1997 a disputa com Villeneuve foi até a ultima corrida. Foi um campeonato disputado, porém, apenas na pontuação: somente na última corrida, em Jerez de la Frontera, na Espanha, Schumacher e Villeneuve estiveram correndo próximos e disputando a posição que daria o título mundial. Em nenhum pódio do campeonato os dois se encontraram. A disputa em Jerez de la Frontera durou 48 voltas, até o momento em que Villeneuve tentou a ultrapassagem e Schumacher tentou impedir, da mesma forma como fizera com Hill em 1994. Desta vez, o carro do adversário conseguiu continuar na prova, e Schumacher voltou a ser apontado como o vilão da Fórmula 1.164 Schumacher perdeu os pontos conquistados no campeonato e teve seu vicecampeonato cassado pela FIA. Flávio Gomes comentou, com seu estilo perceptivelmente muito próximo ao de um torcedor: “Ninguém conseguiu enxergar nada de bom, todos alegaram, eu também, que pra ele tanto faz como tanto fez, vice não é título.”165 Em 1998 a temporada foi mais disputada. A McLaren, que ganhara três corridas em 1997, depois de um período de três anos sem vitórias – a última foi na Austrália, com Ayrton Senna, em 1993 –, surgiu como favorita ao título após excelentes atuações nas primeiras corridas do ano. O finlandês Mika Häkkinen despontou como adversário de Schumacher e eles disputaram o título até a última etapa. Schumacher perdeu para Häkkinen, mas manteve sua posição de “melhor piloto da Fórmula 1”

166

, pois Häkkinen teria sido favorecido pela

tecnologia (a superioridade de seu McLaren) e não por sua técnica superior, enquanto piloto. Ao fim do ano, na retrospectiva da temporada, a edição especial da Racing dizia:

162

GOMES, Flávio. Schumacher e a Indy. 07/06/1996. www.warmup.com.br, acesso em 25/09/2003. FERREIRA, Bernardo. Fórmula dos 6. Revista Lance a mais, São Paulo, n. 164, outubro 2003. p. 18. 164 Auto-derrotado. Fórmula 1: anuário 1997-98. São Paulo, ano 1, n. 1, 1997. p. 19; MARTINS, Gilmar. Dick Vigarista é, enfim, castigado. Diário Catarinense, Florianópolis, 27/10/1997. p. 27. 165 GOMES, Flávio. Papagaiada eficiente. 14/11/1997. www.warmup.com.br, acesso em 23/09/2003. 166 Show de Schumacher. Racing: Anuário de Fórmula 1. Edição especial. São Paulo, n. 2, 1998. p. 11. 163

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[...] não há como negar a surpreendente arrancada da McLaren quando todos ainda apostavam em Williams e Ferrari. Já a reação de Schumacher, mesmo com um carro inferior, não pode ser encarada com surpresa – pois trata-se de um dos mais competentes pilotos da história da Fórmula 1, goste-se ou não dele.167

Admitir a competência, em função dos resultados nas pistas, não necessariamente implicava admiração pelo piloto (ou pelo homem Schumacher), como pode-se perceber nos comentários anteriores. Em 1998, portanto, ainda havia bastante distância, na cobertura de imprensa, entre o reconhecimento de Michael Schumacher como grande piloto e a sua possível transformação em ídolo do esporte. Certamente a colisão com Villeneuve, em 1997, agravada pela lembrança do acidente anterior com Damon Hill, em 1994, colaborou muito para a mídia manter separada a imagem do grande piloto, mostrada na pista por Schumacher, e a condição de ídolo, que também é construída e difundida por ela. Em 1999, Schumacher iniciou o ano sem brilho, com uma quebra na primeira prova e um segundo lugar na seguinte. Mas, era líder do campeonato na terceira prova. Na quinta etapa, na Inglaterra, um problema nos freios o fez sair da pista na segunda volta e bater na barreira de pneus. Foi o mais grave acidente que Michael Schumacher sofreu na carreira. Fratura na perna direita, que lhe deixou três meses e sete corridas parado, eliminando a chance de disputar o campeonato. Seu companheiro de equipe, o irlandês Eddie Irvine, é que disputou com Mika Häkkinen o título da temporada 1998. Apesar de ser o piloto mais regular do ano, não pontuando em apenas duas etapas, Irvine perdeu o título na última prova. Sem Schumacher no campeonato, as disputas foram mais acirradas, o campeonato mais disputado, e isso elevou a audiência e o interesse pela Fórmula 1. “A F1 nunca ocupou tanto espaço na imprensa internacional quanto em 1999, quando foram batidos recorde de audiência na mídia eletrônica e de espaço na mídia impressa.”168 Apesar de não ter disputado o título, Schumacher, para a revista Racing, única no Brasil especializada em esporte a motor, obteve atuações brilhantes e foi considerado o melhor piloto do ano. Se havia alguma dúvida sobre a posição que Michael Schumacher deveria ocupar na lista dos dez melhores da temporada, sua antológica apresentação no GP da Malásia serviu para esclarecer a questão. Mesmo afastado das pistas por três meses, em virtude do acidente no GP da Inglaterra, o alemão deixou claro que está acima da concorrência.169

167

QUINTANILHA, Sérgio. Lições para o futuro da F1. Idem. p. 3. Popularidade e custos em alta. Racing: Anuário de Fórmula 1. São Paulo. n. 3, 1999. p. 12. 169 Idem. p. 7. 168

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Na Malásia, Schumacher dominou os treinos de sexta e sábado, marcou a poleposition, dominou a corrida inteira mantendo Häkkinen sob controle e, no final, entregou a vitória a Eddie Irvine, que tinha chances de vencer o campeonato. Um jogo de equipe, que não teve as conseqüências que teria futuramente, quando Barrichello faria o mesmo, levantando muita polêmica. Ao escolher Schumacher como o melhor de 1999, na sua retrospectiva, a revista Racing ressalta: “De qualquer forma, nenhum piloto da atualidade está mais próximo da perfeição: seu preparo físico, sua facilidade de adaptar-se às mudanças de clima e da pista e a sua dedicação absoluta estão acima de qualquer suspeita.”170 3.3 Nova fase. Nova imagem? A temporada de 2000 foi a redenção para Schumacher e a Ferrari. Nesta temporada em que nunca perdeu a liderança, mas foi seriamente ameaçado a partir da segunda metade do campeonato, a pressão se fez sentir, e foi demonstrada em Monza, com o desabar em choro, na entrevista dos três primeiros colocados naquela corrida. Schumacher, que iniciou o ano com três vitórias e terminou com quatro, somando mais duas, igualou seu recorde de nove vitórias em uma temporada, os 108 pontos de Nigel Mansell, marcados em 1992, e tornou-se tricampeão pela mais tradicional equipe da Fórmula 1. Desde 1979 a Ferrari não obtinha um título de pilotos. Reginaldo Leme então destacou: Michael Schumacher, aos 31 anos de idade, consegue aquilo que outros grandes nomes da F-1 tentaram sem sucesso. Gilles Vileneuve, Alain Prost e Nigel Mansell, para citar apenas os três maiores do período [1980-1999], passando por Didier Pironi, Gerhard Berger, Patrick Tambay, Michele Alboreto, René Arnoux, Jean Alesi e até Eddie Irvine, no ano em que Schumacher ficou fora de 7 corridas.171

O campeão Schumacher declarou ter sido esse o mais importante título de sua carreira, até então. “A Benetton que me desculpe, mas vencer pela Ferrari é fantástico.”172 O título, pelo fato de ser com a Ferrari, que estava há 21 anos sem vencer, foi destacado pela mídia. Mas foi o desempenho de Schumacher que sobressaiu. “O título desta temporada fez justiça

170

Os dez mais da F1 em 1999. Racing: Anuário de Fórmula 1. São Paulo. n. 3, 1999. p. 7. [Nessa escolha não é citado nenhum critério adotado pela revista, nem quais profissionais participaram da mesma. Apenas foi publicado uma relação onde constam os dez melhores de 1999, de acordo com a revista.] 171 LEME, Reginaldo. O canto d’Agostini. Speedway, São Paulo, n. 35, outubro 2000. p. 60. 172 ZAMBELI, Vinicius. Schumacher arrasa: tricampeão. Racing, São Paulo, n. 53, outubro 2000. p. 38. 65

ao melhor piloto em atividade. Mas Michael Schumacher continua sedento: agora quer os recordes de Alain Prost.”173 Em 2001 a temporada foi mais tranqüila para Schumacher. Mais uma vez nove vitórias, o recorde de 123 pontos na temporada e a conquista antecipada do título, a três etapas do fim. O recorde de vitórias de Alain Prost foi superado junto com o igualar do quarto título. A reação da imprensa não foi enfática: parecia uma conquista natural. Alguns lances polêmicos surgiram, como a troca de posições com Barrichello na Áustria. Schumacher vinha em terceiro, com Barrichello em segundo, não tendo alcançado David Coulthard, que liderava. A Ferrari, no interesse do campeonato de Schumacher, que tinha 18 pontos à frente de Barrichello, deu ordem para que este cedesse a posição para Schumacher. O fato gerou polêmica, mas foi em geral bem aceito pela imprensa especializada brasileira. Flávio Gomes comentou: Li, ouvi e falei muito sobre a já famigerada troca de posições entre Barrichello e Schumacher no domingo - muito mais do que o fato, em si um episódio menor, merece. [...] A situação é bem mais simples do que se imagina e a maneira mais apropriada de me livrar desse assunto é reduzi-lo ao que minha dor de barriga exige: 1. Barrichello não disputa o título. Não porque é um pobrezinho brasileiro discriminado pelos poderosos europeus, mas porque chegou à Áustria com 14 pontos contra 36 do Schumacher, porque o Schumacher é melhor e nas 23 corridas que disputaram juntos ganhou 12 contra uma do Rubens, e largou 21 vezes à sua frente. Portanto, se a Ferrari tem de apostar em alguém, é no alemão. 2. Ordem de equipe é a coisa mais antiga do mundo, embora esportivamente não agrade a todos. Mas e daí? Em 1999 o Schumacher quase parou o carro para o Irvine ganhar na Malásia e ninguém transformou o irlandês no anticristo das pistas. Mais do que isso é esticar um assunto que, francamente, não vale a tinta do jornal.174

Nelson Piquet também fez comentário parecido: O Rubinho andou bem e, no final, por interesse da equipe (nada mais natural) deixou o Schumacão chegar em 2º. Pena que depois tenha ficado com aquela cara de quem não gostou. É o seguinte, do mesmo jeito que no futebol: quem não faz, toma. Ele não conseguiu passar (nem ameaçar) o Coulthard, então, tinha que contribuir.175

Apesar do que disse Flavio Gomes, o episódio, entre os colunistas analisados, não mereceu muito destaque. Irvine, em 1999, já havia feito algo igual, cedendo a terceira posição para Schumacher, na Espanha. Como ressaltou Flávio Gomes, “ordem de equipe é a coisa mais antiga do mundo.” Mas, o mesmo que houve em 2001 iria repetir-se no ano seguinte,

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AGUIAR, José Emilio. GP Japão F1. Speedway, São Paulo, n. 35, outubro 2000. p. 82. GOMES, Flávio. Resumo de um fato menor.16/05/2001.www.warmup.com.br, acesso em 18/11/2003. 175 PIQUET, Nelson. Coulthard em alta. Racing, São Paulo, n. 68, maio 2001. p. 35. 174

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com mais polêmica, pois Barrichello iria ceder a vitória a Schumacher, em nome do campeonato. Schumacher, ao final da temporada de 2001, continuou com o aval da imprensa escrita sobre sua condição de “melhor de todos”. Sergio Quintanilha, editor da Racing, relacionando os dez melhores da temporada, escreveu: “Schumacher – com 9 vitórias e 5 segundos lugares, atingiu a perfeição como piloto. É imbatível atualmente em condições normais.”176 A cobertura da corrida que lhe deu o tetracampeonato já afirmara: Negar as qualidades de Schumacher e a sua condição de melhor piloto da atualidade, razão pela qual conquistou o título mais significativo de sua carreira, é não querer ver a própria realidade da Fórmula 1. Mas é inegavelmente realidade que a jornada do piloto alemão em direção ao tetracampeonato foi amplamente facilitada. Não bastasse o seu talento acima da média e a excelência da Ferrari, Schumacher praticamente não teve adversários.177

Voltava a vigorar a afirmação de que Schumacher “não tinha adversários”. Ela será mais ressaltada ainda em 2002. A hegemonia da Ferrari até então não incomodava a Fórmula 1, devido à competitividade que havia (embora apenas Williams, McLaren e Ferrari tivessem vencido corridas em 2000 e 2001). Foi a partir de 2002 que a Ferrari mostrou-se quase invencível. As novas regras permitiam testes privados livres, e a Ferrari, tendo duas pistas particulares, soube aproveitar-se dessa prerrogativa. A temporada foi, em termos de recordes para Michael Schumacher, perfeita. Foram 11 vitórias, 17 pódios em 17 corridas, 144 pontos. Recordes absolutos. A maior polêmica da temporada foi a ordem de equipe da Ferrari que obrigou Rubens Barrichello a ceder a primeira posição para Michael Schumacher no GP da Áustria. Rubens Barrichello havia dominado os treinos do fim de semana e, largando da pole, liderara toda a corrida, sempre com Schumacher em segundo e bem próximo. Nas últimas voltas, recebeu ordens da equipe, por rádio, para trocar de posição com Schumacher. A ordem foi obedecida na última curva, a metros da chegada. Schumacher venceu a prova e Barrichello foi o segundo. As manchetes da revista Racing daquele mês foram fortes: “Scuderia Farsante”, como título principal, seguido de “Os homens da grande farsa da Ferrari”, “Vale a pena torcer por este Barrichello?”, “Schumacher tem poder na Ferrari. Porque não tirou o pé?”178 Na matéria, 176

QUINTANILHA, Sergio. Carta do editor: minha lista dos dez melhores. Racing, São Paulo, n. 80, outubro 2001. p. 4. 177 TEIXEIRA Jr, Américo. Schumacher é tetra. Racing, São Paulo, n. 75, agosto 2001. p. 14. 178 Racing, São Paulo, n. 93, maio de 2003. Capa. 67

uma ampla cobertura dos motivos da ordem da Ferrari e das questões levantadas que “precisam ser respondidas sem paixão.”179 As quatro questões eram: “Barrichello deveria ter aceito a ordem?”, “Michael Schumacher deveria ter aceito a vitória?”, “Rubens Barrichello deve deixar a Ferrari por ter sido exposto a esta situação?” e “a FIA tem poderes para punir a Ferrari?”.180 Para essas questões, a revista respondeu com imparcialidade, aparentemente. Barrichello tinha um contrato que estabelecia que deveria acatar ordens, e o fez. Schumacher também estava sujeito às ordens, e as seguiu. O próprio Schumacher ressaltou: “vai saber se esses pontos não vão fazer falta no final do campeonato?” 181. Barrichello não deveria deixar a Ferrari. Não havia melhor equipe para vencer corridas e, mesmo após uma “humilhante” situação, deveria continuar na equipe, pois não havia como mudar o quadro - “é a realidade atual”. Por fim, a FIA não teria poderes para punir a equipe, pois não poderia interferir nos procedimentos de trabalho delas. O que aconteceu depois foi uma punição por “quebra do protocolo do pódio”, onde a Ferrari foi multada em US$ 1 milhão, sendo que US$ 500 mil foram pagos de imediato, e os outros US$ 500 mil no caso “alguma atitude igual ocorrer nos próximos 12 meses”. O artigo 170 do Regulamento Esportivo foi desrespeitado quando Barrichello ocupou o alto do pódio, e foi considerado “um ato desrespeitoso para com uma autoridade” o gesto de Schumacher repassar o troféu de vencedor para Barrichello, logo após recebê-lo do chanceler austríaco.182 A imprensa no Brasil destacou bastante o episódio, certamente por envolver um piloto brasileiro. Lemyr Martins foi enfático em sua coluna: Foi, sim, uma afronta que no mínimo deveria ser digna de alguma atitude severa da Federação Internacional de Automobilismo. O que ocorreu na pista de Spielberg foi um ato perverso contra o esporte e contra Rubinho.183

Sobre Michael Schumacher, foi bastante acusador, atribuindo a ele a responsabilidade pelo desfecho: O que deve ficar bem claro na maracutaia da Ferrari é que, quem tem a última palavra - ou gesto - no jogo de equipe é mesmo Michael Schumacher. Foi o alemão quem recomendou a contratação do projetista Rory Byrne, que concordou com a gerência de Jean Todt e impôs Ross Brawn, seu velho parceiro desde a Benetton. Schummy é plenipotenciário na Ferrari e os demais, seus súditos. Daí, conclui-se que é dele a última palavra. Digo isso porque ele poderia não aceitar - e nem precisava - ser o vilão do GP da Áustria de 2002.184 179

Ferrari envergonhou o esporte. Racing, São Paulo. op. cit. p.26. Idem. p. 27-28. 181 Ibidem. p. 27. 182 ZAMBELI, Venício. FIA pune Ferrari só no bolso. Racing, São Paulo, n.97, julho 2002. p.12. 183 MARTINS, Lemyr. Uma questão de matemática. www.grid.abril.com.br, acesso em 20/02/2003. 184 Idem. 180

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Flávio Gomes deu uma opinião menos acusadora, mas atribuiu a Schumacher apenas a “perda de uma oportunidade”: 1) a Ferrari fez uma burrada monumental, deu uma ordem antipática e, acima de tudo, desnecessária; 2) Schumacher perdeu uma ótima chance de dar uma de bonzinho e limpar a imagem, arranhada por tantas trapalhadas no passado; 3) Barrichello decepcionou muita gente com seu comportamento submisso, fez papel de palhaço no pódio, mas respeitou o contrato, isso ninguém pode negar185

