May 26, 2017 | Author: Martín Covalski Viveiros | Category: N/A
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Artigo de revisão
Epidemiologia da infecção genital pelo HPV Epidemiology of the genital HPV infection Edison Natal Fedrizzi1
Resumo A infecção genital pelo papilomavírus humano (HPV) é a mais frequente doença sexualmente transmissível na mulher e no homem. Estima-se que pelo menos 50% dos indivíduos sexualmente ativos irão entrar em contato com o HPV, em algum momento de suas vidas, e que 80% das mulheres terão esse contato até os 50 anos de idade. Como acontece com a prevalência, a incidência da infecção por HPV é alta em mulheres jovens, no início da atividade sexual e a cada novo parceiro, e diminui com a idade, observando-se também segundo pico em mulheres mais velhas. No Brasil, a positividade para o HPV na população geral de mulheres varia de 21 a 48%, sendo o HPV de alto risco encontrado em 48 a 53%. A coinfecção com múltiplos tipos de HPV e a infecção sequencial com novos tipos é bastante comum e o risco de adquirir um novo tipo de HPV parece ser independente da infecção prévia por outros tipos. Em relação aos homens, no Brasil, a prevalência varia de 35 a 72%, sendo os HPV de alto risco responsáveis por 25 a 56% dos casos. Quando se avalia as lesões pré-cancerosas e câncer, observa-se que o HPV 16 e 18 são responsáveis por 50-55% dos casos de lesões de alto grau e em torno de 70% dos casos de câncer cervical, tanto no mundo, quanto na América do Sul e Brasil. Palavras-chave: infecções por papilomavírus; epidemiologia; doenças dos genitais femininos; doenças dos genitais masculinos.
Abstract The genital human papillomavirus (HPV) infection is the most common sexually transmitted disease in woman and man. It is estimated that at least 50% of sexually active individuals will come into contact with HPV at some point in their lifes and that 80% of women will have this contact until the age of 50. As prevalence, the incidence of HPV infection in young women is high at the start of sexual activity and after a new partner and it decreases with age, noting also the second peak in older women. In Brazil, the positivity for HPV in women general population varies from 21 to 48%, and the high risk HPV types were found in 48 to 53%. The coinfection with multiple HPV types and sequential infection with new types is very common. The risk of acquiring a new HPV type seems to be independent of previous infection with other types. In relation to men, in Brazil, the prevalence varies from 35 to 72%, and the high risk HPV is responsible for 25 to 56% of cases. Analyzing only precancerous lesions and cancer, HPV 16 and 18 are responsible for 50-55% of high grade lesions and about 70% of cases of cervical cancer around the World, in South America and in Brazil. Keywords: papillomavirus infections; epidemiology; genital diseases, female; genital diseases, male.
INTRODUÇÃO A infecção genital pelo papilomavírus humano (HPV) é a mais frequente doença sexualmente transmissível (DST) na mulher e no homem1. Atualmente existem mais de 200 tipos diferentes identificados de HPV, entre os quais mais de 100 estão completamente sequenciados geneticamente e mais de 120 com sequenciamento parcial. Cerca de 45 tipos infectam o epitélio do trato anogenital masculino e feminino2. Destes, 13 a 18 são considerados de alto risco oncogênico, principalmente os tipos 16 e 18, associados ao câncer anogenital e do trato aerodigestivo3. Esses HPV são necessários, mas não suficientes, para causar virtualmente todos os casos de câncer cervical no mundo4. Os HPV de baixo risco oncogênico,
Endereço para correspondência: Centro de Pesquisa Clínica Projeto HPV - Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (HU/UFSC). Campus Universitário, Bairro Trindade – CEP: 88040-970 Florianópolis (SC), Brasil. E-mail:
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principalmente o 6 e 11, causam as lesões benignas anogenitais (verrugas, lesão intraepitelial escamosa de baixo grau) e na laringe (papilomatose laringeia recorrente), com substancial morbidade e alto custo de tratamento3. Muñoz et al., em 2003, classificaram, do ponto de vista epidemiológico, principalmente os HPV 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59, 68, 82, 26, 53, 66 e 73 como de alto risco oncogênico e os HPV 6, 11, 40, 42, 43, 44, 54, 61, 72, 81, 70, CP6108 como de baixo risco4. Estima-se que pelo menos 50% dos indivíduos sexualmente ativos irão entrar em contato com o HPV em algum momento de suas vidas e que 80% das mulheres terão esse contato até os 50 anos de idade5. A duração da infectividade é um importante fator de disseminação de uma DST em uma população, ou seja, uma infecção de maior duração
Trabalho realizado no Centro de Pesquisa Clínica Projeto HPV do HU/UFSC, Florianópolis (SC), Brasil. 1 Professor Assistente de Ginecologia e Obstetrícia da UFSC – Florianópolis (SC), Brasil. Chefe do Centro de Pesquisa Clínica Projeto HPV do HU/UFSC – Florianópolis (SC), Brasil.
