CONTRIBUIÇÃO À ANÁLISE DE PERIGOS NA PRODUÇÃO DE ALFACE

August 11, 2017 | Author: Lucas Gabriel Monteiro Palmeira | Category: N/A
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1 191 ISSN CONTRIBUIÇÃO À ANÁLISE DE PERIGOS NA PRODUÇÃO DE ALFACE Simone Silv...

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Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.11, n.2, p.191-198, 2009 ISSN 1517-8595

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CONTRIBUIÇÃO À ANÁLISE DE PERIGOS NA PRODUÇÃO DE ALFACE Simone Silva Machado1, Pabline Rafaella Mello Bueno2 , Marinna Barros de Oliveira3, Celso José de Moura4 RESUMO Para controle preventivo e funcional da contaminação na alface, que é um alimento amplamente consumido, foi realizada a análise de perigos para o processo de produção em uma empresa localizada no município de Aparecida de Goiânia – GO. As amostras de alface, água, solo e adubo orgânico envolvidos na produção foram analisadas quanto aos seguintes parâmetros: contagem de aeróbios mesófilos totais, coliformes a 35°C, E.coli e Salmonella. Foram ainda realizadas análise microscópica da alface e análise de metais pesados – chumbo, cádmio, cobre e cromo - nas amostras de alface. Os resultados indicaram contaminação por aeróbios mesófilos entre 104 e 105UFC g-1. Para coliformes a 35°C a contaminação foi inferior a 103 NMP g-1 para todas as amostras. As contagens de E.coli, tanto da alface lavada como da alface sem lavar, foram menores que 102 NMP g-1, e todas as amostras analisadas mostraram ausência de Salmonella, ovos e larvas de helmintos e protozoários de importância clínica. As análises de metais pesados indicam que o teor de chumbo encontrado está acima dos padrões da legislação internacional. Palavras chaves: contaminação, metais pesados, Salmonella, Escherichia coli, enteroparasitas. CONTRIBUTION TOWARDS AN ANALYSIS OF THE RISKS BROUGHT ABOUT BY LETTUCE PRODUCTION ABSTRACT For preventive and functional control of contamination caused by lettuce, hazard analyses were accomplished on the production process at a company located in Aparecida de Goiânia - GO. Lettuce samples, water, soil and organic fertilizers involved in the production were analyzed in accordance with the following parameters: mesophyll, aerobic micro-organisms, total Coliforms, Escherichia coli and Salmonella. Microscopic analysis of lettuce and toxic metals analysis - lead, cadmium, copper and chrome – were accomplished on lettuce samples. The results showed contamination by mesophyll aerobic varying from 104 to 105NPM g-1. For total Coliforms, the contamination was less than 103 NMP g-1 on all samples. The E.coli counts on both the lettuce washed and on the lettuce without washing were smaller than 102 NMP g-1, and all the analyzed samples did not show the presence of Salmonella, eggs and larvae of helminthes and protozoa of clinical importance. An analyses of toxic metals revealed some lead content above the quantity ruled by international legislation. Keywords: contamination, toxic metals, Salmonella, Escherichia coli, parasitological contamination.

Protocolo 1108 de 13/05/2009 1 Professora Doutora do Centro Federal de Educação Tecnológica de Goiás – Unidade de Ensino de Inhumas. End: Av. Universitária, s/n, Vale das Goiabeiras Inhumas – GO, CEP: 75400-000. Fone: (62) 3514 9516/3514 3909. Fax: (62) 3514-9500, e-mail: [email protected]. 2 Acadêmica do curso de Engenharia de Alimentos, Universidade Federal de Goiás (UFG). End: Rua Mamédio Calil nº111, Centro, Inhumas-GO, CEP: 75400-000. Fone: (62) 9252-7312, e-mail: [email protected]. 3 Acadêmica do curso de Engenharia de Alimentos, Universidade Federal de Goiás (UFG). End: Rua C263 nº36 Apto. 803, St. Nova Suíça, Goiânia-GO, CEP: 74280-260. Fone: (62)9929-4233, e-mail: [email protected]. 4 Professor Adjunto da Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos, Universidade Federal de Goiás (UFG). End: Rua R20 Qd.19 Lt.14, St. Itatiaia, Goiânia-GO. Fone: 35211537, e-mail: [email protected]. Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.11, n.2, p.191-198, 2009