Não dando mais tanta importância ao caso, Flávio Gomes comenta em sua coluna seguinte: Afinal, discorrer mais uma vez sobre motivos e conseqüências daquela patuscada, teorizar sobre as atitudes de cada personagem envolvido, partir para julgamentos sobre caráter e personalidade de pilotos e dirigentes, passados alguns dias do episódio, me parece inútil e cansativo.186

A polêmica não foi além de algumas semanas. Em pouco tempo a imprensa deixou de falar no assunto e dedicou-se a falar do pentacampeonato de Schumacher, conquistado três meses depois. Como comentou Marcus Zamponi, ainda nos dias do incidente: Podem apostar que os aficcionados estarão normalmente antenados nos próximos GPs porque dor de cotovelo tem cura fácil. Por mim, que me desculpem os radicais, não vou desgostar de automobilismo nem um pouquinho (nem eu nem o Rubinho, podem apostar). Afinal, todos nós deveríamos saber porque o jornal L’Equipe da França carrega em seu subtítulo: ‘Um jornal de esportes e de automobilismo’. Porque, neste grande negócio que é a Fórmula 1, não deveria existir espaço para a paixão...187

Deve-se notar que a “condição” para o não-pagamento da segunda parte da multa de US$1 milhão era a de não ocorrerem mais tais ações. Mas, na etapa dos Estados Unidos, Michael Schumacher liderou de ponta a ponta e, na linha de chegada, deixou que Rubens Barrichello emparelhasse e chegasse 0,011 segundos à sua frente. A atitude pôde ser compreendida como uma retribuição pela troca de posições na Áustria. Schumacher já havia conquistado o título no mês anterior, não tinha mais necessidade de somar o máximo de pontos agora. Na matéria da revista Racing sobre a corrida, nada de polêmico foi escrito sobre a troca de posições em cima da linha de chegada, como foi na Áustria. Dessa vez o beneficiado foi Barrichello, e Schumacher é que havia dominado os treinos do fim de semana, como

185

GOMES, Flávio. O verdadeiro pecado mortal. 16/05/2002. www.warmup.com.br, acesso em 20/11/2003. GOMES, Flávio. Obrigado, Jean Todt! 17/05/2002. www.warmup.com.br, acesso em 20/11/2003. 187 ZAMPONI, Marcus. Negócio sem paixão. Racing, São Paulo, n. 94, maio 2002. p. 74. 186

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Barrichello havia feito na Áustria. Em uma pequena coluna, de um quarto de página, a revista, na edição seguinte à da cobertura da corrida, escreveu que: “O episódio [...] foi muito comentado e ainda será motivo de polêmica por mais tempo. A facilidade com que estiveram à frente da concorrência não dava motivo para que eles banalizassem a vitória em uma corrida, como aconteceu. Pelo menos, esta é a opinião de algumas pessoas do ‘circo’, que opinaram sobre o acontecido”188

Como ressaltado, era a opinião de algumas pessoas, sendo estas o diretor técnico da Williams, Patrick Head, o piloto Jacques Villeneuve e o presidente do circuito de Indianápolis, Tony George. Das três opiniões transcritas, apenas as de Head e Villeneuve eram críticas. A outra, muito elogiosa, do norte americano Tony George: “uma jogada de publicidade da Ferrari que gera polêmica, mas, também, retorno da marca e das pessoas envolvidas.”189 Flávio Gomes considerou a corrida uma “marmelada”, dizendo: Afinal, se é verdade que se trata do mesmo doce, também é evidente que sua digestão foi muito mais fácil. A marmelada americana não causou indignação nenhuma, foi quase desprezada e a crítica mais severa que ouvi foi de um sujeito que me disse "como são bobos esses caras", com o que concordo. A troca de posições não passou de mais uma bobagem nesta temporada cheia de bobagens, um campeonato tão desigual que permitiu essa troca de gentilezas que não tem nada de esporte. Como diz outro amigo, e me perdoem o termo esdrúxulo, nada mais do que uma viadagem só possível porque as outras equipes não existem e os dois pilotos da Ferrari são amiguinhos.190

Seu comentário deixa perceber como a temporada foi tranqüila para a Ferrari, que a dominou por inteiro. Foram quatro vitórias de Barrichello e onze de Schumacher. Apenas Coulthard e Ralf Schumacher venceram corridas além deles. Quinze vitórias em dezessete possíveis, como o fez a McLaren, em 1988, com Senna e Prost. E também deixa perceber que a imprensa brasileira parece fazer mais alarde quando o beneficiado é Schumacher. Em seu “papel de vilão”, o alemão é criticado por atos que prejudiquem o brasileiro, mas não é tão criticado quando “brinca com o esporte.” Flávio Gomes mostra como o fato foi considerado irrelevante mesmo em alguns setores da imprensa internacional: A melhor análise que vi do fato foi, pasmem, de um colunista americano do "Indianapolis Star", um jornal local com alguma tradição em automobilismo. "Who cares?", ele perguntava em seu artigo de segunda-feira. É isso aí:

188

Deu o que falar. Seção Pit e Paddock. Racing, São Paulo, n. 104. p. 16. Idem. 190 GOMES, Flávio. Quem se importa? 03/10/2002. www.warmup.com.br, acesso em 20/11/2003. 189

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quem se importa com quem ganhou a corrida, de que forma, com qual diferença, por quantos centímetros?191

E justifica, pedindo: Esqueçam essa xaropada, a Ferrari que faça o que bem entender, assim como seus pilotos. Eles que se divirtam, que aproveitem o momento. [...] Nós temos mais o que fazer. Tem eleição domingo, o Brasil está muito perto de reparar um enorme erro cometido há 13 anos. Isso sim importa. O resto, que me desculpem vocês que amam a F-1 acima de todas as coisas, é irrelevante.

O episódio da Áustria repetiu-se, e a FIA não cobrou a outra parte da multa. Nos EUA, com o campeonato decidido em favor de Schumacher, podia-se fazer jogo de equipe? Ou Schumacher podia “brincar”, deixando Barrichello vencer? Mesmo sem ter havido a “ordem” da equipe para a troca de posições, a outra parte da multa deveria ter sido cobrada, pois era a determinação da FIA para o caso de “alguma atitude igual [a da Áustria] ocorrer nos próximos 12 meses”. Schumacher reduziu a velocidade na reta de chegada e tirou o carro para a esquerda, para Barrichello ficar ao seu lado na chegada. Foi uma manobra explícita para favorecê-lo. Mas o ponto máximo do campeonato, em relação à história da Fórmula 1 e de Schumacher, foi a conquista do pentacampeonato de pilotos. 45 anos após Juan Manuel Fangio ser pentacampeão, alguém igualou seu feito. Na capa da Racing, a manchete “Edição Histórica: Schumi iguala Fangio.” A cobertura foi simples, de cinco páginas. Como destaque, ressaltou-se a “nova condição” que o piloto passava a ter: Schumacher chega, aos 33 anos, à condição de maior ícone do automobilismo mundial. É plenamente lícito o questionamento de algumas atitudes que ele tomou nas pistas, desde a sua estréia na categoria, em 25 de agosto de 1991, da mesma forma que as circunstâncias que fizeram dele esse herói moderno da Fórmula 1. Se Senna não tivesse morrido em 1994... Se Schumacher não tivesse jogado para fora da pista o inglês Damon Hill na decisão de 1994 na Austrália... Se ele não tivesse ido para a Ferrari em 1996... Se não houvesse na equipe italiana essa condição de primeiríssimo piloto... Se seus companheiros de equipe não fossem proibidos de vencê-lo... Há muitos pontos para que seus críticos se apeguem para minimizar a importância de seus feitos, mas, como ‘se’ não ganha corrida, é deste alemão nascido em 3 de janeiro de 1969, em Hürt-Hermühlheim, a condição de nome maior do esporte.192

Na edição seguinte, fotos do carro e entrevista exclusiva com o campeão, com a cobertura da etapa da Alemanha, com mais uma vitória de Schumacher. Nada além do normal, no que diz respeito às coberturas que a revista costuma fazer.

191 192

Idem. TEIXEIRA Jr. Américo. O penta alemão. Racing, São Paulo, n. 98, julho 2002. p. 4-7. 71

Os colunistas brasileiros especializados em Fórmula 1 deram mais atenção para o feito. Flávio Gomes fez um interessante comentário, em que defendeu as qualidades de Schumacher, acima de seus defeitos: Portanto, aplausos para Schumacher, o pentacampeão mundial de F-1, o homem mais adaptado a um carro de corrida que o planeta já viu. Sim, ele trapaceou em 1994, ele fez jogo sujo em 1997, ele tem a equipe a seus pés, ele isso, ele aquilo. Bem, o esporte não é feito de anjos, mas de vitoriosos. E só um ganha. Julgar Schumacher por seus deslizes é distorcer a realidade e desmerecer sua eficiência, sua competência, seu talento acima do normal.193

Lemyr Martins enfatiza bem a conquista: “Michael Schumacher passa à galeria da Fórmula 1, como o seu maior piloto: tem mais vitórias, recordes de voltas, pódios, pontos e mais voltas na liderança. Agora igualou-se com Juan Manuel Fangio no número de títulos.”194 Através de seus recordes, é posto na condição de “maior piloto” da Fórmula 1. Sobre seu comportamento após o título, Lemyr comenta: “Nunca se viu o homem tão solto e em paz com a velocidade. Schummy ri à toa, dá autógrafos com satisfação de novo ídolo e, em nenhum momento, assumiu a costumeira carranca nos boxes - até parece que seu queixo diminuiu.”195 Sobre os recordes, na coluna seguinte, Lemyr Martins afirma: Ficará faltando - e isso é ótimo - buscar os recordes de pole-positions. Queira ele ou não, de agora em diante vai competir sempre contra a estatística, porque já lhe falta adversário no atual circo da Fórmula 1. Pelo menos enquanto a competente Gestione Sportiva da Ferrari estiver fornecendo-lhe máquinas maravilhosas como esse modelo 2002, que lhe permite soltar todo o seu talento e demonstrar como um gênio se diverte, a 300 km/h.196

Os recordes agora serão muito comentados, visto que a “falta de adversários”, enquanto tem “máquinas maravilhosas” que lhe são dadas pela Ferrari, só lhe permite correr contra si e contra os recordes que lhe faltam, segundo Lemyr Martins. Nessa temporada de 2002 não houve pilotos que disputassem diretamente o título contra Schumacher. Nem mesmo Rubens Barrichello, que tinha o mesmo equipamento, conseguiu. Schumacher conquistou o título com seis provas de antecedência e 62 pontos de vantagem para o segundo colocado, até então. Barrichello era o terceiro no campeonato. Schumacher obteve oito vitórias, entre as onze possíveis até a França. Foi um ano de domínio quase absoluto da Ferrari. A imprensa,

193

GOMES, Flávio. Aplausos para o alemão.18/07/2002. www.warmup.com.br, acesso em 20/11/2003. MARTINS, Lemyr. Com o pé na estrada do hexa. 21/07/2002. www.grid.abril.com.br, acesso em 20/02/2004. 195 Idem. 196 MARTINS, Lemyr. Correndo contra os recordes. 01/09/2002. www.grid.abril.com.br, acesso em 20/02/2004. 194

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assim, enfatizou suas conquistas numéricas, prevendo os recordes que Schumacher poderia ainda alcançar. 3.4 A F1 busca "emoção" e dificulta o hexacampeonato. Na temporada de 2003, a tão desejada “competitividade” volta à Fórmula 1. As mudanças no regulamento mexeram em quase todos os aspectos do formato de classificação e impediram que falhas, erros e quebras fossem resolvidos rapidamente, dando chance para que o piloto pudesse recuperar o tempo perdido. Agora, os pilotos teriam apenas uma volta lançada (ou seja, sair dos boxes, vir correndo, iniciar uma volta em alta velocidade, completá-la e retornar aos boxes) para obter o melhor tempo possível para classificar seu carro, ao invés de quatro voltas, como era desde 1994. Se um carro quebrasse na classificação, ou o piloto errasse sua volta, não teria mais como tentar novamente. Se errasse, ficaria com um tempo e uma posição ruim no grid. Foram também proibidos a troca de pneus e o reabastecimento para a corrida. Os carros largariam com os mesmos pneus e sem abastecer novamente, só podendo fazer isso após a largada. Essa mudança fez com que, muitas vezes, carros mais rápidos precisassem partir entre os últimos, dando às corridas “mais emoção” em virtude das expectativas de ultrapassagem. Mas especialistas duvidaram que as mudanças pudessem prejudicar o desempenho do pentacampeão: “Tratando-se de Schumacher, um piloto que comete poucos erros, isto não parece ser grande problema.”197 Equipamentos eletrônicos que auxiliavam a pilotagem foram proibidos, para que, desse modo, se pudesse nivelar a pilotagem, deixando que os pilotos controlassem mais seus carros. As ordens de equipe, que tanta polêmica causaram em 2002, também foram proibidas. A comunicação só foi permitida do piloto para o box, e sendo monitorada pela direção da prova. Mas, dificilmente, impediu que as estratégias fossem alteradas durante as corridas. O sistema de pontuação, que antes dava pontos aos seis primeiros colocados, passou a brindar os oito primeiros. A diferença entre o vencedor e o segundo colocado nas corridas agora seria de dois pontos, e não mais quatro. A intenção, com essas mudanças, era “dificultar ao máximo o trabalho da Ferrari”198, devolvendo ao público o espetáculo perdido com o domínio de Schumacher e sua equipe em 2002 e tornando a Fórmula 1 menos “previsível”.199

197

ZAMBELI, Venício. Carta do editor: ver para crer. Racing, São Paulo, n. 109, dezembro 2002. p. 4. ZAMPONI, Marcus. Fórmula 1 e silicone. Racing, São Paulo, n. 114, março 2003. p. 10. 199 OTAZÚ, João Alberto. F1: mudanças de impacto. Racing, São Paulo, n. 111, fevereiro 2003. p. 16-18. 198

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Junto com tudo isso, a redução de custos na categoria, que via duas equipes, a Arrows e a Prost, falirem no mesmo ano. Tendo uma Fórmula 1 mais atrativa, haveria mais público, e assim, mais investimento dos patrocinadores: “[...] paralelamente à redução de custos, havia nos planos de Max Mosley, presidente da FIA, a intenção de interromper a seqüência de conquistas da Ferrari para tornar as corridas mais interessantes.”200 Mesmo consagrando Michael Schumacher e a Ferrari como campeões em 2003, repetindo os três anos anteriores, a temporada foi a melhor dos últimos anos, pois vários pilotos venceram corridas e a disputa foi até a última etapa, no Japão. O aumento da quantidade de ultrapassagens e a imprevisibilidade quanto ao vencedor elevaram a audiência e trouxeram mais retornos financeiros para a Fórmula 1. Para Schumacher, a temporada de 2003 foi mais difícil que as anteriores. Vencendo apenas seis corridas, só conquistou o campeonato na última corrida, depois da bandeirada. Foi a mais disputada temporada da qual participou. A imprensa destacou sua conquista com a mais significativa das sentenças: “O maior piloto de todos os tempos”. A revista Racing foi assim, enfática, em sua capa.201 A matéria estampava: “2003; o ano da consagração.” Na matéria, a ressalva: “Michael Schumacher só é superado em um quesito nas estatísticas da Fórmula 1. Ele tem 55 poles contra 65 de Ayrton Senna.”202 Novamente a comparação com Senna e a citação da marca que ainda não detém. Com a temporada de 2003 ainda em andamento, Reginaldo Leme comentou o modo de agir de Schumacher: “O alemão é do tipo vencedor. Em vez de lamentar a superioridade técnica de uma equipe rival, ele prefere pensar no que conseguiu somar para construir o caminho de mais um título. [...] É incrível a capacidade que tem este Michael de mostrar cabeça fria.”203 Na etapa dos Estados Unidos, quando conseguiu uma vantagem de 9 pontos, a “sorte” de Schumacher foi citada como um dos fatores que mais costumam acompanhar o alemão. Falando em Schumacher, podemos admitir que a sorte ajudou de novo, que os adversários não tiveram a força que imaginavam ter ou até que os comissários podem ter dado uma mãozinha. Mas contra competência não há discussão. Ainda bem que eu disse aqui na coluna passada que a corrida de Indianápolis seria decidida na força mental. Não deu outra. Na hora decisiva, quem manteve a cabeça no lugar foi Michael Schumacher, que, em uma única volta, chegou a perder tudo o que havia conquistado na largada, mas 200

LEME, Reginaldo. O medo que mudou a cabeça da FIA. 17/01/2003. www.warmup.com.br, acesso em 16/11/2003. 201 Racing, São Paulo, n. 130, outubro 2003. capa. 202 GONZALEZ, Wagner. Agora só falta o número de pole positions... Racing, São Paulo, n. 130, outubro 2003. p.20. 203 LEME, Reginaldo. Há tempo para uma virada? 11/07/2003. www.warmup.com.br, acesso em 21/11/2003. 74

sabe enxergar mais longe do que os outros e apenas lutou para se manter na pista à espera de novas mudanças no tempo e na corrida.204

O destaque para a “competência indiscutível” e a “força mental” mostra o modo como o piloto é separado dos demais no que se refere à capacidade de lidar com as adversidades. Referindo-se ao GP da Hungria, Reginaldo Leme comentou: “Se ele conseguir chegar à frente de Montoya e Raikkonen, poderá partir para as três etapas finais com uma estratégia de defender posição, o que, no caso de um piloto inteligente como ele, quase sempre dá certo.”205 E destacando problemas que Schumacher estava então vivendo, Reginaldo Leme ainda assim não lhe tira a condição de provável melhor piloto da história do automobilismo: É difícil admitir, mas nas últimas duas corridas estivemos diante de um fato novo em se tratando de Schumacher: ele correu como um piloto normal. Errou no treino, errou na corrida e até azar ele teve. Tudo o que pode acontecer com qualquer um, mas não acontecia com ele. De agora em diante mesmo um sujeito frio como ele é capaz de sentir o peso da pressão pela eventual perda de um campeonato que parecia ganho. E, o que é pior, para Montoya, colombiano desbocado que, com seu jeito desafiador, desde o início pintou como alguém que vinha para abalar o reinado daquele que é apontado como o melhor da história. Provavelmente é, de fato, o melhor. Mas não imbatível.206