Fonte de financiamento: Nenhuma. Conflito de interesse: Pesquisador dos Ensaios Clínicos da Vacina Anti-HPV da MSD, “Speaker” eventual da MSD. Recebido em: 09/04/2011 Aprovado em: 15/07/2011
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tem impacto potencialmente maior1. Estudos longitudinais tem constantemente mostrado que a maioria das infecções HPV detectadas pelas técnicas de biologia molecular são transitórias e não são detectadas por mais de 1-2 anos3. As infecções por HPV de alto risco persistem mais tempo que as de baixo risco. Em relação aos HPV de alto risco, há algumas evidências que o HPV 16 pode persistir por maior tempo que os outros tipos. Sendo assim, é provável que a disseminação dos HPV de alto risco (particularmente o 16) seja maior que a dos de baixo risco, considerando equivalente o modelo de contato sexual e a transmissibilidade1. A probabilidade da transmissão do HPV por relação sexual varia de 5 a 100%, com média de 40%6. A probabilidade de transmissão por parceiro (homem-mulher) é estimada em 60% para o HPV 167 e para as verrugas genitais8. A infecção pelo HPV em homens também é de menor duração, com a maioria das infecções não sendo mais detectadas após 1 ano9. Ainda é desconhecido se a transmissibilidade do HPV é a mesma durante todo o período que ele é detectado. PREVALÊNCIA Na população feminina geral, a prevalência da infecção HPV varia de 2 a 44%3. Em uma recente metanálise com 78 estudos publicados, as mulheres com citologia normal apresentaram prevalência global ajustada de 10,41% (95% intervalo de confiança [IC]10,2-10,7), com considerável variação, de acordo com a região1 (Tabela 1). As informações do HPV Information Centre do Insituto Catala d’Oncologia, divulgado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2009, demonstra prevalência de 13,2% para a América do Sul e 14,1% para o Brasil do HPV em mulheres com citologia normal10 (Tabela 2). Esses resultados são ainda menores do que outros estudos realizados no Brasil, que encontraram positividade para o HPV, na população geral de 21 a 48%11-13, sendo o HPV de alto risco encontrado em 48 a 53%. Em torno de ¼ das vezes, observa-se infecção mista com os HPV de alto e baixo risco12.
Tabela 1. Prevalência da Infecção HPV* estimada em metanálise de 78 estudos de mulheres com citologia normal nos diferentes continentes. Local
Nº Estudos
n
78 08 24 27 19
157.879 6.226 40.399 70.129 41.125
Global África América Europa Ásia
Prevalência ajustada (%) 10,41 22,12 12,95 8,08 7,95
95% IC 10,16-10,67 20,87-23,43 12,41-13,51 7,77-8,41 7,53-8,40
*Ajustada por região, tipo e desenho de estudo, ano de publicação, forma de coleta da amostra, meio de armazenamento celular, técnica para detecção de HPV, primer utilizado e idade para cada estudo. Não foi reportado nenhum dado da Oceania. Fonte: Burchell NA, Winer RL, Sanjosé S, Franco EL. Vaccine 2006;24S3:52-611. IC: intervalo de confiança
Tabela 2. Prevalência da infecção HPV em mulheres com citologia normal. Local Brasil América do Sul Mundo
n 5.582 17.500 436.430
Prevalência HPV (%) 14,1 13,2 11,4
95% IC 13,2-15,1 12,7-13,7 11,3-11,5
Fonte: WHO/ICO. HPV Information Centre. Human Papillomavirus and Related Cancers – Brazil, Summary Report 200910. IC: intervalo de confiança