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INTRODUÇÃO As grandes inovações tecnológicas nas várias fases das cadeias produtivas dos diferentes alimentos, não foram capazes de eliminar a crescente ocorrência de surtos de toxinfecção alimentar (Fuzihara et al., 2005). Existem diversas formas de se contaminar o alimento, desde a sua produção até o momento em que ele é consumido. Algumas causas que propiciam o aumento da probabilidade do alimento chegar contaminado ao consumidor são as práticas inadequadas de produção do alimento; a falta de priorização por técnicas que reduzam a contaminação alimentar; as condições higiênico-sanitárias dos locais de fabricação, comercialização e serviço; o treinamento inadequado dos manipuladores de alimentos e a falta de ética de alguns setores que para preservarem seus lucros ignoram sumariamente a legislação em vigor (Peeters, 1999). É de fundamental importância que se estabeleça padrões para os produtos agrícolas, pois isso faz com que o processo de produção se mantenha sempre igual, garantindo a mesma qualidade do que é plantado, colhido e vendido, safra após safra (Instituto Akatu, 2003). O controle de qualidade de alimentos vem sendo objeto de uma constante evolução, visando produzir e oferecer ao consumidor produtos de origem vegetal absolutamente de acordo com as normas específicas de segurança sanitária. (Costa, 2003). No Brasil, os estudos socio-econômicos sobre a segurança dos alimentos são incipientes e não existem informações precisas mostrando a ocorrência de doenças transmitidas por alimentos. Paradoxalmente, pode-se supor que no país o sistema de controle dos alimentos não está operando de modo eficaz, dado que convive freqüentemente com surtos de doenças transmitidas por alimentos. Muitas são as ações governamentais e da sociedade que devem ser adotadas em conjunto para garantir a segurança alimentar. Estima-se que 60% das toxinfecções alimentares decorrem de falhas na manipulação de alimentos (Peeters, 1999). O desenvolvimento de programas de gestão da qualidade com enfoque no programa de treinamento (para cadeia de produção e distribuição) é uma, dentre as várias ações, que necessita ser tomada. O Sistema de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) é uma

Machado et al.

abordagem estruturada que avalia os riscos potenciais da operação com alimentos e decidi que áreas são críticas para a segurança do consumidor. Uma vez identificadas, os pontos críticos de controle (PCCs) podem ser monitorados e os desvios dos limites de segurança podem ser corrigidos, oferecendo alta garantia de segurança alimentar. Cada produto alimentar requer um sistema APPCC separado (Foegeding & Roberts, 1996; Hobbs & Roberts, 1998). As hortaliças podem ser contaminadas através do uso indevido de produtos químicos, da água contaminada utilizada para irrigação, devido a práticas inadequadas no campo e ainda durante as etapas de colheita e pós-colheita, através de limpeza deficiente, infestação de insetos, transporte, distribuição e exposição à venda de forma imprópria. Essa contaminação é de difícil remoção, já que o alimento é consumido cru. A alface que está entre as hortaliças mais vendidas para consumo cru, é bastante utilizada na elaboração de sanduíches, decorações de pratos, saladas, etc., além do produto pronto para consumo, na forma de hortaliça minimamente processada. Apresenta como principal vantagem um baixo valor energético, razão pela qual é freqüentemente indicada na dieta alimentar de convalescentes e idosos. Tendo em vista o amplo consumo da alface, este trabalho teve por objetivo realizar análise de perigos para o processo de produção em uma empresa localizada no município de Aparecida de Goiânia - GO. MATERIAIS E MÉTODOS Foram estudadas todas as operações envolvidas, desde a preparação do solo até a expedição da alface, cultivada em uma empresa produtora de hortaliças. O estudo das operações foi realizado com a condução de reuniões com os funcionários, gerente e presidente da empresa, em que estes foram estimulados a relatar os procedimentos realizados durante a produção da hortaliça e os problemas mais freqüentes relacionados à contaminação do produto. Foi também realizado o acompanhamento de todas as etapas de produção in loco. O estudo realizado na empresa, com capacidade de produção média de mil plantas de alface por dia, localizada no município de Aparecida de Goiânia, GO. A terra onde foi cultivada a alface é