Após vencer e ir para a última etapa com o título praticamente nas mãos, Schumacher frustra os torcedores que esperavam outro campeão em 2003. Reginaldo Leme mostra isso na mesma coluna, bem como a percepção generalizada de que Schumacher é um piloto agraciado pela sorte: Não são poucos os torcedores frustrados com o rumo que tomou o campeonato quando se esperava briga até Suzuka. Sidney dos Santos Junior desabafa: "Não agüento mais este alemão". Fernando Busnardo Azarite pergunta: "Quem é que pode parar este alemão sortudo?". A carioca Neimar Rodrigues Guimarães, inconformada com a punição a Montoya, define Schumacher como aquele personagem primo do Pato Donald, o "Gastão", que dava sorte em tudo o que fazia. Com o que concorda Antonio Toledo, de São Paulo: "O carro do Schumacher tinha a marca do pneu de algum outro que bateu ali, mas quando isso acontece com ele, o carro não roda, a carenagem não quebra, o radiador não fura".207

Lemyr Martins também registrou a “coragem” e “frieza” de Schumacher, referindo-se ao GP da Áustria: Mas se Schummy demonstrou coragem na fechada sobre Montoya, teve que ter muito mais sangue frio ao voltar à pista, depois que a bomba injetora de combustível incendiou-se no seu primeiro pit stop, na 22ª volta. E esse fato 204

LEME, Reginaldo. Efeito Schumacher. 03/10/2003. www.warmup.com.br, acesso em 21/11/2003. LEME, Reginaldo. Quem arrisca uma aposta? 08/08/2003. www.warmup.com.br, acesso em 21/11/2003. 206 Idem. 207 LEME, Reginaldo. Efeito Schumacher. op. cit. 205

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foi o mais anormal da prova, principalmente em se tratando da Ferrari e com o carro de Schumacher. Entre troca de pneus, reabastecimento, labaredas e jatos de extintor, foram 20,4 segundos de suspense. Tempo suficiente para qualquer piloto perder a concentração e a corrida, mas como se tratava de Michael Schumacher, ele transformou o susto em gana e voltou para definir o Grande Prêmio.208

Para a etapa final da temporada de 2003, quando Schumacher tinha 9 pontos de vantagem, precisando apenas de um ponto para ser campeão, Lemyr Martins, certo da conquista, garante: “seria necessário uma hecatombe para que a Terra não tenha o seu primeiro hexacampeão de F1. E eu acho que nem Kimi Raikkonen tem essa esperança.”209 Flávio Gomes viu de outra forma a temporada. Em meados do ano, como a Ferrari perdia o domínio, parecia ser a Williams que iniciaria uma nova fase de hegemonia. Sendo assim, Schumacher agora teria outro papel: E é Schumacher, agora, a esperança da F-1 de não ficar chata de novo. Porque foi ele o responsável, naqueles seis anos [1992 a 1997], pelas únicas derrotas da Williams. A equipe inglesa só perdeu os campeonatos de 1994 e 1995 porque, no caminho, havia um Schumacher. Só alguém como Schumacher poderia atrapalhar, como atrapalhou. E ele continua lá, no meio do caminho. Schumacher, que até outro dia era o demônio a ser combatido, é agora o único que pode impedir uma nova era de domínio de uma equipe sobre o resto, a julgar pelo que aconteceu em Nürburgring e Magny-Cours. Quando a gente diz que na F-1 as coisas mudam muito rápido, não é força de expressão.210

Com a temporada em andamento e o campeonato indefinido, muitas hipóteses eram levantadas para explicar o fraco desempenho de Schumacher em algumas corridas. Flávio Gomes foi enfático ao comentar isso: Apenas algumas conclusões, que li em alguns lugares, ouvi em outros, soube que foram formuladas e espalhadas por aí, para explicar o que está acontecendo com Schumacher. 1) O GP da Hungria provou que ele está desmotivado, depois de cinco títulos; 2) Depois que deram equipamento igual para Barrichello, começou a andar atrás do brasileiro; 3) Ele só ganha com carro bom, com carro ruim é um piloto como qualquer outro, não consegue tirar leite de pedra "como nosso inesquecível Ayrton Senna" (um ouvinte da Rádio Bandeirantes disse isso, daí as aspas); 4) Ele está com problemas pessoais, pode ser a morte da mãe, a morte da cabrita, as pulgas nos cachorros; 5) O alemão é uma farsa, sempre foi.211

208

MARTINS, Lemyr. A arma preferida de Schumacher. 18/05/2003. www.grid.abril.com.br, acesso em 22/11/2003. 209 MARTINS, Lemyr. A temporada já deu saudades. 28/09/2003. www.grid.abril.com.br, acesso em 22/11/2003. 210 GOMES, Flávio. Um Schumi no meio do caminho. 10/07/2003. www.warmup.com.br, acesso em 24/11/2003. 211 GOMES, Flávio. Conclusões sobre um alemão. 28/08/2003. www.warmup.com.br, acesso em 24/11/2003. 76

São comentários significativos para pensar a relação da imprensa e do público brasileiros de Fórmula 1 com um piloto que já era pentacampeão - as diversas provas de “competência” ainda não pareciam suficientes. Se Schumacher vence sempre, é porque não tem adversários. Se fica sem vencer, é porque é uma farsa, e só ganha com carro bom. Quando está em uma fase vencedora, é “desvalorizado” por “não vencer ninguém”, e quando não vence, é criticado por não conseguir vencer. De um modo ou de outro, Schumacher não consegue que a imprensa ou o público sejam unânimes em alguma opinião a seu respeito. Ponderando tais comentários, segue Flávio Gomes: Não recebo para defender Schumacher. Apenas fico perplexo ao me deparar com tantas verdades absolutas sendo ditas de um piloto que, no campeonato em que está desmotivado, andando atrás do companheiro, com um carro ruim, tendo problemas em casa e exercendo seu papel de farsante consegue, ao mesmo tempo, liderar o Mundial, ter vencido mais corridas e fazer mais poles do que qualquer outro.212

A temporada de 2003 parece ter sido decisiva para arranhar a idéia de perfeição técnica que havia sido associada a Schumacher: o semideus mostrou-se mais humano que divino. Talvez o fato de ter um equipamento do mesmo nível dos adversários, levando-o a arriscar-se mais na pista fosse o responsável por tantos erros. A imprensa, porém, aproveitou para expor o lado humano do alemão, através de seus erros e da pressão que sofreu durante a temporada. Flávio Gomes destacou que Schumacher, por melhor que fosse perante os adversários, permaneceu humano e falível, capaz de errar e arriscar-se além do necessário: Uma máquina trituradora de adversários e recordes? Sim, e mesmo com tudo isso, capaz de fazer as bobagens que fez em Suzuka, correndo riscos desnecessários, guiando como um novato atrás de seu primeiro ponto. O que mostra que não é nem infalível, nem imbatível. E se os outros não o batem, e falham mais que ele, bem, aí é problema dos outros.213

Na revista Racing, a cobertura da temporada foi mais ampla, devido às corridas mais acirradas, em que vários pilotos deram espetáculo. Na reta final do campeonato, uma edição da revista elaborou um perfil dos três pilotos que disputavam o título, analisando-se seus equipamentos e suas condições físicas e psicológicas para as três últimas etapas. Schumacher 212

Idem. Sobre o “ter vencido mais corridas”: Schumacher tinha, até então, 4 vitórias, Ralf Schumacher e Montoya, os que mais haviam vencido, tinham 2 cada. Schumacher terminou a temporada com 6 vitórias, o triplo de Montoya, Ralf e Barrichello. 213 GOMES, Flávio. Sejamos gratos. 16/10/2003. www.warmup.com.br, acesso em 25/11/2003. Quanto às “bobagens” em Suzuka: na última corrida, no Japão, Schumacher precisava de um único ponto. Largando em 14º devido à chuva que atrapalhou os treinos de sábado, ainda precisou trocar o bico do carro após um toque em uma tentativa de ultrapassagem, e sofreu uma saída de pista ao tocar rodas com Ralf Schumacher. Fazendo, a partir de então, uma corrida mais prudente, decidiu manter-se na oitava posição, que lhe dava o ponto necessário, enquanto Rubens Barrichello liderava a corrida tendo Kimi Raikkönen em segundo, à espera de uma quebra das

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superaria Raikkönen e Montoya nas condições físicas “não é raro ver Schumacher sair do carro sem mostrar cansaço”), psicológicas (“a concentração de Schumacher é o seu ponto forte”) e técnicas (“o piloto da Ferrari leva vantagem nesse item. [...] é superior a seus adversários, pois sabe extrair o máximo do carro. Além disso, erra menos na hora de pilotar ao extremo.”).214 O certo é que Schumacher, ao vencer a temporada apenas na última etapa, e depois de muitas disputas e espetáculos, confirmou os prognósticos que indicavam 2003 como a mais competitiva temporada dos últimos anos. A última com mais disputas e vencedores fora em 1999, coincidentemente quando Schumacher ficou sete corridas afastado. 3.5 Algo mudou com o heptacampeonato? A revista Speedway, em matéria sobre Schumacher e seu hexacampeonato, perguntava: o que faltava para que fosse “considerado por unanimidade o maior piloto de todos os tempos?” E respondia: “talvez o carisma, como o que levava multidões do mundo inteiro a torcer por Ayrton Senna. Ou quem sabe, um grande rival.” Elenca os rivais de grandes pilotos como Fangio, Clark, Senna, Stewart, Piquet, destacando que Schumacher teve, comparativamente, “concorrência mais fraca: Hill, Villeneuve, Hakkinen.”215 A imprensa costuma desqualificar os adversários de Schumacher, que foram, inclusive, campeões mundiais. Villeneuve, campeão de 1997, foi campeão de Fórmula Indy e vencedor das 500 Milhas de Indianápolis em 1995, antes de ir para a Fórmula 1, em 1996. Damon Hill foi duas vezes vice-campeão, em 1994-95, campeão em 1996 e um dos maiores vitoriosos da categoria. Häkkinën foi bicampeão em 1998-99 e dono de 20 vitórias. Pilotos muito mais vitoriosos que os “grandes rivais” de Fangio, Clark, Stewart, entre outros. Por outro lado, Flávio Gomes, que em 1996 já destacara a tecnologia superior dos carros como forte adversário de Schumacher, em 2003 reforça o discurso: [...] sempre teve adversários fortíssimos (carros também contam: a Williams de 1994 a 1997, a McLaren de 1998 a 2000), não é obrigado a chorar e se ganhou nos últimos dois anos com o melhor carro, não foi o primeiro, nem o último (Senna tinha os melhores carros em 1988, 1990 e 1991, anos de seus títulos). 216

duas Ferraris, o que lhe daria o título, pois precisava da vitória e que Schumacher não marcasse nenhum ponto. Barrichello venceu a corrida e Schumacher, chegando em oitavo, tornou-se hexacampeão de Fórmula 1. 214 GONZALEZ, Wagner e ZAMBELI, Venício. O rei ameaçado. Racing, São Paulo, n. 127, setembro 2003. 215 A um passo da unanimidade. Speedway, São Paulo, n. 60, novembro 2003. p. 31. 216 GOMES, Flávio. Porque não gostam dele. 17/08/2003.www.warmup.com.br, acesso em 25/11/2003. 78

Mesmo a Fórmula 1 tendo várias equipes e pilotos – em 1994 eram 14 equipes, o que permaneceu até 2003, quando passou a 10 equipes, tendo 2 pilotos cada – para a imprensa, muitas vezes Schumacher “não teve adversários.” Apaga-se o papel da Williams, depois da McLaren, sempre favoritas, com pilotos vencedores. Deixa-se de salientar que Schumacher correu diretamente contra quatro campeões mundiais, e venceu Senna e Piquet indiretamente, superando-os em algumas corridas e, depois, conquistando mais títulos e vitórias que eles. Essa opinião, sobre os adversários de Schumacher, parece refletir a do público, no Brasil. Ou será que o público é que reflete a opinião da imprensa? Antes da conquista do hexacampeonato, Flávio Gomes parecia ter uma explicação para isso, por meio da qual se pode pensar que a imprensa e o público criam juntos a imagem de Schumacher: As pessoas não gostam do Schumacher no Brasil. "As pessoas", dito assim, é algo generalizante. Às favas. É assim. As pessoas têm bronca do cara. Usam vários argumentos: é antipático, mascarado, vigarista, não tem adversários, não chora no pódio, só ganha porque tem o melhor carro. Cansei de ouvir o mesmo papo. O cara ganhou cinco títulos. Quem não gosta dele desqualifica todos. [...] As pessoas não gostam do Schumacher no Brasil por causa de Senna. Ele fez o que Senna não conseguiu. Não falo apenas nos números, porque Senna teria, também, estatísticas exuberantes se não fosse sua morte prematura — embora, com o mesmo número de corridas nas costas, Schumacher já tivesse conquistado mais do que Ayrton. Falo de façanhas. Ser campeão numa equipe pequena. Pegar a Ferrari em frangalhos e fazer dela uma equipe vencedora. Ganhar em todas as pistas. Bater todos os recordes. Ser o melhor de todos os tempos. 217

Será a comparação com Ayrton Senna, pilotos de épocas e fases tão distintas, o que vai sempre ofuscar, no Brasil, as conquistas do alemão Michael Schumacher? No quesito números, Schumacher será sempre superior - é curioso, mas Prost, nessas discussões, quase sempre é esquecido218 - , mesmo se contarmos apenas dez anos de carreira, o que tinha Senna, ou o mesmo número de corridas. Adversários? Schumacher e seus adversários chegaram à Fórmula 1 na mesma época. Talvez, por não terem esses adversários, títulos e vitórias anteriores, ou não haverem corrido e lutado contra Senna e Prost, os “grandes” dos anos de 1980 e começos de 1990 sejam considerados “menos” capazes. A mídia, que aprova ou desaprova o que melhor convém a seus interesses e ao de quem lhes garante as cotas de patrocínio, parece entender que Schumacher é melhor produto quando “demonizado”, do que se for aclamado fenômeno ou herói do esporte a motor. Por não haver corrido contra Piquet, Prost, Senna e Mansell, (por “não ter corrido contra”, entenda-se: não ter disputado título) Schumacher deve ter seus títulos e demais conquistas desmerecidas? 217 218

Idem. GOMES, Flávio. Ninguém fez mais que Michael. 06/09/2001. www.warmup.com.br, acesso em 18/11/2003. 79

Se em 2003 a competitividade e a revelação de novos talentos – Raikkönen, Alonso, Button – e a ascensão de Williams e McLaren à briga pelo título trouxe mais espetáculo e interesse do público e patrocinadores para a Fórmula 1, o ano de 2004 irá mostrar como a Ferrari e Michael Schumacher conseguiram adaptar-se às mudanças de regras que vigoraram em 2003 e foram ampliadas para 2004. Para 2004, a Fórmula 1 mudou pouco. As mudanças nos formatos de treinos e escolha de pneus não foram suficientes para manter em 2004 a competitividade e o espetáculo de 2003. A principal mudança foi em relação aos motores. Apenas um por fim de semana, quando as equipes usavam até quatro. Em caso de quebra nos treinos, ou troca por defeitos, o piloto perderia dez posições no grid de largada. Pequenas modificações na parte de aerodinâmica completaram as mudanças. A Ferrari, que sempre contou com a alta confiabilidade de seu equipamento, repetiu a atuação de 2002, dominou o campeonato por completo, e Michael Schumacher igualou e ampliou os recordes que já detinha. Nas cinco primeiras corridas do ano, quatro pole-positions e cinco vitórias. Um acidente em Mônaco e, então, nas sete corridas seguintes, espantosas sete vitórias consecutivas. Um recorde nos tempos atuais. Alberto Ascari havia feito o mesmo, mas em 1952-53, quando os campeonatos tinham 6, 7, 8 corridas apenas. Mais uma vitória no Japão, penúltima etapa, e Schumacher fechou o ano com treze vitórias e 148 pontos, superando mais uma vez um recorde seu. Ainda foi quinze vezes ao pódio, fez a volta mais rápida da prova em dez corridas e marcou oito pole-positions. Para os outros pilotos, sobraram algumas vitórias: duas para Barrichello e uma para Trulli, Raikkönen e Montoya. Depois da quinta vitória consecutiva de Schumacher, Reginaldo Leme oferece um exemplo de como a imprensa começa a falar do alemão: Desta vez a facilidade de Schumacher virou brincadeira para a imprensa, como o jornal alemão "Bild", que tripudia, pedindo para o hexacampeão ter piedade dos outros, ou o "Kurier", de Belgrado, que sugere à FIA a cassação da licença de pilotagem do alemão. Tudo isso é reflexo das piadas que se ouve nos bastidores, como a idéia de se arrecadar dinheiro das equipes rivais para pagar a Schumacher metade do que ele ganha na Ferrari, desde que se comprometa a passar os próximos dez anos pescando com os amigos, bem longe das pistas.219

O mesmo Reginaldo Leme voltou a acentuar, em meados da temporada de 2004, a facilidade do domínio de Schumacher: “Mesmo nos melhores momentos dos seus quatro títulos conquistados com a Ferrari, o alemão não encontrou tanta facilidade como agora. Os