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Segundo a OMS, mais de 630 milhões de homens e mulheres (1:10 pessoas) estão infectadas pelo HPV14. Para o Brasil, estima-se que haja 9 a 10 milhões de infectados por esse vírus e que, a cada ano, 700 mil casos novos surjam, podendo ser considerada, portanto, uma epidemia15. Cerca de 105 milhões de pessoas são positivas para o HPV 16 ou 18 no mundo16. As maiores prevalências da infecção são em mulheres mais jovens e diminui com o grupo da meia idade, havendo segundo pico após os 5060 anos, exceto na Ásia1. Essa mesma tendência é demonstrada nos dados da OMS (Figura 1) e na metanálise de Sanjosé et al. em 200717. A razão para esse segundo pico e sua variação geográfica não está clara, mas pode estar associado à reativação de infecção prévia não detectada ou a aquisição da infecção por um novo contato sexual, tanto da mulher quanto do homem, principalmente em consequência das mudanças dos padrões de comportamento sexual nas últimas décadas3. Fatores como comportamento sexual, crença religiosa, tabagismo, paridade, anticoncepção, entre outros, podem ser responsáveis pela diferença da prevalência nas diversas regiões do mundo1. Por exemplo, dados de 29 países indicam que 80% dos homens e 65% das mulheres de 40-80 anos foram sexualmente ativos no ano anterior ao estudo, com exceção da Ásia, onde homens e mulheres relataram menor atividade sexual18. Curiosamente, um estudo com prostitutas, também mostrou diminuição significativa na prevalência do HPV com a idade, mesmo com a continuidade de elevada atividade sexual, sugerindo o desenvolvimento de imunidade HPV tipo específica prevenindo a reinfecção19. Estima-se que as lesões verrucosas (condilomas acuminados) afetem cerca de 1% dos adultos sexualmente ativos20. A coinfecção com múltiplos tipos de HPV é uma constante em muitos estudos epidemiológicos. O estudo brasileiro de coorte do Instituto Ludwig-McGill mostrou que múltiplos tipos de HPV foram detectados na mesma visita em 1/5 das mulheres positivas para o HPV21. A média de tipos de HPV em mulheres avaliadas por Winer et al. foi de diferentes tipos por mulher, variando de 1 a 1422. Em estudo longitudinal com estudantes universitárias, a incidência cumulativa em 24 meses da infecção HPV em mulheres virgens foi de 7,9% (95% IC 3,5-17,1). Nenhum tipo de contato sexual sem penetração (dedo-vulva, pênis-vulva, oral-genital) foi associado com maior risco de adquirir a infecção23. Em estudo em mulheres que tinham relações sexuais somente com mulheres, o DNA de HPV foi detectado em amostras do trato genital de 19%24. Em relação aos homens, uma revisão de 13 estudos mostrou que a prevalência da infecção HPV no homem varia de 3,5 a 45% para todos os tipos e 2,3 a 34,8% para os HPV de alto risco, sendo o 16 o mais frequente25. A prevalência da infecção pelo HPV de baixo risco varia de 2,3 a 23,9%. No Brasil, a prevalência varia de 35 a 72%26, 27, sendo os HPV de alto risco responsáveis por 25 a 56% dos casos26, 28. Os dados globais, entretanto, demonstram que a prevalência de infecção HPV em homens (7,9%) é mais baixa que em mulheres (17,9%), provavelmente em função do tecido peniano ser menos receptivo ao HPV do que o genital feminino25. Quando se avaliam as lesões pré-cancerosas e câncer, observa-se que o HPV 16 e 18 são responsáveis por 50-55% dos casos de lesões de alto grau e em torno de 70% dos casos de câncer cervical, tanto no mundo, quanto na América do Sul e Brasil10 (Tabela 3). Na figura 2, podem-se observar os 10 tipos mais frequentes de HPV em mulheres com e sem lesão cervical no Brasil, comparado com a América do Sul e Mundo. Um percentual significativo do HPV é encontrado nos outros carcinomas do trato anogenital masculino e feminino (vulva, vagina, ânus e pênis), como pode ser observado na Tabela 4.
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América do Sul
Brasil
Mundo
25
25
25
20
20
20
15
15
15
10
10
10
5
5
5
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