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utilizada somente para o cultivo de hortaliças há dezessete anos. Somente nos dois primeiros anos se utilizou agroquímicos. No período que antecedeu o cultivo de hortaliças, uma parte da área foi utilizada para pastagem e outra parte para o cultivo de milho, arroz e feijão, com utilização intensiva de agroquímicos. Durante a pesquisa, se fez uso somente de adubo orgânico de frango maturado, por tratamento passivo, torta de mamona e adubo químico. Após a germinação da semente, de alface crespa (cultivar Mariane) em estufa, foi feito o plantio no campo, previamente tratado com torta de mamona ou cama de frango. Neste período, até a colheita foi feita a limpeza periódica dos canteiros. A irrigação foi realizada quatro vezes ao dia, por aspersores durante 15 minutos. A água utilizada na irrigação foi proveniente de um poço artesiano e de uma represa, com água captada de um riacho localizado nas proximidades do estabelecimento. O ponto de colheita foi definido para 40 dias após o plantio. Depois de colhida, a alface foi lavada por imersão em água não clorada e não re-circulante, proveniente do poço artesiano, em duas etapas. A primeira etapa consistiu de uma rápida passagem das plantas no primeiro tanque, para a retirada da terra aderida às plantas. A seguir, as plantas foram transferidas ao segundo tanque, permanecendo na água por aproximadamente dois minutos. Posteriormente as plantas foram embaladas em sacos de polietileno, identificados e colocados em caixas plásticas, onde permaneceram em temperatura ambiente (25 °C), até o dia seguinte, para serem levadas até a Universidade Federal de Goiás. Análises microbiológicas da alface Na alface recém colhida e no produto pronto para expedição foram coletadas amostras para análises dos microrganismos: aeróbios mesófilos, coliformes a 35°C, E. coli e Salmonella. As análises de contagem total de microrganismos aeróbios mesófilos e Salmonella seguiram os métodos recomendados e regulamentados pela American Public Health Association (1992). Para análise de coliformes foi utilizado o método alternativo “Simplate” (CEC) para contagem de coliformes totais e E.coli. A amostragem foi realizada em quatro repetições, coletadas em uma única etapa, de

Machado et al.

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pontos diferentes e pré-determinados da área de cultivo, sendo que cada ponto correspondeu a um quarto da área total de produção. As amostras do solo foram coletadas de pontos diferentes da área próxima ao córrego, com lençol freático a 70 cm da superfície. Cada amostra coletada, num total de 10, equivaleu a uma planta de alface, logo após a colheita e após a lavagem. As amostras, devidamente embaladas e identificadas por rótulos, seguiram para o Laboratório de Microbiologia da Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Goiás para análise de microrganismos aeróbios mesófilos e de coliformes e para o Laboratório de Microbiologia de Alimentos do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás, para pesquisa de Salmonella. Análises microbiológicas da água de lavagem da alface Para análises microbiológicas da água de lavagem foram coletadas no segundo tanque amostras para análises de contagem total de microrganismos aeróbios mesófilos e coliformes totais e fecais, seguindo métodos recomendados e regulamentados pela Apha (1992). A amostragem foi coletada em uma única etapa, sendo uma amostra da água do tanque antes do início da lavagem, uma durante a lavagem e uma após a lavagem. As amostras identificadas foram analisadas no Laboratório de Microbiologia da Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos, da Universidade Federal de Goiás. Para análise microbiológica do solo e do adubo orgânico “cama de frango” maturada foram coletadas quatro amostras, em pontos diferentes do campo de produção da alface e duas amostras do esterco armazenado, para a pesquisa de Salmonella (Apha, 1992). As amostras, devidamente embaladas e identificadas por rótulos, seguiram para o Laboratório de Microbiologia de Alimentos do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás, onde foram analisadas. Análise microbiológica do solo e do adubo orgânico “cama de frango” maturada larvas

Foram realizadas pesquisas de ovos e de helmintos e protozoários de

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importância clínica, utilizando metodologia e amostragem recomendados e regulamentados pela Association of Official Analytical Chemists (1992), num total de cinco amostras representativas da área de produção. As amostras foram analisadas no Laboratório de Controle de Qualidade de Alimentos da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Goiás.