219

LEME, Reginaldo. Para inglês ver. 14/05/2004.www.warmup.com.br, acesso em 31/12/2004. 80

antigos rivais fracassaram e os novos ainda não chegam a ameaçar.”220 Leme não levava em conta, porém, o retrospecto do alemão, que em 2002, na mesma 7ª etapa, tinha 42 pontos de vantagem para o segundo colocado do campeonato, enquanto que em 2004 tinha apenas 18. E, mesmo que o segundo lugar não valesse 8 pontos, a diferença seria de 34 pontos. Ainda assim, maior que em 2002. Flávio Gomes, após a primeira corrida de 2004, ressalta o trabalho da Ferrari e a dedicação de seus pilotos como responsáveis pelos resultados que alcançarão em 2004: Que se diga desde já: a culpa pela pasmaceira que será o Mundial de 2004 não é da Ferrari. [...] A culpa é de todo mundo, menos de quem está ganhando. Que repouse sobre Williams e McLaren [...] aquelas que têm mais condições de fazer alguma coisa, o ônus do delito inaceitável no automobilismo de andar atrás tanto tempo sem reagir. [...] Seus pilotos, se tivessem um mínimo de dignidade, enfurnar-se-iam num autódromo das seis da manhã às dez da noite para treinar e desenvolver seus carros. Porque não dá para tirar deles, também, a parcela de culpa pelo que não conseguem fazer. Não se empenham como deveriam, não ajudam a melhorar seus carros, vivem transferindo as responsabilidades e procurando escusas para as surras que levam. Schumacher, Barrichello e Badoer trabalham, fazem a lição de casa com afinco e suor. O alemão tem um quartinho em Fiorano com academia de ginástica onde dorme antes de testar. Acorda com os passarinhos, e só pára de andar quando anoitece. E está a 14 anos lutando por vitórias, troféus, tacinhas, medalha, medalha, medalha. E o que fizeram, enquanto isso, Coulthard, Montoya, Ralf, Hill, Panis, Fisichella, Villeneuve, Frentzen, Alesi, Berger? Ficaram choramingando pelos cantos, arrumando confusão, reclamando de tudo, blasfemando contra a injustiça universal que não lhes permitiu correr na Ferrari. Seria a Ferrari o que é se fossem eles, e não quem está lá, a ter de dar conta do recado? Não seria.221

Considerando que é somente o trabalho que traz a excelência, Flávio Gomes ressalta em Schumacher e na Ferrari o profissionalismo que não detecta nas outras equipes. Eleva Schumacher à condição de profissional extremamente dedicado, que não mede esforços para alcançar os objetivos, e por isso é premiado com vitórias e títulos. Na terceira corrida, antecipa o resultado do campeonato: Schumacher já é o campeão, podem esquecer. E não é porque a Ferrari tem o melhor carro, só. É porque ele faz o carro em que estiver sentado ser o melhor, seria o campeão também se estivesse na Williams, na Renault ou na BAR. Na McLaren, não. Ele é bom, mas não é santo milagreiro.222

O domínio de Schumacher impressiona o colunista, que o trata como algo a ser estudado: “Com nove vitórias em dez corridas, Schumacher estabeleceu um domínio neste

220

LEME, Reginaldo. Jogo dos sete. 18/06/2004. www.warmup.com.br, acesso em 31/12/2004. GOMES, Flávio. Pára tudo e volta. 11/03/2004. www.warmup.com.br, acesso em 29/12/2004. 222 GOMES, Flávio. Ecos do Bahrein. 18/04/2004. www.warmup.com.br, acesso em 29/12/2004. 221

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ano na F-1 que esportista nenhum no mundo consegue impor a seus adversários. Virou um 'case', algo a ser estudado. Ganhou todas que terminou.”223 Diante das insistentes opiniões da mídia, de que Schumacher sempre teve tratamento e equipamento melhor que Barrichello, Flávio Gomes escreve: A tal história de que o alemão tem prioridade e só ganha porque a Ferrari não deixa o outro chegar perto serviu de muleta aos seus companheiros de equipe desde 1996. Aqui, no entanto, faça-se justiça a Barrichello: se ele reclamou várias vezes de problemas no carro "que o outro não tem", nunca acusou diretamente a equipe de prejudicá-lo, ao contrário; há mais de quatro anos o brasileiro repete o discurso de que "temos o mesmo equipamento", "as mesmas condições", etc.224

E defende Schumacher, meses depois: Não há como negar que Schumacher, se é mesmo tratado a pão-de-ló, faz por merecer e devolve aos que o bajulam resultados com os quais eles nunca sonharam. Não sei se outro, com o mesmo tratamento, seria capaz de fazer o mesmo. Aliás, sei: não seria, não. Schumacher é um caso único, um achado da história ferrarista, que tem mais é de agradecer aos céus por ele ter nascido.225

Dessa forma, Schumacher é elogiado e enaltecido (entre os colunistas brasileiros, sobretudo por Flávio Gomes) no ano de seu heptacampeonato. Mas sempre visto como profissional dedicado, que faz por merecer os privilégios que supostamente recebe da equipe, e ainda assim, continua a ser tão humano e normal quanto seus colegas de profissão. Prova disso parece ser o comentário que Flávio Gomes faz sobre o fraco desempenho do alemão na etapa da China: “Michael Schumacher nos deu duas lições domingo. A primeira, mais visível e divertida, foi a de que ele consegue ser tão barbeiro quanto o pior dos pilotos. A segunda, só perceptível à luz dos cronômetros, é que o Mundial seria razoavelmente equilibrado se ele, Schumacher, não existisse.”226 A revista Racing chegou a publicar uma matéria onde fez uma suposição de como seria o campeonato, caso Schumacher não estivesse participando. Faltando seis provas para o encerramento, cinco pilotos teriam chances de título, e as vitórias teriam sido mais distribuídas entre esses cinco.227 Na Racing, edição dos campeões, publicada no final do ano, estava o resumo da temporada: “Ele conseguiu mais uma vez. Contrariando todas as expectativas do início do

223

GOMES, Flávio. Brincando de correr. 08/07/2004. www.warmup.com.br, acesso em 29/12/2004. GOMES, Flávio. Não muda nada. 19/03/2004. www.warmup.com.br, acesso em 29/12/2004. 225 GOMES, Flávio. Azar dele. 13/08/2004. www.warmup.com.br, acesso em 29/12/2004. 226 GOMES, Flávio. Barbeiro de Xangai. 30/09/2004. www.warmup.com.br, acesso em 29/12/2004. 227 RAMOS, Luiz Fernando. Imagine a Fórmula 1 sem Michael. Racing, São Paulo, n. 151, agosto 2004.p.12-15. 224

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ano, que diziam que as novas regras deixariam a Fórmula 1 mais equilibrada, Michael Schumacher conquistou mais um título na principal categoria do automobilismo mundial.”228 Na etapa final da temporada, no Brasil, Reginaldo Leme registrou um Schumacher que não era o piloto: A passagem de Schumacher pelo Brasil não foi a que ele queria pelo resultado na pista, mas ele foi embora satisfeito com o reconhecimento dos torcedores. Atendeu todo mundo com simpatia. O problema, como sempre, são os assessores. Por exemplo, quando o fotógrafo brasileiro Miguel Costa Junior quis lhe dar de presente um álbum preparado junto com o laboratório Instan Color, com as melhores fotos da carreira do alemão, desde a Fórmula 3. Impedido de fazer a entrega pessoalmente, Miguel assistiu à distância Schumacher receber o presente das mãos de uma assessora e passar um bom tempo folheando. Só no dia seguinte, aproveitando o tumulto de uma entrevista do alemão, o fotógrafo se aproximou e conseguiu perguntar sobre o álbum. A reação de Michael foi instantânea. Ele parou o que estava fazendo para olhar em direção a Miguel, a quem abraçou dizendo que tinha sido uma dos presentes mais bonitos que ele havia ganho na carreira.229

Ainda na etapa do Brasil, que encerrou a temporada, Ricardo Perrone destacou a relação da mídia com o público torcedor, bem como apontou possíveis mudanças na relação dos torcedores brasileiros de Fórmula 1 com o piloto Schumacher: O alemão é odiado no Brasil, é? Sei... Vi no Palestra Itália a torcida toda gritando seu nome, ao contrário do Rubens, que chegou a ser vaiado por alguns. Será que a coisa inverteu? Ou será que o povo abriu os olhos para o que parte da mídia, que se diz especializada, faz contra o alemão para vender mais?230

Sobre essa mídia, Flávio Gomes escreve um interessante comentário: Cansei desse papo furado de que a Fórmula 1 está chata. Que ninguém vê porque só o mesmo ganha, que perdeu a graça, que não tem disputa. Papo que virou moda no Brasil, inconformado com o domínio de Michael Schumacher, que veio a desbancar um dos maiores ídolos esportivos do país. [...] A imprensa esportiva brasileira, que só se importa com futebol e abre exceções de quatro em quatro anos com as Olimpíadas, especializou-se em esculhambar a F-1. Usando a falácia acima. Cansei de ver colunistas que não entendem bulhufas de corridas deitarem regras sobre as próprias.231

O “protesto” foi publicado no mês do GP do Brasil, quando é maior o montante de matérias sobre Fórmula 1 nos jornais brasileiros. “Isso ocorre sazonalmente. Vai ser assim daqui a alguns dias, perto do GP do Brasil.”232 Usa do exemplo de outros esportistas que dominaram seus esportes e não foram considerados “chatos”, ou que “tiraram a graça” do 228

FAVORETO, Rodrigo. Schumacher absoluto! Racing, São Paulo, n. 161, dezembro 2004. p. 7. LEME, Reginaldo. Abrindo fogo. 15/11/2004. www.warmup.com.br, acesso em 31/12/2004. 230 PERRONE, Ricardo. Curtas e diretas. 21/10/2004. www.f1naweb.com.br, acesso em 22/10/2004. 231 GOMES, Flávio. Má-vontade. 07/10/2004. www.warmup.com.br, acesso em 31/12/2004. 232 Idem. 229

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esporte que dominaram. Ao contrário, são enaltecidos e viram “deuses”. Michael Phelps, da natação, Carl Lewis, do atletismo, Pete Sampras, do tênis, o time de vôlei do técnico Bernardinho... Esses caras, e tantos outros, dominaram seus esportes por anos a fio e foram alçados à condição de foras-de-série extraterrenos. Ninguém deu importância ao fato de que transformaram seus adversários em farrapos humanos. [...] É algo para se elogiar, a excelência no esporte, a busca incessante da vitória. Sem esquecer, claro, de Robert Scheidt, este emblemático: heptacampeão, como Schumacher (há duzentos anos na mesma classe, seria como se Senna decidisse passar a vida na F-Ford, mas vá lá), e para nossa preparadíssima mídia nada menos do que um fenômeno, prova viva de nosso espírito de luta, de nossa capacidade de superar obstáculos, da força do iatismo brasileiro! Mas na F-1, não. Schumacher é um chato, é tudo um porre. Meus colegas de profissão recusam-se a enxergar o óbvio, que o cara é como um Pelé, um Michael Jordan. Têm raiva da F-1, sabe-se lá por quê. Talvez porque tenha corrida em Mônaco.233

Em parte, considerando-se esse comentário, pode-se refletir um pouco sobre a postura da mídia brasileira em relação à Fórmula 1 - sobretudo no que se refere à cobertura esportiva, costumeiramente mais voltada para o futebol. Através do olhar de um de seus componentes, sugere-se que a Fórmula 1 tem um tratamento diferente devido ao domínio de um piloto que não é brasileiro, ou que, por haver superado as marcas de Ayrton Senna, é desmerecido e pouco valorizado. No caso específico de Schumacher, sua “demonização” inicial era por ser o adversário de Senna. Morto, Senna passou a ser “cultuado”, e Schumacher, ocupando seu posto de “Grande Senhor das Pistas”, continua a ser demonizado, dessa vez por defender suas vitórias e conquistar seus títulos de forma mais “agressiva”, com manobras “desleais”, submetendo os companheiros de equipe, que assinam contratos como “2º. piloto” e exigindo todas as regalias para si. Se para Ricardo Perrone, o “povo abriu os olhos para o que a mídia faz contra Schumacher”, então, pode ser um caminho para sua heroificação. Segundo Daniel Lins: Tudo leva a crer que o processo de admiração é um dos efeitos possíveis de heroificação ou, simplesmente, do reconhecimento da excelência do outro, excelência que pode ser, igualmente, vivida sob a forma de inveja, que estenderá, ao contrário, a evacuação da culpabilidade na minimização do sofrimento, vivido pelo herói.234

Como comentado anteriormente, a construção que a mídia brasileira faz de Schumacher o deixa no limite entre o herói e o vilão. Por mais que ele vença e conquiste, sempre “falta” algo para a mídia (ou, ao menos, uma parte dela, pois Flávio Gomes e Ricardo 233 234

Ibidem. LINS, Daniel Soares. op. cit. p.87. 84

Perrone são uma demonstração de que nem todos os jornalistas especializados pensam assim). O que se observa é que, mesmo obtendo um sucesso semelhante a Fangio, guardadas as devidas proporções, mas mantidas as semelhanças (os grandes adversários de Fangio, Moss, Ascari, Farina, começaram junto com ele, assim como Hill, Villeneuve e Häkkinen iniciaram junto com Schumacher) e obtendo conquistas com melhor equipe, de modo semelhante a Ayrton Senna (com seu “super” McLaren de 1988 a 1991), Schumacher, para parte significativa da imprensa, de alguma forma não personifica o herói perfeito como outros esportistas. Parece, para a mídia, não ter “moral” para reivindicar esse posto.235 A ênfase nos índices e nos recordes, característica da avaliação contemporânea dos esportes, não elimina, portanto, as outras dimensões presentes na Fórmula 1 que são importantes na construção da carreira de um piloto. Sua imagem necessita ser bem trabalhada para que possa servir de “moldura” dos produtos a ela associados. Quanto mais carisma e idolatria tem o piloto, mais forte é o apelo publicitário que ele emana. A Fórmula 1, esportenegócio ligado à poderosa indústria automobilística e a numerosas outras que a ela se articulam por meio de investimentos e patrocínios, tem ainda como principal “produto” o espetáculo esperado em cada uma das corridas de uma temporada. E, como bem nos ensinaram a publicidade e a indústria de entretenimento, essa mercadoria deve estar associada à emoção, à fantasia, ao sonho.236 Assim, é importante que o piloto, sendo parte indissociável desse negócio, esteja sempre envolto em altos e baixos, seja em seu trabalho, seja em seu relacionamento com o companheiro de equipe ou colegas de profissão. É preciso que dele saia notícia, informação, assunto. Como fazer ídolo alguém chamado de “homem de gelo”? Um piloto que costuma calar-se nas horas difíceis e falar pouco nos momentos de êxito? Talvez por isso Flávio Gomes tenha chamado Hakkinen e Irvine de “pilotos sem representação”.237 Chamando um de “finlandês, gelado e monossilábico” e o outro de “irlandês maluco”, quis dizer que os dois

235

Sobre ética, moral e mídia, disse Daniel Soares Lins: “De fato, a mídia parece ditar a moral brasileira, uma sorte de moral sem ética. Ora, o que garante a validade ou não de uma moral é justamente o julgamento ético. É a ética que vai determinar se o que a moral considera como sendo o Bem ou o Mal procede, mesmo porque [...] o Bem não deve ser confundido como Bom, nem o Mal com o Ruim. ” LINS, Daniel Soares. op cit. p. 73-4. 236 Discutindo a indústria de entretenimento, Sevcenko destacou: “[...] mais que mera diversão ou entretenimento, o que essa indústria fornece, ao custo de alguns trocados, são porções rigorosamente quantificadas de fantasia, desejo e euforia, para criaturas cujas condições de vida as tornam carentes e sequiosas delas. Como disse outro teórico, Guy Debord, essa indústria se esforça por compensar o extremo empobrecimento da vida social, cultural e emocional, arrebatando as pessoas para uma celebração permanente das mercadorias, saudadas como imagens, como novidades, como objetos eróticos, como espetáculo, enfim. ” SEVCENKO, op.cit. p.81. 237 GOMES, Flávio. C’est la vie. 29/10/1999. www.warmup.com.br, acesso em 29/10/2003. 85

nada tinham que servisse de apelo ao público, que valesse o entusiasmo da decisão do título de 1999. Nesse quesito, parece que Schumacher é o mais cotado para o espetáculo. Possuindo os rótulos de “anti-herói, Dick Vigarista, gênio”, entre outros, é sempre notícia, focado nos holofotes do “circo”. Seus gestos ou ações são comentados e noticiados. É a fonte de assuntos da imprensa, para o bem ou para o mal. A Fórmula 1 envolve corridas de carros em alta velocidade que podem resultar não só em ultrapassagens arriscadas como em acidentes (e mortes) espetaculares. Pode-se considerar, assim, que a expectativa quanto a ultrapassagens, quebras, acidentes, não poderia ser plenamente superada pelo desenvolvimento tecnológico disponibilizado para as equipes. Esse foi o principal motivo das mudanças de regras, quanto à eletrônica embarcada, nos últimos quinze anos, desde o início da hegemonia da Williams, em 1991. O risco nas ultrapassagens, o perigo dos desastres e a violência que eles necessariamente envolvem, devem continuar no horizonte da corrida. E são aqueles que literalmente correm estes perigos - os pilotos - o principal alvo de atenção do público. Esses, “embora não desconsiderem o caráter suicida da profissão, ignoram o risco, motivados pela vital concentração que o perigoso ofício exige”238. Os pilotos são os personagens principais de um seriado - uma novela? - que se renova anualmente. Não à toa, a cobertura da imprensa brasileira parece dedicar-se pouco às tensões que certamente envolvem os muitos grupos de interesse ligados à Fórmula 1. Tensões que são percebidas nas alusões rápidas à pouca participação dos pilotos nas discussões sobre segurança, ou às “manobras políticas inacreditáveis” que podem estar presentes na definição de um campeonato, ou ainda à preocupação de dirigentes e patrocinadores com “o pouco interesse do público”. A imprensa brasileira concentra-se, sim, muito mais, no desempenho das equipes e dos pilotos, construindo os personagens da narrativa de modo a mostrar quem merece mobilizar as emoções do público - seu riso, seu choro, seu amor, seu ódio, seu desprezo. Daí que a cobertura envolva freqüentemente considerações de caráter moral e ético, a respeito de atitudes dos pilotos, e destaque as relações que eles mantêm entre si: se o piloto foi trapaceiro, se “deu uma de bonzinho”, se fez “papel de palhaço”, se foi favorecido, se é simpático ou antipático, se chorou, se riu, se desentendeu-se com o companheiro de equipe etc.239 Entre 238

MARTINS, Lemyr. Os 13 golpes de sorte do bicampeão. Quatro Rodas, São Paulo. novembro 1995. p. 125. Antoine Prost, discutindo o papel da mídia no século XX, afirma: "Os jornalistas acreditam tratar os problemas que interessam à opinião pública, e a opinião pública acredita nos jornalistas enquanto não se tornarem maçantes ou cansativos... E, para não cansar, é preciso personalizar. Entre a mídia e o público, a comunicação substitui a informação. A informação apresentava as questões públicas como tais, em sua

239

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esses veículos de mídia, o mais importante é a televisão, por onde se assiste as corridas e vislumbra-se os pilotos. É, também, um dos mais importantes construtores da imagem necessária aos pilotos. “Para que algo exista, é preciso que seja mostrado: é a imagem televisionada que vai dar, ao sujeito, o estatuto da existência”.240 É também a televisão um dos mais interessados e importantes “clientes” da Fórmula 1. Por isso, foi responsável por mudanças nos formatos dos treinos nos últimos anos. Em busca de uma audiência máxima, estabeleceu-se que somente os treinos de sábado valeriam para a formação do grid, a partir de 1997. Enfim, na novela da Fórmula 1, mocinhos e bandidos, vilões e heróis estão presentes. O talento - junto com a competência”, a habilidade técnica, o preparo físico, a capacidade de concentração e dedicação ao trabalho - determina quem serão os protagonistas, e quais os coadjuvantes. Mas parece não bastar para criar o verdadeiro “herói”, o “ídolo”, o “gênio” termos presentes nos textos dos jornalistas especializados aqui destacados. É preciso algo que o diferencie ainda mais, que o torne ainda mais especial: como não perceber isso, por exemplo, nas referências à “sorte” de Schumacher? Por outro lado, mesquinhez e trapaças não parecem combinar com heróis (a menos que sejam heróis pícaros241), e a trajetória de Schumacher também foi associada a elas (mesmo que se procure minimizá-las, entendendo que “o esporte não é feito de anjos, mas de vitoriosos”).

generalidade e exterioridade. A comunicação quer que todos as partilhem pessoalmente: ela aborda os problemas gerais através de exemplos particulares que possam despertar uma identificação, dramatizando e apelando aos sentimentos. Ela pretende que o acontecimento seja 'diretamente vivido', como se o espectador fosse um ator. Assim, ela dissolve as fronteiras do privado e do público." PROST, Antoine. Fronteiras e espaços do privado. op.cit. p.146-149. 240 LINS, Daniel Soares. op. cit. p. 27. 241 KOTHE, Flávio. O herói. São Paulo: Ática, 2000. 87

Figura 34. A primeira conquista. Michael Schumacher, no exato momento em que se tornava campeão mundial. Adelaide, Austrália – 1994.

Fonte: Folha de São Paulo, 14/11/1994. Caderno de esportes, p. 8. 88

Figuras 35 a 40. O personagem inspirador do rótulo “Dick Vigarista” e os acidentes que definiram os títulos de 1994 e 1997. Dick Vigarista e seu ajudante Mutlley. Personagens do desenho animado Corrida Maluca, dos anos de 1960, produzido pelos estúdios Hanna-Barbera. 35 36

Dick Vigarista e Muttley

Acidente que definiu o título. Michael Schumacher é catapultado ao tentar impedir a ultrapassagem de Damon Hill. Adelaide, Austrália – 1994. 38 37

Acidente que definiu o título em favor de Jacques Villeneuve. Michael Schumacher tentar impedir a ultrapassagem e termina fora da corrida ao bater em Villeneuve. Jerez de La Frontera, Espanha - 1997 40 39

89

Figuras 41 a 47. As polêmicas trocas de posições em 2002.

Zeltweg, Áustria – 2002.

Indianápolis, Estados Unidos – 2002.

41. A polêmica troca de posições.

45. A menor diferença da história: 0,011.

42. O constrangimento no pódio.

46. Dívida paga, bons amigos novamente.

43. Schumacher reverencia Barrichello.

44. Schumacher dá seu troféu a Barrichello. 47. Montagem fotográfica na Web ironizando o pódio da Áustria em 2002.

90

Figuras 69 a 74. Momentos pessoais fora da pista. 69. A concentração nos boxes.

70. Com o empresário Willy Weber. Magny-Cours, França – 2004.

72. Atenção aos fãs. Monte Carlo, Mônaco – 2004.

73. Com Flávio Briatore, chefe da Benneton. Aida, Japão – 1995.

71. Com Rubens Barrichello, companheiro de equipe, Luca di Montezemolo, presidente da Ferrari e FIAT, e Jean Todt, chefe de equipe, no 700º GP da Ferrari. Spa-Francorchamps, Bélgica – 2004.

74. Com os jornalistas. Suzuka, Japão – 2004.

91

Figuras 56 a 60. Os momentos do pentacampeonato. A conquista do pentacampeonato. Magny-Cous, França – 2002. 56. A Bandeirada do título.

59. A Vibração da Vitória

57. As Lágrimas da Conquista

60. Michael Schumacher, tendo ao fundo o retrato de Juan Manoel Fangio. Cerimônia de Premiação – FIA. Paris, França - 13 de dezembro de 2002.

58. O Beijo à Esposa

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Figuras 61 a 68. Os Adversários nas pistas. 61. Ayrton Senna - 1994

64. Mika Häkkinën - 1998 / 1999 / 2000

62. Damon Hill – 1994 / 1995 65. David Coulthard – 2001

67. Kimi Raikkonën – 2003 63. Jacques Villeneuve – 1997

66. Rubens Barrichello – 2002

68. Juan Pablo Montoya 2003

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Considerações Finais Nesse estudo sobre o piloto alemão de Fórmula 1, Michael Schumacher, pôde-se perceber um pouco como a imprensa escrita brasileira, em principal através de colunistas especializados, por meio de jornais, revistas e websites especializados em automobilismo, modelou e transmitiu a imagem desse piloto ao público brasileiro nos últimos 13 anos. Pôde-se vislumbrar como os comentaristas têm opiniões bastante distintas sobre Michael Schumacher, estendendo-as aos outros pilotos, em geral. Entre si e no modo de escrever, demonstraram usar linguagens diferenciadas e muitas vezes bastante coloquiais, como se fossem fervorosos torcedores exaltando seu herói nas pistas. A passionalidade para comentar e falar dos acontecimentos ou dos comportamentos é uma das características mais marcantes. Os pilotos são bons ou maus, vencedores ou perdedores, monossilábicos, “malucos”, frios ou destemperados, entre outros adjetivos que demonstram como também podem ser estereotipados pela mídia, em parte por suas etnias, ou traços de nacionalidade. Ao conversar com um professor de origem finlandesa, comentando sobre a suposta “frieza” dos pilotos da Finlândia, este me afirmou que o povo de seu país é mesmo assim, introspectivo e de pouca fala, dificilmente demonstrando emoções, exatamente como demonstram seus representantes na Fórmula 1. Conhecendo os habitantes deste continente, posso perceber alguns dos traços usualmente associados à latinidade em Montoya, e até entender um pouco o modo como este é “rotulado” pelos jornalistas. Mas, sem conhecer minimamente o povo alemão, como posso entender os estereótipos que atribuem a Michael Schumacher? A visão da imprensa é o único modo de acesso às ações e falas do personagem. Por meio desses fragmentos da vida e trajetória esportiva de Michael Schumacher, construídos pela mídia brasileira, tentei identificar um perfil pessoal e profissional do homem e do piloto. A dificuldade maior foi encontrar uma imagem única para Schumacher. Rotulado como herói, gênio, mito, entre tantos adjetivos exaltadores, é também demonizado como trapaceiro, “Dick Vigarista”, arrogante, entre outros mais, pela mesma mídia e jornalistas que, ora o elogiam e exaltam, admirados de seus feitos, ora o criticam ferozmente por seus deslizes e supostas deslealdades.

94

A admiração dos jornalistas não é tanto pelo homem quanto é pelo piloto. E mesmo esta admiração pelo piloto tem suas restrições. Os resultados na pista e na carreira são aos poucos reconhecidos, mas nunca servem para um reconhecimento unânime do personagem como ídolo ou herói do esporte onde atua. Salvo Flávio Gomes ou Ricardo Perrone, nenhum outro jornalista chega a demonstrar freqüentemente alguma admiração por Michael Schumacher. Por mais títulos, vitórias ou recordes que Schumacher venha a obter, ainda não são suficientes para obter uma unanimidade entre os jornalistas ou público brasileiros. O fator “público”, porém, não foi um dos objetos de análise desse estudo. Apenas foi levemente percebido nos escritos dos jornalistas, encontrados nas leituras das revistas e websites consultados. O tratamento da mídia para a Fórmula 1, quando esta é dominada por um piloto que não é brasileiro, em um período de ausência de pilotos nacionais revezando vitórias e títulos, como ocorria nos anos de 1980 e 1990, parece ser o diferencial onde se percebe como o interesse por este esporte é menor agora do que antes, quando o Brasil “reinava nas pistas”. A imprensa esportiva, muito mais voltada ao futebol, não parece ver com bons olhos o domínio de um estrangeiro onde antes um brasileiro “simpático” era a grande vedete. Para Flávio Gomes, o domínio de Schumacher irrita os brasileiros, que não se conformam de ver um alemão – seria o mesmo com um inglês, turco, japonês – conseguindo o que o “nosso Senna” não conseguiu. E por mais que Schumacher conquiste e vença, nunca pende para um dos lados da tênue linha que o mantém entre a vilania e o heroísmo. Parece ser mais interessante que Schumacher mantenha-se dividido entre o bem e o mal, para que não se torne o “bom moço”, deixando de ser uma fonte de notícias por vezes polêmicas, contrastando com exibições talentosas em seu ofício, onde nem sempre tem reconhecimento. A mídia vive do que escreve, e precisa escrever o que agrade aos seus leitores e consumidores. E esses parecem querer realmente ler esse tipo de imagem e discurso. Algo que torne o personagem humano como ele, o leitor, fã, consumidor. E, ao mesmo tempo, seja um ídolo que esteja acima dos outros competidores, para poder ser admirado e destacado, pelo bem ou pelo mal. O reconhecimento da excelência pode ser medido também pela inveja. Afinal, não se inveja o que nos parece igual ou inferior ao que temos ou somos. No presente trabalho, algumas vertentes de pesquisa não foram exploradas.

95

O trabalho da mídia televisiva é um dos referenciais mais importantes para a compreensão da imagem de Schumacher que é passada para o público. Tendo a exclusividade das transmissões da Fórmula 1, a Rede Globo, em sua paupérrima cobertura dos eventos extra-GPs, colabora para o pouco conhecimento dos pilotos e do “mundo” da Fórmula 1. Um estudo específico de como a televisão informa sobre as corridas e trata de apresentar o personagem através de seus narradores, pode ser um modo de perceber como a imagem de Schumacher é construída no mais amplo meio de comunicação a que o público tem acesso. Um outro estudo que tem possibilidade de ser elaborado é o que pode servir para conhecer a amplitude do processo de heroicização de Michael Schumacher, entre os jornalistas especializados no Brasil. Os vários adjetivos exaltadores - “gênio, herói, mito, fora-de-série” - servem para perceber que Schumacher passa por momentos onde é elevado à condição de grande piloto, não permanecendo constantemente nela, alternando as notícias e comentários com qualquer ação ou situação onde fuja do modelo de bom herói. Esse processo de mitificação teve início a partir de 2001, quando se percebeu que Schumacher igualar ou superar os cinco títulos de Fangio era algo iminente, questão de tempo. A mídia começou a mudar seu modo de perceber Schumacher, embora não tenha ensaiado uma unanimidade. É um dos pontos não realizados aqui, mas que servirá para futuras pesquisas ou ensaios. Por fim, destaco que o estudo, embora relativamente longo, não pôde contemplar totalmente o material disponível, sob minha guarda, para a pesquisa. E, mais ainda, não pude dispor de todo o material que realmente gostaria para efetuar esse estudo, podendo refazer toda a trajetória profissional do personagem através dos jornais de distribuição nacional e de revistas especializadas do começo dos anos de 1990. Devo lembrar que a Internet, como veículo de informação e com a variedade de fontes e informações que possui hoje, é algo bastante recente (o website Warm Up, o mais antigo consultado, surgiu em 1995), tendo se popularizado, através dos computadores pessoais, a partir dos anos 2000. Ficam, portanto, essas indicações, para possíveis aprofundamentos futuros.

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REFERÊNCIAS Livros AMADO, Janaína e FERREIRA, Marieta de Moraes (orgs.). Usos & abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Ed. da FGV, 1998. BURKE, P. A escrita da história. São Paulo: UNESP, 1992. COLLINS, Thimoty. Schumacher: a vida do novo campeão da Fórmula 1. Lisboa: Talento, 1995. CORRÊA, Eduardo. Fórmula 1: pela glória e pela pátria. São Paulo: Globo, 1994. DAVIS, Natalie Zemon. O retorno de Martin Guerre. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. FITTIPALDI, Emerson. Uma vida em alta velocidade. Rio de Janeiro: Objetiva, 2003. GUAZZELLI, César Augusto Barcellos. Questões de Teoria e Metodologia da História. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2000. GUINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. KOTHE, Flávio. O herói. São Paulo: Ática, 2000. LINS, Daniel Soares. Ayrton Senna: a imolação de um deus vivo. Fortaleza: EUFC, 1995. MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX - O Espírito do tempo I, Neurose. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. PROST, Antoine, VINCENT, Gérard (org.). História da vida privada - v.5: Da Primeira Guerra a nossos dias. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. RODRIGUES, Ernesto. Ayrton: o herói revelado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004. SCHMIDT, Benito Bisso (org). O biográfico: perspectivas interdisciplinares. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000. SEVCENKO, Nicolau. A corrida para o século XXI: no loop da montanha-russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. (Virando séculos, 7).

Revistas Fórmula 1: anuário 1997-98. São Paulo. Motorpress, nº 1, 1997. F1RACING. Suplemento da Revista Racing. São Paulo: Motorpress. Edições nº 117 e 137. Grid. São Paulo: Editora Azul. Edições nº 03, 10, 14, 22, 23, 28.

97

Lance a mais. São Paulo, nº 164. outubro 2003. Quatro Rodas. São Paulo: Abril. Edições de set. 92, dez 94, abr., nov. e dez. 95, set. 96 e set.02. Racing. São Paulo: Motorpress. Edições de 1996 a 2004. Racing: Anuário de Fórmula 1. São Paulo: Motorpress. Edições nº 2 e 3. 1998 e 1999. Speedway. São Paulo: IM. Edições nº 35, 36, 54, 60. Você s.a. Nº 29. nov. 00. 0Km. São Paulo: Editora três. Jun. 95.

Jornais Diário Catarinense. Florianópolis. 27/10/1997. Folha de São Paulo. São Paulo. 14/11/1994 Lance! São Paulo. 21/06/2004. O Estado de São Paulo. São Paulo. 01/04/01.

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98

APÊNDICES

APÊNDICE A - A “Era Ferrari” de Schumacher. APÊNDICE B - Ranking da Fórmula 1 - Revista Quatro Rodas. APÊNDICE C - Tabela de pontuações e vitórias de Michael Schumacher por país onde disputou corridas. APÊNDICE D - Tabelas de classificação dos seis pilotos melhores colocados nas temporadas de 1991 a 2004. APÊNDICE E - Tabela de classificação dos pilotos por títulos conquistados. APÊNDICE F - Tabela de classificação dos pilotos por pontuação nos campeonatos conquistados APÊNDICE G - Tabela dos pilotos com maior número de corridas entre os colocados que marcam pontos. APÊNDICE H - Tabela de vitórias por piloto em toda a carreira. APÊNDICE I - Tabela de vitórias por piloto em uma temporada. APÊNDICE J - Tabela de pilotos com maior número de vitórias sucessivas. APÊNDICE K - Tabela de pilotos com mais de 10 pole positions em toda a carreira. APÊNDICE L - Tabela dos 20 pilotos com mais pole-positions por temporada. APÊNDICE M - Tabela dos 20 pilotos com mais pole-positions por temporada. APÊNDICE N - Tabela de pilotos com mais de 5 pole-positions sucessivas. APÊNDICE O - Relação das pole positions de Michael Schumacher. APÊNDICE P - Tabela dos 10 pilotos com mais pódios na carreira. APÊNDICE Q - Tabela dos pilotos com mais de 10 pódios em uma temporada. APÊNDICE R - Tabela de pilotos que realizaram por dez ou mais vezes a volta mais rápida de uma corrida. APÊNDICE S - Tabela com o número de vezes que Schumacher classificou-se na frente dos companheiros de equipe. APÊNDICE T - Tabela de “Dobradinhas” no pódio. APÊNDICE U - Tabela dos pilotos com mais de 150 corridas na carreira. APÊNDICE V - Relação das estatísticas da carreira de Michael Schumacher.

99

Apêndice A: A “Era Ferrari” de Schumacher. “Após o fim do jejum de títulos, alemão promete domínio da escuderia na F1 a partir do GP da Austrália”242. Em março de 2001, na primeira corrida da temporada, na Austrália, Michael Schumacher afirmou nas entrevistas: “Nos últimos anos, vimos a McLaren e a Williams dominando algumas temporadas. Agora é a nossa vez. Quero iniciar uma era Ferrari na F1”.243 A certeza de Schumacher foi confirmada por todos que a ouviram e registraram. Até o final da temporada 2004, ele mantém o cumprimento de sua promessa. O quadro abaixo mostra as equipes que dominaram e venceram os campeonatos pilotos de desde 1950, deixando perceber após os anos 70 como a Fórmula 1 passou a sofrer a hegemonia de pelo menos duas equipes em cada década, e a dominação da Ferrari nos últimos cinco anos.