Machado et al.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados para as análises das amostras de alface não lavadas após a colheita e as lavadas imediatamente após colheita encontram-se na Tabela 1. As contagens de microrganismos mesófilos aeróbios apresentaram valores que descartam o produto da classe de alimentos suspeitos. Os valores encontrados se enquadram dentro da faixa de valores obtidos por Riser et al. (1984) para contagem de mesófilos aeróbios em alface hidropônica, ou seja, de 3,8 x 104 a 2,3 x 108 UFC g-1. Porém, considerando os resultados obtidos por Vasquez et al. (1997), 1,2 x 106 a 4,7 x 108 UFC g-1, as contagens foram inferiores. Para coliformes totais, Vasquez et al. (1997) obtiveram valores para alface de 3,2 x 103 a 1,1 x 107 NMP g-1 e Silva (2002), utilizando SimPlate, obteve valores a níveis de 104 NMP g-1, que ao comparar o método de análise de Coliformes oficial da Apha com o SimPlate, concluiu que em seis dos doze alimentos avaliados as metodologias não diferiram significativamente entre si (p>0,05).

Análises microscópicas da alface Para verificação da presença de metais pesados na hortaliça foram coletadas amostras de pontos pré-definidos, tendo como base a declividade do terreno, foram analisadas quanto a presença de chumbo, cádmio, cobre e cromo por absorção atômica em método recomendado pela AOAC (1992). As amostras foram analisadas no Centro de Pesquisa de Alimentos, da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Goiás.

Tabela 1 - Resultados de análise microbiológica de alface crespa, cultivar Mariane, logo após a colheita sem lavagem (SL) e pós-colheita com lavagem prévia em água não clorada (LP), Aparecida de Goiânia, GO. Amostra

Aeróbios Mesófilos* UFC g-1(5) SL

1 2

LP

3,0 x 10

5

1,8 x 10

5 5

SL

0,5 x 10

2

2,6 x 10

4

7,3 x 10

4

5,9 x 10

4

7,0 x 10

4

4,8 x 10

4

3

1,24 x 10

4

1,7 x 10

5

1,3 x 10

5

6

1,3 x 10

5

7

4,0 x 104

5,0 x 104

8

5,3 x 10

4

1,0 x 10

4

1,5 x 10

5

6,0 x 10

4

5

9

5

Coliformes a 35°C* NMP g-1(6)

4

E. coli* NMP g-1(4)

LP

7,4 x 10

3

2,4 x 10

3

7,4 x 10

2

3,4 x 10

3

7,4 x 10

3

0,4 x 10

3

SL

LP

LP

3

< 10

< 10

Ausência**

1

< 10

1,9 x 10 6,0 x 10

2

1,8 x 10

2

8,0 x 10

6

< 10

Ausência**

1

< 10

Ausência**

1

< 10

Ausência**

1

6,0 x 10 6,0 x 10

3

6,0 x 10

< 10

Ausência**

2

1,0 x 10

< 10

< 10

Ausência**

1,1 x 103

6,2 x 102

< 10

< 10

Ausência**

0,4 x 10

3

2

< 10

< 10

Ausência**

2,9 x 10

3

2

< 10

< 10

Ausência**

2

< 10

< 10

Ausência**

3

2,0 x 10

3,2 x 10 2,4 x 10

10 1,9 x 10 3,7 x 10 2,0 x 10 4,0 x 10 *Valor médio de 4 repetições. ** Ausência em 25g.