Equipes que Conquistaram Títulos de Pilotos De 1950 a 1959 Equipe Título de pilotos Ferrari 3 52, 53 e 58 Alfa Romeo 2 50 e 51 Mercedes 2 54 e 55 Lancia 1 56 Maserati 1 57 Cooper 1 59

De 1960 a 1969 Equipe Título de pilotos Lotus 3 63, 64 e 68 Ferrari 2 61 e 64 Brabham 2 66 e 67 Cooper 1 60 BRM 1 62 Matra 1 69

De 1970 a 1979 Equipe Título de pilotos Lotus 3 70, 72 e 78 Ferrari 3 75, 77 e 79 Tyrrell 2 71 e 73 McLaren 2 74 e 76

Equipes que Conquistaram Títulos de Pilotos Equipe McLaren Williams Brabham

De 1980 a 1989 Título de pilotos 5 84, 85, 86, 88 e 89 3 80, 82 e 87 2 81 e 83

De 1990 a 1999 Equipe Título de pilotos McLaren 4 90, 91, 98 e 99 Williams 4 92, 93, 96 e 97 Benetton 2 94 e 95

De 2000 a 2004 Título de pilotos Ferrari 5 2000 a 2004 Equipe

Adaptado de: Editoria de Arte/Folha Imagem. Schumacher inicia projeto de ‘era Ferrari’. Folha de São Paulo, 03/03/2001, p. D6.

242 243

SEIXAS, Fábio. Schumacher inicia projeto de ‘era Ferrari’. Folha de São Paulo, 03/03/2001, p. D6. Idem. 100

Comentários sobre as hegemonias das equipes na Fórmula 1. Nos anos 50 Nos anos 60 Nos anos 70 Nos anos 80

Nos anos 90

Nos anos 2000

Sem tecnologias, o equilíbrio é grande entre as equipes. Juan-Manuel Fangio conquista 5 títulos por quatro equipes diferentes. A Lotus alternava entre a produção de excelentes carros e de grandes fracassos. Ainda havia um pouco de equilíbrio nas disputas entre as equipes. A Tyrrell inicia a crescer, mas pára com a saída do piloto Jackie Stewart. Ferrari e Lotus dominam a década. Começa a ascensão da McLaren. A Williams e a Brabham iniciam um domínio revezado, mas a McLaren, apoiada na tecnologia que começava a surgir na Fórmula 1, aliada aos pilotos de alto nível que teve (Lauda, Prost e Senna), inicia em 84 uma dominação que só terminou na década seguinte, em 1991, tendo sido interrompida apenas em 87, pela Williams. Dominada tecnologicamente por McLaren e Williams, apoiada nos motores Honda e Renault, só foi interrompida em 94 e 95 pela Benetton, que tinha Michael Schumacher. Curiosamente, foi com a saída desses motores que essas equipes declinaram de rendimento. A Ferrari, com Michael Schumacher, domina amplamente a Fórmula 1. Talvez uma exceção tenha sido o ano de 2003, onde Williams e McLaren tiveram bons carros mas não conseguiram vencer. A recuperação da Ferrari no meio da temporada fez Schumacher novamente campeão.

Adaptado de: Editoria de Arte/Folha Imagem. Schumacher inicia projeto de ‘era Ferrari’. Folha de São Paulo, 03/03/2001, p. D6.

101

Apêndice B: Ranking da Fórmula 1 Ranking dos melhores pilotos de Fórmula 1. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004. Posição 1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º 10º 11º 12º 13º 14º 15º 16º 17º 18º 19º 20º 21º 22º 23º 24º 25º 26º 27º 28º 29º 30º 31º 32º 33º 34º 35º 36º 37º 38º 39º 40º 41º 42º

Piloto Michael Schumacher Juan Manuel Fangio Alain Prost Ayrton Senna Jackie Stewart Jim Clark Alberto Ascari Stirling Moss Nigel Mansell Niki Lauda Nelson Piquet Damon Hill Mika Hakkinen Jack Brabham Giuseppe Farina Graham Hill Emerson Fittipaldi Jody Schekter David Coulthard Carlos Reutemann Tony Brooks Denis Hulme Alan Jones Jochen Rindt James Hunt Ronnie Peterson Jacky Ickx John Surteess Jacques Villeneuve Mike Hawthorn Mario Andretti Rubens Barrichello Gerhard Berger Phill Hill Froilan Gonzalez Keke Rosberg Juan Pablo Montoya Gilles Villeneuve Dan Gurney Wolfgang Von Trips Ralf Schumacher Clay Regazzoni

País ALE ARG FRA BRA ESC ESC ITA ING ING AUT BRA ING FIN AUS ITA ING BRA AS ESC ARG ING NZ AUS AUT ING SUE BEL ING CAN ING EUA BRA AUT EUA ARG FIN COL CAN EUA ALE ALE SUI

Vitórias 83 24 51 41 27 25 13 16 31 25 23 22 20 14 5 14 14 10 13 12 6 8 12 6 10 10 8 6 11 3 12 9 10 3 2 5 4 6 4 2 6 5

GPs 211 51 199 161 99 72 32 66 185 173 204 116 161 126 33 176 144 112 175 146 38 112 116 60 92 123 116 111 133 45 128 195 210 18 26 114 69 67 86 27 131 132

Pontos 88 57 70 52 44 33 26 36 33 41 45 26 32 35 24 38 31 23 27 23 12 25 17 16 14 18 21 26 17 21 14 25 22 4 11 16 11 6 11 7 11 13

Média 34,61 26,82 17,93 13,24 11,99 11,45 10,56 8,72 5,53 5,47 5,07 4,93 3,97 3,88 3,63 3,02 3,01 2,05 2,00 1,89 1,89 1,78 1,75 1,60 1,52 1,46 1,44 1,40 1,40 1,39 1,31 1,15 1,04 0,93 0,84 0,70 0,63 0,53 0,51 0,51 0,50 0,49 102

43º 44º 45º 46º 47º 48º 49º 50º 51º 52º 53º 54º 55º 56º 57º 58º 59º 60º 61º 62º 63º 64º 65º 66º 67º 68º 69º 70º 71º 72º 73º

Peter Collins Bruce McLaren Billy Vuckovich Pat Flaherty Riccardo Patrese René Arnoux Didier Pironi Jacques Lafitte Michelle Alboreto Peter Revson Eddie Irvine John Watson Heinz-Harald Frentzen François Cevert Richie Ginther Patrick Depailler John Parson Thierry Boutsen Kimi Räikkönen Lorenzo Bandoni Innes Ireland Fernando Alonso Pedro Rodrigues Johnny Herbert Patrick Tambay Jean Alesi Joseph Siffert Elio de Angelis Jean Pierre Beltoise Alessandro Nanini José Carlos Pace

ING NZE EUA EUA ITA FRA FRA FRA ITA EUA IRL IRL ALE FRA EUA FRA EUA BEL FIN ITA ING ESP MEX ING FRA FRA SUI ITA FRA ITA BRA

3 4 2 1 6 7 3 6 5 2 4 5 3 1 1 2 1 3 2 1 1 1 2 3 2 1 2 2 1 1 1

32 101 5 5 256 140 70 176 194 30 146 152 156 46 52 95 9 163 67 42 0 50 50 160 114 201 97 108 86 102 72

5 11 1 2 16 7 8 9 11 4 9 7 10 8 8 6 1 6 7 4 4 4 4 4 3 11 2 2 2 2 1

0,46 0,43 0,40 0,40 0,37 0,35 0,34 0,30 0,28 0,26 0,24 0,23 0,19 0,17 0,15 0,12 0,11 0,11 0,10 0,09 0,08 0,08 0,07 0,07 0,05 0,05 0,04 0,03 0,02 0,02 0,01

Fonte: Revista Quatro Rodas, São Paulo, dez. 1995, p. 136. Atualizado até 2004, com base no acompanhamento das corridas pelo autor na revista Racing. Obs.: Para calcular a média dos pilotos, a Revista Quatro Rodas adotou um pré-ranking, que distribui aos seis primeiros colocados do campeonato a pontuação que vigorou para as corridas na maior parte da história da Fórmula 1: 9 pontos para o 1º colocado, 6 para o 2º, 4 para o 3º, 3 para o 4º, 2 para o 5º e 1 ponto para o 6º colocado. A soma dos pontos obtidos durante a carreira está na coluna “Pontos”. Depois, divide-se o total de vitórias do piloto pelo número de corridas disputadas. O resultado é multiplicado pelos pontos do pré-ranking, onde se alcança a média que o classifica no ranking. Exemplo: Schumacher soma 88 pontos com seus 7 títulos, 2 vices244, 2 terceiros, 1 quarto e 1 quinto lugares nas 13 temporadas que disputou. 83 vitórias ÷ 211 Gps x 88 pontos = 34,61 pontos de média.

244

A titulo de estatística, foi mantido o vice-campeonato de 1997, cassado pela FIA. 103

Apêndice C: Total de Pontuações e Vitórias de Michael Schumacher por País onde disputou corridas. Países África do Sul Alemanha Argentina Austrália Áustria Barhein Bélgica Brasil Canadá Espanha Luxemburgo* Estados Unidos Europa** França Hungria Inglaterra Italia Japão Malásia México Mônaco Pacífico Portugal San Marino

Total

Temporadas 92

93

94

95

96

97

98

99

00

01

02

03245

04

3 4

NT 6

NT

10

2

10

NT

2 10 NT 4

NT

NT

6 NT 6 1

NT

6

3 NT NT

ND

NT

10 4 NT

0 ND

10 NT

10 6

10 10

5 10

10

NT

1

10 4 6 6

6 4 6 4

DCL 10 10 6

10 10 2 10 10

10 4 NT 10 6

10 2 10 3

NT 4 10 4 6

ND 6 NT 4 ND

6 10 10 2 10 10

10 6 6 10 10 6

10 10 10 10 6 6

NH NT 10 10 4 10

10 8 2 10 10 10 10

2 NT

NT NT 3 4 NT

NT 10 4 10 10 D 10 0 6 DCL NT D ND NT NT 6 10

ND D NT 10 6

NT 10 3 NT 1 10

10 10 10 10 NT

2 ND ND ND 6 6

NT 6 4 10 10 10

10 10 6 3 10 10

10 6 10 6 10 4

6 1 5 10 1 3

10 10 10 8 10 10

4 3

NT

0 NT

53

91

1

4

1º - 10 pontos

Abrev.

NT - Não terminou

Vitórias

3 53 14 57 31 10 80 72 90 100 246 62 42

3 1 4 2 1 6 4 7 6 4 3 1 7 4 3 4 6 3

10 10 6 NT

NT

10

0

10

NT

10

6

6

NT

10 6

10 10 ND 10

82 56 54 64 99 247 43 4 65

4 6

6

6

10

10

NT

10

10

10

21 84

5 2 1 6

52

92

102

59 78248 86

93

146

1.184

83

2º - 6 pontos

1º - 10 pontos 2º - 8 pontos

Total

44

108 123 144

Pontuação pelas Colocações – 1991 a 2002 3º - 4 pontos 4º - 3 pontos 5º - 2 pontos

Pontuação pelas Colocações – A partir de 2003 3º - 6 pontos 4º - 5 pontos 5º - 4 pontos 6º - 3 pontos DCL - Desclassificado

ND - Não disputou

7º - 2 pontos

6º - 1 ponto 8º - 1 ponto

NP - Não participou

*Grande Prêmio da Europa 95, 96, 98 a 2004 – Nurburgring, LUX. **Grande Prêmio da Europa 93 – Donington Park, ING. **Grande Prêmio da Europa 94 e 97 – Jerez de La Frontera, ESP. Fonte: http://michael-schumacher.eng.rtl.de/cont/index01.html. Acesso em 18 de maio de 2004. Atualizada e reformulada em 31 de dezembro de 2004, a partir do acompanhamento das corridas da temporada pelo autor na revista Racing. 245

Em 2003 houve mudança no sistema de pontuação. Somados os pontos do Grande Prêmio da Europa de 94 e 97, em Jerez de La Frontera. 247 Somados os pontos do Grande Prêmio do Pacífico de 94 e 95, em Aida. 248 Pontos cassados pela FIA por conduta antidesportiva na corrida final do campeonato. Mantidos aqui para fins estatísticos. 246

104

Apêndice D: Classificação dos seis pilotos melhores colocados nas temporadas de 1991 a 2004. Campeonato Mundial de Pilotos – 2004 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Michael Schumacher Rubens Barrichello Jenson Button Fernando Alonso Juan Pablo Montoya Jarno Trulli

País Alemanha Brasil Inglaterra Espanha Colômbia Itália

Equipe Ferrari Ferrari BAR-Honda Renault Williams-BMW Renault

Pontos 148 114 85 59 58 46

Campeonato Mundial de Pilotos – 2003 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Michael Schumacher Kimi Räikkönen Juan Pablo Montoya Rubens Barrichello Ralf Schumacher Fernando Alonso

País Alemanha Finlândia Colômbia Brasil Alemanha Espanha

Equipe Ferrari McLaren-Mercedes Williams-BMW Ferrari Williams-BMW Renault

Pontos 93 91 82 65 58 55

Campeonato Mundial de Pilotos – 2002 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Michael Schumacher Rubens Barrichello Juan Pablo Montoya Ralf Schumacher David Coulthard Kimi Räikkönen

País Alemanha Brasil Colômbia Alemanha Escócia Finlândia

Equipe Ferrari Ferrari Williams-BMW Williams-BMW McLaren-Mercedes McLaren-Mercedes

Pontos 144 77 50 42 41 24

Campeonato Mundial de Pilotos – 2001 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Michael Schumacher David Coulthard Rubens Barrichello Ralf Schumacher Mika Hakkinen Juan Pablo Montoya

País Alemanha Escócia Brasil Alemanha Finlândia Colômbia

Equipe Ferrari McLaren-Mercedes Ferrari Williams-BMW McLaren-Mercedes Williams-BMW

Pontos 123 65 56 49 37 31

105

Campeonato Mundial de Pilotos – 2000 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Michael Schumacher Mika Hakkinen David Coulthard Rubens Barrichello Ralf Schumacher Giancarlo Fisichella

País Alemanha Finlândia Escócia Brasil Alemanha Itália

Equipe Ferrari McLaren-Mercedes McLaren-Mercedes Ferrari Williams-BMW Benetton-Playlife

Pontos 108 89 73 62 24 18

Campeonato Mundial de Pilotos – 1999 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Mika Hakkinen Eddie Irvine Heinz-Harald Frentzen David Coulthard Michael Schumacher Ralf Schumacher

País Finlândia Irlanda Alemanha Escócia Alemanha Alemanha

Equipe McLaren-Mercedes Ferrari Jordan-Mugen-Honda McLaren-Mercedes Ferrari Williams-Supertec

Pontos 76 74 54 48 44 35

Campeonato Mundial de Pilotos – 1998 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Mika Hakkinen Michael Schumacher David Coulthard Eddie Irvine Jacques Villeneuve Damon Hill

País Equipe Pontos Finlândia McLaren-Mercedes 100 Alemanha Ferrari 86 Escócia McLaren-Mercedes 56 Irlanda Ferrari 47 Canadá Williams-Mecachrome 21 Reino Unido Jordan-Mugen-Honda 20

Campeonato Mundial de Pilotos – 1997 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Jacques Villeneuve Heinz-Harald Frentzen David Coulthard Jean Alesi Gerhard Berger Mika Hakkinen

País Canadá Alemanha Escócia França Áustria Finlândia

Equipe Williams-Renault Williams-Renault McLaren-Mercedes Benetton-Renault Benetton-Renault McLaren-Mercedes

Pontos 81 42 36 36 27 27

Campeonato Mundial de Pilotos – 1996 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Damon Hill Jacques Villeneuve Michael Schumacher Jean Alesi Mika Hakkinen Gerhard Berger

País Reino Unido Canadá Alemanha França Finlândia Áustria

Equipe Williams-Renault Williams-Renault Ferrari Benetton-Renault McLaren-Mercedes Benetton-Renault

Pontos 97 78 59 47 31 21

106

Campeonato Mundial de Pilotos – 1995 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Michael Schumacher Damon Hill David Coulthard Johnny Herbert Jean Alesi Gerhard Berger

País Alemanha Reino Unido Escócia Reino Unido França Áustria

Equipe Benetton-Renault Williams-Renault Williams-Renault Benetton-Renault Ferrari Ferrari

Pontos 102 69 49 45 42 31

Campeonato Mundial de Pilotos – 1994 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Michael Schumacher Damon Hill Gerhard Berger Mika Hakkinen Jean Alesi Rubens Barrichello

País Alemanha Reino Unido Áustria Finlândia França Brasil

Equipe Benetton-Ford Williams-Renault Ferrari McLaren-Peugeot Ferrari Jordan-Hart

Pontos 92 91 41 26 24 19

Campeonato Mundial de Pilotos – 1993 – Resultado Final Pos 1 2 3 4 5 6

Piloto Alain Prost Ayrton Senna Damon Hill Michael Schumacher Riccardo Patrese Jean Alesi

País França Brasil Inglaterra Alemanha Itália França

Equipe Williams-Renault McLaren-Ford Williams-Renault Benetton-Ford Benetton-Ford Ferrari

Pontos 99 73 69 52 20 16

Campeonato Mundial de Pilotos – 1992 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Pilotos Nigel Mansell Riccardo Patrese Michael Schumacher Ayrton Senna Gerhard Berger Martin Brundle

País Reino Unido Itália Alemanha Brasil Áustria Reino Unido

Equipe Williams-Renault Williams-Renault Benetton-Ford McLaren-Honda McLaren-Honda Benetton-Ford

Pontos 108 56 53 50 49 38

Campeonato Mundial de Pilotos – 1991 – Resultado Final Pos. 1 2 3 4 5 6

Piloto Ayrton Senna Nigel Mansell Riccardo Patrese Gerhard Berger Alain Prost Nelson Piquet

País Brasil Inglaterra Itália Áustria França Brasil

Equipe McLaren-Honda Williams-Renault Williams-Renault McLaren-Honda Ferrari Benetton-Ford

Pontos 96 72 53 43 34 26.5

Fonte: http://www.formula1.com/archive/season/2005.html, acesso em 12/06/2005. 107

Apêndice E: Títulos conquistados (por pilotos) Tabela dos pilotos campeões mundiais com número total de títulos conquistados e respectivos anos de conquista. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004.