5

Salmonella sp*

UFC g-1 – Unidade Formadora de Colônia por grama. NMP g-1 – Número Mais Provável por grama. Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.11, n.2, p.191-198, 2009

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As contagens para E.coli, da alface sem lavar, estiveram abaixo de 60 NMP g-1, com ocorrência de 30%. Para a alface lavada a contagem foi menor que 10 MNP g-1. Conforme a Resolução – RDC nº 12 (Brasil, 2001), não há índice máximo de coliformes a 45°C permitido em hortaliças frescas inteiras. Vasquez et al. (1997), em análise de alface, encontraram valores que variaram desde menor que 10 até o valor máximo de 9,3 x 103 NMP g-1 para coliformes a 45°C. Embora a contaminação por E. coli seja relativamente baixa, quando comparada a outros trabalhos (Paula et al., 2003; Simões, 2001) em que os resultados foram acima de 200 NMP g-1, a prevalência deste microrganismo foi alta. Considerando que a presença de E. coli em amostras de alimentos, além de ser o indicador de contaminação fecal mais empregado, pode ser interpretada como a possibilidade da presença de biótipos enteropatogênicos como a

Machado et al.

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E. coli enterohemorrágica (EHEC) (DeRoever, 1998), a presença desta bactéria, mesmo em pequena quantidade, indica a possibilidade de risco à saúde do consumidor. A legislação estabelece somente a ausência de Salmonella em 25g de amostra (Brasil, 2001). Para todas as amostras de alface não foi detectada a presença de Salmonella, o que enquadra a hortaliça nos padrões especificados pela legislação brasileira. Machado (2003) e Paula et al. (2003) também não detectaram a presença de Salmonella em amostras de alface. Os valores para a contagem de microrganismos aeróbios mesófilos para as amostras de água usada para a lavagem da alface (Tabela 2) tiveram uma variação pequena durante a lavagem da alface, confirmando a boa qualidade microbiológica das amostras, antes da lavagem.

Tabela 2 - Resultados da análise microbiológica da água do tanque de lavagem de alface, Aparecida de Goiânia, GO. Microrganismos Aeróbios Coliformes Totais* Coliformes Fecais* Água Mesófilos* UFC g-(3) NMP g-1(4) NMP g-1(4) 3 Antes da lavagem 1,15 x 10 4,0 < 0,3 Durante a lavagem 4,15 x 103 4,0 < 0,3 Após a lavagem 2,2 x 103 4,0 < 0,3 *Valor médio de 4 repetições. De acordo com os resultados obtidos, a água avaliada se enquadra na classe 2, quanto ao seu uso: “águas destinadas ao abastecimento doméstico, após tratamento convencional, à irrigação de hortaliças ou plantas frutíferas e à recreação de contato primário (natação, esquiaquático e mergulho)” (Brasil, 1986). Neste regulamento, é permitido até 5000 NMP g-1 de coliformes totais e 1000 NMP/g de coliformes fecais. Ao não estabelecer limites máximos para a presença de coliformes termotolerantes em hortaliças in natura, a legislação brasileira baseia-se no fato de que o produto deverá ser adequadamente sanitizado por manipuladores antes do seu consumo. A lavagem dos vegetais é a prática mais comum para se obter um produto mais seguro. É de primordial importância, no entanto, que essa água seja, antes de tudo, de boa qualidade, como no presente trabalho. Porém, a eficácia da operação de lavagem, deve ser aumentada com a inclusão de antimicrobianos ou sanitizantes nessa água de lavagem, devido à possibilidade da presença

de E. coli enteropatogênica. Frank & Takeushi (1999) afirmam que uma lavagem eficiente de hortaliças, em água adicionada de sanitizantes, é um ponto crítico de controle, utilizado com freqüência em países como os Estados Unidos da América do Norte. A pesquisa de Salmonella em amostras do solo de cultivo da alface e do adubo cama de frango curtida e utilizada como fertilizante no cultivo apresentou resultado negativo para todas as amostras. Os resultados confirmam a eficiência e a necessidade do tratamento da cama de frango, uma vez que existe a possibilidade da presença de Salmonella neste material. A presença dessa bactéria é rotineiramente verificada na cama dos aviários através de pesquisa bacteriológica. Davies & Wray (1995) encontraram em 22% das amostras, de swab de superfície de dois aviários, a bactéria S. enteritidis. Não foram detectados ovos e larvas de helmintos e protozoários nas amostras de alface analisadas (Tabela 3), colhidas em pontos diferentes e lavadas imediatamente após a colheita.