Class. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27

Piloto Michael Schumacher Juan Manoel Fangio Alain Prost Jack Brabham Jackie Stewart Niki Lauda Nelson Piquet Ayrton Senna Alberto Ascari Jim Clark Graham Hill Emerson Fittipaldi Mika Häkkinën Giuseppe Farina Mike Hawthorn Phil Hill John Surtees Denny Hulme Jochen Rindt James Hunt Mario Andretti Jody Scheckter Alan Jones Keke Rosberg Nigel Mansell Damon Hill Jacques Villeneuve

Qtde. 7 5 4 3 3 3 3 3 2 2 2 2 2 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1

Temporadas 1994, 1995, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004 1951, 1954, 1955, 1956, 1957 1985, 1986, 1989, 1993 1959, 1960, 1966 1969, 1971, 1973 1975, 1977, 1984 1981, 1983, 1987 1988, 1990, 1991 1952, 1953 1963, 1965 1962, 1968 1972, 1974 1998, 1999 1950 1958 1961 1964 1967 1970 1976 1978 1979 1980 1982 1992 1996 1997

Fonte: http://www.f1sport.com.br/campeoes%20por%20pontos.htm, acesso em 05/11/2004.

108

Apêndice F: Pontuação dos pilotos nos campeonatos conquistados Class. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28

Ano 2004 2002 2001 1992 2000 1995 1998 1993 1996 1991 2003 1994 1988 1997 1990 1999 1989 1987 1985 1986 1984 1977 1973 1976 1980 1975 1978 1969

Piloto Michael Schumacher Michael Schumacher Michael Schumacher Nigel Mansell Michael Schumacher Michael Schumacher Mika Hakkinen Alain Prost Damon Hill Ayrton Senna Michael Schumacher Michael Schumacher Ayrton Senna Jacques Villeneuve Ayrton Senna Mika Hakkinen Alain Prost Nelson Piquet Alain Prost Alain Prost Niki Lauda Niki Lauda Jackie Stewart James Hunt Alan Jones Niki Lauda Mario Andretti Jackie Stewart

Pontos 148 144 123 108 108 102 100 99 97 96 93 92 90 81 78 76 76 73 73 72 72 72 71 69 67 64.5 64 63

Class 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 44 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55

Ano 1971 1972 1983 1974 1965 1963 1979 1967 1981 1968 1970 1982 1960 1966 1962 1958 1954 1964 1957 1955 1952 1953 1961 1959 1951 1956 1950

Piloto Pontos Jackie Stewart 62 Emerson Fittipaldi 61 Nelson Piquet 59 Emerson Fittipaldi 55 Jim Clark 54 Jim Clark 54 Jody Scheckter 51 Denny Hulme 51 Nelson Piquet 50 Graham Hill 48 Jochen Rindt 45 Keke Rosberg 44 Jack Brabham 43 Jack Brabham 42 Graham Hill 42 Mike Hawthorn 42 Juan Manoel Fangio 42 John Surtees 40 Juan Manoel Fangio 40 Juan Manoel Fangio 40 Alberto Ascari 36 Alberto Ascari 34.5 Phil Hill 34 Jack Brabham 31 Juan Manoel Fangio 31 Juan Manoel Fangio 30 Giuseppe Farina 30

Fonte: http://www.f1sport.com.br/campeoes%20por%20pontos.htm Acessado em 05/11/2004.

Obs.: Esta tabela mostra a pontuação dos pilotos campeões mundiais desde 1950, ano do primeiro campeonato de Fórmula 1. O sistema de pontuação variou bastante desde então: De 1950 a 1959, pontuavam os 5 primeiros, recebendo 8, 6, 4, 3, 2 pontos, respectivamente, e 1 ponto quem fizesse a volta mais rápida. De 1950 a 1953 só eram contabilizadas as quatro melhores pontuações entre os sete Grandes Prêmios do ano. Em 1954, passaram a ser cinco, depois seis em 1958. O número de descartes variava em função do número de corridas. Em 1960, o sexto colocado passou a receber 1 ponto, e a volta mais rápida não valia mais pontos. De 1961 a 1990, a pontuação passou a ser a seguinte: 9, 6, 4, 3, 2, 1 para os primeiros seis colocados, respectivamente. A FIA também dividiu o campeonato em duas partes iguais de 1967 a 1978, quando os pilotos eram obrigados a abandonar um resultado em cada parte, para aqueles que pontuassem em todas as corridas. Em 1979 o máximo que os pilotos podiam somar eram quatro melhores resultados de cada fase, que totalizavam 15 corridas no ano. Em 1980, com 14 provas no calendário, apenas os cinco melhores resultados de cada metade valiam para a contabilização de pontos na tabela. Entre 1981 a 1991 não existia mais a divisão da temporada em duas metades, mas os concorrentes eram obrigados a descartar quatro ou cinco resultados durante o ano, dependendo do número de provas. A partir de 1991, o vencedor passou a receber 10 pontos pela vitória. As demais posições de chegada permanecerem recebendo 6, 4, 3, 2 e 1 ponto respectivamente. A partir de 1992 não houve mais descarte de resultados, passando a valer todos os pontos marcados durante a temporada. Em 2003, a nova mudança no sistema de pontuação passou a pontuar os 8 primeiros colocados, dando 10 pontos para o vencedor, e 8, 6, 5, 4, 3, 2, 1 pontos respectivamente para os demais. (Informações extraídas de: MARTINS, Lemyr. A velocidade não é democrática. 06/01/2003. www.grid.abril.com.br/index.shtml. Acesso em 08/12/2003

109

Apêndice G: Corridas sucessivas na Zona de Pontuação Tabela dos pilotos com maior número de corridas entre os colocados que marcam pontos. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004.



Piloto

Qtde

Seqüência

1

Michael Schumacher (ALE)

24

Hungria-2001 / Malásia-2003

2

Michael Schumacher (ALE)

18

San Marino-2003 / Espanha-2004

3

Carlos Reutemann (ARG)

15

Bélgica-1980 / Bélgica-1981

4

Jim Clark (ESC)

12

Bélgica-1963 / Bélgica-1964

5

Mika Hakkinen (FIN)

12

San Marino-2000 / Itália-2000

6

Rubens Barrichello (BRA)

12

Japão-2003 / Inglaterra-2004

7

Niki Lauda (FIN)

11

Alemanha-1975 / Suécia-1976

8

Nelson Piquet (BRA)

11

Mônaco-1987 / México-1987

9

Eddie Irvine (IRL)

10

Mônaco-1999 / Itália-1999

10

David Coulthard (ESC)

10

EUA-2000 / Mônaco-2001

11

Ralf Schumacher (ALE)

10

Austrália-2003 / França-2003

Obs.: Até 2002 somente os seis primeiros colocados de cada corrida pontuavam. Desde a temporada de 2003 passaram a ser premiados os oito primeiros colocados. Fonte: Nos EUA, Barrichello alcança feito raro. 21/06/2004. www.warmup.com.br, acesso em 21/06/2004. Adaptado, na formatação e distribuição dos dados, e atualizado com base no acompanhamento das corridas pelo autor na revista Racing.

110

Apêndice H: Vitórias por piloto (em toda a carreira) Tabela de pilotos com mais de 10 vitórias até 2004, com número total de corridas disputadas e percentuais de aproveitamento. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004.

Piloto

Vitórias

GPs

%

1

Michael Schumacher (ALE)

83

211

39,33

2

Alain Prost (FRA)

51

199

25,62

3

Ayrton Senna (BRA)

41

161

25,46

4

Nigel Mansell (ING)

31

185

16,75

5

Jackie Stewart (ESC)

27

99

27,27

6

Jim Clark (ESC)

25

72

34,72

7

Niki Lauda (AUT)

25

173

14,28

8

Juan Manoel Fangio (ARG)

24

51

47,05

9

Nelson Piquet (BRA)

23

204

12,74

10 Damon Hill (ING)

22

116

18,96

11 Mika Häkkinen (FIN)

20

161

12,42

12 Stirling Moss (ING)

16

66

24,24

13 Jack Brabham (AUS)

14

126

11,11

14 Emerson Fittipaldi (BRA)

14

144

9,72

15 Graham Hill (ING)

14

176

7,95

16 Alberto Ascari (ITA)

13

32

40,62

17 David Coulthard (ESC)

13

175

7,42

18 Mario Andretti (EUA)

12

128

9,37

19 Alan Jones (AUS)

12

116

10,34

20 Carlos Reutemann (ARG)

12

146

8,21

21 Jacques Villeneuve (CAN)

11

135

8,14

22 James Hunt (ING)

10

92

10,86

23 Ronnie Peterson (SUE)

10

123

8,13

24 Jody Scheckter (AFS)

10

112

8,92

25 Gerhard Berger (AUT)

10

210

4,76

Fontes: http://www.f1sport.com.br/volta%20mais%20rapida.htm Percentuais de aproveitamento calculados pelo autor. 111

Apêndice I: Vitórias por piloto (em uma temporada) Tabela dos 12 pilotos com mais vitórias por temporada, até 2004. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004.

Piloto

Qtde

Temporada

1

Michael Schumacher (ALE)

13

2004

2

Michael Schumacher (ALE)

11

2002

3

Nigel Mansell (ING)

9

1992

4

Michael Schumacher (ALE)

9

1995 / 2000 / 2001

5

Ayrton Senna (BRA)

8

1988

6

Michael Schumacher (ALE)

8

1994

7

Damon Hill (ING)

8

1996

8

Mika Hakkinen (FIN)

8

1998

9

Jim Clark (ESC)

7

1963

10 Alain Prost (FRA)

7

1984 / 1988 / 1993

11 Ayrton Senna (BRA)

7

1991

12 Jacques Villeneuve (CAN)

7

1997

Fonte: SANTOS, Francisco dos. Ayrton Senna do Brasil. Lisboa: Talento, 1994. Adaptado e atualizado em 31/12/2004, com base no acompanhamento das corridas pelo autor na revista Racing.

112

Apêndice J: Vitórias Sucessivas por Piloto Tabela dos pilotos com 4 ou mais vitórias sucessivas, até 2004. Em negrito, o piloto em atividade após 2004.

Piloto

Qtde

Temporada

1

Alberto Ascari (ITA)

9

1952/53 *

2

Michael Schumacher (ALE)

7

2004

3

Michael Schumacher (ALE)

6

2000/01 **

4

Jack Brabham (AUS)

5

1960

5

Jim Clark

5

1965

6

Nigel Mansell (ING)

5

1992

7

Michael Schumacher (ALE)

5

2004

8

Ayrton Senna (BRA)

4

1988 / 1991 ***

9

Alain Prost (FRA)

4

1993

4

1994 / 2002

10 Michael Schumacher (ALE) * 6 vitórias em 1952 e 3 vitórias em 1953. ** 4 vitórias em 2000 e 2 vitórias em 2001. *** 4 vitórias em cada ano.

Fonte: SANTOS, Francisco dos. Ayrton Senna do Brasil. Lisboa: Talento, 1994. Adaptado e atualizado em 15/12/2004, com base no acompanhamento das corridas pelo autor na revista Racing.

113

Apêndice K: Total de Pole Positions por Piloto (em toda a carreira) Tabela de pilotos com mais de 10 pole positions até 2004, com número total de corridas disputadas e percentuais de aproveitamento. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004.

Piloto

Poles

GPs

%

1

Ayrton Senna

65

161

40,37

2

Michael Schumacher

63

211

29,85

3

Jim Clark

33

72

45,83

4

Alain Prost

33

199

16,58

5

Nigel Mansell

32

187

17,11

6

Juan Manoel Fangio

28

51

54,90

7

Mika Hakkinen

26

161

16,14

8

Niki Lauda

24

171

14,03

9

Nelson Piquet

24

204

11,76

10 Damon Hill

20

116

17,24

11 Mario Andretti

18

128

14,06

12 René Arnoux

18

140

12,85

13 Jackie Stewart

17

99

17,17

14 Stirling Moss

16

66

24,24

15 Alberto Ascari

14

32

11,38

16 Ronnie Peterson

14

123

43,75

17 James Hunt

14

92

15,21

18 Jack Brabham

13

126

10,31

19 Graham Hill

13

176

7,38

20 Jacky Ickx

13

116

11,20

21 Jacques Villeneuve

13

135

9,62

22 R. Barrichello

13

195

6,66

23 Gerhard Berger

12

210

5,71

24 David Coulthard

12

175

6,85

25 Juan Pablo Montoya

11

69

15,94

26 Jochen Rindt

10

60

16,66

Fonte: http:www.f1sport.com.br/poles.htm . Percentuais de aproveitamento calculados pelo autor. 114

Apêndice L: Pole Positions por piloto (em uma temporada) Tabela dos 20 pilotos com mais pole-positions por temporada, até 2004. Em negrito, o pilots em atividade após 2004.

Piloto

Qtde Temporada Qtde GPs

1 Nigel Mansell (ING)

14

1992

16

2 Ayrton Senna (BRA)

13

1988 / 1989

16 / 16

3 Alain Prost (FRA)

13

1993

16

4 Mika Hakkinen (FIN)

11

1999

17

5 Michael Schumacher (ALE)

11

2001

17

6 Ayrton Senna (BRA)

10

1990

16

7 Ronnie Peterson (SUE)

9

1973

15

8 Niki Lauda (FIN)

9

1974 / 1975

15 / 15

9 Nelson Piquet (BRA)

9

1984

16

10 Damon Hill (ING)

9

1996

17

11 Mika Hakkinen (FIN)

9

1998

17

12 Michael Schumacher (ALE)

9

2000

17

13 James Hunt (ING)

8

1976

15

14 Mario Andretti (ITA)

8

1978

16

15 Ayrton Senna (BRA)

8

1986 / 1991

16 / 16

16 Nigel Mansell (ING)

8

1987

16

17 Michael Schumacher (ALE)

8

2004

18

18 Ayrton Senna (BRA)

7

1985

16

19 Damon Hill (ING)

7

1995

17

20 Michael Schumacher (ALE)

7

2002

17

Fonte: SANTOS, Francisco dos. Ayrton Senna do Brasil. Lisboa: Talento, 1994. Adaptada e atualizada em 15/12/2004, 2004, com base no acompanhamento das corridas pelo autor na revista Racing.

115

Apêndice M: Pole Positions sucessivas por piloto (em uma temporada) Tabela de pilotos com pole-positions sucessivas, até 2004. Em negrito, o piloto em atividade após 2004.

Piloto

Qtde

Temporada

1

Ayrton Senna (BRA)

8

1988/89

2

Ayrton Senna (BRA)

7

1990/91

3

Alain Prost (FRA)

7

1993

4

Michael Schumacher (ALE)

7

2000/01

5

Stirling Moss (ING)

6

1959/60

6

Niki Lauda (FIN)

6

1974

7

Ayrton Senna (BRA)

6

1988 / 1989

8

Nigel Mansell (ING)

6

1992

9

Mika Hakkinen (FIN)

6

1999

10

Mika Hakkinen (FIN)

5

1999

Fonte: SANTOS, Francisco dos. Ayrton Senna do Brasil. Lisboa: Talento, 1994. Adaptado e atualizado em 15/12/2004, com base no acompanhamento das corridas pelo autor na revista Racing.

116

Apêndice O: Pole Positions de Michael Schumacher 1994

1995

1996

1997

1998

1999

16 GPs

17 GPs

16 GPs

17 GPs

17 GPs

16 GPs250

Seis poles

Quatro poles Quatro poles

Três poles

Três poles

Três poles

1 Mônaco 2 Espanha 3 Canadá 4 Hungria 5 Europa 6 Japão

7 San Marino 8 Espanha 9 Canadá 10 Japão

11 San Marino 15 Canadá 12 Mônaco 16 França 13 França 17 Hungria 14 Hungria

21 Canadá 18 Itália 19 Luxemburgo 22 Malásia 23 Japão 20 Japão

2000

2001

2002

2003

2004

17 GPs

17 GPs

17 GPs

17 Gps

18 GPs

Nove poles

Onze poles

Sete poles

Cinco poles

Oito poles

24 Espanha 25 Mônaco 26 Canadá 27 França 28 Hungria 29 Itália 30 EUA 31 Japão 32 Malásia

33 Austrália 34 Malásia 35 Brasil 36 Espanha 37 Áustria 38 Canadá 39 Europa 40 GrãBretanha 41 Hungria 42 EUA 43 Japão

44 Malásia 45 San Marino 46 Espanha 47 Alemanha 48 Bélgica 49 EUA 50 Japão

51 Austrália 52 San Marino 53 Espanha 54 Áustria 55 Itália

56 Austrália 57 Malásia 58 Barhein 59 Espanha 60 Europa 61 Alemanha 62 Hungria 63 Japão

249

Obs.: Em 1994 o regulamento mudou o formato do treino de classificação: os pilotos não teriam mais 1 hora livre na sexta e sábado para tentarem marcar a pole-position. Agora, os pilotos teriam apenas 12 voltas, no tempo limite de 1 hora, na sexta e sábado, para tentarem marcar a pole-position - Em 1997 houve a supressão da validade do treino de sexta-feira. Apenas os tempos de sábado valeriam para a formação do grid. Os pneus eram limitados em 7 jogos de quatro pneus por corrida, incluindo os treinos. - Em 2003 o regulamento estipulou apenas uma volta por piloto para definição do grid de largada. A entrada na pista seguiria a ordem inversa do treino da sexta feira. Os carros teriam que largar no domingo com os mesmos pneus com os quais classificaram seus carros. - Em 2004, o regulamento estipulou apenas um motor por final de semana. Se algum problema obrigasse a troca de motor, o piloto perderia 10 posições no grid de largada, indo para o final do grid. Se um piloto fizesse a pole-position e trocasse seu motor, largaria em 10º lugar. Fonte: www.f1naweb.com.br, acesso em 25/11/2003. Adaptado, na formatação e distribuição dos dados, e atualizado com base no acompanhamento das corridas pelo autor pela revista Racing. 249 250

Não disputou 2 GPs por cumprir suspensão. Não disputou 6 Gps por estar recuperando-se de fraturas sofridas no GP da Inglaterra. 117

Apêndice P: Pódios por piloto (em toda a carreira) Tabela dos 10 pilotos que mais vezes conseguiram o primeiro, segundo ou terceiro lugares em uma corrida, em toda a carreira, até 2004. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004.