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Geralmente, tanto em áreas rurais quanto urbanas dos países de terceiro mundo, devido às baixas condições sanitárias, as parasitoses intestinais são amplamente difundidas, sendo as

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hortaliças citadas como um dos veículos de suas estruturas infectantes (Marzochi & Cavalheiro, 1978; Silva et al., 1995).

Tabela 3 - Resultados da análise microscópica de alface crespa, cultivar Mariane, lavada em água não clorada, Aparecida de Goiânia, GO. Amostras 1 2 3 4 5 Ovos e larvas de Helmintos e Protozoários*

Ausência

Ausência

Ausência

Ausência

Ausência

* Importância clínica/100g do valor médio de 4 repetições. A principal forma de contaminação dessas hortaliças dá-se, principalmente, através da água contaminada por material fecal de origem humana, utilizada na irrigação das hortas ou ainda por contaminação do solo por uso de adubo orgânico com dejetos fecais (CDCP, 1998; Faria et al., 1986; Oliveira & Germano, 1992b). Assim sendo, o fato de não se detectar a presença de helmintos e protozoários no presente estudo, se explica pelos bons resultados obtidos para a qualidade microbiológica da água utilizada e pela utilização no solo somente de adubos maturados. Analisando os valores médios encontrados do metal chumbo (Tabela 4), de acordo com a Portaria nº 685 de 1998 do Ministério da Saúde (Brasil, 1998), o limite máximo de tolerância para chumbo em alimentos é de 0,05 a 2,0 mg kg-1; para o cobre em hortaliças é de 10 mg kg-1 e para o cromo em alimentos de 10 mg kg-1, para o cádmio não há indicação O Codex Alimentarius (Fao/Who, 2001) recomenda limite máximo de 0,2 mg kg-1 de cádmio e de 0,3 mg kg-1 de chumbo em vegetais. Verificou-se então que os valores de chumbo estão acima do limite de tolerância,

considerando-se a recomendação do Codex Alimentarius, para todas as amostras analisadas, enquanto os outros elementos encontram-se dentro das especificações da legislação. Exposição contínua de chumbo resulta na acumulação gradual desse elemento em órgãos vitais humanos, que pode causar mudanças bioquímicas e neurológicas profundas no corpo (Matloob, 2003). De acordo com estudo de Piomelli (1994), envenenamento com chumbo é o problema de saúde ambiental mais importante para crianças. É possível que o chumbo encontrado, em níveis preocupantes, seja proveniente da poeira contendo partículas do metal, que pode aderir à superfície do vegetal; e neste caso a alface do tipo crespa estaria sujeita à retenção dessa poeira, devido à característica própria de suas folhas. Outra possibilidade seria o adubo cama de frango utilizado na cultura, e neste caso, a contaminação seria proveniente do consumo de ração com altos teores de chumbo pelas aves (Hapke, 1991). Pode também ocorrer à absorção de chumbo por plantas em solos com concentrações elevadas desse elemento, portanto, é necessário que mais estudos sejam realizados, com o objetivo de detectar a fonte de contaminação por chumbo.

Tabela 4 - Resultados das determinações de metais pesados em alface crespa in natura, cultivar Mariane, Aparecida de Goiânia, GO. Amostras 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Chumbo* mg kg-1 1,20 1,38 1,40 0,86 0,68 1,00 0,68 1,80 Cádmio* mg kg-1 0,0 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 Cobre* mg kg-1 1,11 1,50 1,30 0,96 0,84 1,32 1,00 1,06 Cromo* mg kg-1 - (7) 2,00 3,30 1,50 2,80 3,79 1,27 0,55 *Valor médio de 4 repetições.