Piloto

Qtde

GPs

1

Michael Schumacher (ALE)

137

211

2

Alain Prost (FRA)

106

199

3

Ayrton Senna (BRA)

80

161

4

Nelson Piquet (BRA)

60

204

5

David Coulthard (ESC)

60

175

6

Nigel Mansell (ING)

59

185

7

Rubens Barrichello (BRA)

57

195

8

Niki Lauda (AUT)

54

173

9

Mika Hakkinen (FIN)

51

161

10

Gerhard Berger (AUT)

48

210

Fontes: http://www.f1sport.com.br/podios.htm. Acesso em 26/02/2005.

118

Apêndice Q: Pódios por piloto (em uma temporada) Tabela dos pilotos que conseguiram o primeiro, segundo ou terceiro lugares em uma corrida dez ou mais vezes em uma mesma temporada, até 2004. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004.

Piloto

Qtde

Temporada

Michael Schumacher (ALE) Michael Schumacher (ALE) Alain Prost (FRA) Michael Schumacher (ALE) Rubens Barrichello (BRA) Alain Prost (FRA) Ayrton Senna (BRA) Michael Schumacher (ALE)

17* 15 14 14 14 12 12 12

2002 2004 1988 2001 2004 1993 1991 2000

9 10 11 12 13 14 15 16

Alain Prost (FRA) Nelson Piquet (BRA) Ayrton Senna (BRA) Damon Hill (ING) Michael Schumacher (ALE) Jacques Villeneuve (CAN) Mika Hakkinen (FIN) David Coulthard (ESC)

11 11 11 11 11 11 11 11

1985/1986/1989 1987 1988 / 1990 1994 1995 / 1998 1996 1998 / 2000 2000

17 18 19 20 21 22 23 24

Nelson Piquet (BRA) Michael Schumacher (ALE) Damon Hill (ING) Mika Hakkinen (FIN) David Coulthard (ESC) Rubens Barrichello (BRA) Kimi Räikkönen (FIN) Jenson Button (ING)

10 10 10 10 10 10 10 10

1986 1994 1996 1999 2001 2001 / 2002 2003 2004

1 2 3 4 5 6 7 8

Fontes: Revista Racing. São Paulo: Motorpress, período de 1997 a 2004. http://www.formula1.com/archive/season/2005.html, acesso em 12/06/2005.

*Obs.: A temporada de 2002 teve 17 corridas. Jamais um piloto foi ao pódio em todas as etapas de um campeonato.

119

Apêndice R: Voltas mais rápidas nas corridas Tabela de pilotos que realizaram por dez ou mais vezes a volta mais rápida de uma corrida, até 2004. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004. Piloto

V+R

GPs

1

Michael Schumacher (ALE)

66

211

2

Alain Prost (FRA)

41

199

3

Nigel Mansell (ING)

30

185

4

Jim Clark (ESC)

28

72

5

Niki Lauda (AUT)

25

173

6

Mika Häkkinen (FIN)

25

162

7

Juan Manoel Fangio (ARG)

23

51

8

Nelson Piquet (BRA)

23

204

9

Gerhard Berger (AUT)

21

210

10

Stirling Moss (ING)

20

66

11

Damon Hill (ING)

19

116

12

Ayrton Senna (BRA)

19

161

13

David Coulthard (ESC)

18

175

14

Clay Regazzoni (SUI)

15

132

15

Jackie Stewart (ESC)

15

99

16

Rubens Barrichelo (BRA)

15

195

17

Jack Ickx (BEL)

14

116

18

Alan Jones (AFS)

13

116

19

Riccardo Patrese (ITA)

13

256

20

Alberto Ascari (ITA)

12

32

21

Jack Brabham (AUS)

12

126

22

René Arnoux (FRA)

12

140

23

John Surtees (ING)

11

111

24

Juan Pablo Montoya (COL)

11

69

25

Graham Hill (ING)

10

176

26

Mario Andretti

10

128

Fontes: Ranking. Racing. São Paulo, nº 157, outubro 2004. http://www.f1sport.com.br/volta%20mais%20rapida.htm 120

Apêndice S: Schumacher e companheiros de equipe nos grids de largada Número de vezes que Schumacher classificou-se na frente dos companheiros de equipe. Em negrito, o piloto em atividade após 2004.

Ano 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 04

Vezes na frente M I C H A E L S C H U M A C H E R

1 4 16 16 4 8 2 16 16 16 16 9* 15 16 13 10 13

0 1 0 0 0 0 0 1 1 1 1 1 2 1 4 6 5

Companheiros Andréa De Cesaris Nelson Piquet Martin Brundle Ricardo Patrese J. J. Letho Jos Verstappen Johnny Herbert Johnny Herbert Eddie Irvine Eddie Irvine Eddie Irvine Eddie Irvine Rubens Barrichello Rubens Barrichello Rubens Barrichello Rubens Barrichello Rubens Barrichello

Fontes: Revistas Quatro Rodas. São Paulo: Abril, período de 1991 a 1995; Racing. São Paulo: Motorpress, período de 1996 a 2004.

* Obs.: Disputou apenas 10 etapas.

121

Apêndice T: "Dobradinhas" Tabela das duplas de pilotos da mesma equipe que por seis ou mais vezes alcançaram as duas primeiras colocações da corrida, independente da ordem. Em negrito, a dupla de pilotos em atividade, na mesma equipe, após 2004.

Pilotos e Equipe

Qtde

Temporada

1

M. Schumacher (ALE) / R. Barrichello (BRA) - Ferrari

23

2000 a 2004

2

A. Senna (BRA) / A. Prost (FRA) - McLaren

14

1988 / 1989

3

M. Hakkinen (FIN) / D. Coulthard (ESC) - McLaren

11

1997 a 2001

4

N. Mansell (ING) / R. Patrese (ITA) - Williams

8

1991 / 1992

5

N. Mansell (ING) / N. Piquet (BRA) - Williams

6

1986

Schumacher e Barrichello disputaram juntos 84 corridas pela Ferrari, até 2004. Senna e Prost disputaram juntos 35 corridas pela McLaren. Hakkinen e Coulthard disputaram juntos 98 corridas pela McLaren. Mansell e Patrese disputaram juntos 32 corridas pela Williams. Mansell e Piquet disputaram juntos 31 corridas pela Williams.

Fonte: SANTOS, Francisco dos. Ayrton Senna do Brasil. Lisboa: Talento, 1994. Adaptado e atualizado em 15/12/2004, com base no acompanhamento das corridas pelo autor, na revista Racing.

122

Apêndice U: Quantidade de Corridas por Piloto (na carreira). Tabela dos pilotos com mais de 150 corridas na carreira, até 2004. Em negrito, os pilotos em atividade após 2004.

Pos.

Piloto

GPs

1

Riccardo Patrese (ITA)

256

2

Michael Schumacher (ALE)

211

3

Gerhard Berger (AUT),

210

4

Andrea de Cesaris (ITA)

208

5

Nelson Piquet (BRA)

204

6

Jean Alesi (FRA)

201

7

Alain Prost (FRA)

199

8

Rubens Barrichello (BRA)

195

9

Michele Alboreto (ITA)

194

10 Nigel Mansell (ING)

187

11 Graham Hill (ING)

176

12 Jacques Laffite (ING)

176

13 David Coulthard (ESC)

175

14 Niki Lauda (AUT)

171

15 Thierry Boutsen (BEL)

163

16 Ayrton Senna (BRA)

161

17 Mika Hakkinen (FIN)

161

18 Johnny Herbert (ING)

160

19 Martin Brundle (ING)

158

20 Olivier Panis (FRA)

157

21 Heinz-Harald Frentzen (ALE)

156

22 John Watson (IRL)

152

Fonte: http://www.f1sport.com.br/total%gps.htm

123

Apêndice V: Números totais de Michael Schumacher. Tabela com o resumo das estatísticas do piloto Michael Schumacher na Fórmula 1, no período de 1991 a 2004.

Ítem

Total

Temporadas disputadas

13

Gps Disputados

211

Títulos Mundiais

7

Vitórias

83

Poles Positions

63

Primeira Fila

103

Total de Pódios

137

Total de Pontos na Categoria

1.186

Voltas mais Rápidas

66

Número de Voltas na Liderança

4.657

Número de Voltas percorridas

11.808

Número de Kms na Liderança

21.968

Total de Kms percorridos

56.124

Fontes: http://www.f1sport.com.br; Ranking. Racing. São Paulo, nº 157, outubro 2004.

124

ANEXOS

ANEXO A -

Coluna Potenza. 16/10/2003.

ANEXO B -

Coluna Warm Up. 19/10/2003.

125

Anexo A: Coluna Potenza. 16/10/2003. Um cidadão hexacampeão. 16/10/2003.

Bebi mesmo, destruí a TV, o rádio, o frigobar, destruí tudo que apareceu na frente! Meti a camisa da Toyota, que se dane a Ferrari, afinal, ela não tem o direito de reclamar de nada comigo. Deixei fotografar, que se dane a imprensa. Eu não tinha acabado? Então, olha eu aqui quebrando tudo e tendo minha noite de cidadão normal, cidadão feliz, pessoa física, ser humano como vocês. Sou eu mesmo, o cara frio, o pai de família, num dia de fúria! Acharam feio? Porque acharam engraçado o Piquet bater na cara do Salazar? Porque era bonito o Senna tentando encher o Irvine de porrada? Não foi legal quando o Senna partiu pra cima de mim? Não era show o Vampeta bêbado na rampa do presidente do país dele? Não foi engraçado tudo isso? Então, só porque eu ganhei de novo e fiz novamente disso tudo um esporte previsível e chato, mereço ser um marginal? Pode publicar, se quiser faço até pose! Não fiz nada que eu não posso assumir. Fiz em local privado, convidado por quem é da casa, com os funcionários da casa juntos, todos rindo e brincando conosco. Ou seja, não fiz mal público, quebrei algo privado, e posso pagar por isso, mesmo sabendo que os donos estavam juntos e rindo de tudo isso. Direito? Exemplo? Porque eu tenho que dar exemplo se sou um vilão incontestável? Porque eu vou continuar sendo o “certinho” fora da pista se dentro dela o que faço é questionado até hoje. Vale a pena? Me matei a vida toda para ser campeão do mundo, hoje sou hexa, e ainda ouço gente dizer que sou farsa. Bebi mesmo, e comemorei como jamais fiz na minha vida. Sabe porque? Porque eu sou como você. Eu vou no banheiro, eu como, eu durmo, eu erro, eu falo besteira, eu dou gargalhadas, eu brinco com meus cachorros, eu sinto dor de dente, tenho tudo o que você tem. Inclusive o direito de tomar um porre e comemorar o simples fato de minha vida ter sido o máximo do sucesso dentro daquilo que me propus a fazer. Você não comemoraria? Me dão licença de esquecer por algumas horas que 100% do que faço é notícia e sou mais um produto do que uma pessoa? Posso ser Michael e não Schumacher por algumas horas? To puto sim! To puto da vida porque eu brinquei há algumas semanas dizendo rindo que o Rubens nunca tinha me ajudado, mas a imprensa se recusou a contar que foi uma brincadeira com ele. Quando o próprio Rubens viu a imagem e confirmou que era brincadeira com ele, ninguém publicou!

126

To puto porque eu tenho que provar todo GP que sou bom piloto, porque nunca disse que sou melhor que Fangio e mesmo assim tenho a obrigação, na cabeça de muitos, de mostrar que sou. Tô cansado de ter a sombra do Senna atrás de mim. Eu não me comparo a ele, chorei por ele, era meu ídolo, mas querem que eu seja ele. Sou Michael Schumacher, não tá bom assim? Eu venci. Venci de novo. Venci na vida, venci as opiniões contrárias, venci os argumentos contrários, venci Montoya, venci Kimi, venci Mika, venci Senna, venci Rubens, venci indiretamente Prost, Senna e Fangio. E eu esnobei alguém por isso? Disse que eu era o maior? Usei dos meus números alguma vez para dar um depoimento arrogante diminuindo os demais? Não, mas deveria ter feito! Fui um piloto exemplar depois de 97, quando vi que errei e amadureci. Não fiz besteira fora da pista, pouco errei e ousei dentro dela, no entanto, segui sendo o único cidadão do mundo recordista de tudo e ainda tendo que provar a cada corrida. Aparece um tal de Montoya, com 1 pole na vida, e já tinha eu que provar que era melhor que ele. Vinha Rubinho, vencia uma vez, e eu já tinha novamente que voar para não “ter acabado” aos olhos do mundo. Bandeira amarela? Nem ler regras as pessoas tem o cuidado antes de me condenar para achar um motivo para não me reconhecer. Eu nunca pedi para ser considerado o maior, só para ser respeitado. Cansei, isso tudo enche o saco. A Corina, a Gina e o Mick precisam de mim. Sei que posso parar, sei que se eu parar agora, serei um Deus lá na frente, mas não. Quero seguir, quero fazer o que amo, mesmo que isso me custe mais 3 anos sem poder falar, sem poder perder, sem poder sequer sentir o peso da idade chegando. Sei que ainda vou ter que provar, provar, provar. Mas, enquanto não começa a próxima temporada, vou beber e comemorar, porque eu provei de novo que tenho meus defeitos, erro como todos erram, mas eu não sou o que sou por acaso. Caiu a teoria do melhor carro e da falta de adversários. Qual será agora? Lá pra janeiro inventam uma nova pra eu “provar” em 2004... - Isso aí, pessoal, é tudo o que eu imagino que Michael gostaria de dizer hoje. Quem sou eu pra falar por ele? Mas, pra bom entendedor ficou claro que eu quis mostrar o que eu penso sobre este cidadão hexacampeão mundial da maior categoria do automobilismo no mundo, do qual tenho orgulho de ter visto correr.

Ricardo Perrone é o responsável pelo Site F1 na WEB. Desde 1997 cobrindo Fórmula 1, já passou pela Band FM, Rádio Trianon (SP), Rádio Imprensa, Band RS, Rádio Record (SP), Sportv, TV Bandeirantes, Rádio Direto e Bangu FM. Atualmente se dedica ao F1 na WEB e as transmissões ao vivo de futebol na AOL.

Fonte: http://www.f1naweb.com.br. 16/10/2003. Acesso em 05 de novembro de 2003. 127

Anexo B: Coluna Warm Up. 09/10/2003. Coluna "Warm Up" Flavio Gomes 09/10/2003 - 00:38

Senhoras e senhores, parei.

Parei Flavio Gomes

Não há mais recordes a bater, exceto um, que considero desimportante e não vale a pena o esforço, até porque tenho a impressão de que se eu chegar perto, mudam as regras de novo. Acho que fiz o que podia fazer, carreguei esta categoria nas costas por dez anos, já deu.

AFP

Quero ver o que vocês vão fazer sem mim...

Sim, carreguei nas costas, porque se não fosse eu, nestes dez anos, de quem vocês estariam falando agora? Contra quem torceriam? Que marcas históricas relatariam? Fariam suas manchetes com quais personagens? A quem acusariam de politiqueiro, sacripanta, alcoviteiro?

Parei porque cansei de ouvir que nenhum de meus títulos tem valor, cansei de ler que só ganhei com o melhor carro ou trapaceando, estou farto dessa história de que nunca tive adversários, e de que tudo que consegui só foi possível porque passei a vida correndo sozinho. Pois fiquem com meus não-adversários, divirtam-se com eles, usem o espaço em seus jornais para falar deles, esqueçam que eu existo. Vai ser curioso acompanhar a distância seu esforço para transformar o colombiano gorducho numa estrela, ou para arrancar três palavras interessantes daquele moleque loiro aguado da Finlândia, ou para comparar o espanholzinho imberbe a um grande toureiro ou a um personagem de Almodóvar. A propósito, tenho algumas sugestões. Aproveitem o momento para ressuscitar o canadense que pinta os cabelos, ou chamar de volta aquele inglês grisalho que toca guitarra, ou ainda o francesinho que vive reclamando que deu azar porque guiou o mesmo carro que eu numa fase ruim, coitado. Parei. Fiquem com meu companheiro de equipe e seus queixumes, busquem em países exóticos eventuais substitutos, gente capaz de fazer o que eu fiz, encontrem os adversários que não tive. Convençam aqueles que por dez anos rodaram o mundo atrás de mim, comprando seus ingressos e bonés, lotando hotéis e restaurantes, engordando sua audiência na TV, a continuar seguindo suas corridas, a continuar comprando seus ingressos, a lotar seus hotéis e restaurantes, a ligar a TV todo domingo. Parei. Quero ver como vão se virar sem mim. Jornalista desde 1982, começou a carreira no 'Popular da Tarde', passou pelas rádios Cultura e USP, 'Folha de S.Paulo' e 'Placar', antes de montar a agência Warm Up, que desde 1995 cobre o Mundial de F1 para cerca de 60 jornais brasileiros. De 1994 a 2001 foi comentarista e apresentador da Rádio Jovem Pan. Atualmente, é repórter e comentarista de F-1 da Rádio Bandeirantes, da Rádio Capital (Roma, Itália) e da revista "Quatro Rodas". Nasceu em São Paulo em 1964. Casado, tem dois filhos e torce para a Portuguesa. Sua maior paixão automobilística não tem nada a ver com F-1: é colecionador de DKWs.

Flavio Gomes [email protected]

Fonte: www.warmup.com.br, acesso em 22/06/2005. 128

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