7

10 1,20 0,00 1,86 0,76

Determinação não realizada. Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.11, n.2, p.191-198, 2009

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. CONCLUSÕES A contaminação por E. coli é baixa, com incidência de ocorrência de 30% na alface sem lavar. Para a alface lavada a contagem é menor que 10 NMP g-1 da bactéria. Todas as amostras do solo de cultivo, do adubo cama de frango maturada e da alface apresentam ausência de Salmonella, descaracterizando, portanto, esse microrganismo como perigo. O perigo potencial para a lavoura avaliada é a presença de chumbo na alface, que apresentou valores acima dos níveis recomendados internacionalmente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS American Public Health Association - APHA. Technical Commitee on Microbiological Methods for Foods. In: Vanderzant, C.; Splittstoesser, D. F. (Ed.) Compendium of methods for the microbiological examination of foods. 3. ed. Washington: American Public Health Association, 1992. p. 336-383. Association of Official Analytical Chemists AOAC. Official methods of analysis. 15. ed. Washington, 1992. Brasil. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Portaria nº 020/CONAMA, de 18 de junho de 1986. Diário Oficial [da Republica Federativa do Brasil], Brasília, v. 124, n. 143. p. 11356-11361, 30 jul. 1986. Seção 1 Brasil. Portaria nº 685/ Ministério da Saúde de 27 de agosto de 1998. Princípios gerais para o estabelecimento de níveis máximos de contaminantes químicos em alimentos. Diário Oficial da União [República Federativa do Brasil], Brasília, n. 165. p. 28-29, 24 set. 1998. Brasil. Resolução RDC nº 12, 2 jan 2001. Aprova o regulamento técnico sobre padrões microbiológicos para alimentos. Diário Oficial da União [República Federativa do Brasil], Brasília, v. 139, n. 7-E, p. 49-53, 10 jan. 2001. Seção 1. Centers for Disease Control And Prevention. Incidence of foodborne illnesses. Morbidity and Mortality Weekly Report, v. 47, p. 782-786, 1998. Costa, C. G. Controle de qualidade dos alimentos. Disponível em: . Acesso em: 21 out. 2003. Davies, R. H.; Wray, C. Contribution of the lesser mealworm beetle (Alphitobius Diaperinus) to carriage of Salmonella Enteritidis in poultry. Veterinary Record, London, v. 137, n. 16, p. 407-408, Oct. 1995. DeRoever, C. Microbiological safety evaluations and recommendations on fresh produce. Food Control, Oxford, v. 9, n. 6, p. 321-347, Dec. 1998. Fao/Who. Codex Alimentarius Commission. Food additives and contaminants. Joint FAO/WHO Food Standards Programme; ALINORM 01/12A:1- 289, 2001. Faria, J. A. S. et al. Estudo de alguns aspectos da disseminação de enteroparasitas na cidade de Salvador, Bahia. Revista Baiana de Saúde Pública, Salvador, v. 13, n. 1, p. 141-144, 1986. Frank,J. F.; K. Takeushi. Direct observation of Escherichia coli O157:H7 inactivation on lettuce leaf using confocal scanning laser microscopy. In: International Conference of International Committee on Food Microbiology And Hygiene (ICFMH), 17, 1999, Vendhoven, Netherlands. Proceedings... Vendhoven, Netherlands, 1999. p. 795-797. Foegeding, P. M.; Roberts, T. Assessment of risk associates with foodborne pathogens: an overview of a council for agricultural science and technology report. Journal of Food Protection, Ames, v. 59, p. 19-23, 1996. Supplemente. Fuzihara, T. O. et al. Surtos de toxinfecções alimentares confirmados, laboratorialmente, ocorridos na região do ABC, SP, no período de 1991 a 2004. In: Encontro Nacional de Analistas de Alimentos, 2005, Goiânia. Anais... Goiânia, 2005. Hobbs, B. C.; Roberts, D. Toxinfecções e controle higiênico-sanitário de alimentos. São Paulo: Varela, 1998. 376 p. Hapke, H. J. Metal Accumulation in the food chain and load of feed and food. Metals and Compounds in the Environment. Weinheim, New York: VCH, 1991. p. 469479, Instituto Akatu. Selos de qualidade: alimentos mais baratos e mais seguros. Disponível em: . Acesso em: 21 out. 2003. Machado, D. C. Qualidade microbiológica de hortaliças orgânicas cultivadas na

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